Capítulo Único
Death Is Just a Heartbeat Away
Você e eu caminhamos por um caminho frágil.
Eu sabia disso o tempo todo,
Mas nunca pensei que viveria para vê-lo se quebrar.
Está escurecendo e tudo quieto demais,
E eu em nada posso confiar agora.
E se aproxima de você
Como se tudo fosse um grande erro.
Você e eu caminhávamos por trilhas frágeis, Severus. Eu sempre soube, e você mais ainda.
E por que tudo precisaria acabar? Por que meus sonhos deveriam se estilhaçar assim como nossos destinos sempre tão imperfeitos (ou perfeitos apenas aos nossos olhos cegos e deslumbrados)?
A noite tenebrosa e vazia nos amaldiçoava, e Hogwarts aparentava estar cada vez mais imersa em trevas. Seria o sinal maior de que perderíamos tudo? Eu, pelo menos, haveria de perder.
A lua parecia opaca quando eu a fitava com meus olhos desesperançosos, cujo tom de castanho parecia também visivelmente desbotado. A neblina encobria parcialmente minha visão do céu e parecia calar, ainda, tudo que havia de bom em mim. Todas as minhas lembranças felizes a noite fazia questão de levar embora, como um ladrão a invadir lares desprotegidos, em uma madrugada obscura e lúgubre, para roubar tudo de valor que há ali.
Eu deveria confiar em mim? Eu deveria confiar em você, que eu não acreditava, verdadeiramente, ser um traidor? Deveria confiar ao menos na minha sombra? Meu erro era seu, o seu erro também era meu – meu sonho que n’água turva se diluiu e se perdeu.
A Batalha Final tinha Hogwarts como seu palco, como não poderia deixar de ser. Voldemort havia se retirado da Escola com seus súditos e anunciado, na noite mais imensa, aos mais altos brados que Harry Potter fosse entregue por quem ali estivesse. Ninguém faria isso, contudo: mais uma vez a bondade das pessoas foi subestimada pelo Lorde das Trevas.
Oh, prendendo a respiração,
Não vou perdê-lo de novo.
Algo fez seus olhos esfriarem.
Pouco depois, eu o vi se despedaçar, querido Severus.
Você chegou à Casa dos Gritos. Harry e eu também estávamos lá, sob a Capa de Invisibilidade. Era minha chance, precisava dar um jeito de falar com você, de mostrar que o que está em mim não morreu, nem que fosse para uma derradeira despedida.
Eu não o perderia de novo! Não poderia perdê-lo!
Eis que ouço a voz fria daquele homem – que mais parecia uma criatura ofídica do que um humano – espalhar-se pelo ambiente. Tão vil, bárbara e sem vida.
Eu não prestava muita atenção ao que ele dizia, por mais que me esforçasse para compreender o porquê de ele querer Severus ali.
Meus pulmões precisavam de ar, pois era como se eu não respirasse com o que viria a seguir.
Num silvo cruel, veio a ordem que destruiria de vez o meu desejo maior. Vi a enorme cobra se aproximar de você, que havia congelado, estagnado, tamanha sua surpresa.
Só Deus sabe o quanto desejei fazer algo para salvá-lo. Harry, no entanto, me deteve, dizendo-me num sussurro que se agíssemos seria pior para nós. Talvez ele tivesse razão.
Escutei o estalar de seus ossos ao ser sufocado por Nagini. O sangue começava a deixar seu corpo pela enorme ferida no pescoço. Parte da minha alma também se partiu, indo para bem longe, e meu coração desejava saltar ao ouvir o animal dominá-lo. Sim, eu apenas ouvia, pois eu me recusava a manter os olhos abertos diante daquela tortura imensa a você. Tortura que também passou a ser minha, pois a sua dor eu sempre tomava para mim.
Ao ver Voldemort deixar a Casa dos Gritos em posse daquela que ele imaginava ser a Varinha das Varinhas, saímos Harry e eu do abrigo da Capa de Invisibilidade. Meu melhor amigo foi atrás do seu destino, que era encarar a morte diante de seu maior inimigo, deixando-me ali. E eu fui ao encontro daquele que deveria ser o meu destino – o homem que padecia no chão ensanguentado.
Venha, venha,
Não me deixe assim.
Eu pensei que tivesse entendido você,
Algo deu terrivelmente errado.
Você é tudo que eu sempre quis.
Quando notei sua alegria ao ver que me aproximava de você – ainda que em seu leito de morte –, apenas confirmei o que, no mais profundo de mim, eu já sabia. Você jamais havia traído Dumbledore e, menos ainda, a minha confiança. Aquilo me fez sorrir, inexplicavelmente. Um sorriso inesperado, mas franco.
Deus! Como era maravilhoso estar certa de que você era inocente!
Ajoelhei-me ao seu lado, tomei uma de suas mãos entre as minhas, e o sorriso foi, paulatinamente, dando lugar às lágrimas que brotavam dos meus olhos, algumas, inclusive, a molhar seu rosto tão pálido, como se tivessem o papel de lavar minha alma e a sua, já perto de abandonar seu corpo fragilizado.
Aquelas gotas continham mais do que água e sabor salgado e indigesto, pois carregavam parte de mim. As lágrimas levaram, junto com meu sorriso e sua morte, meus sonhos – antes já tão impossíveis – embora.
Por que você tem de partir? Por que nada entre nós pode, enfim, dar certo? Por que tudo que eu quis e amo precisa me abandonar da pior forma? – eu pensava sofregamente.
Seus olhos negros, que eram minha única luz naquela noite trevosa, se tornaram vazios. Estavam abertos, mas era como se estivessem fechados, como duas cortinas no nosso Teatro dos Pesadelos. Era o nosso fim. Era o fim daquele espetáculo trágico que se encerrou sem aplausos.
Sentei aqui e vi você largar
Tudo o que tínhamos.
Mas eu ainda faço jus a cada palavra que eu disse a você.
Ele vai tentar tirar a minha dor
E pode simplesmente me fazer sorrir,
Mas o tempo todo eu desejei que fosse você ao invés dele
A tristeza deu lugar ao medo. Eu estava ali sozinha com o seu corpo já imóvel e sem saber o que fazer. Quem diria, Grifinórios também sentem medo. Ainda mais quando perdem tudo.
E só ao vê-lo sem vida lembrei-me de tudo que atravessamos. E percebo toda a minha ingenuidade.
Ele fez tudo pensando em me ver feliz, ou ao menos segura! Deixou-me para me proteger da ira de seu Lorde caso alguém descobrisse que há algo entre ele e uma ‘sangue-ruim’ e, além disso, insistiu para que eu ficasse com Ronald, ainda que odiasse o ‘cabeça-de-fósforo’ – ri ao lembrar-me de sua feição desgostosa ao pronunciar o apelido de Ron dado por você mesmo.
Ron poderia até tentar preencher parte do vazio que você deixou em mim, curar parte da minha dor apenas com seu jeito divertido e, por que não, atrapalhado de ser, que tanto me fez rir no passado. Mas a verdade é que ele não é você, e quão difícil é isso conceber.
Respiro fundo e percebo que ainda tenho meus dedos entrelaçados à sua mão fria. Meus olhos voltam a enxergar os seus, sem o menor sinal vital.
Você partiu primeiro, agora era a minha vez de deixá-lo, mesmo que você não pudesse sentir qualquer mágoa ou receio por isso. Acaricio seu rosto de modo desajeitado e permito que uma última lágrima manche o seu rosto macilento antes de me levantar e sair dali.
Meus passos pareciam calmos naquela noite silenciosa, mas tranquilidade era algo que não seria capaz de resumir o que eu verdadeiramente sentia. A neblina novamente me acompanhava – desta vez na volta até o Castelo –, e a luz fraca da lua encoberta era a única que ainda não havia me deixado naquele final de noite.
Sentia o vento desarranjar meus cabelos naturalmente revoltos e me empurrar para aquilo que seria o meu azar e definhamento – ou minha fortuna e avivamento.
Oh, prendendo a respiração.
Não vou vê-lo de novo,
Algo fica me prendendo ao nada.
Quando me aproximava de Hogwarts, meu melhor amigo, por mais que pensássemos que era loucura ele se entregar assim, escolheu seu destino ao seguir até a Floresta Proibida. Sozinho.
Nem o mais otimista dos bruxos acreditaria que ele sairia dali com vida, e assumo que eu não o julgaria ou culparia por isso.
Chego ao Salão Principal e me deparo com tantos dos nossos deitados no chão, de rostos cobertos. Mortos. No fundo, eu gostaria de estar entre eles.
O vazio me tomou outra vez, pois eu não o veria novamente, sonho meu. Não o ouviria ralhar comigo e meus melhores amigos ao tirar pontos da minha Casa nem uma frase carinhosa tão rara de sair dos seus lábios finos direcionada a mim. Devo admitir: eu já sinto falta do melhor e do pior em você, querido Severus.
Até que se desenha em minha mente o complemento do mapa para minha trilha mortífera. Algo que me pareceu ser uma solução ilógica e ao mesmo tempo tão lógica.
Lembro-me de quando o ódio da Sociedade Bruxa, em geral, o perseguiu, exatamente após o assassinato de Dumbledore forjado naquela Torre.
Ali Severus caiu em desgraça. E é ali que eu também me perderei.
Eu sei, eu sei,
Eu simplesmente sei.
Você não se foi.
Vamos lá, você não pode ter ido embora.
Não!
Eu nunca pensei que viveria para vê-lo definhar. Nunca pensei que eu veria... Mas naquela noite eu vi como Severus, tão duro e severo, poderia ser frágil diante do espelho da morte.
Ele se foi, mas nunca me deixou de verdade. – era o que me consolava.
Sim, ele se foi, sua idiota, e você não tem mais nada a fazer aqui nem nada a perder! – meus sonhos partidos me contrariavam, enquanto eu subia as escadas.
Não consigo respirar quando eu sei que você se foi.
Não dá pra voltar atrás agora,
Estou assombrada.
Eu tinha medo, mas minha fraqueza era maior que minha vontade de viver. Se eu continuasse ali, lutaria pelo quê? Dizem que suicídio é mais ato de covardia do que de coragem, e talvez estejam certos. Talvez o Chapéu Seletor tenha se equivocado comigo.
Eu tremia e minhas mãos suavam frio. Mas não, eu não voltaria atrás. Não agora que havia chegado até ali.
Apóio meus pés no parapeito e prendo a respiração. E naquele instante, na Torre de Astronomia regada às ruínas de uma guerra que também era minha, eu caio. Pela segunda vez. Porque eu já havia me sentido cair quando vi o brilho nos seus olhos, amado Severus, desvanecer na hora que se passou. Naquela Torre, senti-me voar após ter desabado. Ali sorri após, com a sua morte, ter chorado. E, enfim, vivi quando a morte nos havia chegado. Pois sem você aqui não há vida, e na morte – ou sobrevida – estaríamos juntos de novo, tomados por montes de clichês e paradoxos. Mais uma vez.
Notas:
- Estava quase que terminando a fic e no maior desespero por ainda não ter um nome para ela. É, eu sempre sofro com isso. Eis que começo a ouvir Out In The Fields (um cover de Gary Moore feito pelo Sonata Arctica) e um pequeno verso me atém. Pois é, como podem notar, ele passou a dar nome ao texto.
- Sou péssima com songs, relevem.
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!