Prólogo



Prólogo


 


O deserto do Saara, localizado ao norte do continente africano, não é um lugar onde alguém gostaria de estar ao meio dia, com o sol a pino no céu e eventuais tempestades de areia podendo ocorrer a qualquer momento. Porém, no ensolarado dia em que nossa história tem início, um distinto senhor caminhava calmamente entre as dunas, trajando pesadas roupas e uma capa negra sobre elas. Vestimentas incomuns no deserto. Embora os habitantes locais e viajantes geralmente usem roupas fechadas, a fim de proteger a pele dos raios de sol, uma pesada capa em nada ajudava.


O semblante do homem, porém, não revelava desconforto; antes, uma ansiedade com tons de cobiça. Parecia procurar atentamente por algo que deveria estar à sua volta, pois não parava de olhar para os lados. Poucos minutos atrás, ele havia simplesmente “surgido” no meio do deserto, como se o ar tivesse repentinamente decidido tomar forma, e então iniciara sua procura.


Após cruzar uma duna, ele viu. Um losango de cor marrom, quase se confundindo com a areia do deserto, pairava a cem metros de distância. O homem apressou os passos mais e mais, até atingir, ofegante, a intrigante forma.


A intrigante forma era um portal. Puxando uma fina varinha do bolso esquerdo, o homem o atravessou. E imediatamente, desapareceu desta dimensão, ao mesmo tempo em que o portal se fechava.


Uma luz branca o envolveu assim que adentrou o portal, e por um instante, sentiu-se sem chão. Mas logo estava novamente sobre uma superfície. Endireitou-se, brevemente, e olhou ao redor.


Encontrava-se agora numa cálida campina. O sol aparecia pouco acima dos pequenos montes e elevações rochosas ao horizonte. Pequenos lagos podiam ser vistos aqui e ali, entre as árvores de um bosque logo a sua frente.


O indivíduo assumiu uma postura tranquila, como se esperasse por alguém. Continuava a segurar a varinha, pronto para erguê-la, se preciso fosse.


Ergueu a mão direita e a passou, distraidamente, pelos longos cabelos brancos. Os olhos negros e um tanto arrogantes, as sobrancelhas levemente franzidas e a barba mal feita davam traços de austeridade a seu rosto, o qual mostrava algumas expressões do tempo, mas não revelava sua verdadeira idade. Quem o visse, o julgaria membro de alguma rica família bruxa, tais eram suas vestes bem costuradas e asseadas.


Repentinamente, surgiram seres de dentre as árvores. Trajavam resplandecentes túnicas brancas, que, assim como seus longos cabelos cor de ouro, pareciam irradia um certo brilho, mesmo sob a luz do sol. Poderiam ser confundidos com humanos, não fosse sua beleza ofuscante e orelhas pontudas.


Estavam em pequeno número, cinco ou seis. Aproximaram-se rapida e determinadamente do homem. Este abandonara a pose tranquila. Parecia agora tenso e pronto para lutar.


– Que fazes aqui, filho de Slytherin? Bem deves saber que os de vossa linhagem não são bem-vindos ao mundo élfico ou seus arredores, o que inclui este lugar. Ousas desafiar uma raça mais antiga e poderosa que a tua?


Pela primeira vez, o intruso falou. Sua voz era baixa, grave e suave.


– Sim, uma raça mais antiga que a minha, e mais poderosa. Porém, não por muito tempo. Vocês têm algo que me pertence. Pertenceu a Salazar Slytherin, é meu por direito.


– Sei a que se refere. Cogitei essa possibilidade assim que nosso  soberano sentiu tua presença e nos mandou aqui. Porém, aquilo nunca pertenceu a Slytherin. Salazar nos roubou – entretanto, a relíquia voltou ao nosso poder. Obviamente, não nos sentimos inclinados a ceder-te o objeto.


– E quem falou em “ceder”?


Com uma velocidade impressionante, o descendente de Slytherin ergueu a varinha, e dela saiu um jato vermelho. Com uma aceno de mão, o elfo fez com que o jato sumisse no ar; ainda assim, foi impulsionado para trás pela força do feitiço.


– Desejas realmente duelar? – gritou outro elfo. – Vês que somos mais numerosos e poderosos. Ainda assim, in...


Foi interrompido por um grande clarão de luz verde saído da varinha do oponente. Tão rápido quanto o vento, o homem cortou o ar com a varinha; no momento seguinte, os elfos jaziam mortos.


No mesmo instante, surgiu, na borda do bosque, outro elfo. A coroa de folhas em sua cabeça o denunciava como soberano dos elfos. No indicador da mão direita, trazia um anel, com um vistoso topázio no centro.


– Maldito seja! – gritou, vendo os subordinados mortos. – Que fizeste, infeliz?


Empurrou as mãos para baixo, como se pressionasse algo. Imediatamente, uma onda de terra se moveu até o intruso humano. Este, por um instante desequilibrado, logo se recompôs e apontou a varinha para o soberano elfo. O raio que dela saiu arrebentou-se contra a barreira de terra que o elfo ergueu à sua frente, com um simples aceno de mão.


Agora, foi a vez do elfo atacar. Repetidas vezes, fez movimentos com as mãos, como se brandisse chicotes contra o oponente. Por sua vez, o outro se esquivava e defendia-se com acenos da varinha.


O duelo foi tornando-se cada vez mais violento, os dois combatentes calados, suas faces concentradas nos feitiços a serem lançados.  Duas vezes o elfo caiu, para logo se levantar e voltar ao combate com mais ferocidade, e uma vez o humano esteve perto da morte, sendo soterrado por uma enorme quantidade de areia conjurada pelo elfo.


Por um breve momento, os dois se encararam. E o que o elfo viu, nos olhos daquele homem, o assustou mais do que tudo o que ja vira em seus milênios de existência. Era ódio. O ódio mais negro, forte e profundo que jamais fora contemplado por olhos mortais e imortais. E então, o duelo recomeçava.


Após mais alguns minutos de exaustivo combate, o humano viu sua varinha ser arremessada pala longe. Nova pausa.


– Segue-me, filho de Slytherin, e livra-te de teu ódio – disse o elfo, as mãos erguidas. – Ele cresceu como uma parasita dentro de ti, consumindo toda tua mente e tua alma, mas ainda podes ser salvo. Segue-me.


O homem não respondeu. Alguns segundos se passaram, e ele ergueu as mãos, num gesto de suposta rendição.


– Neste instante – disse, suavemente –, encontre-se com a morte, ó imortal. SERPENSORTIA! – terminou, berrando e estendendo as mãos, como se rogasse uma praga.


Assim que o humano começou a pronunciar a palavra, uma grande cobra, grossa e prateada, materializou-se em volta do elfo. Quando terminou, este estava caído, impossibilitado de respirar pelo aperto da serpente.


Silenciosamente, o homem caminhou até o imortal caído. Abaixou-se.


– O imortal à beira da morte. Que irônico.


Os olhos élficos, perfeitos, o fitaram, não com raiva nem ódio, mas piedade. Pura e doce piedade. Impossibilitado de sustentar este olhar, desviou os olhos para a mão direita do moribundo. O anel faiscava à luz do sol. Lenta e delicadamente, ele o retirou do indicador do outro, colocando-o em seu próprio.


Levantando-se, contemplou o anel em seu dedo. Em seguida, bateu palmas uma vez. Toda a terra a sua volta foi sacudida por um leve tremor.


– Um a menos. Faltam quatro – falou friamente, antes de caminhar até o lago mais próximo, na beira do bosque, e desaparecer.

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