de volta à mui antiga e nobre



Faltava pouco para meio noite do dia 31 de Julho. Harry, agora com seus recentes 16 anos, se encontrava, em seu quarto, único refúgio sempre que estadiava naquela monótona rua dos Alfeneiros, número quatro. Em cima da cama, os presentes ainda permaneciam jogados desde o momento que os abrira. Rony, Hermione, Hagrid, a Sra Weasley, Tonk, o Professor Lupin, todos haviam mandado presentes. Em onze anos da sua vida, sequer recebera nada diferente de um par de meias velhas que, com sorte, não estariam com o cheiro fedorento dos pés de Duda e naquela noite, sua cama estava atolada de lembranças dos amigos que não se esqueciam dele. Era grato por isso. Era sim! Mas, pela primeira vez, desde que entrara em Hogwarts, Harry sentia-se satisfeito em estar na casa dos tios trouxas. Alí, ninguém se preocuparia em como estaria, o que estava sentindo, se estava bem ou não. Não que o desagradasse a atenção que lhe dedicavam, mas naquele momento, Harry só queria que esquecem, um pouquinho que fosse, dele. Nada de perguntas, nada de superproteção, muito menos os olhares de pena que o seguiam desde o dia em que saíra, mais uma vez vivo, do Ministério da Magia.



A paz que o garoto encontrava sempre que a noite caía e seus tios se recolhiam em seus quartos já não existia mais. Depois dos primeiros dias de férias, passou a desejar que os dias não se acabassem. Não queria mais a noite, não queria ter que se deitar na cama e fechar os olhos e mais uma vez contemplar a face de Sirius. O seu rosto com aquela expressão terrível de medo que jamais achou que pudesse ver no padrinho. E essa lembrança se repetia, noite após noite, desgastando-o de forma visível. Por isso lhe agradava estar na rua dos Alfeneiros. Já era suficientemente atormentante não conseguir dormir devido às lembranças, felizmente estava fora das vistas de qualquer pessoa que se importasse com ele. Não queria imaginar a expressão da Sra. Weasley se o visse naquele estado.



Foi com esse pensamento que Harry terminou de guardar os presentes em seu malão guardando-o novamente debaixo da cama a fim de deitar-se na tentativa de descansar o tanto quanto conseguisse. Antes mesmo de amanhecer ele seria recepcionado novamente por um novo grupo de bruxos encarregados de fazê-lo chegar inteiro ao Largo Grimmald onde permanecia a sede da Ordem, mesmo após a morte do último Black. O garoto evitou pensar como seria voltar para a casa de Sirius. Com certeza não lhe agradava a idéia mas evitava pensar no assunto até que realmente fosse necessário.



Aos poucos o jovem Harry Potter foi fechando os olhos escandalosamente verdes até cair num sono leve, rotineiramente turbulento.





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"Haaarrrryyyyyy!!!!!!!!!!!!". Rony e Hermione exclamaram em tom uníssono ao avistarem o amigo atravessar porta a dentro.



"Olá!", respondeu demonstrando uma falsa empolgação!



"E aí cara, recebeu nossos presentes?", Rony perguntou.



"Recebi sim. Adorei todos!"



"Garotos, Harry deve estar cansado", a Sra Weasley apareceu, ainda de roupão. "Como vai Harry, meu querido. Está tudo bem com você?". A mãe de Rony passou a verificar pedaço por pedaço do jovem, certificando-se de que estava inteiro, finalizando com um caloroso abraço. "Você está muito abatido querido. Venha, você pode tomar o café da manhã antes de descansar."



E assim seguiram para a cozinha. Harry sentou-se rodeado dos rostos que conhecera no verão passado. "Sem muitos estragos, por enquanto". pensou ao examinar pessoa por pessoa. Estavam todos alí. Pelo menos todos de que se lembrava freqüentar a mansão nas últimas férias. Comparando ao que Professor Moddy andou relatando sobre a última Ordem, não haviam sobrado muito. Seria um sinal de que estavam melhores preparados ou de que a Guerra estaria só no começo? Harry evitou pensar. Preferiu se entreter com as diversas conversas que se formavam à cozinha, sempre direcionando, aleatóriamente, perguntas à ele de como passara as férias até então.



Harry examinou a cadeira ao seu lado, em que a Sra Weasley se sentara exageradamente próxima sem tirar os olhos do garoto. Por mais que tentasse disfarçar, ela ainda o checava cautelosamente. Há um ano atrás, Harry se sentara naquela mesa, tendo Sirius ao seu lado, no exato lugar em que se encontrava a mãe de Rony que, naquela ocasião, discutia ferozmente com Sirius que teimava em contar o que andava acontecendo no mundo mágico. Sentiu-se culpado ao desejar que não fosse a mulher que estivesse ao seu lado e sim o padrinho. "Quanta consideração em Harry?", pensou. Sra. Weasley sempre o tratou como se fosse da família, mas Sirius...oras, ele era a sua família.



Nem bem terminou o café, Harry seguiu para o quarto. Rony fez menção de seguí-lo, mas Hermione o deteve discretamente fazendo com que agradecesse mentalmente por ser tão perceptiva.



Já no quarto, encontrou sua cama cuidadosamente arrumada, de forma extremamente convidativa. Então ouviu batidas na porta.



"Entra...", autorizou



"Ei Harry", o professor lupin se aproximou. "Trouxe essa poção para você tomar. Molly ficou bastante preocupada com a sua afeição de quem não tem dormido nem um pouquinho nos últimos tempos. Isso vai fazer você descansar".



Harry agradeceu com um sorriso e tomou de uma vez o líquido amargamente estranho. Suas forças se limitaram a alcançar a cama e, segundos depois, cair num sono profundo e, finalmente, tranqüilo.



Quando despertou, o garoto sentiu como se dormisse pelo resto das férias. Esticou o braço alcançado os óculos na cabeceira. O quarto estava vazio. A cama de Rony permanecia arrumada. O garoto sentou-se na cama sentindo-se milagrosamente disposto. Permaneceu parado por alguns minutos tentando espantar o pouco de sono que ainda lhe restava. Levantou-se dirigindo até a janela fechada onde uma fraca iluminosidade insistia entrar. Supôs que fosse dia ainda, embora faltasse muito pouco para que anoitecesse.



O silêncio do quarto foi quebrado por uma explosão de gritos terrívelmente familiar. "Saiam da minha casa. Escórias. Seus imprestáveis, estão poluindo o ambiente com a presença de mestiços imundos. Saiam! Saiam todos! Vocês não tem mais o porque de ficarem aqui". Alguém havia acordado o simpático quadro da Senhora Black. Ainda podia ouvir uma muvuca quando o som foi rapidamente abafado. Como havia previsto segundos antes, a porta se abriu cautelosamente.



"Imaginei que você iria acordar com toda essa gritaria".



"Eu já estava acordado. Entre professor", Harry se precipitou ao perceber que Lupin mantinha-se parado á porta. O antigo professor obedeceu o garoto, aproximando-se da primeira cama, a de Rony, e sentando-se, sendo seguido por Harry que voltou à sua cama.



"E então, como está você Harry?"



Quase lhe escapou um "Estou ótimo", mas se conteve. Não era verdade e todos sabiam disso. Seria extremamente arrogante se mentisse. Seria como se nada do que estivesse acontecendo em sua vida fizesse diferença. Seria uma injustiça à memória de Sirius.



"Vou levando", respondeu de forma sincera. "E o senhor?"



"Na medida do possível"



O quarto novamente caiu no silêncio. Por alguns segundos que se arrastaram cansativamente, nenhum dos dois se atreveu a pronunciar mais uma palavra. Remo observava Harry e esse, sentindo as vistas do professor sobre ele, dispersava os olhos verdes para qualquer canto do ambiente.



"Sabe Harry. Desde que a sede da Ordem foi transferida para cá, Sirius me convidou para que ficasse aqui com ele e eu assenti. Era bastante torturante para ele ter que viver novamente debaixo desse teto que ele tanto menosprezava em circunstâncias tão irritantes. Ele se sentia preso na própria casa. "Nessa maldita cara", ele dizia. Por essa razão eu aceitei e vim fazer companhia para ele. Depois da....", Remo estudou novamente as palavras a serem usadas. "...depois de tudo o que aconteceu no Ministério da Magia no começo do verão, imaginei que a casa já não seria mais útil para a sede. Percebi que estava enganado quando Dumbledore mesmo certificou-se em me avisar que não haveria mudança de planos e pediu para que eu continuasse na casa".



Harry finalmente ergueu os olhos para o professor com uma expressão bastante surpresa.



"O senhor está morando aqui?"



"De forma provisória, se quer saber meus planos. Já não era agradável mesmo com a presença de Sirius, imagina agora."



"E o senhor fica sozinho aqui?"



"Ah não. Há sempre pessoas na casa. Indo e vindo. São raras as ocasiões que fico sozinho, na maioria das vezes à noite. Mesmo assim já estou acostumado. Sabe, não é fácil conviver com um segredo".



Percebendo a completa atenção voltada à ele, Lupin continuou.



"Nas noites de lua cheia, me tranco no sóton e, com o efeito da poção Mata-Cão, fico aguardando até que volte a fazer dia. Tornou-se bastante prático pois lá eu não interfiro em nada que possa estar acontecendo ainda dentro da casa. Eu fico no meu canto enquanto os membros da ordem continuam a trabalhar. Mas sabe Harry, foi semana passada, na última noite de lua cheia que eu encontrei algo que é de seu interesse".



Harry desviou os olhos para um pacote que Remo tirou de dentro das vestes.



"O que é isso?", perguntou interessado.



"Eu encontrei no sóton. Sirius passou bastante tempo trancado naquele lugar, sempre com a desculpa de ir alimentar Bicuço. Nas últimas semanas ele, de repente passou a dedicar tempo quase que integral àquele lugar. Só então, quando encontrei "isso", eu pude entender". Remo entregou para Harry que ficou a observar o pacote sem abrí-lo.



"Ele estava montando para você Harry, como presente de aniversário, foi o que pude entender. Achei propício entregá-lo a você. Não repare no pacote. Fui eu mesmo quem fiz."



Harry estava sem reação defronte ao pacote. Um presente de Sirius para ele. Não conseguia decifrar o que sentia, mas era bom, muito bom, mixado com uma pontinha de tristeza por não ter sido entregue pelo próprio padrinho. E mais uma vez Harry se sentiu culpado por desfazer tanto da presença daqueles que cuidavam dele com tanta vontade.



"Vou deixá-lo sozinho para que possa dedicá-lo a ele". Lupin levantou-se em direção à porta. "E Harry...é um presente! Não esqueça do mundo à sua volta. Não vai lhe fazer bem ficar preso em lembranças e esquecer de viver a sua vida. Prometa que vai com calma?!"



"Não se preocupe", respondeu sem entender. "Professor!", chamou antes que Remo sumisse pela porta. "Muito obrigada!"



"Está sendo um prazer Harry", e fechou a porta.



O garoto ajeitou-se na cama ainda encarando o pacote. Só então tentou desatar o nó com as mãos e percebendo que se tratava de um feitiço usou a varinha para desmanchar o pacote. Descobriu então uma pasta escura que continha os dizeres: O Diário de Lílian Potter! E mais embaixo: feito por Sirius Black.



Extremamente excitado, embora sem entender como seria a participação do padrinho do diário de sua mãe, Harry examinou o objeto percebendo que se tratava de não muitas folhas de pergaminho unidas, provavelmente, por algum feitiço e guardadas dentro da pasta. Abriu a capa voltando-se a ler a primeira folha. Rapidamente reconheceu a letra de Sirius e Harry sentiu o coração acelerar a cada palavra que lia:



Querido Harry,



Esse é um segredo que venho guardando de você nos últimos dois anos. Trata-se de um diário de sua mãe que eu encontrei na noite em que seus pais foram atacados. Me desculpe por não ter-lhe contado antes sobre a existência dele. Sabe, ela realmente escrevia muito. E quando eu digo muito eu quero dizer MUITO MESMO. É por isso que, conhecendo você, preferi não lhe entregá-lo de imediato. Devo ser sincero com você Harry de que essa pasta não é o diário de sua mãe. Eu tomei a liberdade de destacar alguns momentos que, conhecendo Lílian, deveriam ter sido bastante significativos. Momentos também que, mesmo não tão importantes, seria interessante que você conhecesse. Fui ousado o suficiente em atualizar no meu ponto de vista o que me garantiu horas de tremendo prazer nesses últimos tempos. Foi refletindo o meu comportamento diante do diário que optei por não entregá-lo por hora. Sei que essa minha atitude vai deixá-lo decepcionado, mas espero que você entenda. Entendo que você iria se prender por demais em suas páginas e conseqüentemente iria deixar de viver. Posso dizer com certeza pois por tanto tempo me nutri com as lembranças contidas nele. Por mais prazeroso que seja, vicia! E deixa de fazer bem. Espero que se sinta satisfeito com o que lhe reservei. Boa leitura. Acredito que irá se divertir ao lê-lo, tanto quanto eu me diverti ao fazê-lo.



Feliz Aniversário Harry,



Sirius.


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