Único



- Ah Dorcas, por favor! – Lily pediu.


- É pequena, estamos entre amigos – Sirius falou.


Todos sorriam excessivamente – provavelmente por causa do álcool – e insistiam mais do que sorriam. Era bem verdade o que Sirius havia dito; eu estava entre amigos. Na verdade, pra estar mesmo entre amigos precisava excluir algumas pessoas aleatórias do meu colégio que também estavam na festa.


Aliás, a festa era na casa do Remus. Não havia um motivo aparente pra ele dar uma festa, mas Lily me confessou que ele estava fazendo isso pra tentar se aproximar de mim. Ele com certeza pensou que eu ia beber, extrapolar e ele teria que cuidar de mim, como sempre havia sido. Mas não. As coisas tinham mudado muito pra mim; eu não queria mais saber do Remus, de qualquer maneira. O melhor que eu poderia fazer era esquecê-lo, o que não foi tão difícil quando eu cresci um pouco e encarei as coisas de uma maneira diferente da que costumava encarar.


De qualquer forma, acabei acatando ao pedido dos meus amigos e colegas: eu ia cantar um pouco pra eles. Peguei o violão que me ofereceram e disse, antes de começar a música:


- Acho que a melhor coisa sobre a música é quando conseguimos nos expressar através dela – abri um sorriso e completei: - Espero que sintam minha sinceridade e não joguem tomates podres em mim!


Algumas pessoas riram um pouco da minha piada sem graça e eu comecei a dedilhar. Tinha escolhido aquela música por causa de Remus e acho que todos acabariam percebendo isso (pelo menos os que estivessem sãos). Era o conflito emocional mais recente pelo qual eu havia passado, e como disse: a melhor coisa sobre a música é quando conseguimos nos expressar verdadeiramente através dela. Eu nunca cantava se não fosse algo relacionado comigo.


- I took my love and I took it down. I climbed a mountain and I turned around. And I saw my reflection in the snow covered hills, till the landslide brought it down. Oh mirror in the sky, what is love? Can the child within my heart rise above? Can I sail through the changing ocean tides? Can I handle the seasons of my life? Well I’ve been afraid of changing, cause I built my life around you. But time makes you bolder, children get older, and I’m getting older too.


Continuei tocando e cantando a parte que se repetia, depois. Enquanto isso, sentia o olhar de Remus sob mim mais forte que o das outras pessoas. Ele sabia muito bem que aquilo tudo era um desabafo e uma satisfação – se é que se pode chamar de satisfação.


- So take this love and take it down. If you climb a mountain and you turn around, and you if you see my reflection in the snow covered hills, well the landslide brought me down. And if you see my reflection in the snow covered hills, well maybe… Well maybe… Well maybe the landslide will bring you down.


Acabei a música e decidi finalmente encará-lo. Seu olhar era confuso e desesperado, mas isso pouco me importava. Depois de tudo que nos aconteceu, não fazia a mínima diferença se o Remus sofresse; acho que até desejava um pouco que isso acontecesse, no fundo do meu coração. Mas não é tão fácil entender por que se não passarmos do começo ao fim da história, que acontece agora. Pois bem:


 


Alguns meses atrás.


- Não sei como você e o Remus acabaram namorando. Pra mim vocês eram tão amigos... – Lene comentou.


- Ela sempre teve uma queda por ele, não teve, Dó? – Lily respondeu pela amiga, enquanto lhe cutucava.


- Sim, sim. Tive. É verdade - Dorcas concordou. – Pra ser sincera, nunca imaginei que fosse dar certo, mas estou feliz que deu.


- Com certeza! Vocês formam um casal maravilhoso, nisso todos nós concordamos, não é Lily?


- Ah! Absolutamente.


Dorcas sorriu e comeu mais um pouco do seu almoço. Alguns minutos depois o sinal bateu e ela e as amigas se separaram, cada uma para sua aula; não tinham nenhuma das próximas juntas, mas por uma incrível coincidência, tinha todas com o Remus. Correu para vê-lo e lá estava ele: sentado na carteira do canto e lhe esperando um sorriso maravilhoso no rosto.


Já estavam namorando há uns meses. Talvez uns cinco, ou seis. Conheciam-se desde sempre e nunca foram menos que bons melhores amigos; sabiam tudo um sobre o outro e eram inseparáveis. Dorcas já chegou a causar ciúmes até nos dois fiéis escudeiros de Remus: James e Sirius. Um dia a menina percebeu que gostava de Remus de uma maneira um pouco estranha, pois ficava nervosa quando o via com outras mulheres que não ela e não conseguia conversar mais com ele sem tirar os olhos de sua boca.


Decidiu que seria melhor falar com ele, mas acabou não sendo preciso. Ele mesmo percebeu a coisa toda e um dia, enquanto estavam deitados na cama dele conversando sobre o nada, ele a beijou. A coisa toda acabou dando certo e funcionando melhor do que eles esperavam. Eram um casal desses tranquilos; sem muitas brigas, sem muitos shows; discretos, calmos, românticos. Daquele tipo que dava vontade de olhar e admirar por algumas horas seguidas.


- Senti sua falta – ele sussurrou em seu ouvido assim que ela se sentou ao seu lado.


Apenas sorriu e o beijou levemente em resposta. Não era preciso mais que isso pra que ele soubesse que ela também havia sentido sua falta.


- Bom dia meninos – a professora falou, entrando na sala e fazendo com que Dorcas virasse para frente imediatamente.


Começou a aula da maneira usual: dizendo que tinha uns assuntos novos e legais pra tratar; como se a Revolução Francesa ou a Guerra Fria fossem tão interessantes assim – pelo menos não eram pra Dorcas. Remus tinha uma paixão descomunal por história, filosofia e qualquer coisa que envolvesse pessoas e reflexão. Já ela gostava de coisas exatas, que pudesse calcular com os próprios dedos e que lhe fizesse sentido completo, com apenas uma resposta e alternativa.


Porém, no meio da explicação sobre como Maria Antonieta tinha causado um reboliço com sua famosa frase, uma loira ofegante surgiu na porta e fez com que a professora parasse de falar.


- Com licença – disse enquanto tentava respirar – Sou Emmeline Vance.


- Ah! Sim, claro. Pode se sentar onde quiser, minha querida – apontou para a sala. A loira sorriu e sentou no primeiro lugar vago que encontrou, por acaso na frente de Remus. – Eu estava ciente de sua situação. Meninos, essa é Emmeline, a nova colega de vocês. Espero que a recepcionem bem.


Alguns meninos do fundo da sala começaram a dar risadinhas, provavelmente por alguma piada idiota do tipo “com certeza recepcionaremos”. Ela era mesmo muito bonita, e tinha um ar diferente do da maioria das pessoas de Londres. Seus cabelos estavam meio bagunçados, mas lindos de qualquer maneira; usava uma saia xadrez, uma blusa branca, um casaco de couro marrom e botas, além das meias grossas e pretas.


- Seja bem vinda – Dorcas disse assim que o silêncio e a calma se estabeleceram na sala novamente.


- Obrigada – Emmeline sorriu.


Remus mexeu um pouco a cabeça e disse:


- Somos Remus e Dorcas.


- Oh. Muito prazer. Podem me chamar de Emme.


Ele apenas concordou, maravilhado. Dorcas sentiu um aperto momentâneo e rápido no coração ao ver os dois conversando e sorrindo um para o outro, mas logo deu de ombros e mandou a si mesma que parasse de ser neurótica.


O que ela não sabia é que estava certa ao ter um mau pressentimento quanto aos dois; nas semanas seguintes eles estavam mais juntos que feijão e arroz. Tinham descoberto que ambos amavam história e pensavam em fazer direito ou história mesmo, na faculdade. Os assuntos e semelhanças pareciam não ter fim. Dorcas assistia a tudo calada, tentando ignorar o que estava escrito em sua cara. Emmeline era tão perfeita. Gostava das mesmas matérias que Remus, os mesmos filmes antigos de guerra, lia os mesmos livros gigantes de filósofos famosos; não bebia refrigerante, apenas chá, assim como ele, e também tinha complicações na família. Era perfeitamente capaz de entendê-lo no que quer que fosse, diferente de Dorcas. E isso a perseguia.


- Você realmente não vai fazer nada? – Lily perguntou apontando Emmeline e Remus.


- Eles são só amigos, Lily. O que você quer que eu faça? Impeça o Remus de ter amigas? – ela respondeu simplesmente.


No fundo ela já sabia: os dois estavam apaixonados. Mas “saber no fundo” é diferente de admitir até pra si mesma a realidade; por isso, quando os dois vieram conversar com ela sobre o assunto, foi um choque.


- Eu sei que soa patético, mas eu nunca amei ninguém assim. Quero que você compreenda, Dorcas, que não fiz por mal, e muito menos Emme...


Remus tentava dizer. Dorcas balançava a cabeça negativamente e Emmeline não tinha coragem de olhá-la nos olhos.


- Não, com certeza nenhum dos dois fez por mal. Traidores. Imundos. Filhos duma puta! Isso que vocês são! Tomara que não consigam ficar juntos, é isso que eu desejo. Como conseguiram fazer isso comigo? Se vocês se apaixonaram desde o dia que se conheceram, porque esperaram tanto tempo pra me contar e ficaram me fazendo de idiota?!


Ela chorava muito, assim como a amiga no canto, que ainda não lhe encarava. Remus, porém, enfrentou Dorcas; com todo o cuidado que tinha e ainda sim demonstrando que estava um pouco nervoso, disse:


- Acha que é fácil? Estávamos pensando em você, lutando contra que a gente sentia pra te proteger! Tentei te amar esse tempo todo, Dorcas, acha que foi bom descobrir que não consigo?!


Aquilo foi mais do que um simples “tapa na cara”. Ela parou de chorar imediatamente e ficou séria. Emmeline pela primeira vez levantou a cabeça; também não tinha acreditado no que tinha acabado de ouvir.


- Ah, é? Bom. Sinto muito, então, que você tenha perdido seu tempo me namorando esse “tempo todo”. Vocês estão livres agora pra se comerem se quiserem, não que eu acredite que não tenham feito isso ainda.


- Dorcas! – Emmeline disse de repente – Eu nunca seria capaz... Você sabe que eu te considero minha melhor amiga desde que cheguei aqui.


- Isso não te impediu de se apaixonar pelo meu namorado. Ou impediu? Você devia ter se afastado. Maldito foi o dia que você pisou nessa cidade pela primeira vez; queria nunca ter te conhecido.


Remus, ignorando que toda a raiva de Dorcas estava sendo direcionada para a pessoa errada, pois Emmeline foi quem fez questão de segurar a situação toda pra que em momento algum Remus traísse Dorcas, falou:


- Saiba que você está dando permissão pra que fiquemos juntos, não adianta brigar comigo depois.


- Permissão?! – Dorcas riu – Diga-me em qual parte da conversa você ouviu a palavra permissão? Pois eu te digo, meu amor, que no que depender de mim vocês dois nunca vão ser felizes. Eu te amei primeiro. Você ainda vai voltar pra mim, Remus.


Saiu dali. Não aguentaria mais um segundo olhando na cara daquela traidora que dizia ser sua amiga. E que ódio! Realmente havia sido uma boa amiga, e Dorcas sabia que Emmeline era a mais vítima da história toda, depois dela mesma; se dependesse da loira eles provavelmente nunca teriam vindo falar com Dorcas e simplesmente esqueceriam os sentimentos, pelo bem de todos. Sabia que todo aquele discurso agressivo era de Remus e que ele havia realmente lhe traído. Mas seu coração forçou-a a culpar a amiga por todas as desgraças do seu relacionamento.


Durante as semanas seguintes, agiu de acordo com o que havia dito: não permitiu que a vida dos dois fosse fácil. Aparecia o tempo todo, onde quer que eles estivessem. E não adiantava que Marlene ou Lily lhe aconselhassem a não fazer mais isso, não mexer mais nessa história e apenas deixar tudo pra trás. Ela se sentia no direito de atrapalhar a felicidade de Emmeline; coisa que também Marlene e Lily tentavam abrir seus olhos pra não fazer: “a Emme é quem menos teve culpa, Dorcas, você sabe” ou “para de se enganar e tratar o Remus como o seduzido da situação; ele é bem grandinho e fez suas próprias escolhas, amiga” elas diziam. E não era novidade, logico que não era. Mas o coração apertado de Dorcas não queria saber se Remus era um idiota, se Remus tinha a tratado como um nada; se ele tinha, rapidamente, sem nem pensar duas vezes, decidido trocar o que tinha com ela, que era um relacionamento sólido, tranquilo e longo, por algo que ele nem mesmo sabia o que era; por uma “aventura” que lhe apareceu.


Sabia que o sentimento de Remus por Emmeline não era real, tampouco duradouro. Se ela não existisse no dia seguinte, então dois dias depois ele já nem a teria em mente. E ao mesmo tempo sabia que o sentimento que Emmeline nutria por ele era tão ou mais verdadeiro que o seu próprio; ela sim o amava de verdade, diferente dele que apenas acreditava amá-la; era possível ver em seus olhos. Mas independente de amá-lo e de ter sido arrebatada por aquele sentimento de maneira devastadora, Dorcas sabia, Emmeline jamais ficaria com ele.


Por isso, mesmo que Dorcas não tivesse tentado destruir a felicidade deles, Emmeline já tinha se decidido: iria voltar pra cidade de onde veio e permanecer por lá. Nunca devia ter saído, como Dorcas disse. Destruiu o coração da amiga e sabia disso; nunca se perdoaria por ter se apaixonado por Remus. Suas passagens já estavam compradas e iria embora ao dia seguinte; mas tinha uma obrigação a cumprir:


- Dorcas? – Emmeline chamou a amiga delicadamente através de uma fresta da porta.


Tinha ido até sua casa pra se despedir e pedir um perdão definitivo.


- Entre.


- Eu estou indo embora amanhã. Queria que você soubesse que eu sinto muito, em momento algum quis te fazer infeliz. Você estava certa: eu nunca devia ter aparecido por aqui.


- Não – levantou os olhos de repente pra encarar a amiga – Eu não estava. Sabe o que vim pensando nos últimos dias, Emme?


Como ela não respondeu, Dorcas continuou:


- O tempo nos faz mais fortes. E faz com que a gente enxergue algumas verdades que antes não queríamos ou não conseguíamos enxergar direito. Aconteceu comigo. Às vezes me pergunto o que é amor de verdade, e se alguma vez, pelo menos por um dia, o Remus sentiu isso comigo ou eu senti com ele. Mas isso não importa. Eu sei que tudo o que aconteceu não foi culpa sua; sei que você jamais faria nada pra me machucar.


Emmeline abraçou fortemente a amiga, pedindo perdão repetidas vezes. Dorcas chorava, assim como ela, e retribuiu o abraço com a mesma intensidade.


- Você nunca foi idiota e não merecia que eu tivesse tentado atrapalhar sua felicidade. O Remus foi idiota, ele sim não merece ser feliz. Mas nem com isso me importo mais. Acho que acabei crescendo um pouco e amadureci a coisa toda; não quero mais me ligar a ele. Não quero mais sofrer por causa dele.


- Ah, Dorcas! Eu sinto tanto mesmo que você tenha tido que passar por tudo isso... Mas sou obrigada a concordar com você: o Remus não te merece. Tendo se apaixonado por mim ou não, ele agiu como um estúpido. E apesar de eu ainda amá-lo, estúpido do jeito que é, também não quero mais me ligar a ele. Não posso. Do jeito que ele agiu com você... Não gostei. Não o aceito, se for assim.


- Acho que no fim nós duas nos demos bem – deu um sorriso fraco. – Ele foi mesmo um cafajeste.


- Sim! – Emmeline riu um pouco, limpando as lágrimas.


- Você tem mesmo que ir?


- Ah... – ela suspirou e Dorcas compreendeu: seria impossível pra Emmeline viver num mesmo lugar que Remus no momento; estava perdidamente apaixonada por ele, afinal.


- Tudo bem. Eu entendo. Só sinto que você tenha que ir.


- Eu também. Queria poder ficar com você.


- É. Obrigada por tudo, Emme.


- Não, não. Obrigada por tudo, Dorcas.


As duas sorriram.


E no dia seguinte a loira realmente partiu; Dorcas e as meninas a acompanharam até a estação de trem e esperaram que o trem com Emme partisse pra que voltassem pra casa. Lily e Marlene acabaram exigindo uma explicação básica de Dorcas sobre o que tinha acontecido e qual tinha sido a grande mudança, no que Dorcas se viu forçada a explicar:


E explicou. Todo o processo sentimental e mental que tinha se submetido nos últimos dias; refletiu sobre tudo o que aconteceu, sobre como tudo aconteceu e chegou a conclusão de que precisava parar de se iludir: Remus nunca havia sido o homem perfeito e provavelmente nunca havia a amado de verdade. Tinha que dar adeus aquele sentimento que nutria por ele, fosse amor ou não. Admitiu para as amigas que estava com medo de mudar, já que sua vida inteira tinha sido construída em volta dele; mas o tempo fez dela uma pessoa mais forte e madura, pronta pra encarar as coisas como deviam ser.


Porém, quem não esperava por isso, era Remus. Duas semanas após a volta de Emmeline pra casa, ele já não lembrava mais com exatidão dos seus sentimentos pela loira. E começava a se perguntar se ele não tinha se confundido e se não amava Dorcas, no final das contas. Talvez, ele pensou, Emmeline tenha sido apenas uma distração. Uma mulher bonita que me distraiu do que realmente me importa: Dorcas.


Procurou-a incessantemente pra que pudesse falar-lhe os sentimentos, mas não conseguiu por um momento sequer obter sua atenção. Procurou Lily e essa apenas lhe disse “deixe a pobre menina em paz, Remus”. Procurou por James e ele lhe respondeu “se eu fosse ela não ia querer olhar na sua cara mesmo”. Até Sirius lhe aconselhou “acho que procurar a Dorcas e tentar algo a essa altura é estúpido; devia ter pensado melhor antes de escolher quem não te escolheu, aluado”. Estavam todos contra ele, então?


Estúpidos. Lógico que Dorcas ainda lhe amava, ela disse que lhe amaria pra sempre; ela mesma previu aquilo tudo: “você ainda vai voltar pra mim, Remus” foi o que ela disse. E era verdade. Estava voltando de quatro com o rabo entre as pernas, como dizem. Disposto a pedir perdão por toda a bobagem que cometeu.


- Sabe o que vou fazer?


Lily e James olharam pra ele, levemente preocupados.


- Dar uma festa. Lá ela não me escapa!


- Acho que você não devia contar com um final feliz, Remus... – Lily disse.


- Vocês dois não sabem o que eu sei. Dorcas me ama. Sempre me amou, sempre me amará. Fomos feitos pra ficar juntos.


X


- Tomates podres! – Marlene gritou quando a música acabou – Tenho mesmo vontade de te jogar tomates podres... Como você consegue cantar tão bem, maldita?


Apenas ri. Ela já falava desembolado, sorrindo e rindo histericamente por causa do quanto havia bebido. E Sirius e ela se agarravam ferozmente, coisa que raramente faziam em público. Mas estava feliz pelos dois; que o relacionamento estivesse bem, que as coisas não fossem mais tão complicadas quanto foram um dia.


- Dorcas – senti que alguém segurava meu braço.


“Alguém”.


- Sim?


- Você não pode ter cantado aquilo pra mim.


- Posso sim. – respondi.


- Eu te amo, Dorcas. E sei que você me ama também. Vamos parar com essa bobagem, me perdoe e volte pra mim.


Fiquei um pouco em silêncio, estudando em seus olhos pra ver se ele falava a verdade. Como também eu saberia? Ele não “me amou” uma vez? E conseguiu deixar de me amar tão rápido. Tão fácil. E ele nem sequer cogitou enquanto se descobria apaixonado por Emmeline se aquilo era realmente sério, se valia a pena terminar comigo por ela; se não era apenas desejo e vontade de tê-la, porque ela era bonita e parecida com ele.


Não. Em momento algum ele pensou em mim.


- Dorcas, diga alguma coisa... Sei que você está chateada, mas me escute: eu cometi um erro, jamais cometerei outro.


- Sim.


- Você me perdoa?


- Sim, você cometeu um erro. E sim, eu perdi semanas da minha vida chorando por você, me perguntando qual era o problema comigo, o que eu devia mudar pra que você voltasse a se apaixonar por mim. Sabe o que descobri? – não esperou ele responder: - Que não preciso mudar nada.


- Sou apaixonado por você do jeito que você é.


- Sim. Você me ama exatamente do jeito que eu sou. Só que eu não te amo exatamente pelo que você é.


Tendo dito isso, deixei Remus sozinho e fui procurar alguma coisa pra beber. Não sei se ele tentou falar comigo alguma outra vez ou se sequer me chamou quando o deixei pra trás, mas tenho a impressão de que não; ele passou a noite absorvendo o que eu tinha dito e sendo levado pelo desmoronamento, da mesma maneira que me aconteceu.


 


Alguns anos depois.


- Emme? – abriu um sorriso ao ver a amiga em sua porta.


- Dorcas, querida! Senti tanto sua falta!


Abraçaram-se por alguns minutos e logo Dorcas a convidou para entrar. Sentaram-se na sala e pegaram um pouco de chá. Fazia alguns anos que não se viam, e bem raramente se comunicavam por cartas ou e-mails.


- Diga-me, querida, como você está? Sua casa é linda! É enorme!


- Estou tão feliz, Emme. Isso é tudo que eu sempre quis. John é maravilhoso e você precisa conhecer Lucy, nossa filha. Ela é um anjo de menina! Fez minha vida ter um novo sentido, assim como John. Também precisa conhecê-lo, logicamente.


- John? – escondeu sua surpresa ao não ouvir o nome que esperava – E onde vocês se conheceram? Há quanto tempo estão juntos? Quantos anos tem Lucy? Conte-me tudo!


- Nos conhecemos na faculdade. Dá pra acreditar que ele odeia matemática? Foi a primeira vez que falei com ele: discutimos sobre a importância da matemática, da física e da química, e daquelas outras matérias chatas – fez uma careta.


Emmeline riu; sabia que a amiga detestava matérias da área de humanas.


- Ele é geólogo, sabe? Odeio geografia! Mas acho que isso só apimentou mais a relação. Não demorou pra descobrirmos que no final de uma briga era bom se agarrar um pouco – riu displicente – Dois bobinhos. Casamo-nos assim que saímos da faculdade, e aí veio Lucy. Ela já tem três anos e é tão esperta! Vive dizendo que vai ser artista, pra não contrariar nem o pai, nem a mãe.


- Faz ela muito bem! – Emmeline concordou.


- Mas e você? Como está? Tempos que não ouço notícia sua...


- Ah, mentira. Você sabe como estou. Pouca coisa mudou desde que falei com você pela última vez. Ainda estamos procurando uma solução para o problema, mas acho que acabaremos optando por uma fertilização in vitro. Já compramos um cachorro! – riu.


- Um cachorro! Lucy vive me pedindo um cachorro... Aposto que dá muito trabalho. Qual o nome dele? Ou dela?


- Marley! Concordamos que Marley E Eu está na nossa lista de filmes preferidos, e acabamos homenageando o Marley. Só que o nosso Marley é um beagle. E sim, dá muito trabalho. Mas não mais que filhos.


- Exatamente. Já me canso muito com Lucy. Mas pensarei no caso – brincou.


Continuaram conversando e se colocando a par das notícias recentes. Após umas duas horas de conversa, Emmeline disse que precisava ir, pois ainda passaria pra ver Lily e Marlene. Omitiu que procuraria Remus.


As amigas estavam como ela imaginava: Lily e James casados e muito bem casados, por sinal. Tinham tido um filho que decidiram chamar de Harry. Um menino igual o James, mas com os olhos de Lily. Tão tímido e sapeca ao mesmo tempo, uma graça! Comentaram com Emmeline que estavam trabalhando no próprio negócio: como Lily tinha feito psicologia e James economia, tinham aberto um escritório de psicologia, o qual James coordenava e controlava e Lily entrava com o serviço efetivo. Parecia estar funcionando; moravam em uma casa grande de dois andares em um bairro bom e calmo de Londres.


Marlene e Sirius também estavam juntos. E para a surpresa de Emmeline: casados! Mais: com três, sim três filhos! Dois meninos e uma menina. Pelo visto a amiga já tinha tido o primeiro antes de terminarem a faculdade e antes mesmo de se casarem. Decidiram juntar oficialmente as escovas quando Marlene engravidou do segundo filho, e logo depois veio a menininha. Sirius acabou se formando em design gráfico, como sempre quis, e Marlene como artista plástica. A casa dos dois era uma coisa: quadros com pinturas e desenhos de Marlene e obras do Sirius coloridas ou feitas no computador. Uma bagunça de casa, mas muito aconchegante.


Tinha também dois andares e não era muito longe da casa de Lily e James. Os filhos se chamavam, respectivamente, na ordem do mais velho ao mais novo: Daniel, Thomas e Marie. Emmeline riu muito enquanto esteve por lá; era divertido de se ver a vida dos dois. Nunca havia imaginado que um dia os amigos acabariam assim.


Por último, foi visitar Remus. Lily havia lhe passado o endereço. Ficava numa área mais afastada e um pouco mais rica da cidade. Sua casa era grande, com um jardim enorme na frente e atrás – pelo que ela pode ver – e parecia muito clássica. Exatamente como ela esperava que fosse a casa de Remus. Tocou a campainha e não demorou para que ele, usando um robe confortável, com os óculos no rosto e um livro na mão, viesse lhe atender.


- Emme! – exclamou ao vê-la.


A convidou para entrar rapidamente e lhe ofereceu alguma coisa. Ela acabou optando por um conhaque. Perguntou-lhe como estava vida e se surpreendeu ao descobrir que Remus não estava casado. Havia formado em direito, logicamente, e havia dado aula – e ainda o fazia – de história em uma das melhores faculdades do país. E também resolvia alguns casos, quando lhe pareciam interessantes. Mas estava completamente solitário. Constatando esse fato, após alguns minutos de animada conversa, Emmeline resolveu perguntar:


- Como foi que as coisas acabaram desse jeito, Remus? Existia tanto amor entre nós.


E por nós ele sabia que Emmeline incluía os três: ele, ela própria, e Dorcas.


Deu de ombros e pensou um pouco antes de responder, pois talvez ele mesmo não soubesse a real resposta para aquela pergunta; por fim, disse:


- Acho que o problema foi exatamente esse: houve amor demais.


Ela não respondeu. Era a única resposta que fazia sentido. Tanto amor entre os três, que não funcionou; era pra existir amor entre dois. Mas nenhum dos três era culpado, pois nada havia sido forçado. E por fim, havia sobrado para Remus o peso da solidão.


- E por que você está sozinho, Remus? Não conseguiu seguir em frente?


Levantou os olhos para ela. Bebeu um pouco do conhaque e não pareceu se importar ao dizer:


- Cada um faz suas escolhas, Emme.


E ele havia feito a dele.






Sejam muito bem vindos a mais um dos meus surtos. Tive a idéia pra fanfiction ouvindo a música (obviamente) e acabei escrevendo um esboço dela na faculdade, aí cheguei em casa ontem e me dedidquei a fazê-la por completo. Ficou tudo muito rápido, concordo, eu poderia ter trabalhado melhor os sofrimentos e tal, mas a minha intenção dessa vez era calar a boca e fazer uma short fic autêntica! Tive que me contentar com o pouco que foi e com o quanto achei ralo. Não sei se interpretei a música corretamente, porque a Santana canta pra Brittany em Glee e não me parece um break up, então... Talvez eu também não tenha entendido o episódio. Enfim! Não importa. Dei uma interpretação pra música e foi isso aí que saiu. Espero que apreciem, e se quiserem, deixem comentários carinhosos (ou não) aí. Sintam-se a vontade. Mi casa, su casa. 

Adios amigos! Até a próxima (: 

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