Saudades.
- É hoje!
A chuva batia violentamente na janela, as árvores arranhavam o vidro e o único som além da chuva caindo no asfalto era o das folhas sendo chacoalhadas pela ventania. Mesmo com esse dia nada alegre Audrey Lioncourt sentia como se tivesse acordado em um dia ensolarado com passarinhos cantando no peitoril.
O motivo de todo esse entusiasmo era o fato de ser o dia em que as aulas retornariam na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. A garota que nasceu de mãe trouxa e pai bruxo adorava ter nascido com os poderes do pai, porém não conseguia fazer sua mãe se acostumar com este “dom natural”. Sua avó era a única da família de sua mãe que realmente entendia (e sabia) a euforia que era poder fazer magia, e estudar em uma escola onde todos fazem isso.
Audrey levantou de sua cama e partiu com pressa para o banheiro. Devo estar super atrasada, pensou ela. Com apenas 17 anos ela já tinha a maioridade bruxa, portanto já podia usar magia fora da escola. Puxou a varinha das vestes e com um Feitiço Convocatório ela pegou o pente que estava a poucos centímetros de sua mão.
Ela sempre foi uma garota muito bonita, mas nunca admitiu isso. Tinha longos cabelos negros e olhos grandes e pretos que freqüentemente ficavam acinzentados. Nunca saia de casa sem delineador nos olhos e um ótimo feitiço de alisamento no cabelo. Penteou os fios com pressa e escovou os dentes. Saiu apressada procurando seu delineador e por um segundo esqueceu que podia chamá-lo.
- Accio delineador.
Passou-o depressa e trocou de roupa. Saiu do quarto para tomar café-da-manhã e encontrou seu pai lendo o Profeta Diário enquanto bebia café. À mesa havia apenas duas xícaras com café, torradas e geléia de amora.
- Bom D... – seu cumprimento matinal foi interrompido pelo som da campainha. - Deve ser sua mãe, vá atender – disse seu pai enquanto virava mais uma página do jornal.
A garota deu a volta na mesa, foi até a porta e abriu-a. Sua mãe estava parada ali, com várias sacolas e uma expressão assustada.
- Oi mãe. Pra que tanta sacola?
- Eu trouxe algumas coisas pra você comer no trem – disse sua mãe entrando e colocando as compras sobre a mesa – Francis, esse jornal se mexe toda hora? Eu não consigo me acostumar com eles.
Francis Lioncourt olhou para a mulher com cara de “você tem problema” e disse:
- Você tem problema.
Audrey fitou o pai com tanta fúria que ele logo percebeu que tinha que ficar quieto.
- Mãe, não precisa de tudo isso, eu não vou fazer um piquenique no trem.
- Mas...
Audrey olhou para o relógio na parede.
- Sem essa, to atrasada.
Audrey entrou no quarto correndo, puxou o seu malão que estava debaixo da cama e pegou seu pufoso Roberto que ainda dormia. Atravessou a sala as pressas e depositou as coisas na porta da casa.
- Vocês vão ficar ai parados ou vão me levar logo pra estação?
- Nós vamos te levar, não é Francis? – sua mãe fitou seu pai por um tempo.
- Vamos sim – concordou ele meio atordoado por obedecer a tantas mulheres.
Seu pai pegou o malão e eles saíram discretamente de casa para que os vizinhos não percebessem o movimento ou notassem o animal de estimação diferente que Audrey tinha. Ela sentou no banco de trás e seu pai disse indignado:
- Você dirige. Eu não sei usar esse negócio dos trouxas – abriu o porta-malas e colocou o malão, depois sentou no banco do passageiro.
- Você tem problema – disse sua mãe com sarcasmo.
Durante todo o caminho Audrey foi desenhando em sua prancheta a última chuva que via em Londres. Desenhou as pessoas correndo para se proteger dos pingos, segurando o guarda-chuva para que ele não voasse com o vento, nervosas porque receberam um banho de algum motorista mal educado, desenhou tudo que era típico de trouxas em uma tempestade como essa.
Em alguns minutos estavam estacionados em frente à estação de King’s Cross. Como o tempo passa rápido quando a gente desenha. Desceu do carro correndo para não tomar chuva e esperou seu pai e sua mãe chegarem com a mala. Depois de distrair alguns trouxas eles atravessaram a parede e chegaram a plataforma nove e meia.
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Maryann Hatcher acordou bem cedo. Levantou da cama e saiu procurando pela sua aranha. Por que você tem tanto medo de trovão? Tirou o malão debaixo da cama, abriu e revirou-o inteiro a procura da tarântula medrosa.
- Desisto. Se você não aparecer vai ter que ir de coruja pra Hogwarts.
Foi só sentir o efeito dessa frase que a aranha saiu de dentro de um tênis jogado atrás da porta e entrou em sua gaiola. A garota de cabelos levemente ruivos e olhos verdes ficou orgulhosa de sua brilhante estratégia, mas não perdeu muito tempo com isso. Jogou as coisas dentro da mala novamente e a trancou.
Mary se vestiu e passou os dedos no cabelo enquanto colocava os sapatos. Se eu pentear meu cabelo hoje, o pente nunca mais desgruda.
- Vem tomar café, Mary.
- To indo mãe.
Ela foi até a janela e olhou a chuva lá fora, depois fechou as cortinhas e saiu do quarto. Seu pai estava sentado à mesa e sua mãe ia e vinha da cozinha toda hora trazendo alguma coisa diferente. Sentou-se e puxou um prato, mas estava tão ansiosa que mal tocou nos ovos com bacon.
- Come alguma coisa querida. Se não comer nada vai acabar desmaiando.
A mãe da garota era enfermeira no hospital St. Mungus para Doenças e Acidentes Mágicos e vivia com paranóicas sobre ser lesionada por um feitiço ou ter os tímpanos estourados por mandrágoras. Seu pai trabalhava no Ministério da Magia, no Departamento Internacional de Cooperação Mágica e vivia falando dos problemas do trabalho desde o retorno de Você-Sabe-Quem.
- Eu não estou com fome. Vamos logo para King’s Cross, você sabe como odeio me atrasar.
- Então leve um sanduíche para comer no trem.
- Não precisa mãe, vai ter um banquete gigante quando chegarmos a Hogwarts.
Para não ter que aturar sua mãe até a estação falando da importância da comida ela resolveu comer um pouco dos ovos. Seu pai resolveu dar sinal de vida e começou a falar sobre mais problemas.
- Até o Profeta Diário foi dominado por Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado, como se já não bastasse o Ministério estar cheio de Comensais da Morte. Yaxley acha que é o Ministro e Dolores Umbrige tem um olho pregado na própria porta – seu pai virou mais uma página do jornal – Que gente doida.
- Logo isso vai acabar querido. Melhor irmos Mary, ou você vai se atrasar.
- Finalmente você entendeu.
- Seu pai conseguiu um carro com o Ministério, vá pegar suas coisas para irmos.
Mary tomou um ultimo gole de suco de abóbora e correu para o quarto para pegar seu malão e sua tarântula Amanda. Despediu-se da chuva lá fora e saiu arrastando a mala pela casa.
- Use a varinha – lembrou seu pai, vendo a tentativa frustrada de arrastar a mala pesada.
- Bem pensado. Wingardium Leviosa.
Mary foi levando o malão discretamente até o carro e depois partiram para a estação.
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- Anne, acorda você está atrasadíssima.
Anne Harrison abriu os olhos com má vontade, dormir com chuva era a melhor coisa pra ela, mas levantar com chuva com certeza era a pior. Saiu da cama arrastada, tirou a varinhas das vestes e com um aceno fez musica começar a tocar. Foi até o banheiro e pegou o pente, subiu em cima do vaso sanitário e começou a cantar com o pente como microfone. Seus cabelos compridos e loiros acastanhados começaram a ficar embaraçados com tanta loucura.
- DESLIGA ESSA MÚSICA E VEM COMER – gritou sua mãe da cozinha.
A garota desceu do vaso, desligou a música com outro aceno de varinha e desembaraçou os cabelos com pressa. Vestiu as primeiras roupas que viu e saiu do quarto aos pulos, tentando colocar os tênis.
Sentou a mesa com sua mãe e seu pai. Pegou alguns ovos e comeu depressa enquanto ouvia seus pais discutirem sobre a primeira página do Profeta Diário, onde Harry Potter era procurado como Indesejável Número 1.
- Que sem noção. Como se o Harry fosse mais perigoso que Você-Sabe-Quem – disse Anne de boca cheia.
- Depois que o Ministério foi tomado parece que todo mundo finge acreditar que Potter é perigosíssimo só pra não aborrecer os Comensais – disse seu pai enquanto olhava para o relógio.
- Eu sinceramente acho que vão invadir Hogwarts e eu vou estar lá para batalhar pela escola. E tenho certeza que Harry Potter vai ser um dos batalhantes também.
- Potter vai acabar se metendo em muitas confusões por causa desses cartazes.
- Ele já se mete em confusão sem a ajuda deles.
Anne riu e engasgou, bebeu um pouco de suco de abóbora e levantou da mesa.
- Vou pegar minhas coisas.
Ela pegou seu malão, olhou para a gaiola de sua coruja e Charlie não estava. Foi até a janela, abriu e junto com os pingos violentos e ventania entrou sua coruja avermelhada toda molhada. Ela entrou na gaiola e chacoalhou as penas, molhando a saia de Anne.
- Eu mereço – disse ela, pegando a varinha, apontou para a saia e disse um feitiço que a secou na hora – sorte sua que posso usar magia.
Pegou o malão com um feitiço e a gaiola com a mão. Saíram um pouco atrasados de casa, mas entraram em um táxi e desceram na estação de King’s Cross. Encontrou alguns colegas da Grifinória, mas não deu muita atenção a eles, queria mesmo era ver seus amigos. Atravessaram a plataforma nove e meia e Anne matou as saudades.
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- Matt, acorda filho. Você tem 5 minutos pra se trocar e comer. Esqueceu que hoje você volta pra Hogwarts?
Matt Goldman levantou com um salto, abriu o guarda-roupa e foi jogando todas as roupas que via na frente até que achou uma para vestir. Foi ao banheiro, jogou uma água no rosto e remexeu os cabelos loiros. Saiu correndo do quarto e começou a comer de pé e quase não mastigando as torradas.
- Se você comer assim em Hogwarts madame Pomfrey vai ficar cansada de te ver todo dia.
- Não enche mãe. To atrasado pra caramba.
- Não está tão atrasado assim. Senta ai e mastiga direito.
Matt sentou e bebeu um pouco de café pra acordar. Olhou para o relógio e viu que sua mãe o havia enganado, ele tinha 10 minutos ainda. Apoiou a cabeça na mão e viu sua mãe lendo o Profeta Diário. A primeira página estampava a foto de Harry Potter e ele se lembrou do fato de que seu pai era um Comensal da Morte. Ele também é responsável por essas injustiças e mortes, pensou ele. Seus pais se separaram quando sua mãe descobriu que seu pai era um seguidor de Voldemort, desde então ele mora apenas com a mãe.
- Quer alguns ovos? – sua mãe apontou um prato com ovos mexidos.
- Não, não. Vou comer no caminho pra estação.
- Está bem. Vá pegar suas coisas enquanto eu pego algumas torradas pra você comer no táxi.
Matt subiu as escadas correndo e pegou seu malão super pesado e seu sapo Spreem que estava tomando um banho no vaso sanitário. Desceu as escadas e sua mãe o ajudou a levar a mala até o táxi. O taxista olhou assustado para o sapo em sua mão, mas não disse nada.
Durante o caminho, Matt comeu as torradas que sua mãe preparou, estava morrendo de fome. Passaram por uma loja de doces e ele se lembrou do carrinho que havia no trem para Hogwarts. Se seus amigos ouvissem seus pensamentos o chamariam de esfomeado.
Chegaram à estação e correram para atravessar a plataforma nove e meia. Ainda mastigando ele se engasgou ao rever seus amigos.
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- AAAAAAAAA – Audrey pulava e gritava com o reencontro – Que saudade de vocês.
Os quatro amigos se abraçaram em grupo.
- Tá legal, agora chega. Essa aglomeração vai me fazer pegar algum vírus indesejado – disse Mary enquanto pegava um lenço e limpava os braços.
- Deixa de ser neurótica Mary. O máximo que você pode pegar é chatice aguda – disse Anne.
- Chega de idiotices femininas. Vamos entrar logo pra pegarmos uma cabine vazia.
Todos concordaram e se despediram dos pais. Os quatro amigos eram inseparáveis desde o primeiro ano, quando foram todos para a Grifinória. Entraram no trem vermelho e andaram pelo corredor cheio de gente até acharem uma cabine desocupada. Guardaram as malas e se sentaram.
- Foram tão boas as minhas férias. Usar magia fora da escola é mais divertido do que lá dentro – disse Audrey enquanto fazia seu pufoso rosa levitar.
- É legal, mas dentro da escola tem mais gente pra zoar – Anne dizia enquanto cutucava debaixo da unha com a varinha.
- E a diversão acabou de chegar – Matt apontou para fora da cabine onde Crabbe e Goyle abriam a porta.
Os dois tentaram entrar ao mesmo tempo, mas entalaram e começaram a discutir pra ver quem desentalaria um ao outro. Depois de alguns minutos ficou decidido e Crabbe entrou na frente.
- Bem vindos de volta idiotas. Preparados para a humilhação 24 horas? – disse Crabbe com cara de sarcasmo.
- Só se for a sua humilhação, não é Crabbe? Agora que o Malfoy resolveu se juntar aos pobres seguidores do imbecil que se nomeia Lord vocês assumiram o comando da covardia? – disse Anne com tédio.
- Como você ousa? – Crabbe pegou a varinha, mas Audrey foi mais rápida e desarmou-o com um aceno da sua.
- O que você faz agora que tem que usar as mãos? – Anne levantou-se e fixou Crabbe nos olhos – Se eu fosse você não faria isso Goyle – Anne pegou a varinha e disse – Expelliarmus – e a varinha de Goyle vôo para sua mão.
- Hahahaha. Que imbecil. É tão gordo que demora 3 horas pra pegar a varinha – disse Matt zombando de Goyle enquanto tentava ler a matéria que Mary lia em sua revista.
- É melhor você ir embora Crabbe. Acho que já perderam de mais por aqui – Anne e Audrey levantaram as varinhas deles – quer perder o olho também?
- Tá legal, a gente sai, mas isso não vai acontecer em Hogwarts. Snape é o novo diretor e Amico e Aleto Carrow são os novos professores. Eu só deixei vocês nos desarmarem para terem um ultimo gostinho de vitória. Esse ano tudo será diferente.
Anne ficou vermelha e meteu um soco no olho de Crabbe. Goyle olhou assustado para ela e deu alguns passos para fora da cabine.
- E isso é pra você se lembrar que seus amiguinhos comensais não vão estar sempre por perto para proteger vocês. Quando você estiver no banho, eu vou estar lá. Quando você estiver comendo, eu vou estar lá. Até nos seus sonhos, eu vou estar lá. Entendeu? – Anne pegou a varinha de Crabbe da mão de Audrey e jogou as duas em direção a cabeça de Goyle que se abaixou fazendo elas bateram no vidro e caíram no chão.
- Agora sai da minha frente seu porco.
Os dois saíram correndo da cabine, mas ainda assim ouviram os gemidos de Crabbe se afastando no corredor.
- Gostei de ver Anne. Mostrou quem são os grifinórios.
- Valeu Mary.
- Já não basta meu pai ser um deles agora vou ter que agüentar um pelotão de comensais? – disse Matt enquanto alisava seu sapo.
- Né, mas nós vamos infernizar a vida deles não vamos?
- Com certeza Au.
Os quatro começaram a rir e ficaram horas falando coisas engraçadas das férias. Alguns minutos antes de chegarem a Hogwarts eles colocaram seus uniformes e só então perceberam que a saudade daquele imenso castelo era maior do que eles imaginaram. Logo em seguida ouviram o apito do trem anunciando a chegada na estação de Hogsmeade.
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