Capítulo único

"Correndo o risco do fracasso, das decepções, das desilusões, mas nunca deixando de buscar o amor. Quem não desistir da busca, vencerá."

 

 

 

Era fim de tarde e ventava bastante. Alguns alunos ainda estavam espalhados pelos terrenos da Escola, aproveitando o tempo vago, enquanto outros menos corajosos preferiram ficar no Castelo, se dividindo entre a Biblioteca ou os Salões Comunais de suas Casas.

Dorcas estava sentada próxima ao Lago Negro, lendo distraidamente um romance trouxa. Não era do seu feitio ficar lendo obras como Romeu e Julieta, mas aquela história de amor chamara a sua atenção. Um casal impedido de ficar junto por causa da rivalidade da família... Aquilo era tão cruel que a menina se revoltava com a ideia de existirem pais tão pouco compreensivos, ainda que fosse apenas na ficção.

Seus cabelos castanhos esvoaçavam conforme o vento batia em seu rosto, mas ela não se importava. Estava tão entretida com sua leitura, que mal percebeu quando seus amigos foram se sentar ao seu lado. Quer dizer, ela chegou a ouvir passos em sua direção, mas não se preocupou em erguer o olhar do livro para ver quem havia acabado de chegar.

- Semana passada estava viciada em Hamlet... Agora em Romeu e Julieta... Se continuar assim você será a maior fã de Shakespeare que Hogwarts já abrigou. – Lily comentou, enquanto erguia a capa do livro para conferir o título do romance que a amiga lia concentradamente – Algum motivo para ler essa tragédia?

- Não é exatamente uma tragédia. Estamos diante de um dos contos mais famosos do mundo trouxa e isso deveria ter algum significado para vocês! – Dorcas disse, empinando o queixo – Principalmente para você, Lils, que conhece o mundo trouxa tão bem quanto eu.

- A Lene também conhece e nem por isso você está brigando com ela! – Lils retrucou e lançou um olhar para a menina de cabelos pretos, que estava de pé, a poucos passos dali, claramente flertando com Sirius Black.

Dorcas suspirou e fechou o livro, antes de se virar para encarar Lily.

- Sim, mas a Lene não tem essa visão romântica do mundo. Então de que adianta perder meu tempo tentando convencer a minha irmã de que Romeu e Julieta não é uma história idiota cujos personagens principais se matam porque foram burros o suficiente para não pensarem em outra forma de solucionar seus problemas, se no final ela só vai revirar os olhos e me chamar de boba sonhadora? – Dorcas retrucou e revirou os olhos quando viu Marlene dar um tapa no braço de Sirius e se afastar em direção ao Castelo. – Eu sinceramente gostaria de saber qual é o problema desses dois...

- Tensão sexual, Dorquinhas! – James apareceu acompanhado por Remus, que parecia estar perdido nos próprios pensamentos – Minha querida ruiva, que bom ver você!

Lily revirou os olhos e se colocou de pé. Não gostava mesmo de ter que conversar com James, porque ele tinha o dom de fazê-la sair do sério com apenas duas frases.

- Que pena que não é recíproco, Potter! – foi a única coisa que ela disse antes de se afastar dali.

James riu e passou a mão pelos cabelos naturalmente bagunçados, jogando-se em seguida na grama. Remus apenas revirou os olhos e se sentou ali também, para encarar o Lago.

- Essa ruiva sabe como me deixar maluco, fala sério! – James comentou, fazendo Dorcas sorrir.

- Tem sorte dela não ser como a minha irmã. Se fosse a Lene, provavelmente você estaria na enfermaria cuspindo lesmas!

- Pois é... Ainda bem que a deixei para Sirius. Ele sabe bem como fazer para domar o furacão McKinnon!

Mesmo sem querer, Dorcas acabou não segurando uma risada. Não era como se sua irmã fosse a pessoa mais calma e centrada do mundo, por isso os Marotos haviam dado esse apelido para ela – embora Lene não fizesse a mínima ideia do jeito carinhoso que a chamavam pelas costas.

- Fico me perguntando como você conseguiu ser tão calma, Dor...

- Bom, considerando que somos apenas filhas da mesma mãe, creio que eu tenha puxado a tranqüilidade dos Meadowes, enquanto a minha mana puxou o lado irritado e sexy dos McKinnon! – Dorcas deu de ombros.

James riu com a resposta e se colocou de pé.

- Agora que já dei a Evans os cinco minutos de vantagem para que voltasse ao Castelo, preciso ir atrás dela. Teremos um passeio em Hogsmeade esse sábado e preciso convidá-la... De novo!

- Vai com fé, Pontas! – Remus incentivou – Quem sabe você consiga dessa vez.

- Ou quem sabe eu leve outro fora. Vai saber?! Não se pode prever com as garotas, Aluado.

Dizendo isso James foi embora, deixando Dorcas e Remus a sós, à beira do Lago Negro.

Um clima desconfortável pairou sobre o ar, enquanto os dois ficaram praticamente imóveis, sem nem saber o que dizer, enquanto olhavam fixamente para o horizonte.

Havia alguns dias desde que Remus contara a Dorcas os motivos de sempre afastá-la e algumas vezes até tratá-la mal, mas toda a sinceridade do maroto pareceu não ter surtido o efeito esperado. Na verdade, ele esperava que a jovem gritasse, o chamasse de monstro e saísse correndo. Em nenhum momento previra que ela aceitaria sua condição de lobisomem como um fato normal, e isso o deixou perturbado. Não era possível que a menina não tinha nenhum senso de autopreservação e insistisse que sua condição peluda na lua cheia não era nada demais.

Cansada de fingir que não havia nada errado, que não sentia falta dele e que aquele clima tenso era absolutamente normal, Dorcas virou-se na grama para encarar Remus, que já a observava há algum tempo.

Olhando a menina assim, ele quase se arrependia da sua decisão de mantê-la longe. Mas o que podia fazer? Não poderia correr o risco de tê-la por perto e acabar lhe causando algum mal. Dorcas merecia alguém melhor que ele. Alguém que não se transformasse em um monstro quando a Lua Cheia aparecesse no céu.

Dorcas, por sua vez, queria entender o que se passava na cabeça de Remus exatamente. Se ele havia sido corajoso o suficiente para compartilhar com ela o seu segredo mais profundo, porque diabos insistia em afastá-la agora? Era ela quem deveria decidir se queria ou não ficar longe. Conhecia os riscos, sabia que lobisomens eram instáveis quando a Lua Cheia se aproximava e que ele perdia toda a consciência humana quando se transformava... Isso deveria ser motivo o suficiente para que ela o esquecesse, mas não. Ela não poderia simplesmente deixar que esse probleminha com pêlos e lua a deixasse longe daquele que amava. Quer dizer, por baixo dessa máscara de monstro que Remus insistia em usar, sabia perfeitamente que havia um rapaz bom, generoso e incrivelmente carinhoso.

- Sabe o que mais me fascina nessa história de Shakespeare? – Dorcas perguntou, erguendo o livro enquanto falava.

- O que? – Remus quis saber, não porque estava curioso, e sim porque gostava de ouvir a menina se dirigir a ele.

- É que o amor do Romeu e da Julieta é mais forte que tudo e todos. Eles enfrentam as dificuldades apenas para ficar juntos no final.

- Eles morrem no final, Dor.

- Mas conhecendo-os bem, acha que esse detalhe os impediu de ficar juntos? – Dorcas se colocou de joelhos e engatinhou até Remus, que lutava contra o desejo de puxá-la para seus braços e o de mandá-la ir embora.

- Aonde você quer chegar, Dorcas?

 Dorcas suspirou e tocou o rosto de Remus gentilmente. Como sempre, sua pele estava mais quente do que a de um ser humano normal. Talvez dois ou três graus acima da temperatura considerada correta. 

- Por que você faz isso com a gente? – ela murmurou enquanto acariciava o rosto de Remus com a ponta dos dedos – Não existe ninguém nos impedindo de ficar juntos e mesmo assim você me afasta como se tivesse alguma doença contagiosa ou coisa assim.

Remus fechou os olhos com o toque gentil de Dorcas, pensando em qual resposta deveria dar a ela. Sabia que não adiantaria discursar muito, mas precisava fazê-la entender que ele era perigoso demais e ela era frágil demais para ficar tão perto.

- É o correto a se fazer, Dorcas! – Remus disse, ainda de olhos fechados – Eu não sou um simples animago que escolhe o momento exato em que quero me transformar... Diferente do Pontas e do Almofadinhas, eu não tenho escolha; nunca tive! Fui amaldiçoado e não tenho o direito de te condenar a viver ao meu lado.

- Já passou pela sua cabeça que essa decisão não é sua?

- Dor...

- Eu falo sério, Remmy! – Dorcas segurou o rosto dele entre as mãos, obrigando-o a encará-la – Você não tem o direito de dizer o que é ou não certo para mim! A vida é minha, eu decido. Sou eu quem deve dizer se acho ou não correto ter você ao meu lado. Sou eu quem deve decidir isso, então pare de dizer que preciso me afastar ou que você é um monstro, porque para mim não tem a menor importância!

Remus riu sem humor e, gentilmente, afastou as mãos de Dorcas de seu rosto.

- Não tem importância? Dorcas, você perdeu o senso de sobrevivência? Você já viu como o James ou o Sirius voltam depois de passar a noite me seguindo por aí? Mesmo sendo animagos, eles voltam feridos, mas não tanto quanto eu por saber que fui o responsável por cada machucado deles. Imagina se, em um belo dia me transformo perto de você! Eu poderia machucá-la...

- Você não faria mal a mim!

- Eu poderia matá-la! E acredite, é melhor não te ter por perto, e saber que está viva e em paz, do que arriscar a sua vida e me culpar pelo resto dos meus dias por tê-la ferido.

Dorcas sabia que precisava controlar aquelas malditas lágrimas que começaram a transbordar em seus olhos, mas não conseguiu. Ouvir Remus falando essas coisas para ela doía muito mais do que se ele tivesse a machucado fisicamente. Por que diabos ele não podia aceitar o fato de que nada do que dissesse a manteria longe? Por que ele tinha que ser tão altruísta e cabeça dura?

- Existem várias formas de se matar uma pessoa, Remmy. – Dorcas disse com a voz embargada – Você não precisa necessariamente tirar a vida de alguém para fazer com que ela se sinta morta. Na verdade, basta tirar dela aquilo que precisa para viver e ser feliz, que estará matando-a.

- Dorcas, eu...

- E é isso que você faz comigo todos os dias, Remmy! – ela continuou – Você me mata todos os dias quando diz que vai se manter distante de mim; quando me afasta apenas para que eu fique supostamente segura... E sabe o que é mais engraçado? É que nunca, em toda a minha vida, me senti tão segura e feliz ao lado de uma pessoa. Então, o que custa aceitar de uma vez que a única forma de me ver perfeitamente bem é estando com você?

- Dor...

- Eu te amo, e sou eu quem deve decidir se quero ou não ficar ao seu lado. – ela disse sem rodeios, tornando a segurar o rosto de Remus entre as mãos – Eu escolho ficar com você, quer goste ou não. Será que pode deixar de ser cabeça dura e aceitar que não adianta tentar me afastar, porque eu não vou a lugar nenhum?

Remus suspirou e por fim abriu um largo sorriso. Aquele sorriso totalmente iluminado que fazia Dorcas esquecer onde estava e mergulhar em seu universo particular onde só havia os dois e eles eram incrivelmente felizes por toda a eternidade.

- Você não tem jeito mesmo, não é menina? – Remus disse de forma divertida e acariciou o rosto da menina com a ponta dos dedos – Quando quer algo, não desiste de jeito nenhum...

- Na verdade eu desisto de várias coisas, o que faz a Marlene gritar comigo e me chamar de pirralha indecisa... Mas, apesar de ser uma maluca de pedra, eu sei perfeitamente o que eu quero para mim. E nunca, jamais, em hipótese nenhuma passou por minha cabeça deixar que você fosse embora. – Dorcas sorriu para o rapaz e colocou sua mão sobre a dele, que ainda estava em seu rosto – Poxa, se até casais fictícios lutam por seu amor, eu não iria quebrar essa tradição.

Remus riu e colou a testa na dela.

- Quer dizer que nós somos uma espécie de Romeu e Julieta, sem as mortes?

- Não... O drama de Romeu e Julieta não é páreo para o nosso. – Dorcas brincou e roçou seu nariz no dele devagar – Nós somos Dorcas e Remus, e nossa história de amor, definitivamente deveria ser contada por aí.

- É claro, porque todas as pessoas gostariam de ler algo a respeito de um lobo mau apaixonado pela menininha inocente.

- Todas as pessoas gostariam de ler a história de duas pessoas que se amam mais que tudo e não deixam nada, nem a questão peluda que surge na lua cheia, atrapalhar esse amor.

- Essa me parece uma boa história para ser contada.

- Porque essa é a nossa história.

E então sem se importar com o vento frio que soprava e com o fato de que provavelmente a maioria dos alunos que se encontravam no jardim estava os encarando, Remus aproximou seu rosto do de Dorcas e a beijou docemente, como apenas ele sabia fazer.

Porque no final de tudo, Remus Lupin finalmente havia entendido; ele finalmente havia compreendido que não há amor sem luta e que não haveria felicidade para ele sem a romântica e sonhadora Dorcas Meadowes.

 

 

 

 

 

~~

 

 

 

 

 

N/A: Hey *-*

Essa fic na verdade é um presente para minha mana de coração, Kakah. Ela é apaixonada por Remus/Dorcas, então achei digno escrever essa história em homenagem a ela. ‘Tava sem fazer nada ontem, e de repente a inspiração surgiu, e pensei: “Por que não?” e eis aí a história hauhauhha

Espero que tenham gostado. É a primeira short dos marotos que eu faço e não tenho ideia se ficou realmente boa.

Bom, é isso aí.

Comentem e digam o que acharam, certo?

XoXo,

Mily.

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