Don't wanna be...
...All by myself;
Passei a ponta dos dedos vagarosamente pelo piano preto de cauda e, colocando meu copo de whisky em cima dele, sentei e encarei as teclas. Era fato que a única coisa que me restava era tocar a minha solidão até que eu me cansasse. Eu poderia beber enquanto isso; as coisas se tornam exorbitantemente mais fáceis quando não se está sóbrio.
Infelizmente eu sabia que era uma mentira e uma tolice acreditar nisso, pois eu não deixaria de ficar sóbria. Minha resistência me assombraria até o fim dos meus dias, que, de alguma forma eu sei, estavam cada vez mais próximos.
Isso tudo significava uma coisa apenas: assim que eu fechasse os olhos e entrasse no meu costumeiro transe ao tocar o piano, milhões de lembranças invadiriam minha mente; minha estúpida memória fotográfica. O que mais eu podia fazer a não ser as convidar para invadir minha mente e minha sexta-feira solitária? Oh.
Sentada, sozinha, como sempre lendo meu livro e tomando meu chá gelado. Eu não precisava de mais nada pra me fazer feliz, eu com certeza não precisava. Eram apenas eu, minha solidão e as palavras; as palavras sempre foram uma ótima companhia, ao menos pra mim. As pessoas não eram, enquanto as palavras, independente de hipócritas, cruéis ou doces, elas eram. Elas sempre foram.
Mas toda essa certeza e essa tranqüilidade nunca significaram paz total, talvez porque o mundo não compreendia meu jeito de levar minha vida. Por mundo, eu quero dizer, obviamente, Sirius Black.
“Lene?” ele me chamaria, enquanto eu lentamente tiraria os olhos das minhas palavras pra ver a pessoa que também nunca foi.
Era óbvio. Tudo nele e naquela porcaria de relação era óbvio, e por isso eu não me entregava. Jamais aceitaria compactuar com qualquer tipo de romance clichê, jamais! O que fazíamos, e fazíamos com freqüência, era minha diversão, nada além daquilo. Significava tanto quanto quando eu fazia com outros.
“Por que você é assim?” seria a pergunta que ouviria, não pela primeira e muito menos pela última vez. Claro, me controlaria pra não dizer nada além da minha resposta educada de sempre: “Eu não sou, Sirius”.
Não é que eu não gostasse dele um pouco; ele era um amigo que eu considerava bastante, mas eu não queria ninguém, eu não queria nada além de brincadeiras, porque nada valia o meu esforço. Aliás, porque eu também não precisava, nunca precisei de ninguém. Era muito bom viver assim, mesmo que todas as pessoas ao meu redor não só discordassem, como insistissem que eu acabaria um dia “deixando o amor da minha vida passar”, eu ainda gostava.
Abri os olhos mais uma vez, notando que, se eu fosse capaz de chorar, já teria lágrimas rolando minha face abaixo. Eu não sabia se era por lembrar de seu rosto, por toda a carga psicológica de estar sozinha em uma sexta-feira à noite, ou se porque o som do piano me levava a isso, mas eu sabia que estava. Era, inclusive, meu momento de parar e refletir sobre como é interessante o fato de que o ser humano pode estar, mas nunca ser, como eu disse antes; só que algo me impediu de pensar sobre o que quer que fosse: eu precisava sair dali.
Sentia-me mal; era como se eu sentisse que eu tivesse perdido as minhas chances, não sei. Eu não costumava sentir aquele tipo de coisa, até porque eu não era assim. Mas o que veio até mim foi mais do que desespero: foi uma depressão que nem em um milhão de anos eu conseguiria explicar; algo que tomou conta de mim e me fez sair depressa, casaco preto no corpo, saltos pretos e minha bolsa também preta.
Parei ao chegar à porta, pensando no porque de estar levando minha bolsa. Afinal, eu não iria de carro a lugar algum. Eu precisava andar, sentir um pouco o frio que devia estar fazendo.
Eu sabia aonde meus pés me levariam. Comecei a sentir o que eu estava prestes a fazer, e soube disso inclusive, assim que a sensação me invadiu. Não poderia me impedir, ainda assim, pois era algo que eu simplesmente tinha que fazer. E eu ainda tinha a certeza de que acabaria me surpreendendo, mesmo sabendo de como as coisas iriam acontecer.
Já havia ligado para Lily e James, Emmeline, Dorcas, Remus, Peter, até Alice e Frank naquela noite, e quase ninguém estava em casa. Só encontrei Peter em casa, mas ele estava esperando uma mulher (que eu jurei ter entendido ser sua namorada) que iria para sua casa. Incrível. Até Peter tinha alguém e eu estava naquela situação! Quanta hipocrisia, também. De repente, tudo que eu sempre acreditei parecia estar destruído e massacrado diante dos meus olhos.
Olhei para a porta branca e encarei a campainha por alguns minutos. Ele poderia não estar em casa, o que era bem mais provável. O que eu estava pensando? Que indo ali sem nenhum aviso ele abriria a porta pra mim, me abraçaria e adivinharia tudo que eu estava sentindo, fazendo com que passasse? Era uma estupidez, e eu soube conscientemente disso assim que me deparei com sua porta, mas também não consegui voltar atrás.
Mais forte do que eu foi o impulso que me fez bater a campainha. Esperava que nenhuma mulher viesse abrir a porta ao invés dele, pois seria algo que me quebraria por dentro.
- Marlene? – ele perguntou quando abriu a porta; graças a Deus, havia sido ele – Você tá bem?
- Não – respondi quase que em um sussurro.
Eu sentia que elas viriam, hoje elas viriam e viriam logo.
Ele abriu a porta e me puxou para dentro, me colocando sentada no sofá, logo se sentando do meu lado e me encarando com aqueles lindos olhos azuis. Era incrível a sensação que ele estava me passando nesse momento; um misto de sentimentos inexplicáveis, coisas que eu não havia nunca sentido antes. Era como se, através daquela preocupação em seu rosto, eu visse uma beleza inimaginável; um ser humano que transcendia qualquer descrição, indo até onde ninguém mais poderia ir, pois ninguém mais poderia jamais ter um por cento daquela beleza toda que ele emanava; ele ou sua alma, nunca soube ao certo.
Era óbvio, e eu já sabia desde que havia ouvido e sentido a primeira nota do piano: eu estava apaixonada por ele. Eu dependia dele, mesmo que só tivesse percebido isso alguns anos depois e mesmo que hoje já não tivéssemos mais nada. Eu demorei meu tempo pra notar que eu não queria mais estar sozinha, pois a solidão me dava medo. Não haviam mais palavras, não havia mais música ou bebida que pudesse substituir a necessidade e a saudade que eu tinha de uma das coisas mais banais da vida: um ser humano.
Mesmo que esse ser humano nunca pudesse ser, eu precisava que ele estivesse, e precisava que fosse comigo.
- Eu... – abri a boca para falar, mas antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, as lágrimas descerão rapidamente de meu rosto e Sirius já me abraçava.
- O que aconteceu, Lene? – perguntou com um tom mais ávido de preocupação.
Não entendia o porquê, e principalmente o porquê de estar me deixando agir tão fraca; era ainda mais irritante não compreender como eu não conseguia me irritar por estar passando por aquilo: eu precisava que o Sirius me abraçasse, me protegesse e me dissesse que tudo ia ficar bem, pois ele estaria ali sempre. Ele não só estaria; ele estaria ali comigo.
Senti seus dedos puxando delicadamente meu rosto para que eu pudesse olhá-lo outra vez. Em seus olhos eu vi várias coisas; eu vi o amor que eu sabia que ele sentia por mim, vi a indiferença que os anos sem que eu me preocupasse com ele causaram, e vi a preocupação. Esta última era tomada, lentamente, pela compreensão. Não demoraria muito pra que ele soubesse exatamente o que estava acontecendo.
- Quer conversar?
Resolvi pensar bem na resposta. Na verdade, eu não sabia mesmo ao certo o que eu queria fazer. Ir até ali, chorar e parecer uma mulher louca era a única parte que constava no meu plano. O que fazer depois, o que dizer e como ir embora era algo que eu não saberia fazer.
- Eu... Eu não sei – falei por fim, jogando meu rosto contra minhas mãos, esperando que eu fosse capaz de afogá-lo ali.
Sirius apenas continuou me olhando, o mesmo jeito indiferente que eu sabia ser minha culpa; eu não sabia por que estava me sujeitando àquela situação, era quase humilhante. Ele agia como se houvesse motivos pra que ele estivesse com raiva de mim, e eu agia como a perfeita garota boba que está prestes a pedir desculpas pelo que quer que ela tenha feito de errado. Mas claro, eu havia feito algumas coisas, e uma delas foi “desaparecer” por anos da vida dele, além das coisas que eu disse na última vez que nos encontramos.
- Isso é muito... – tentei começar, mas minha voz não saia tão firme quanto eu queria – Obscuro.
- Amor? – ele riu – Você fala de um jeito que quase me faz acreditar que não é uma coisa boa, Marlene.
- Mas não é – falei com convicção. Pois de fato não é.
- Você precisa da cura pra esse seu problema. Precisa parar de fugir das coisas, das pessoas e principalmente de mim.
- Adiantaria alguma coisa se eu te dissesse que hoje eu sei? – perguntei insegura.
Estava com medo, e era um medo maior do que qualquer outra vez que já senti medo, e eu não costumava sentir com freqüência.
Aquela situação estava me irritando demais.
- Adiantaria pra você – respondeu – Pois é você quem precisa parar de levar a vida do jeito que leva.
Fiquei em silêncio, encarando as palavras que haviam saído de sua boca e agora pairavam no ar. Elas eram, e por Deus, eu não queria que elas fossem. Naquele momento quis que palavras não pudessem ser, só pudessem estar, pois todo o valor que elas tinham seria resumido a quase nada, que era o que pessoas sempre significaram pra mim.
- Eu te avisei que você acabaria sozinha, Lene – ele falou depois de um tempo do meu silêncio e se levantou, provavelmente pra pegar alguma coisa.
- Eu não quero ficar sozinha! – gritei antes que conseguisse me segurar, e ele rapidamente virou pra trás me encarando assustado.
Era provavelmente a coisa mais estranha que eu já havia dito pra ele.
- Você o quê? – perguntou.
- Não quero ficar sozinha! – continuava gritando; sentia-me uma criança de sete anos pedindo por doces – Eu não quero, eu não suportaria, eu não agüento mais! Eu preciso de alguém, eu preciso de você, eu preciso muito.
Ele se aproximou lentamente de mim, a indiferença ainda presente em seu rosto, mas não mais em seus olhos. Eu não sabia o que esperar. Por mais que soubesse ler aqueles olhos muito bem, eu não conseguia o fazer desta vez; e por mais que esperasse por alguma coisa, senti que ele me surpreenderia de maneira exemplar.
- Quero te perguntar uma única coisa – falou, bem próximo de mim, sem tirar os olhos azuis dos meus por um segundo sequer – Por que você é assim, Lene? – sorriu ao soltar as palavras e então me beijou.
Um beijo rápido, mas não o suficiente pra que deixasse de ser os beijos românticos que ele costumava me dar; eu até devia me considerar uma garota de sorte. Até onde eu sabia, Sirius Black tinha alergia à romance quando se tratava de qualquer outra mulher no mundo, menos de mim. Comigo era válido tudo, sendo que o importante era o resultado final que ele esperava: fazer eu me apaixonar por ele do jeito que ele havia se apaixonado por mim.
- Dessa vez eu não sei te responder – disse sorrindo também.
Às vezes, quem sabe, pessoas poderiam até ser, mesmo que pra isso elas precisassem de outra pessoa, e então elas seriam, mas não pra si mesmas, sim para o outro; elas seriam, porque estar não seria mais suficiente.
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MMcK: Tadã! Eu fiz essa fanfic de tanto escutar essa música, HE. Ela é linda, fala sério. E ficou um lixo (a fanfic), mas eu gostei, velho. E por isso eu postei. Tem umas coisas meio esquisitas do tipo pessoas não serem, palavras serem, e isso são coisas que passam pela minha cabeça às vezes. Pessoas não são nada, entende? Palavras são. Tipo, concretas, por exemplo. Honestas, cínicas, mentirosas, mas elas são. Pessoas só estão sendo, afins. HEHE Ridículo, mas enfim. É o que se passa na minha cabeça de maluca de vez em quando Q
Logo eu posto as outras que são capítulo único (todas estão escritas, he, só preciso de tempo mesmo). Comentem bastante, hihi, plis *-*
Beijócas!
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