Capítulo 2
Capítulo II
Flashback – Último semestre do último ano
Local: Drayton Manor High School – Aula de Matemática Avançada
Horário: 13:20h
Quando: 20/JANEIRO - quarta
Lily olhou mais uma vez para o garoto ao seu lado. Calado. Como sempre esteve. Parecia concentrado – até demais – como se nada fosse mais importante do que aquela folha impressa repleta de exercícios de números imaginários, que a Sra. Kobe passara à turma. A ruiva, discretamente, observou em volta: a maioria das duplas trabalhava em conjunto, tagarelando, discutindo e rindo. Lily sentiu-se solitária. Por que não caíra com uma menina, pelo menos? Como passaria o semestre, que só começara há duas semanas, ao lado de um garoto que era não somente o namorado da menina mais poderosa da escola, mas também um dos garotos mais populares de sua série?
James, entendendo o queixo da colega averiguando a sala, lançou seus olhos a ela, obliquamente. Não queria que ela percebesse. Porém, por mais que estivesse sendo cauteloso, não pôde deixar de exclamar um palavrão mentalmente. A menina estava mais do que perdida. Aparentava desespero, mesmo que disfarçado. Suspirou. Irritado com o peso dos olhos daquela garota desconhecida em cima de si, perguntou, em uma voz gentil:
- O que foi? Precisa de alguma ajuda?
Obviamente não conseguiu desviar sua atenção dela. Seu cabelo vermelho-alaranjado era como uma daquelas placas de neon na estrada: impossível não colocar os olhos. Depois que se deteve no cabelo, passou para o resto. Ela era sardenta, porém com um rosto angelical.
Piscou e franziu a testa. Percebeu que aquilo era tudo o que a colega menos queria. Fora descoberta! James reparou em seus olhos arregalados e na coloração rósea que inundou sua face, assim que proferira tais palavras. Nervosa, Lily abaixou instantaneamente a cabeça para o dever, orando para que fosse apenas sua imaginação.
Afinal, por que James Potter dirigiria qualquer palavra a ela? Justo a ela?!
Balançou com força seus cabelos contra suas bochechas, prontamente negando, sem abrir a boca.
James, que ainda não tinha tirado os olhos de Lily, falou:
- De verdade? Porque você não para de me olhar, então achei que quisesse alguma ajuda.
Reprimiu violentamente a vontade de rir daquela menina. Ela parecia muito infantil.
Claro que James já a tinha visto pelos corredores. Muitas vezes, a propósito. Desde que estudava ali, se lembrava de uma menina ruiva que sempre andava pela escola na companhia da presidente do Clube de Teatro, uma gordinha de óculos, aparelho nos dentes e cabelos muito louros. Não que o garoto achasse que a menina ruiva fizesse parte da Turma do Teatro, porque já tinha comparecido a algumas peças e Lily nunca fez parte de nenhum elenco. Não que ele se recordasse – o que seria fácil, já que a garota era uma das poucas estudantes com um cabelo tão berrante.
E, ao contrário da gordinha, Lily parecia ter alguma espécie de áurea brilhante, já que era recorrente a adrenalina que passava pelo corpo de James sempre que a via – sozinha ou não – nos dias de semana. Ainda mais: James sabia quem ela era. Lily tinha conquistado uma coluna de 300 palavras no Jornal da Escola, o Editorial. Então, mesmo que sem querer, ocasionalmente, ele lia sua coluna. Às vezes era a respeito do jogo de Futebol – time do qual James fazia parte -, às vezes era a respeito do Manifesto Contra Saias No Colégio. E ele admitia: existia uma Lily completamente escondida através das próprias palavras.
Lily sacudiu novamente a cabeça, agora com mais força. Pregou os olhos nos números a sua frente e rezou para que o colega voltasse ao trabalho.
- Você não é muito boa em matemática, é? – James estava de olho na folha de exercícios de Lily, fazendo com que ela, automaticamente, adquirisse um ar defensivo – É que você não terminou nenhuma das questões. Acho que está se esquecendo de retribuir o valor numérico dos imaginários.
Lily olhou para James, confusa. Por que o garoto não olhava para o próprio trabalho? O que importava o dela?
- Hum – resmungou ela. Olha para o outro lado, cara!
- Acho que está precisando de uma mãozinha, hein? – James riu de leve, tornando a fazer Lily corar.
Ela odiava corar em público.
- Hum, não precisa – a voz rouca de Lily ressoou de um modo áspero. Ela percebeu que James continuava a esperar melhor resposta e se apressou a dizer: - Eu sei fazer os exercícios, só estou cansada.
- Ah, claro – o garoto sorriu com escárnio.
Lily bufou irritada. Mas o que tinha esse garoto hoje, hein?
- Olha, vai ser difícil sermos colegas de classe desse jeito – James lhe disse com sinceridade, notando a irritabilidade da menina.
Lily sentiu-se culpada. James podia ser um cara legal, afinal. Ainda que fosse muito popular e namorasse a queridinha dos populares, a Kelly Shantt. Não são todos os meninos lindos, populares e comprometidos que agem como animais irracionais, certo? Lily pensou seriamente em oferecer sua mão pequena a ele e pedir desculpas. Mas Lily era Lily. Orgulho era o que ela mais tinha. A menos que...
- Desculpa. Eu sei que não fui muito legal – Lily lhe disse, intensificando o rubor da pela claro da face.
- É, não muito, realmente – admitiu James, mas sorria, como se aquilo nem tivesse acontecido – Mas eu supero – ele riu, desejando pode arrancar risadinhas da colega. Funcionou. Lily riu. Tímida, mas riu. Bem, aquela era a Lily.
- Então, qual o seu nome, parceira de aula?
Lily riu mais uma vez. Conteve-se a não demonstrar muito entusiasmo. Meninos não gostam de meninas bobas.
- Lily - a menina da risadinha comprida lhe disse. Seus cabelos cor de fogo se balançaram harmoniosamente.
- Ah, olá – ele sorriu e completou – Sou James.
Lily o olhou irônica. Disse:
- Eu sei quem você é – mais uma vez, Lily riu baixo.
- Aaah – James fez, com um ar de sabichão – Então é por isso que não quer conversar comigo?
Lily modificou seu olhar. A ironia cedeu lugar a confusão.
- Por isso o quê? – ela perguntou.
- Você não quer conversar comigo porque sou o idiota do James que todo mundo idolatra e nem sabe por que – o garoto replicou, rindo.
Lily desejou poder rir de novo, mas dessa vez não podia. Estaria sendo inconveniente. Não poderia rir de James Potter.
- Nunca o achei idiota – ela balançou a cabeça, séria – Eu não costumo julgar as pessoas antes de conhecê-las – agora Lily sentia-se bem mais à vontade, como se estivesse com mais liberdade para expressar suas opiniões.
James levantou as sobrancelhas. A garota era esquisita, disso ele já sabia, mas tão inocente assim? Não, isso com certeza nunca tinha passado por sua mente.
- Bem, parece que restante do colégio pensa assim – assinalou ele, parecendo surpreso – Essa gente nem sabe se sou tão legal quanto pensam que aparento ser – suspirou.
Lily sentiu-se novamente culpada. Por que teve de abrir a boca?
- Por que isso incomoda você? – ela quis saber, já quase topando os próprios lábios – Pensei que você gostasse de toda essa atenção – ela deu de ombros.
Por mais que ela tivesse a mais absoluta certeza de que estava fazendo tudo errado, dizendo coisas completamente idiotas, não conseguia parar. Ele tinha de saber, certo? Verdades são mais suportáveis do que mentiras. Ou não?
- Bem, quero que eles gostem de mim pelo o que sou de verdade, não por causa da minha aparência ou porque jogo no time ou porque namoro a Kelly – ele pareceu aborrecido, mas adicionou: - Quero dizer, do mesmo modo como me julgam erroneamente, julgam você – Lily arregalou os olhos assim que James constatou esse fato – Digo, todo mundo a ignora só porque você é tímida e por isso não lhe dão chances para conhecê-la como você realmente é – ainda que a menina estivesse espantada, não deixou de pensar que aquela era mesmo uma grande verdade inquestionável.
No entanto, ainda que estivesse espantada com a delicadeza do garoto ao falar tais palavras de modo muito menos pesado, não deixou de também estar surpresa por James parecer mesmo aborrecido com a escola.
James Potter INSATISFEITO com a popularidade? Não, não era possível. Deveria ser encenação.
Lily torceu as mãos discretamente. James a mirava aguardando, com uma expressão na expectativa.
- Bem, você não parece querer me ignorar – observou ela, sem jeito. James sorriu simpático e esquivo.
- Deve ser meio difícil estar sozinha – ele deu de ombros e logo se apressou a dizer: - Ah, você anda com aquela menina do teatro, mas mesmo assim. Vocês nem parecem ser melhores amigas – ele começou a falar muito rápido, não dando tempo para a garota o interpelar, caso quisesse – Você não se sente solitária? – quis saber.
Lily Evans nunca tinha sido a menina mais amistosa de todas. Nunca tinha sido boa em fazer amizades sendo tão tímida, e isso a impedia, muitas vezes, de se aproximar das pessoas. Sua timidez a tornava esquisita e invisível. Claro que ninguém, exceto Jane, queria ficar muito perto da menina ruiva calada.
- Sim, muitas vezes – Lily admitiu, sorrindo desconfortável.
James se ajeitou na cadeira. Brincou com o lápis em seus dedos e disse:
- Também me sinto assim muitas vezes, porque parece que todo mundo só se aproxima de mim por causa da minha popularidade idiota – o tom do garoto estava amargo, mesmo que não quisesse que a colega percebesse. Olhou para Lily com um sorriso divertido nos lábios e complementou: - Bom, todo mundo, menos você – Lily não pôde controlar a vontade súbita de esticar os lábios para cima – Afinal, fui eu que puxei papo com você – ambos riram – E desculpe se estou sendo insuportável: normalmente tenho essa tendência – James finalizou.
Lily se apressou em negar com a cabeça. Em seguida, sorriu. Era incrivelmente fácil fazer isso ao lado dele.
- Não, tudo bem – ela pigarreou – Hum... é legal falar com você. Na verdade, não imaginei que você fosse, sabe como é, tão legal – sua voz expressava culpa, mas relaxou ao entender que James não ligara.
- Ninguém imagina muita coisa a meu respeito – James salientou pensativo.
A garota percebeu que aquilo pudesse mesmo ser verdade. Sabia que só porque uma pessoa jogava futebol não significava que adorasse todas as meninas oferecidas ou todos os privilégios por ser um astro escolar. Talvez James fosse mesmo diferente. Claro que não deixava de ser um cara, mas, ainda assim, um cara desacostumado a receber um amor gratuito. Não que Lily estivesse disposta a ser a amiga secreta do garoto, mas sabia que doar amor gratuito não doía, e muitas vezes, aquecia o coração de ambos os lados.
Lily estava quase querendo lhe dizer que estava mesmo muito contente por não ter de passar mais um semestre de boca fechada – como sempre passava todos os semestres -, mas a Sra. Kobe, analisando todo o entrosamento da dupla e achando que aquilo era mesmo algum tipo de milagre, já que - tal como Lily – estava acostumada a ver sua aluna sempre calada, resolveu averiguar a produtividade da mesa.
- Então, meninos – Sra. Kobe sorria. Seu óculos, que a fazia parecer uma enorme coruja de desenho animado, não parava de escorregar de seu nariz – Acham que conseguem conversar ao mesmo tempo em que resolvem os exercícios? Seria bem útil.
Os garotos pediram instantaneamente desculpas pela negligência e abaixaram rápido suas cabeças para o trabalho à frente.
A professora se afastou de seus alunos, pensando: “James Potter conversando com a menina ruiva? Eu mal sei o nome dela! Lilo? Não, é Lourdes. Ou... Bem, agora já vi de tudo”.
- O que você acha que a Sra. Kobe faz quando de repente sai da aula e diz que foi visitar a Madame Blue?
Lily levou outro susto. Seu raciocínio atrofiou no cérebro e se esqueceu do que estava estudando ali.
- Jane acha que todos os professores são contrabandistas de café da Amazônia – Lily respondeu, escondendo o risinho.
- Ah, você já percebeu que todos eles carregam suas próprias garrafas térmicas de café?
- Totalmente! – os dois olharam para a Sra. Kobe, que bebericava seu costumeiro copo de plástico. Obviamente gostava muito do que estava degustando.
O restante da aula – apenas dez minutos – passou ligeiro. Parecia que o relógio não queria contribuir com ninguém, principalmente quando a professora se levantou, ajeitou seu óculos desproporcional, e bateu as palmas das mãos uma contra a outra, uma única vez.
- Bem, acabou de bater. Gostaria que levassem as folhas para casa e as terminassem – alguém soltou um muxoxo – Não interessa, Sr. Gahler, quantas horas precisará gastar para preencher o seu trabalho – acrescentou, ameaçadora: - Sem desenvolvimento, sem notas!
Lily ficou feliz ao saber que não se deteria em números imaginários por mais de meia hora em casa. Felizmente só não finalizara duas questões. James, por outro lado, não gostou do que viu em sua folha, assim que passou os olhos por ela: a noite seria tomada por matemática.
Ele, então, antes que Lily conseguisse ajeitar seu material em sua mochila, pronta para partir e se enfiar em outra aula, falou:
- Acho que nos daremos bem, hum?
Lily tirou os olhos da folha do dever que tinha dobrado cuidadosamente para que coubesse em seu repartimento do caderno.
- Acho que sim – assinalou, distraída – Que aula tem agora?
- Inglês, acho – James respondeu cético – E você?
- Política, com o Dolfon – James logo percebeu que Lily gostava dessa matéria, pois seu grande sorriso voltara a aparecer.
- Ah, ele é maneiro, apesar de parecer um pouco nazista.
- Não. Ele é separado: está sempre mal-humorado naturalmente – Lily contou.
- Ah – ele piscou, observando-a meter o caderno dentro da mochila com um tanto de pressa – Ei, você acha que algum dia eu vou parar de ficar olhando para o seu cabelo? – sua cabeça estava inclinada.
- O quê? – Lily exclamou confusa demais. Suas mãos escorregaram do caderno.
- Bem, seu cabelo é o máximo. Ele é tão brilhante! – James mantinha os olhos verdes apertados, como se estivesse olhando para o Sol.
- Ah – Lily gaguejou, praguejando por ter sido tão estúpida – É, eu sou uma espécie de mutante – brincou.
Um segundo depois, James riu alto, jogando os cabelos negros e compridinhos para trás.
Lily sorriu desconfortável. Alguém rira de algo que ela falara. Bem, talvez fosse mesmo uma mutante.
Ambos se levantaram de suas cadeiras, e Lily sentia-se muito mais leve.
- Vejo você depois de amanhã – Lily lhe disse, jogando a alça da mochila nos ombros e acenando precariamente.
James a seguiu.
- Com certeza – ele sorriu feliz -, e você poderá me contar como é a vida de mutante – gracejou, arrancando mais sorrisos da garota.
- Ah – ela soltou um risinho, quando já saíam para o corredor -, é uma porcaria, acredite em mim.
James riu novamente. Era imprescindível não fazer tal ação.
No instante que os dois se deram as costas, prontos para seguirem respectivamente para suas aulas do próximo período, James percebeu que a tentação era demasiada grande para qualquer um dos lados.
Agradeceu por fazer Matemática Avançada naquele semestre.
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Narrado por: James Potter
Local: Prédio Lancelot, moradia de Lily Evans
Horário: 16:04h
Quando: 12/AGOSTO – segunda
O condomínio de Lily era mesmo muito bonito. Todas as grandes torres remetiam a um século muito distante, provavelmente o vitoriano. Seus detalhes, pude ver, tinham sido redecorados e reformados, ainda assim imperavam sobre os da vizinhança. De longe era o mais arborizado e o mais limpo. Todos os lobbys que compunham as entradas das torres – cinco, ao total, muito bem dispersas, provavelmente para abranger bem o terreno imenso do projeto da construção – eram alvos e erainevitável não se perder nas pinturas minúsculas que residiam nas abóbadas dos tetos. As estrelinhas douradas davam a impressão de que estávamos embaixo de uma chuva de estrelas cadentes; acho que os moradores não achavam tanta graça nelas, uma vez que mal olhavam para cima: seus palm tops eram bem mais chamativos.
Não pense que eu fui lá para espionar ou algo do tipo. Nunca fui bom nessas coisas.
Mas a minha segunda-feira estava ótima e achei mesmo que conseguisse arranjar um tempinho para respirar ar puro, não somente o fedor de frituras do restaurante. Deixei Hannah no caixa e lhe disse que não demoraria mais do que uma hora. Ela sabia que, apesar da minha enorme satisfação com o negócio, de vez em quando eu me encontrava completamente saturado de tanto lidar com números, com clientes e com crianças correndo entre as cadeiras.
A torre de Lily era a B. O porteiro responsável, um senhor grisalho e manco, prontamente tirou os olhos das cartas que separava e lançou um olhar indagador para mim.
- Olá, senhor – ele me disse em uma voz alegre e rouca. Acho que fumava demais.
- Oi, sou James Potter – apresentei-me, achando que talvez tudo pudesse ser mais fácil – Sou amigo de Lily Evans – o senhor fez um “Ah” e logo sorriu – Ela, por acaso, está em casa?
Com ele não tinha cerimônia alguma, logo percebi:
- Não, não. A Srta. Evans mal pára em casa, sabe – seu olhar ficou pesado – Trabalha demais; eu mesmo mal a vejo. Sempre está correndo.
- Hum. E em que horário eu poderia encontrá-la? – quis saber.
- Sinceramente, não faço idéia – ele abanou a cabeça – Normalmente está em casa à noite, mas nunca tem um horário fixo. Raramente está pela manhã ou pela tarde.
- Ah, certo – eu sorri agradecido pelas informações – Muito obrigado.
- Não há de quê, meu senhor – o porteiro me devolveu com amabilidade.
Então, saí dali. O que mais poderia ter feito?
Além do mais, não tinha muito mais tempo: clientes inundariam o Spring Restaurant para o jantar e se eu não estivesse lá presente, era bem provável que alguém se queimasse ou tropeçasse nos vasos das plantas. A minha equipe era ótima, mas só quando estava ao meu redor. Tinha de ser supervisionada para funcionar. Não era uma coisa que me irritava, mas era cansativo. Sem contar que Finn nunca pegara o jeito de transportar mais de quatro pratos nas mãos.
Afinal, eu só queria parecer por lá. Não queria ser o tipo de visita que aporrinha. Ainda que meu objetivo fosse pegá-la de surpresa, para que não tivesse para onde correr, lançando qualquer desculpa para não ceder um pouco de seu tempo a mim, não gostaria que ela achasse que eu a estava perseguindo.
Mas, pelo o que fui informado, eu não tinha muitas chances assim. De encontrá-la, digo. Lily não parecia ter muitas horas de folga. Nem mesmo acho que os domingos eram poupados dela. Seja lá com o que ela trabalhasse ocupava muito de seu tempo. Talvez não conseguisse nem mesmo dar ração ao gato, se tivesse um.
Decidi, após retornar ao Sol quase fraco do meio da tarde, que arranjaria outro dia para indagar sobre sua presença. Não seria conveniente telefonar depois das oito da noite – Hannah dizia que era falta de respeito, pois tinha lido isso em algum livro. Então, não queria nem arriscar. Se bem que até podia ser que Lily nem mesmo estivesse já em casa naquele horário.
E seria completamente surreal procurá-la por seu celular. Acho que ela nem mesmo atenderia, se visse o número desconhecido na telinha. Bem, normalmente pessoas com cabeça no lugar não aceitam conversar com estranhos.
Mas, tudo bem. Eu esperaria. Eu estava esperando há muito tempo.
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Narrado por: Lily Evans
Local: No apartamento - quarto
Horário: 22:34h
Quando: 27/AGOSTO – terça-feira
Pelo menos uma vez por mês, Max viajava para outras cidades por conta das conferências e congressos e cursos que faziam referência à empresa; ou então tinha de tratar de casos em outros estados, onde as famílias não podiam se deslocar, pois já estavam gastando o maior dinheirão com o advogado. Então, Max ia encontrá-las, de boa vontade. Devo admitir que ele sabia muito bem como administrar e conciliar o seu tempo, ao passo de que eu mal conseguia ter uma boa noite de sono, pois meus pensamentos nunca me largavam. Até achava que, por meros momentos, entendia nossas brigas em que ele me acusava de ser um tanto egoísta por apenas pensar em meu trabalho.
Só que ele nunca tinha entendido o quanto o meu emprego importava para mim. Quero dizer, ele já era um advogado antes mesmo de sair da faculdade e a empresa era de seu pai, então, se o negócio do direito não desse certo – o que era completamente impossível de se acontecer -, ele ainda teria a empresa que herdou. Eu, por outro lado, não era boa em nada além de palavras, por isso trabalhava na Fifteen. Escrever era única coisa que sabia fazer, o que muitas vezes era depreciada por Max. E era ISSO que me magoava.
Maxxie sempre achava que seu trabalho era muito mais importante do que o meu.
Bem, de todo modo, naquela terça-feira, eu estava sozinha. Ele tinha partido para Oldham na manhã anterior e me deixara o resto da semana solitária. Naquela noite, assim que cumprimentei Ploo – o porteiro -, ele se levantou afobado de sua cadeira giratória e me seguiu até o elevador. Parecia afobado:
- Olá, Srta. Evans. Boa noite. Um amigo da Srta. tem aparecido por aqui: quer saber se a Srta. terá alguma folga por esses dias. Pelo jeito quer visitá-la.
Eu sempre entrava no prédio, distraída e cansada demais para ouvir o que Ploo tinha a dizer – às vezes ficava comentando sobre a liga de Futebol ou de Rúgbi, coisas que nunca entendi e não tinha saco para entender -, mas daquela vez eu não podia fingir que o ouvira, quando, na verdade, mal o tinha escutado.
- Ah – falei meramente.
Espera.
Um amigo?
Então, achei que sentiria o chão polido de mármore contra o meu maxilar.
JAMES TINHA APARECIDO E INTERROGADO PLOO?
Mas que...
Não acreditava!
- Qual o nome dele, Ploo? Você se lembra? – perguntei obviamente desesperada. Não que o Ploo tivesse desconfiado.
Quero dizer, eu já sabia a resposta. Não haveria outra alternativa. Mas, sabe como é. Eu era paranóica e doente.
- Ah, sim, perfeitamente. Ele já esteve aqui umas três vezes, a maioria pela tarde – contou-me feliz – É James Potter.
Ter ouvido o nome de James ser proferido por outra pessoa quase me fez querer vomitar.
- O que você disse a ele, Ploo? – mirei o porteiro, segurando a porta do elevador para a Sra. Summer se acomodar lá dentro. Ela me agradeceu e eu somente lhe sorri.
Afastei-me de lá e me concentrei no aparecimento de James.
- Bem, aparentemente ele só quer saber a que horas a Srta. chega do trabalho, portanto eu lhe disse que não sei ao certo, o que é mesmo verdade, pois a Srta. é muito ocupada – aí a expressão de Ploo ficou preocupada e logo quis saber: - Eu devia tê-la consultado primeiro?
Era ÓBVIO que ele deveria ter me consultado primeiro! Eu o pagava para ter segurança!
- Não, Ploo, tudo bem – neguei, mentindo. Coitado de Ploo: ele era um senhor bom demais para ser castigado com a minha fúria e com o meu desespero.
Bem, o que faria? Proibiria a entrada de James no saguão? Não achei muito cordial, sabe. Esse meu requerimento poderia ser tomado como crueldade e culpa. O que o meu porteiro pensaria? Que eu odiava esse meu “amigo”, sem dúvida. O que não era verdade, por mais que parecesse que sim.
- Se a Srta. quiser, posso falar com a portaria lá da frente e...
- Não, não. Não será necessário, Ploo. Obrigada – fiquei horrorizada ao me dar conta que Ploo pegara o meu plano – Hum, boa noite – desejei após ele acenar que entendera que não deveria fazer nada.
Já ia dando as costas para ele, mas sua voz me refreou.
- Espere, Srta. Ele me pediu para lhe entregar isto – ele foi até seu balcão e tirou de uma das gavetas uma caixa perolada do tamanho de uma caixa de sapatos. Arregalei os olhos, chocada e desconfiada.
- O que é? – perguntei-lhe.
- Não sei, querida. Não abri a caixa – ele sorriu, balançando a cabeça reluzente e me estendendo o presente.
- Hum, ok. Obrigada – recebi-a como se estivesse com receio de que em seu interior se escondesse uma família de baratas.
Despedi-me mais uma vez de Ploo e peguei o elevador, totalmente em pânico.
O que James tinha colocado ali?
Entrei no apartamento e fui direto para o quarto. Normalmente, antes de entrar no quarto, bebo um copo de água ou pego alguns biscoitos, mas me esqueci de fazer qualquer coisa normal. Tirei as sapatilhas e afundei no colchão, ainda com a caixa brilhante nas mãos. Olhei-a por um tempo, sentindo o meu coração dançar descontrolado em meu peito. Decidi que gostaria de estar relaxada – ou tentar estar – para desvendar o que havia ali dentro, por isso tirei a roupa e fui para a banheira, adicionando sais e água bem quente. Enquanto estava lá, liguei para Max, para lhe comunicar uma “boa noite”. Claro que Max falou por quase meia hora sobre o seu dia, mal me dando tempo para narrar o meu almoço. Ele nunca conseguia se controlar.
Quando – finalmente – consegui desligar o telefone e sair da água, agora já morna, vesti meu pijama preferido – aquele infestado de pintas, cujo efeito fazia Max me chamar de Dálmata -, sentei-me novamente na cama e mirei mais uma vez a caixa, de volta em minhas mãos.
O que James queria me dar?
Abri a caixa, devagar. Como se estivesse desarmando uma bomba.
Surpreendi-me ao encontrar um livro, uma caixinha de veludo quadradinha e duas cartas, em um envelope pardo.
Detive-me primeiramente na caixinha azul-marinha. Assim que a abri, não pude deixar de ofegar. Lá descansava um colar com um pingente de coração.
Era o MEU colar de pingente de coração!
Era o colar que eu usara nos últimos dois meses do último semestre da escola.
Mas o que o colar estava fazendo com ele? Eu lembrava perfeitamente de tê-lo arrancado de meu pescoço, no meio do aeroporto, e tê-lo jogado longe! Como James o achara?
Mais importante: POR QUE estava me DEVOLVENDO?
Peguei-o nas mãos e o beijei. Sentia tanta falta daquele coração! Ainda tinha mania de entrar em desespero quando apalpava meu pescoço e não o encontrava pendurado ali. Claro que, com tristeza, me lembrava que não o tinha mais. Fiquei tão extasiada ao vê-lo que o devolvi ao lugar costumeiro mais uma vez, só para ter o prazer de mirá-lo no espelho. Passei as pontas dos dedos no metal e sorri. Pude sentir as lágrimas se acumulando em meus olhos.
Oh, James. POR QUE aquilo?
Então, resolvi abrir o envelopo e ler os papéis.
Na primeira folha de caderno, ele escrevera:
Lily, o que aconteceu? Ainda não entendi o que fiz de tão errado para você querer sair correndo para outro estado. Só queria que você me explicasse o seu VERDADEIRO motivo. Você simplesmente se arrependeu de estar comigo por todo esse tempo? Mas, lembra, você me disse que era a menina mais feliz de todas quando estava comigo. E que porcaria de história é essa de “conto de fadas”?
Bem, de todo modo, só queria escrever que sinto muito se a desrespeitei de algum modo – caso seja por isso que fugiu para Liverpool – e que nunca irei me arrepender dos nossos momentos. Você é – e sempre será – a melhor garota que já conheci. E quero que você saiba que eu posso esperar.
Com amor, Jay
Agora as lágrimas escorriam pela minha face.
COM AMOR, JAY.
Era claro que ele escrevera isso há seis anos. Sua letra estava igualzinha à da minha lembrança. Eu nunca recebera uma carta dele enquanto estava fora, porque tinha feito outro e-mail para não ser encontrada por ele. Mas agora que eu estava lendo aquilo... Lendo o quanto ele se magoou – o quanto EU o magoei -, sentia-me verdadeiramente uma idiota.
Quer dizer, COMO eu tivera CORAGEM de machucar aquele cara? Aquele cara que representara – e ainda representava – tanto para mim? Aquele cara que me fizera aprender sobre mim mesma, sobre a vida e sobre o amor? Como eu pudera fugir para o OUTRO LADO DO PAÍS? Como eu pudera ter sido tão imatura e insegura?
Comecei a ler a outra carta:
Oi, Lily
Achei necessário escrever isso. Talvez não por você, mas por mim: para eu poder desabafar, exatamente como você costumava fazer.
Eu sabia que você voltaria. E sinceramente, continuo, mesmo depois de tanto tempo, sem compreender por que não estamos juntos. Agora não tenho mais certeza se quero entender, acho que já perdeu a importância. Digo, não é como se depois de você explicar o seu lado, eu fosse me regenerar como um X-Men. Além do mais, acho que EU não tenho mais importância para você.
Embora você vá achar uma loucura, estou lhe devolvendo seu colar – AQUELE COLAR, LEMBRA? – e não irei ficar chateado se quiser se livrar dele, de uma vez por todas. O coração é seu. Quanto ao livro, ainda me lembro que você apreciava esse tipo de história. Se quiser queimá-lo, tudo bem. O coração é seu. E não se preocupe, não quero atormentar a sua nova vida. Mas se quiser uma boa dica de um restaurante que sirva comida natural, recomendo o Spring Restaurant. Dizem que é muito bom. Quem sabe nos vemos por aí.
Com amor, Jay
Meus soluços ecoavam pelo apartamento silencioso. Aquilo era tão doloroso! Como ele OUSAVA afirmar que achava que não tinha mais importância para mim? O que ele tinha em mente? Que eu o tinha esquecido, como se nunca tivéssemos nos conhecido?
Eu NUNCA poderia odiá-lo! Ele é que deveria estar me odiando, afinal, quem agiu como uma criança fora eu. Eu é que jogara o colar de coração para longe, eu é que dissera que não daríamos certo, e depois de tudo, ainda DESAPARECI por SEIS ANOS, deixando-o para trás, como se ele tivesse sido um cachorrinho desobediente que fora largado no acostamento de uma estrada.
Eu tinha CERTEZA de que depois de todos aqueles anos James NUNCA me procuraria. Não depois do tanto que o feri. Então... POR QUE me tinha me devolvido um antigo colar, prestara-se a escrever mais uma carta E me mandara um livro romântico? POR QUE ainda estava atrás de mim? POR QUE eu ainda representava algo para ele? Eu só era a criança covarde que fugira de seu amor!
Será que tinha falado a sério quando escreveu que “não queria atormentar a minha nova vida”? Quer dizer, ele não precisava estar novamente em minha vida para conseguir atormentá-la.
Totalmente magoada, devolvi tudo à caixa e a escondi em meu closet juntamente com as fotografias do passado. Daí, mesmo sem ingerir nem mesmo uma barrinha energética, deitei-me sobre os lençóis e fiquei chorando igual a um bebê até pegar no sono. Eu estava com vontade de tomar outro banho, mas sabia que aquela ferida não sumiria, pois todos os anos que tentei fazê-la invisível não tinha adiantado de nada: ela estava exposta mais do que nunca.
COMO EU PUDE FUGIR DELE?
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N/A: Ooooi. Nem acredito que estou postando esse cap agora e hoje. Achei mesmo que meu prazo fosse até mesmo ultrapassar domingo, porque estou tão atolada de coisas e essa fic ainda está um pouco no papel, de modo que tenho mesmo de digitar tudo. MAS estou feliz, porque vocês acabaram de ganhar mais um cap. O cap que acho que faz muito tempo que queriam. Então, aqui está. Sei que está meio vaga a história, mas juro que farei o possível para tudo estar coerente. E, qualquer coisa, comentem. Beijos! Boa leitura <3
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