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Era o Dia das Bruxas, e ela se encontrava como uma pri­sioneira em seu próprio escritório. Diabos, como podia ter pensado que venceria o chefe do crime organizado? O que havia arranjado era uma terrível dor de cabeça. Dera nisso porque deixara de ser simplesmente Ginevra Molly Weasley, uma garota comum, para se tornar G.M. Weasley, uma ousada detetive particular.


 


Começou a andar de um lado para o outro em seu escri­tório, parando por vezes atrás das cortinas da janela para olhar para fora. Na rua, havia apenas sombras cinzentas e o vento implacável. O carro preto ainda estava estacionado diante do edifício. Se ousasse sair, o motorista a seguiria. Se fosse até o cofre onde depositara a fita que comprometia o chefe do crime, seria facilmente detida no caminho. Não tinha nem mesmo certeza se estaria em segurança dentro de seu carro. Talvez bastasse fechar a porta e ligar o motor, e uma enorme explosão arrasaria o quarteirão, eliminando do mapa uma certa detetive.


 


Droga!


 


Quando o telefone tocou, ela o atendeu imediatamente.


 


— G.M. Weasley Investigações.


 


— Srta. Weasley?


 


— Sou a secretária — respondeu automaticamente. Bem, A mulher do outro lado da linha não devia pertencer ao grupo dos mafiosos. Em todo caso...


 


— Quero falar com a Srta. Weasley — a mulher disse. — Estou com problemas e preciso de ajuda.


 


— Una-se ao clube.


 


— Como assim?


 


Gina suavizou a voz.


 


— Desculpe-me. A Srta. Weasley está fora da cidade no momento. Por que não tenta a Ace Investigações? Eles pode­rão ajudá-la.


 


A mulher desligou sem se despedir. Gina sentiu-se mal. Quando alguém ligava, era porque precisava de ajuda. E ela queria ajudar, uma vez que era esse seu trabalho. E era com­petente naquilo. Ganhara a reputação de detetive eficiente, uma espécie de heroína a quem todos podiam pedir ajuda.


 


Porém, naquele momento, quem precisava de um herói era ela. Nunca esperara se envolver em uma situação como aquela em que se encontrava.


 


Gravara uma fita comprometedora do marido de uma cliente sua. A esposa de Guido de Rocei, cansada de ser traí­da, tinha recorrido a ela para garantir que sairia ganhando no caso de um divórcio. Gina julgara que gravaria telefone­mas comprometedores entre Guido e suas namoradas, mas, por acaso, havia gravado uma negociação ilegal entre mafiosos. O pior era que ela estupidamente revelara esse fato à esposa do mafioso. Sylvia de Rocei tinha corrido até o marido, contado o que a detetive descobrira e agora o casal, além de ter se reconciliado, vivia aos beijos. Mas Gin estava marca­da para morrer.


 


Podia chamar a polícia, porém seu telefone provavelmen­te estava grampeado, e seria morta antes que os policiais chegassem. Além do mais, era do conhecimento geral que qualquer gângster tem alguns policiais no bolso. Como ela poderia ter certeza de que aqueles que apareceriam ali no es­critório não constavam da folha de pagamento de De Rocei?


 


Olhou pela janela outra vez. Um ônibus estava parado naquele momento no ponto. Pessoas desciam e outras entra­vam. Uma idéia foi tomando forma em sua mente.


 


O bandido no sedã olhava para a porta de entrada do pré­dio e para o carro dela. Mas ninguém podia ver o que aconte­cia dentro do escritório. Gin poderia descer as escadas, mas, em vez de sair, passaria pela porta que ligava a portaria ao escritório de Sal. Essa porta estava geralmente fechada, mas nem sempre. Ela poderia sair pelo lado de Sal sem chamar nenhuma atenção e pegar um ônibus.


 


— Parece um bom plano — resmungou. Olhou dentro de um de seus armários. Sempre tinha ali algumas roupas que usava quando queria se disfarçar. Trocou à saia, o elegante blazer e os sapatos de salto alto por jeans, jaqueta de couro e tênis. Um boné de beisebol esconderia seus cabelos e um par de óculos escuros completaria sua nova imagem.


 


Olhando-se no espelho, concluiu que poderia passar por um garoto. A bolsa, porém, a trairia. Esvaziou-a e colocou nos bolsos da jaqueta apenas o essencial, inclusive seu re­vólver calibre 38. Ótimo. Logo passaria outro ônibus. Disso tinha certeza, porque nem bem um saía, outro chegava. O barulho sempre a incomodara. Não agora, claro.


 


Cuidadosamente, abriu a porta do escritório e foi para o corredor. Não vendo ninguém, seguiu para as escadas e che­gou por fim à porta que ninguém usava e que, como sempre, encontrava-se fechada. Bateu de leve, e Sal a abriu em um segundo.


 


— É você, Gina Weasley?


 


Ela fez sinal para que ele não falasse alto.


 


— Para todos os efeitos, não estive aqui. Você nunca me viu. Estou falando sério, Sal.


 


Ele franziu a testa, preocupado.


 


— Meteu-se em encrencas, menina?


 


— Pode-se dizer que sim.


 


— E o que posso fazer para ajudar?


 


— Sirva-me uma bebida bem forte, e depois finja que não me conhece.


 


Sal sacudiu a cabeça e foi em busca de uma garrafa. Encontrou uma de uísque e serviu uma boa dose em um copo que entregou a Gina.


 


— Você precisa é de um bom sujeito.


 


— E o que vem me dizendo sempre. — Ela pegou o copo e tomou o uísque rapidamente.


 


— Se tivesse um marido, não se envolveria em situações como essa.


 


— Como assim?


 


— Você estaria em casa cuidando dele, em vez de brincar de mocinho e bandido.


 


— Ah, sei. Lugar de mulher é na cozinha, certo, Sal?


 


— Tem funcionado há centenas de anos, menina.


 


— Bem, não serve para mim. Nunca precisei de um homem para me proteger e não planejo ter um agora. — Ouviu o baru­lho de freio. — Oh, Sal, meu ônibus chegou. Tenho de ir.


 


— Para onde?


 


Ela forçou um sorriso, porém tinha o coração na garganta.


 


— Poderia lhe contar Sal, mas então eu teria de matá-lo. — E se apressou a sair. Felizmente, o ônibus bloqueava a vi­são do bandido. Ela apenas voltou a respirar quando estava sentada dentro do ônibus a caminho da cidade.


 


O ônibus se dirigia a Hoboken, mas já que ela não co­nhecia ninguém lá, desceu no terminal e pegou outro. Não tinha exatamente um bom lugar para ir. A casa de seus pais em Princeton estava fora de questão. Seria o primeiro lugar em que os bandidos a procurariam. Não, não podia se arris­car. O jeito era seguir para a casa de horrores de tia Kate, a ovelha negra da família. Isso porque ela se recusara a ser cristã e se mantinha presa à tradição do clã Weasley. Bruxos, mais exatamente. Possuía um livro de feitiços que estava com a família por mais gerações que alguém pudesse contar. Gina tinha visto o livro uma vez. Empoeirado e ve­lho, naturalmente.


 


Por um momento, pensou se algum feitiço de tia Kate po­deria livrá-la dos problemas que enfrentava agora. Mas isso era bobagem. Tudo de que precisava era tempo para clarear as idéias e encontrar um jeito de pegar a fita e entregá-la em segurança à polícia, sem que lhe explodissem a cabeça. Não poderia nem mesmo entregar a fita a Guido, porque ele acha­ria arriscado deixá-la viva, já que sabia demais.


 


A saída era tia Kate. Sentiu um calafrio. Afinal, era a Noite das Bruxas, e ela passaria a data em uma casa assom­brada. Procurou afastar o temor e relaxar enquanto o ônibus seguia para Craven Falls, ao norte de Nova York.


 


— Olá, tia Kate.


 


Kate Weasley ficou parada à porta, observando a sobrinha. Usava um vestido longo com estampa de luas e estrelas. Feito em casa. Provavelmente unindo teias de ara­nhas, Gina pensou. O cabelo da tia era comprido e ainda ruivo e caía solto, o que a fazia parecer mais jovem. Usava um colar de pedras bem pesadas e brilhantes.


 


— Alguém pode ficar cego olhando para essa coisa — Gina observou, sem ter o que falar.


 


— Você parece sua mãe. O que está fazendo aqui, Ginevra?


 


— Não vai me convidar para entrar?


 


Kate soltou um longo suspiro, e depois deu um passo para o lado, deixando-a entrar. O lugar não tinha mudado muito. Pouca luz, mobília bastante antiga. Cheirava a incenso e velas.


 


— Bem... — Kate parecia estar esperando alguma res­posta.


 


Gina umedeceu os lábios.


 


— Eu preciso de um lugar para passar alguns dias.


 


Kate franziu a testa e pareceu menos irritada com a ines­perada visita.


 


— Está em algum tipo de perigo?


 


— Nada que não possa resolver. Apenas preciso ficar es­condida até que as coisas se acalmem.


 


— Partiu apressada, não foi? — Kate olhou-a atentamen­te. — Sem bagagem...


 


Gina deu de ombros.


 


— A senhora parece que estava para sair, toda arrumada assim. Não quero atrapalhar os seus planos. — Era a Noite das Bruxas, provavelmente a noite mais importante do ano para Kate.


 


A tia sacudiu a cabeça.


 


— A data é importante, querida, mas não tão importante quanto a sua segurança. Eu ficarei aqui e...


 


— De jeito nenhum, tia Kate. Estou bem. Verdade. Nenhuma alma no mundo sabe que me encontro aqui. Pode ir passear. Eu me acomodarei no sofá e assistirei à tevê. Talvez dê uma olhada no seu velho livro e tente encontrar um feitiço que transforme os bandidos em sapos. A senhora... ainda tem o livro, não é? — Enquanto falava, olhava em direção à mesa em um dos cantos da sala onde se encontrava um enorme li­vro, velho e aberto.


 


Kate pareceu se aborrecer.


 


— O livro não é um brinquedo, Ginevra. Os feiti­ços são poderosos, sobretudo à noite. Uma amadora poderia provocar um completo desastre, cometendo algum erro, par­ticularmente alguém com sangue pagão como o seu.


 


Um arrepio percorreu a espinha de Gina, mas ela apenas sorriu para a tia.


 


— Eu estava brincando. Não vou mexer no seu livro se não quiser que o faça.


 


Kate a observou por alguns instantes, depois balançou a cabeça, fazendo com que seus brincos soassem como sinos. Eram seis pares.


 


— Se quiser um feitiço de proteção, querida, apenas peça. Eu o prepararei para você.


 


— Sabe que não acredito nessas coisas — Gina retrucou, mas com o olhar voltado mais uma vez para o livro.


 


Kate suspirou profundamente.


 


— Tem certeza de que ficará bem sozinha?


 


— Claro. Pode sair. Ficarei bem. Verdade.


 


Parecendo preocupada, ela acabou concordando e se diri­giu à porta.


 


— Ei — Gina chamou. — Não está se esquecendo da vas­soura?


 


Kate lançou um olhar de alerta para a sobrinha, depois sor­riu, acenou e saiu de casa.


 


Gina ficou andando pela sala por um tempo, e depois li­gou a tevê. Encontrando uma velha versão em preto-e-branco do filme Os Três Mosqueteiros, decidiu se sentar e assistir. Mas seu olhar continuava voltando ao velho e empoeirado livro sobre a mesa. Certamente não faria mal algum dar uma olhada nele.


 


Não podia fazer isso. Afinal, tinha prometido a tia Kate que não o tocaria. Voltou à atenção para a tela da tevê, antes de sacudir a cabeça, desgostosa. Como um homem podia lutar usando roupas ridículas, com as mangas cheias de babados? Como os mosqueteiros queriam parecer heróis com chapéus cheios de plumas? Gh, os mosqueteiros todos deviam ter sido gays. Isso sem contar que ela se sentia bem mais segura com o seu revólver do que com uma daquelas espadas que pare­ciam tão frágeis que balançavam com um simples vento.


 


Apesar do ridículo do filme, sentiu-se meio emocionada quando D'Artagnan jurou proteger a amada com sua própria vida.


 


Pena que não existissem mais heróis como aqueles. Ela não se importaria se um deles a protegesse, mesmo usando aquele ridículo chapéu.


 


O livro chamou sua atenção novamente. Dessa vez, Gina se levantou e foi até ele. Começou a virar as páginas com cui­dado. Parou ao encontrar "Feitiço de Proteção". A coisa pare­cia simples. A pessoa devia ficar sob a luz da lua no primeiro quadrante. Era necessário acender uma vela branca e pedir proteção. Manter o pensamento voltado para o pedido e ler as palavras escritas na invocação impressa no livro.


 


Gina foi até a janela e constatou que a lua já surgira no céu. Abriu as cortinas o suficiente para que o luar entrasse na sala. A lua não estava no período informado pelo livro, mas uma lua cheia talvez fosse melhor ainda.


 


Isso se ela acreditasse em toda essa bobagem. Mesmo as­sim, decidiu começar o feitiço.


 


Voltou à mesa, e o luar atingia justamente o livro. Duas velas estavam ali ao lado do volume. Uma vermelha e ou­tra rosa. Nenhuma branca por perto. Mas uma vela era uma vela, certo?


 


Acendeu as velas e sorriu. Era uma forma divertida de passar a Noite das Bruxas.


 


Bem, agora os próximos passos. Pedir proteção e dizer a invocação em voz alta. Tentou imaginar uma bolha de luz branca a rodeando, e depois uma parede de proteção, como o feitiço sugeria. Mas a mente mantinha-se presa à cena a que acabara de assistir na televisão, a do mosqueteiro prometen­do proteger a amada com sua própria vida.


 


Leu as palavras da página do livro e ouviu o relógio bater meia-noite.


 


Sem aviso, algo explodiu e uma nuvem de fumaça a envol­veu. Tossindo, Gina procurou afastar a fumaça, e subitamente foi tomada pela sensação de que não estava sozinha na sala.


 


Harry se sentou e esfregou a cabeça, com os olhos fechados. Não sabia bem o que havia acontecido. Estivera envolvido em uma pequena briga, tirando satisfações de um doido que ousara insultar o rei da França, quando ouvira uma mulher chamando por ele. Damas em perigo não eram novidade para Harry. Jurara proteger o rei, claro, mas havia muitos mosqueteiros disponíveis para esse trabalho. Assim, via-se com freqüência protegendo belas mulheres. Não se importava com esse trabalho, especialmente conside­rando os modos deliciosos como as belas damas expressavam sua gratidão. Portanto, ele se distraíra com a estranha ca­dência da voz feminina que o chamava agora.


 


Olhou em volta, mas não viu nenhum de seus inimigos, e imaginou que tivessem fugido, como seus oponentes em geral faziam antes de terminar a luta. Pegou seu florete com uma das mãos e o chapéu com a outra, levantou-se e começou a espiar o lugar coberto por uma estranha fumaça.


 


E então parou e piscou surpreso. Ele não se encontrava mais na vila da Provença, onde havia pouco enfrentara três rufiões. Estava dentro de uma casa, e à sua frente, uma bela mulher vestida com o mais estranho dos trajes.


 


Uma visão?


 


Olhou novamente. Ela ainda estava ali. Assustada como se estivesse vendo um fantasma. Seus olhos brilhavam como safiras escuras ao luar, e seu cabelo era uma deliciosa massa de cachos ruivos, que ele imaginava serem macios como seda. Não importava a roupa estranha ou as dúvidas que ocupavam agora sua própria mente. Os problemas de uma mulher bonita assim tinham prioridade sobre quaisquer outros.


 


Bonjour, mademoiselle — murmurou, rapidamente ti­rando o chapéu com um gesto floreado. Aproximou-se, pegou a delicada mão da jovem e a levou aos lábios. Tinha gosto de sal e estavam trêmulas.


 


Ela afastou-a imediatamente.


 


— Quem diabos é você? — a bela dama perguntou. — E o que... o que está fazendo aqui?


 


Harry endireitou o corpo e acariciou as plumas de seu chapéu antes de recolocá-lo na cabeça.


 


— Então prefere falar em inglês — ele observou. — Que bom que eu falo essa língua fluentemente. Sou Harry, um dos mosqueteiros do rei, milady.


 


— Caia na real — ela disse. — Você não é um mosque­teiro.


 


— Sou sim. — Harry deu um passo à frente, e a jo­vem recuou, surpreendendo-o. — Não precisa ter medo de mim, pequenina. Estou... um pouco confuso, mas acredite em mim, vim aqui apenas para ajudá-la.


 


— A... ajudar-me?


 


Oui, ma petite. Ouvi o seu chamado pedindo a ajuda de um protetor. Creio que chamava por um herói. Foi meio estranho, mas eu me lembro bem disso.


 


Ela deu mais um passo para trás.


 


— Isso é uma loucura. Você não pode estar aqui. Isso não pode estar acontecendo.


 


Ele deu de ombros, sorrindo para si mesmo, acostumado com o fascínio que exercia sobre as mulheres.


 


— Muitas damas ficam surpresas com o meu charme, pequenina. Não se sinta embaraçada. Não é um sonho, ma belle. Estou realmente aqui e à sua disposição. — Deslizou o olhar pelos lábios da mulher, que lhe pareceram carnudos e tentadores. — O que quiser, belezinha, eu garanto, posso providenciar. — Enquanto dizia isso, ele deu mais alguns passos à frente.


 


A dama lhe apontou uma pequena arma, vagamente pa­recida com uma pistola preta, tirando-a de algum lugar da roupa que ela usava.


 


— Não dê mais nenhum passo!


 


Curioso, Harry estendeu a mão e pegou o brinquedo que a jovem tinha nas mãos.


 


— O que é esta coisinha tola? — Ele tocou no tambor e apertou os dedos ligeiramente sobre o gatilho. A moça pu­lou de lado, exatamente quando uma explosão ocorreu nas mãos de Harry. Ele sentiu o chapéu voar de sua cabeça e escutou o barulho de um espelho quebrando na parede. Imediatamente jogou a arma no chão. — Mon Dieu!


 


— Você quase atirou em si mesmo, seu idiota! — ela gri­tou. — Ou atirou mesmo? — Aproximou-se do estranho e examinou seu rosto e braços.


 


O medo que Harry sentira desapareceu rapidamente e seu sorriso voltou.


 


— Ah, não tema por mim, milady. Não estou ferido. Mas... pode examinar mais partes do meu corpo, se isso a deixar mais tranqüila.


 


Recuando, ela esmurrou-o no queixo com tanta força que Harry perdeu o equilíbrio e caiu. Mesmo assim, não pa­rou de sorrir.


 


— Então — ele disse, esfregando o queixo — , é tímida, non? Ofendeu-se com os meus atrevimentos. — Pegou o cha­péu do chão e o ajeitou.


 


— Sou tudo menos tímida. Toque-me de novo e vai dese­jar que eu fosse.


 


Ele estava definitivamente confuso com a relutância da jovem. Nunca tinha conhecido uma mulher que não se inte­ressasse por ele. Todas tendiam a cair em seus braços após um simples olhar, Mas já notara que essa dama era estra­nha. Talvez sua mente não funcionasse bem. Uma pena. Ela era verdadeiramente magnífica. Suspirou, desapontado, po­rém resignado com a derrota. Sua primeira derrota. Talvez a moça pudesse mudar de idéia, mas naquele momento ele sabia que era melhor não tentar nada.


 


— Muito bem, ma chérie. Não vou tocá-la de novo. Até que me peça, claro. — Levantou-se com elegância.


 


— Não tenha essa esperança.


 


— Mesmo assim, nunca se dirá que Harry deixou de ajudar uma dama em perigo.


 


— O que eu quero saber é quem penteia o seu cabelo, o capitão Hook?


 


— Por que pediu ajuda? — ele perguntou, ignorando a estranha pergunta.


 


Ela olhou para o chão.


 


— Isso não está acontecendo, meu Deus!


 


— Posso ver que está bastante perturbada. Algum canalha insultou a sua honra, então? Devo desafiá-lo para um duelo, ensinar-lhe uma lição da qual ele não se esquecerá tão cedo?


 


Quando ela fechou os olhos, Harry notou os cílios es­pessos e escuros.


 


— Você é quem está perturbado. Estou achando que eu... que fiz tudo errado.


 


— Isso é compreensível, chérie. Afinal, é apenas uma mu­lher.


 


Ela franziu a testa, irritada.


 


— Pense bem antes de falar.


 


— Estou apenas dizendo que, o que quer que tenha feito de errado, eu posso resolver. Assim, diga-me: o que lhe acon­teceu?


 


— Não é comigo que devemos nos preocupar, mas com você.


 


— Não entendo.


 


Ela suspirou profundamente.


 


— Existem bruxas no lugar de onde veio?


 


Harry arqueou a sobrancelha, curioso.


 


Oui, mas elas não representam um problema. Se saí­rem da linha, nós simplesmente as enforcamos. — Franziu a testa. — Não é uma bruxa, é, milady?


 


— Não. Não... exatamente. Mas... bem, talvez seja melhor você se sentar.


 


— Farei o que deseja milady. — Ele colocou o chapéu debaixo do braço e caminhou até o sofá, mas não se sentou antes que ela fizesse o mesmo. — Agora, conte a Harry o que a está preocupando... Mas primeiro, ma chérie, diga-me o seu nome.


 


Ela mordeu o lábio.


 


— Sou Gina Weasley.


 


— Milady Weasley — ele repetiu, fazendo uma reverên­cia. — Agora, diga-me qual é o seu problema.


 


— Eu me meti em uma encrenca e preciso de ajuda. E então achei este... livro velho... com um... feitiço...


 


— Um feitiço de bruxa?


 


— Isso... um feitiço pedindo proteção. E eu disse as pa­lavras em voz alta... e devo ter feito tudo errado, porque a próxima coisa que eu vi foi você aparecendo por aqui.


 


Harry sorriu levemente.


 


— Pobre lady Weasley... A senhorita acredita mesmo que me trouxe aqui usando bruxaria?


 


— Oh, tenho certeza disso.


 


— O que a faz ter essa certeza, pequenina? Talvez eu sim­plesmente tenha ouvido a sua adorável voz pedindo proteção e, então, segui o som até aqui.


 


— Isso não teria sido possível, Harry. Veja, você... você... viajou no tempo.


 


Ele a observou atentamente. Pobrezinha, era louca. Certa­mente encontraria um modo de livrá-la de suas alucinações! Precisava encontrar. Ela era bonita demais para ser lunática.


 


— Não acredita em mim, não é? Estamos no futuro, Harry. Em 1998.


 


— Oh, doce lady Weasley. Shhh... — Ele levantou-se, foi até Gina e acariciou-lhe delicadamente os cabelos. — Vai ficar bem. Juro que encontrarei um modo de ajudá-la.


 


Gina fechou os olhos, com pena do rapaz.


 


— Posso provar o que estou dizendo.


 


— Verdade? — Não queria contrariá-la e fingiria acredi­tar. Não tinha certeza, mas talvez não fosse sensato seduzir uma lunática. Assim, até que estivesse curada...


 


— Está vendo aquela caixa ali? — ela perguntou, apon­tando para o aparelho de televisão.


 


Ele seguiu o olhar e assentiu. Gina pegou um objeto pe­queno, apertou um botão, e a caixa ganhou vida.


 


Sacre bleu! — Harry gritou pronto para entrar em ação. Pegou sua espada e atacou a coisa, que era impene­trável.


 


O homem ainda estava usando a espada contra o aparelho de televisão quando a porta da frente se abriu e Kate entrou. Gina afundou no sofá ao sentir o olhar que a tia lhe dirigia. A velha senhora ficou apenas olhando para Harry e de­pois para a sobrinha. Então colocou as mãos nos quadris.


 


— Ginevra Molly Weasley, o que foi que você fez?


 


Pobre Harry. Ficou ali apenas olhando, surpreso, en­quanto Kate explicava o que havia acontecido. Ele não queria acreditar a princípio, claro. Mas quando as duas mulheres lhe mostraram as luzes elétricas, o microondas e o carro, Harry finalmente aceitou a verdade.


 


Agora, Kate andava de um lado para o outro enquanto Gina permanecia sentada ao lado de Harry no sofá. Parecia uma criança chamada para falar com o diretor da escola.


 


— Você devia ter me escutado — Kate resmungou. Pegou o livro e consultou a página aberta. — Foi este o feitiço que usou?


 


Gina levantou-se, se aproximou e, por cima dos ombros da tia, olhou a página.


 


— Sim.


 


— Mas este feitiço diz especificamente que a lua deve estar em quarto crescente. Não posso acreditar que o tenha usado durante a lua cheia! E ainda por cima, na Noite das Bruxas.


 


Gina deu de ombros.


 


— Para dizer a verdade, eu não esperava que funcionasse.


 


— Não esperava que funcionasse? Você quadruplicou a sua potência. — Kate encarou a sobrinha, que abaixou o olhar. — E quanto à vela branca? Não vejo nenhuma por aqui. — Notou as velas sobre a mesa. — Rosa e vermelha? Você usou estas, não foi?


 


Gina fez que sim.


 


— Isso é ruim?


 


Kate olhou para Harry, depois para a sobrinha.


 


— Vermelho é para a paixão. O rosa traz o verdadeiro amor. Honestamente, Ginevra, no que estava pensando?


 


Mais uma vez, a sobrinha deu de ombros.


 


— Estava pensando no filme Os Três Mosqueteiros, que passava na televisão àquela hora.


 


Kate estremeceu.


 


— Bem, isso explica tudo. Você precisava de proteção. Conseguiu um protetor, exatamente na forma como o visua­lizou. — Revirou os olhos. — Que as deusas nos protejam das novas bruxas!


 


— Não sou uma bruxa — Mary retrucou.


 


— Acho que Harry discordaria de você.


 


Harry ergueu os olhos à menção de seu nome. Ele estivera sentado, ignorando as duas. Levantou-se do sofá e se aproximou.


 


— Isso pode ser revertido?


 


Kate consultou o livro, virando as páginas com dedos de unhas vermelhas.


 


— Acho que sim. Vou precisar pesquisar, mas...


 


— Bem, isso é ótimo — Gina resmungou. — Nesse meio-tempo, estou de volta onde comecei, com um dos maiores cri­minosos do país à minha procura.


 


Kate arregalou os olhos, e Harry fitou-a admirado. Gina lembrou-se de que ainda não tinha contado a nenhum dos dois o problema em que se metera. Não que pretendesse contar. Não queria envolver mais ninguém nessa encrenca.


 


— Esqueçam o que eu disse. Não é nada que não possa resolver sozinha. Vá, tia Kate. Descubra um jeito de mandar Harry de volta à sua época.


 


Kate meneou a cabeça.


 


— Eu não consigo fazer isso. A única pessoa que pode re­verter o feitiço é você. Posso ajudar, mas...


 


Non!


 


Ambas se voltaram para Harry.


 


— O que significa esse non? Você tem de voltar! — Gina exclamou.


 


Ele a olhou com expressão fechada, e Gina se distraiu observando o mosqueteiro. Se não fosse pelo cabelo longo de­mais e pela barba, pensou, ele seria bonito.


 


— Sou um mosqueteiro — disse. — Trouxe-me aqui para ajudá-la, lady Weasley, e é isso o que eu farei.


 


Abaixando os olhos, Gina meneou a cabeça.


 


— Não há muita coisa que você possa fazer Harry.


 


Quando ela ergueu o olhar, ele estava sorrindo.


 


— Sabe muito pouca coisa de mim, pequenina. Além do mais, nenhum mosqueteiro abandonaria uma dama nessa si­tuação. Esse criminoso... Ele pretende matá-la, non? — Diante da anuência de Gina, declarou com firmeza: — Então, ficarei. E só permitirei que me mande de volta ao meu tempo, se isso for possível, depois que eu tiver despachado esse vilão.


 


Suspirando profundamente, Gina ergueu o queixo de for­ma arrogante.


 


— O que pretende fazer, Harry? Desafiar o bandido para um duelo com espadas? Não quero ofendê-lo, sei que se julga uma espécie de herói do rei e das damas em perigo, e talvez até seja mesmo, lá na sua época. Mas aqui e agora não teria a menor chance contra o homem que quer me ver mor­ta. Ele tem armas poderosas, que você nem pode imaginar, máquinas de guerra e um monte de capangas para fazer o serviço sujo. Nem pode começar a...


 


— Chega! — Harry exclamou, dando-lhe as costas, os braços cruzados no peito.


 


— Agora você o insultou. — Kate dirigiu um olhar de cen­sura à sobrinha. — Ginevra, sua mãe não a ensinou a usar de tato?


 


— Eu estava apenas tentando manter esse homem vivo. — Voltou-se para Harry, que continuava de costas para ela. — Peço desculpas. Não queria de forma alguma insultá-lo ou duvidar das suas... habilidades. Eu apenas... bem, dia­bos, cometi um erro e o trouxe até aqui. Já me sinto horrível por ter feito isso. Se vier a morrer por minha causa, não serei capaz de viver em paz.


 


— E se eu voltar, deixando-a em perigo, nunca vou saber se esse... esse bandido lhe tirou a vida... Não seria capaz de viver comigo mesmo, chérie


.


— Acho que posso entender isso — ela disse. Bem devagar, ele se virou para Gina.


 


— É uma questão de honra, milady. Não posso deixá-la enfrentar sozinha um assassino. E simples assim.


 


Gina evitou o olhar de Harry e procurou a ajuda de Kate, que suspirou.


 


— Não vai conseguir mandá-lo de volta se ele não quiser ir. Além do mais, há conseqüências em usar a mágica em pessoas contra a vontade delas, Ginevra. Isso não se faz.


 


Abaixando a cabeça e sentindo-se abatida, Gina se rendeu.


 


— Está bem. Pode ficar Harry. Mas... — Ela olhou-o novamente da cabeça aos pés. — Vai ter de passar por uma reforma... Quero dizer, as botas são bonitas, mas o resto da sua roupa... — Notando o olhar de censura da tia, percebeu que mais uma vez tinha sido rude e ofendido Harry. Pigarreou nervosamente. — Creio que seria melhor se ves­tisse alguma roupa mais parecida com as que os homens usam atualmente.


 


Harry alisou a barba.


 


— Entendo. Sim, é obvio que as pessoas se vestem... bem diferente hoje em dia. — Dirigiu um olhar desaprovador para o jeans e a camiseta que ela usava.


 


Gina sorriu e se aproximou do mosqueteiro. Retirou-lhe o chapéu e observou os cabelos com atenção.


 


— Vamos começar tirando isto. — Apontou a peruca cheia de cachos que ele usava.


 


O sorriso de Harry era suave e quase... sexy.


 


— Francamente, milady, apenas uso a peruca quando ne­cessário. Não gosto dela tanto quanto a senhorita a despreza.


 


Ele tirou a peruca, e Gina se admirou com os cabelos ne­gros, longos e presos atrás. Num impulso, passou os dedos por eles, descobrindo que eram macios.


 


— Talvez devêssemos cortá-los um pouco — Kate sugeriu. Incapaz de afastar o olhar do mosqueteiro, Gina meneou a cabeça.


 


— Não, creio que... eles podem ficar assim compridos. — Sua voz saiu rouca e ela se perguntou a razão.


 


— Finalmente, alguma coisa em mim de que você gosta — Harry disse com suavidade.


 


Gina afastou de imediato as mãos dos cabelos dele.


 


— Humm... Você vai ter de se barbear.


 


Ele não pareceu nada satisfeito.


 


— Os homens de atualmente não usam barba?


 


— Alguns usam.


 


Gina manteve os olhos baixos, porém podia jurar que Harry estava sorrindo.


 


— Mas você prefere me ver sem a minha — ele observou. Gina ficou desanimada. O homem estava inteiramente convencido de seu charme.


 


— Vamos, Harry — Kate disse. — Vou lhe mostrar onde é o banheiro e explicar como as coisas funcionam. Gina, enquanto estivermos ocupados, vá até a minha vizinha, a Sra. Johnson, e peça-lhe para nos emprestar alguma roupa para um convidado nosso. Harry parece usar o mesmo número que o Sr. Johnson.


 


O mosqueteiro começou a subir as escadas. Antes de sair, Gina notou que a tia olhava preocupada para as velas ver­melha e rosa que ela acendera para o feitiço. Kate franziu a testa, depois procurou se recompor e subiu as escadas para orientar Harry.


 


Gina conseguiu as roupas, junto com um olhar de curio­sidade da Sra. Johnson. Entregou-as à tia, e então esperou. Procurou passar o tempo checando as listas dos canais a cabo, pensando se poderia dar algumas poucas lições a Harry sobre a vida nos anos noventa, deixando-o assistir à televi­são naquela noite e explicando as coisas conforme elas fossem aparecendo. Pensou que talvez devesse ensiná-lo a usar uma arma. Na verdade, não tinha a menor idéia de como o homem a ajudaria. E, pior do que isso, ele era um peso adicional. Agora, ela precisava se preocupar em mantê-lo vivo, assim como em proteger a própria pele. Droga, as coisas tinham ido de mal a pior, e não havia sinal de qualquer melhora à vista.


 


Quando Kate pigarreou, Gina voltou-se e quase caiu do sofá.


 


Harry estava no pé da escada. Os jeans desbotados serviam nele perfeitamente, e a camiseta revelava os mús­culos do corpo. O sujeito tinha peito largo, ombros fortes e bíceps de matar.


 


Mesmo quando ela, finalmente, afastou os olhos dele, ainda não conseguia respirar direito. Os cabelos brilhavam presos. A barba tinha sumido, e sua aparência era a de um ator de cinema. Daqueles que deixam loucas de paixão fãs e atrizes.


 


Quando Harry sorriu para ela, seu estômago se aper­tou. O homem era lindo! Ele se aproximou.


 


— Estou parecendo um homem deste tempo? O que acha?


 


— Você é o máximo, Harry.


 


O sorriso dele aumentou.


 


— A roupa parece estranha, mas é confortável. Mais do que aquela que uso no meu tempo. Apesar de não saber onde colocar a espada.


 


— Os homens não usam espadas hoje em dia — Gina informou. — Pensei que poderia ensiná-lo a usar uma arma moderna.


 


— Se está se referindo àquele brinquedinho que me apon­tou antes, pode esquecer. Uma espada é tudo o que eu quero.


 


— Mas os homens que vamos ter de enfrentar têm armas de fogo. E...


 


— Pode levar todas as armas de que precisar. Para mim, o florete será o suficiente, lady Weasley.


 


Ela mordeu o lábio.


 


— Você é teimoso, sabia?


 


Ele apenas sorriu.


 


— É outono — Kate comentou. — Vamos lhe arranjar um casaco bem largo e comprido, assim ninguém notará a espa­da. Isso não será um problema.


 


— Mas será, se ele se vir na mira de um revólver e uma bala entrar no seu magnífico peito...


 


Harry deu alguns passos, aproximando-se dela.


 


— Oh, mais uma coisa em mim que tem a sua aprovação, non?


 


— Estou apenas dizendo que gostaria de não vê-lo morto, seu arrogante e emplumado metido a Don Juan.


 


— Ah, mesmo assim, estou feliz que ache... o meu pei­to magnifique, lady Weasley. E eu prometo... que não serei morto.


 


Gina engoliu em seco e disse a si mesma que não era o tipo de mulher que reagiria a essa modalidade de flerte. Mas por que suas pernas tremiam?


 


— Não pode ficar me chamando de lady Weasley também — ela disse.


 


— E como vou chamá-la, então? De feiticeira? De belle femme?


 


— Pode me chamar de Gina.


 


— Vou chamá-la de Ginevra, como sua tia faz. Uma dama tão linda merece um nome que se equipare à sua beleza.


 


Gina sentiu a garganta seca.


 


— As mulheres do seu tempo acreditam nas suas pala­vras? Pois eu sei perfeitamente que estou com uma aparên­cia horrível como o inferno.


 


Os dedos dele tocaram-na no rosto.


 


— Se o inferno for igual a você, então vou começar a pecar com mais freqüência.


 


Gina sentiu que enrubescia. Não podia acreditar naquilo.


 


Kate suspirou, ainda olhando para as velas rosa e verme­lha. Pegou-as e as jogou no cesto de lixo.


 


Gina sentou-se no sofá ao lado de Harry, não muito perto, claro, e apertou o controle remoto da tevê. Quando o aparelho ligou, Harry pulou do sofá, mas logo recuperou a calma e olhou interrogativamente para ela.


 


— Então, agora vai me contar o segredo da pequena caixa que prendeu os minúsculos mosqueteiros, non?


 


Gina fechou os olhos e rezou em silêncio.


 


— Não há ninguém lá dentro, Harry. É tudo faz-de-conta. — Ele arqueou a sobrancelha, e ela tentou ser mais clara. — Não é nada real. — Harry continuava sem en­tender. — Vemos apenas fotos de pessoas fantasiadas. Como em uma peça de teatro.


 


— Mas os atores... Eles são tão pequenos.


 


— Porque é apenas um retrato dos atores. Não estão lá dentro. Veja... — Tentou inutilmente encontrar alguma ou­tra explicação. Então viu a tia se aproximar, trazendo sua máquina fotográfica, uma Polaroid.


 


Kate estendeu-lhe a câmera.


 


— Talvez isto ajude.


 


— Perfeito. Sente-se sem se mexer, Harry. — Gina apontou a câmera na direção dele e apertou o botão, batendo a foto. Harry pulou novamente quando o flash foi aciona­do, e então começou a esfregar os olhos. — Sinto muito — ela disse enquanto pegava a foto. Aquele mosqueteiro parecia o príncipe encantado de qualquer garota. Não que agora esti­vesse parecendo um mosqueteiro, já que usava jeans e cami­seta. Enganaria qualquer um, até que abrisse a boca.


 


Mas que boca atraente ele tinha... Pare com isso.


 


Desviou os olhos da foto e notou que Harry a observa­va com curiosidade.


 


— Olhe — ela disse, apontando para a máquina. — Isto é uma câmera, que tira fotografias das pessoas. Veja a sua.


 


Ele pegou a foto e se deslumbrou.


 


— Isto... me surpreende!


 


— É uma fotografia. Há uma máquina parecida que vai tirando as fotos dos atores se movendo, e as imagens são mandadas para dentro do aparelho de televisão para a nossa diversão. Entendeu?


 


Mais uma vez, Harry olhou para a tela, depois para a foto e de novo para a tevê.


 


— E que tipo de peça é essa que está passando agora? — ele perguntou, apontando para a tela.


 


Gina pegou a foto de volta, enfiou-a no bolso e então olhou para a tevê.


 


— Oh, isso é apenas um jogo. Dois times competindo para ver quem vence. Chama-se futebol. Na verdade, uma perda de tempo. — A câmera focou um grupo de animadoras de torcida. Harry arregalou os olhos, e Gina mudou rapi­damente de canal. — Agora é um filme. Uma história está vendo? Se assistirmos juntos, poderei ir explicando as coisas para você enquanto o filme vai passando, e talvez entenda melhor o mundo moderno.


 


— Que tipo... de história? — ele perguntou, lendo na tela os créditos de abertura de Casablanca.


 


Gina suspirou como sempre fazia quando aquele filme passava.


 


— É uma história de amor. Sente-se e relaxe. O filme é ótimo.


 


— Um ótimo filme velho — Kate observou. — Como es­pera que o pobre homem aprenda sobre o mundo moderno assistindo a algo assim?


 


— Silêncio, tia. Já está começando. — Gina se acomodou melhor no sofá.


 


— Ele deveria dormir um pouco. Já é tarde e...


 


— Tia Kate, vá para a cama. Harry e eu ficaremos bem.


 


Kate não desanimou.


 


— Está passando Guerra nas Estrelas no canal 12 — ela disse. Gina ignorou-a. — Indiana Jones no canal 26... E tal­vez o noticiário passe às...


 


Gina dirigiu-lhe um olhar irritado.


 


— Eu estava achando o jogo de bola muito interessante — Harry sugeriu.


 


Gina olhou-o com a testa franzida, depois se virou para a tia.


 


— Ele já está se tornando um homem moderno, tia. — Levantou-se e apontou o dedo indicador para Harry. — Você fica aí e assiste Casablanca. E a senhora — virou-se para a tia — , vá para a cama antes que durma em pé.


 


— E o que você vai fazer minha jovem?


 


— Pipoca. — disse Gina, sorrindo.


 


Seguiu para a cozinha e fez exatamente isso. Quando voltou, Harry estava sozinho, olhando para a tevê. Kate havia finalmente se rendido e ido dormir. Harry experi­mentou a pipoca e gostou, comendo com entusiasmo enquan­to Gina lhe explicava o filme. Os carros, as armas, os aviões, a guerra. Mas quando terminou, ele parecia confuso.


 


— Ele a deixou ir embora — disse. Gina enxugou os olhos.


 


— Eu sei. É uma história linda, não é?


 


— Linda? — Harry a observou bem. — Mas você está chorando! Pensei que tivesse dito que não era de verdade! Faz-de-conta, non?


 


— É claro que sim.


 


— Então... por que está chorando?


 


— Porque é triste.


 


— E mesmo assim, gosta tanto da história? Embora a faça chorar?


 


Ela concordou.


 


— Você é uma mulher tola, Ginevra. E essa... essa história é tola também. Ele não devia ter deixado a mulher ir embora.


 


Gina observou-o atentamente.


 


— Você também parece ter se impressionado com o filme, não?


 


Non! Eu lhe disse, é uma bobagem. Ele estava apaixo­nado pela moça. Não devia tê-la deixado partir com o outro homem.


 


A paixão com que ele falou surpreendeu-a.


 


— Você se envolveu mesmo na história!


 


Ele concordou, e seus olhares se encontraram.


 


— Nada é mais importante que o amor, milady. Nem a guerra, nem a paz, nem o casamento. Nada!


 


Gina abaixou o olhar.


 


— Você fala como se estivesse apaixonado.


 


Ele meneou a cabeça bem devagar, porém continuou com o olhar preso no dela.


 


— Já conheci muitas mulheres, ma belle, mas nunca amei nenhuma delas. Algumas disseram que me amavam, porém eu sei que era por causa da minha posição, da minha espa­da, e não pela minha pessoa. Amavam a imagem romântica de um mosqueteiro. Um dia vou encontrar uma mulher que amará o homem, e não as cores que ele usa e a espada com que luta.


 


— Tenho certeza de que vai encontrar — ela disse suave­mente.


 


— E quando isso acontecer, chérie, não vou deixar que ela vá embora do jeito que fez esse tolo, lá na caixa mágica. Lutarei por ela. Morrerei por ela. Posso até... render minha espada por ela.


 


Gina sentiu o coração disparar ao ouvir essas palavras.


 


— Você me acha um tolo, não é? — ele perguntou.


 


— Acho que essa mulher... agradecerá à sua estrela da sorte.


 


Harry sorriu e entregou-lhe o guia de televisão que Kate havia consultado antes.


 


— Outro filme? — ele perguntou.


 


— Não está cansado?


 


— Estou mais acordado do que nunca, mapetite.


 


A resposta parecia ter duplo sentido, Gina pensou. Sentiu o rosto ficar vermelho e tentou disfarçar, enterrando o nariz na revista e começando a virar as páginas. Jamais pensara conhecer um homem tão romântico em sua vida. Quem ima­ginaria que flertar era assim tão divertido?


 


— Oh, aqui está um programa interessante. Desta vez você vai ver o que eu faço para viver e assim aprenderá sobre a vida moderna. — Apertou o controle remoto no canal 8, no qual começava um filme policial.


 


 


 


 


(...)


 


 


 


 


Espero que tenham gostado :D


Quem quiser o capitulo 2 não deixe de comentar!


 


;**

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