Capítulo Três



*Digo mais uma vez: as partes em itálico são da narrativa do Harry, as outras são dele com a Maya.


Capítulo Três


Algumas vezes na vida temos uma espécie de ilusão, como se um sonho ofuscasse toda razão, bom senso e precaução que temos. Isso aconteceu comigo. Quando cheguei em Nova York era ingênuo demais para perceber que eu simplesmente não chegaria lá como alguém importante, o salvador da campanha, o indispensável...


***


No meu primeiro dia de trabalho fui cedo pra me apresentar. O escritório estava cheio, mas ninguém parecia notar minha presença ali, todos estavam ocupados, a maioria no meio de uma ligação telefônica. Falei com a secretária e ela disse para sentar enquanto esperava um tal de Gareth. O Gareth... Aquele que perceberia meu potencial. E ele chegou, mas a recepção não foi o que eu esperava. Ele estava apressado, falava comigo como se quisesse acabar logo com aquilo:


- Oi. Sou Gareth Henderson.


- Ah, então você é o Gareth. Como vai? - falei enquanto me levantava para apertar sua mão.


- Prazer. Vamos indo, Potter – e então saiu andando rápido e me guiando entre as mesas dos funcionários.  


- Eu trouxe meu currículo e alguns discursos que escrevi para o congressista Sweeney.


- É? Fantástico. Mal posso esperar para ler no meu tempo abundante de sobra! – ele falou, irônico – Enquanto isso, eu tenho uma listinha aqui, de café e pães que eu preciso pra agora tá?


Ele me entregou a lista, me deu um soquinho no ombro e se virou, indo embora. Eu ainda estava meio confuso e falei bem a tempo:


- Espera. Quer que eu vá comprar café?


Ele se voltou pra mim e começou a falar, sorrindo, como se tivesse percebido meu desânimo:


- Em algum momento na vida, todos trazemos café. O seu é agora, vai lá! Traz tudo até 10:00 se não meu chefe, Arthur, me mata. Aí eu vou ter que matar você. E olha que já matei antes.


De repente, ele jogou um objeto na minha direção, que por pouco eu consegui apanhar. Olhei para aquilo, que parecia ser moderno e perguntei:


- O que é isso?


- É um telefone celular. Pra eu falar com você quando e onde eu quiser – dito isso ele virou e entrou em uma sala, me deixando lá, estático.


Bom, aquele não era bem o começo que eu esperava. Parecia que alguém tinha jogado um balde de água fria em mim e dito: acorda Harry, seu babaca! E funcionou. Não estava satisfeito tendo aquela função, agora sabia que pra chegar onde queria ainda tinha muito cafezinho pela frente. Logo na primeira semana fiz algumas amizades com colegas de trabalho, de inicio com um rapaz chamado Ronald. Ele tinha sonhos parecidos com os meus: crescer no campo da política escrevendo discursos e, quem sabe, até se candidatar. Ronald era amigo de Hermione, uma morena bonita e inteligente, pra quem ele arrastava uma assinha. Também tinha Rebecca e, é claro, Gareth, que apesar das piadinhas sarcásticas não era má pessoa.


***


 


Era mais um dia de trabalho comum, eu já tinha comprado os cafezinhos, os pães e até feito as placas de “Apóie Clinton” e “Clinton para Presidente”.  Mas ainda tinha de levar a carga de papel higiênico para o deposito, e lá fui eu Harry, o faz tudo, guardar os tais papéis. Para fazer isso, tinha, obviamente, que passar pela área de trabalho de todo mundo, cheia de mesas, gente e uma confusão de vozes. Mas quando apareci, carregado de pacotes (eram muitos mesmo!), todos estavam em silêncio ouvindo Arthur, o chefão, falar:


- Daqui a quatro semanas será selecionado o próximo Democrata para Presidente, se Bill Clinton ganhar...


O clima de concentração foi interrompido quando eu, ao abrir a porta, tropecei em um dos pacotes que tinha deixado cair e fui parar no chão com um estrondo. Todos olharam em minha direção, surpreso Arthur perguntou a Gareth quem eu era, ao que ouvi Gareth “sussurrar” não tão baixo assim:


- É o novato.


Depois daquilo, começaram a me chamar de “o cara do papel higiênico”. Ainda no mesmo dia, fui tirar umas cópias de uns documentos que o Arthur tinha pedido. A pessoa encarregada da cópia era uma garota, parecia ter quase a mesma idade que eu, talvez um ano mais nova, não mais que dois. Ela era ruiva, tinha as feições delicadas. Fui logo dizendo:


- Preciso de dez cópias disso aqui.


- Ponha na pilha.


- Não. É pro Arthur, preciso disso tipo... Pra ontem. Então, se não se importa...


- Ah, você é cara do papel higiênico não é? – ela falou me interrompendo.


 


- Espera, pai. Quem é essa?


- Essa é a Gina.


 


- Isso, acertou. Sou eu, “o cara do papel higiênico”. Mas se quiser pode me chamar de o “cara do pão e café”, o Todd da contabilidade me chama de Crystal, Crystal é sacanagem né? Nome de mulher.


- Quantas cópias?


- Dez. Por favor – ela pegou os papéis e se voltou para copiadora.


- Por que está apoiando Bill Clinton?- perguntei enquanto ela tirava as cópias.


- Ah, é só pela grana, eu recebo doze dólares a hora, é melhor do que ser babá, era o que eu era de vir pra cá.


- Você é democrata, certo?


- Por que todo mundo tem que ser democrata ou republicano? – ela perguntou de um jeito descontraído - eu tô lutando contra a copiadora.


- Não, então você é independente né?


- Eu não sou nada. Por que eu tenho que ser alguma coisa?Que saco... Por que eu tenho que ter uma opinião sobre tudo?Eu não entendo nada sobre sistema de mísseis, nem Previdência Social, nem imposto!


- Mas e os direitos civis ou os direitos da mulher?O direito de a mulher fazer o que quiser com o corpo?


Achei que tinha convencido ela com esse argumento, mas ela disse despreocupadamente e como que me desafiando:


- Eu faço o que quero com meu corpo.


- Isso é apatia! – falei sem entender como alguém poderia simplesmente ser assim, não ser nada, não ter opiniões sobre os assuntos mais falados.


- Eu não sou apática.


- Sim, é.


- Não sou não. Só sei que esses palhaços  para você trabalha só estão interessados em uma coisa, a ambição deles.


- Isso não é verdade.


- Você acha que o Bill Clinton vai fazer a diferença?- ela perguntou, me desafiando.


- Acho.


- Ele vai fazer o que já é inevitável.


- É aí que você se engana.


- Não me obrigue a grampear sua cabeça! – ela falou enquanto grampeava as cópias.


- Você está enganada. Ele fará a diferença para os negros. Vai ajudar as mulheres. Ele as entende. Veja o governo dele no Arkansas. Veja os planos dele para saúde e educação.


Ela não estava nem aí pro que eu dizia, fingia que estava roncando, dormindo, de tédio. Até que “despertou” e disse:


- Desculpa. Caí no sono – falou gentilmente.


- Tudo bem. Vem aí uma nova América. O Clinton vai mudar tudo.


- Acredito em você – ela estava sendo irônica, mais uma vez.


- Certo. Você me convenceu, você não é nada.


- Eu não sou nada.


Pela segunda vez naquele dia todos da sala silenciaram. Eu me virei para ver o que era. Dessa vez era o noticiário, uma mulher estava discursando, Gennifer Flowers:


“Vim aqui para dizer na frente de todos que fui amante de Bill Clinton por doze anos”.


Uma exclamação geral no aposento.


“Nestes últimos doze anos menti para imprensa a respeito do nosso relacionamento, para protegê-lo. A verdade é que, eu o amo”.


Mais uma exclamação.


“Ele quer que eu negue, mas estou cansada de mentiras”.


Gina se virou pra mim e disse:


- Você tem razão em uma coisa... Ele entende as mulheres.


- Engraçada, você - me virei e fui saindo.


- Tchau, cara do papel higiênico – ela falou animada.


- Tchau, garota da cópia.


 


***


 


Vocês talvez achem esse capítulo meio sem graça. Mas espero que estejam gostando da fic em geral. Não sei quando vou postar o próximo, vou tentar fazer isso o mais breve possível.


Quero agradecer a Fl4v1nh4 por ter comentado, seja bem-vinda, também adoro o filme. Um abrço pra todos. E, cometem!


 


Priscila Tonks.

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