parte O2.
pt O2.
Playing house in the ruins of us
- Ooooooooookay. – Lily falou daquele jeito arrastado e animado que fazia Marlene e Dorcas olharem para os lados procurando sobre o que ela estava falando. Quando não acharam nada de interessante demais no dormitório feminino, deram de ombros e continuaram o que estavam fazendo, a primeira se maquiando num espelho do tamanho dela ao lado da penteadeira em que Dorcas estava tentando tirar o excesso de esmalte das unhas.
- O que foi, tapada? – perguntou Lene.
- Dorcas, você está linda, linda, linda – a ruiva pulou do banheiro até elas, segurando a toalha enrolada no corpo, o cabelo já seco e preso em um rabo de cavalo – Remo vai tipo, surtar.
- Não vai, não, Lil – embora o olhar dela tivesse se entristecido, ela tentou fingir indiferença – Ele deixou bem claro que não se sentia nem um pouco atraído por mim. Por favor, pare de tentar me convencer.
- Ah, Dor – Lene interveio, gesticulando com o rímel – Não exagera. Você sabe exatamente o porquê do Remo ter terminado com você. Todo aquele papo de ficar longe, de não gostar mais... Tudo fachada, já te falamos isso.
- É, tudo por causa do probleminha... Lupino. Ele é um puto altruísta... Mas no fundo ele te ama e, garota, ele vai ficar louco da vida quando te ver nesse vestido.
- Mas que diabo – ela levantou-se e fez um gesto brusco com a varinha, e então seu cabelo ficou liso e brilhante.
Pronta, ela abriu a porta do dormitório – e elas puderam ouvir a música que vinha lá de baixo - e desceu as escadas, seus saltos fazendo barulhos até certo ponto. Marlene trocou um olhar cúmplice com Lílian antes de continuar a se arrumar. Elas começaram a falar sobre Dorcas e Remo e como havia sido um relacionamento conturbado e cheio de emoções fortes. Elas se lembraram do dia em que ele terminou com ela e as três choraram juntas no dormitório, amontoadas na cama de Lílian, enquanto Dorcas soluçava e dizia o quanto estava doendo e perguntava o que havia feito de errado para merecer aquilo.
- Você também não está tão longe, sabe – Lene sorriu para o reflexo de Lil no espelho. Ela usava jeans agarradas, uma blusa verde brilhante, saltos pretos e uma maquiagem incrível. – James vai oficialmente ter um ataque cardíaco por causa de você.
- Tudo bem, garota que conquistou o coração de Sirius Black, pode ir parando de tentar me deixar envergonhada, ok? – a ruiva corou antes de se virar para disfarçar que estava guardando algumas roupas no malão – Foi você quem o tirou de sabe-se lá quantas centenas de garotas atiradas e sem moral.
Lene suspirou e passou o gloss, movendo os lábios um contra o outro para que este se espalhasse bem, e então foi começando a guardar as coisas enquanto falava:
- Você sabe que eu não tirei, Lil. Ele continua com tantas garotas que se pode imaginar.
Lílian abriu a boca, mas não saiu nada dela. Marlene entendia perfeitamente que ela não soubesse o que dizer, por isso sorriu, consolada, para ela, e esfregou um braço da ruiva como se fosse impossível que algo mudasse aquilo.
- E eu só queria saber o que fazer. – falou, mas sua voz saiu baixa e rouca. Ela não queria chorar, mas quando Lily a abraçou com força e disse umas palavras de conforto em seu cabelo, foi quase impossível.
Oh the truth hurts, and lies worse
O salão comunal estava lotado de estudantes bem arrumados, que dançavam na pista improvisada bebendo cerveja amanteigada ou apenas curtindo e conversando com aqueles que em breve teriam sido seus colegas que escola. Credo, eu estou dramática – riu-se Marlene quando aquele pensamento passou pela sua cabeça.
Não foi difícil encontrar Dorcas, com Emmeline e Alice – ambas da Corvinal, perto do som, onde Sirius mexia, concentrado, com um fone de ouvido grande sendo segurado em apenas um lado. Ela suspirou e continuou, porque Lily estava praticamente empurrando-a escada abaixo. James estava bem ali no final, com Remo e Pedro, e deu um sorriso imenso às duas quando as viu.
- Que demora! – ele reclamou, beijando Lil nos lábios e abraçando Lene – Imagino quanto tempo vai ser amanhã.
- James, seja um namorado bonzinho e busque bebidas para nós – Marlene pediu, fazendo ele rir.
- Não mesmo. – falou, virando a própria bebida nos lábios – Você ainda nem viu o seu namorado, vá lá pedir pra ele, oras.
- Como você consegue ser tão chato? – ela espreitou na direção dele.
- Eu sei que você não viveria sem mim, querida – Jay riu – Woa, falando no diabo...
Marlene nem precisou se virar para saber do que ele estava falando. Duas mãos fortes a abraçaram por trás e Sirius beijou seu pescoço rapidamente antes de virá-la.
- Você está linda, gracinha – ele falou, e então puxou-a para sugar seus lábios inferiores num beijo rápido.
- Obrigada, docinho. – ela frisou, e riu da careta que ele fez em seguida.
- Urgh, que mau humor!
- Você quem começou com os apelidinhos melosos! – ela se defendeu.
- Mas que namorada vingativa eu fui arrumar... – Sirius começou a fazer cócegas em seu pescoço com estalos produzidos pelos próprios lábios, e ela se esticou enquanto ria alto, tentando se soltar.
Eles ficaram ali entre os amigos, dançaram e continuaram bebendo até que a maioria já estivesse bem alegre, despreocupado com as aparências e fugindo para os corredores onde poderiam se agarrar. Marlene estava começando a pensar que talvez Sirius tivesse caído em si com aquela pergunta mais cedo, e sentiu uma esperança preenchê-la lentamente, fortalecendo-se a cada vez que ele dava aqueles sorrisos estonteantes ou a beijava daquela forma louca.
Mas é claro, é claro que ele tinha que superar as expectativas. No meio de uma dança, quando por um segundo Lene deixou-se distrair pelo que Dorcas lhe contava e se afastou dele, tudo foi para o espaço. Ela virou-se e ele já havia desaparecido entre as pessoas. Já havia desaparecido do salão comunal. Lily percebeu quando ela olhava para os lados, aflita, sentindo o coração na mão, e a sua expressão fez Marlene querer esmurrar Sirius até ele parecer uma massa disforme.
De novo, ela sabia. Sabia onde ele estava. E, tomada pela raiva, pela frustração de ter pensado que ele podia ter mudado, e pelo álcool que a incitava a ir atrás dele, ela fez isso. Desviou das pessoas bruscamente, sem se importar a mínima se fosse alguém conhecido ou não. Aquilo a estava deixando louca. Uma hora estava por cima, e outra por baixo – tinha sido assim o ano todo. Uma hora ou outra, ia chegar. E por quê não agora?, perguntou-se quando desembocou no corredor.
Olhou de um lado para o outro. Não seria difícil achá-lo, mesmo que os corredores estivessem cheios de casaizinhos. E depois de andar apenas três corredores, ela viu. Não era como se ela já tivesse visto antes – a dor nunca amenizava, como se pudesse se acostumar. Era sempre pior. Ela teve que se segurar para não escorregar pela parede e cair desamparada no chão, porque todos os seus órgãos pareciam ter afundado de uma vez só. Respirou fundo enquanto dava passos rápidos na direção de Sirius e Emmeline Vance, encostados na parede num beijo furioso. Eles se separaram quando o barulho do salto foi alto o bastante e os olhos de Sirius estavam quase suplicantes quando ela uniu toda a força que podia concentrar na palma da mão e esbofeteou a bochecha macia dele.
- Eu nunca mais quero ver você. – ela falou, a voz mais calma do que pensou que fosse capaz, e deu de costas, com vontade de enfiar-se no dormitório e dormir até o ano que vem.
- Lene! – ele estava bem atrás dela. Marlene não andou mais devagar, apenas continuou como se ele não existisse. – Por favor, pare! – Sirius segurou-a pelo braço com força.
A respiração dela estava apressada e seus olhos brilhantes de raiva. Tentou se soltar, mas, bem, quem era ela contra aqueles músculos?
- Me deixe em paz. – murmurou, amarga.
- Você não pode fazer isso comigo – ele falou, a voz incrivelmente arrependida. Ela quase acreditou de novo.
- Você é quem não pode fazer isso comigo, idiota! – sua voz elevou-se alguns decibéis, enquanto ela não suportava mais a dor dentro do peito – Está tudo acabado, está me ouvindo? Eu estou farta de tudo isso!
- Lene... – ele a soltou e passou as mãos pelos cabelos, mas Lene não conseguiu sair do lugar. Estava furiosa e queria que ele ouvisse tudo o que ela tinha para dizer – Me desculpe – Sirius falou, tentando segurar as mãos dela – Eu sei que eu sou um canalha, asqueroso, imbecil... Mas me dá outra chance.
- O ano todo – ela respirou fundo mais uma vez antes de continuar – O ano todo, porra! Eu perdi as contas de quantas chances eu te dei. E você nunca levou isso à sério... qualquer oportunidade de pegar uma vadiazinha e você estava lá, como se eu não estivesse esperando por você!
- Você também não foi a garota mais santa do ano, sabia? Ou por acaso já se esqueceu de Stevan ou de Allan?
- Cala essa boca, Sirius! – ela berrou, sem se conter – Como você pode ser tão patético? Eu saí com dois garotos enquanto você saiu com umas trezentas! Mas eu não fui atrás delas e nem as soquei até que elas prometessem manter distância de você, ou eu fiz isso?
- Não. Mas de qualquer maneira...
- De qualquer maneira nada! Eu só quero botar você pra fora da minha vida de uma vez por todas, porque eu não suporto mais, ok? – os gritos foram diminuindo enquanto ela sentia a dor apertar. E apertar, e apertar.
Sirius aproximou-se com os olhos fechados, e ela não teve forças para afastá-lo. Ele colou suas testas e ficou ali, seu hálito delicioso só fazendo a cabeça de Lene pifar ainda mais.
- Você pode ter qualquer garota que quiser... Pra que ficar me torturando? Eu estou tão cansada disso tudo, Sirius.
Ele inspirou profundamente e então ergueu a cabeça dela pelo queixo, de modo que seus olhos se encontrassem. Do contrário que Marlene pensou, ela não se derreteu e nem cedeu a toda aquela avalanche apenas ao encontrar os cinzas dele – ela sentiu que era uma decisão firme. Tinha, de uma vez por todas, que parar com isso. Por Deus, um ano inteiro...
- Marlene, você não pode me deixar. – ele murmurou com a voz cortada. Marlene sentiu o coração se apertar lentamente quando os olhos dele marejaram – Eu sei que eu faço uma porrada de besteiras, mas meu coração é seu.
Ela quase desistiu de resistir por causa daquela carinha de cachorro sem dono mais perfeita que ela já tinha visto até mesmo ele fazer. Uma lágrima cortou sua bochecha, e Sirius limpou-a rapidamente, franzindo as sobrancelhas.
- E o meu coração é seu também, Sirius. Mas eu não suporto mais ver você despedaçá-lo todo dia e não fazer nada contra isso.
Oh it tears me up, I tried to hold on but it hurts too much
Quando Marlene voltou ao salão comunal, toda a vontade de dormir até sabe-se lá quando foi para o espaço. Ela só queria fazer uma coisa: esquecer. E bem, haviam vários litros de whisky de fogo por ali. Com um sorriso antecipadamente bêbado, ela abriu uma das garrafas e começou a beber, e beber, e dançar com estranhos – e até beijar um – e continuar a beber até que começasse a falar coisas óbvias e dar risadas escandalosas.
Puta merda, ela não achava Lily em lugar algum. Não podia ser tão difícil achar um amontoado de cabelos cor de fogo naquela imensidão de cabelos negros. Ops, aquilo era um cabelo loiro? Ah, seus olhos. Abra os olhos, Marlene. Isso, certo. Agora ela estava vendo Jasper se aproximar, parecendo tão alegre quanto ela naquela dança escocesa, e ela riu, meio estridente. Logo Jasper tinha sumido e então Emmeline estava ali. “McKinnon, eu sei que eu não tenho nada a ver com a tua vida, mas...” que se danasse. Ela passou reto sem dar ouvidos, indo dançar com Allan Francis, o garoto com quem havia saído alguns meses atrás quando descobriu mais uma das traições de Sirius. Ele sorriu para ela, malicioso, e quando ela deu por si estava sentada em um sofá muito macio. Oh, não. Ela estava sentada sim, mas era no colo de Allan, e ele estava tentando dizer coisas provocantes em seu ouvido. Ah, cai fora.
Marlene levantou-se com passos trôpegos e foi desviando das pessoas, arrastando uma garrafa de whisky de fogo consigo e dando risadinhas quando trombava nos outros sem querer. Graças a Deus, Sirius não havia voltado para a festa e nem a havia visto daquela maneira. Não queria que ele soubesse o estrago que a decisão dela estava fazendo nela mesma, porque ele faria o favor de jogar isso na cara dela.
Então estava na porta da saída para os jardins. Não devia estar trancada...? Humpf, que se dane isso. Pulou os degraus, tentando se segurar no corrimão inexistente, e tirou os saltos para pisar na grama fofa. Sentia estar andando em nuvens e as estrelas estavam tão perto que ela quase podia tocar. Ah, que noite linda, vou sentir falta disso aqui.
Não demorou muito para que tudo caísse encima dela. Porque o pior era que, apesar de estar flutuando e tudo, não havia conseguido esquecer. Nem um instante sequer. Dos olhos dele, marejados, implorando para que ela ficasse. O meu coração é seu. Ela havia cuidado bem dele. Havia feito de tudo.
I tried to forgive but it's not enough
- Marlene? – alguém a chamou. Era ilusão de ótica ou James Potter, seu amigo camarada, estava no meio do jardim segurando uma caixinha de veludo nas mãos, se aproximando? Não, era ilusão de ótica, só podia ser. Urght, que mal estar do caramba. – Lene, você está bem?
Não, voz do além, eu não estou nada bem. Acabei de terminar com Sirius Black e isso acabou comigo totalmente, estou caindo aos pedaços... e que porra é essa? Ainda ouço vozes, humpf. Eu sou estranha às vezes... Woa. Ela foi dar um pulo nas hortênsias e acabou perdendo o equilíbrio dos joelhos, que cederam suavemente para o chão. Pensou na vez em que ela e Sirius haviam feito isso outra noite de festa, ambos embriagados, e rolaram pela grama enquanto se beijavam.
- É, foi o que eu pensei. Você não está nada bem.
Quando Marlene deu por si, estava sentada no chão depois de vomitar, chorando aos frangalhos, o corpo todo se sacudindo. Como estava com vontade de fazer há horas, mas o pouco orgulho que lhe restava não havia deixado. E então vomitou de novo, e James limpou sua boca.
- O que aconteceu, Lene? – ele perguntou suavemente, abraçando-a.
- Você sabe o que aconteceu... de novo...
- Você não pode se entregar dessa maneira – ele falou, firme – Não pode, está me ouvindo? Qual é, Lene, você nunca foi assim.
Quando seus olhos se encontraram, Lene pensou que poderia ser a garota mais sortuda de toda Hogwarts por ter um amigo como James. Uma ternura incrível, que não tinha nada a ver com efeitos alcoólicos, passou por ela, que rapidamente inclinou-se para dar um selinho de amizade nele, e abraçá-lo com uma força que sabia ser do efeito alcoólico.
- Eu amo você. Você é tão bom pra mim, James. Eu poderia ter morrido afogada sem você.
Ela sentiu-se minimamente melhor por perceber que essa última frase o fez dar uma risadinha pelo nariz enquanto afagava suas costas.
- Sim, você não sobreviveria um segundo sem mim, querida.
- Você é o melhor... a-migo que alguém pode te-ter.
- Lene! James? – Lily estava descendo os jardins – O que está acontecendo?
Marlene tentou levantar-se, e teve que se apoiar totalmente em James para fazer isso. Ele trocou um olhar significativo com Lil e fez um gesto com o indicador de que alguém ali estava muito mal, e ela se aproximou para ajudá-lo a segurar Lene pelo outro braço e afastá-la do lago.
- Oi, Li – ela cumprimentou, e fungou profundamente – Você está linda hoje. Eu já disse a você quaaaaanta sorte tem por t-ter o James bem nos seus pés?
- Marlene, você está fedendo whisky. – a ruiva disse, em tom levemente repressor, de quem também se preocupa. Ela ajudou James a sentar Lene no segundo degrau de baixo pra cima da escadaria da porta principal e sentou-se ao lado da amiga. – Fica aí sentada. O que aconteceu?
- Ah, por que as pessoas só sabem perguntar isso? – ela choramingou, passando as mãos nos cabelos, amassando-os para trás – Não está bem na minha cara a merda que aconteceu?
- E você simplesmente bebeu todas por causa do patife que ele é – Lily ainda estava falando naquele tom brabo de quem mesmo assim se preocupa – Essa não é você, Marlene... ele é só um cara, você já conheceu tantos caras idiotas como ele! Por Merlin, pare de chorar. – a voz dela vacilou nesse pedido e ela abraçou a amiga, que se sacudia nos soluços.
Lene sentiu a mão de James afagar sua cabeça enquanto Lil chorava baixinho dizendo frases enormes sobre como esse não era seu jeito para ela. Ela odiava quando isso acontecia. Odiava sentir-se tão escrotamente machucada, e sentia-se pior por ver sua melhor amiga chorar por causa disso. E ainda sentia repulsa por si mesma por sentir-se um pouquinho melhor por ver que Lil podia dividir sua dor.
James sumiu alguns minutos, mas Marlene nem ergueu a cabeça e nem falou nada, apenas continuou sentindo as lágrimas escorrerem pelo rosto, quentes, e o abraço de Lil, e o cuidado dela ao afastar os cabelos negros do seu rosto. Então, quando James voltou, havia um par de saltos que fazia dupla com os passos dele. Ela ergueu os olhos brilhantes para encontrar os preocupados de Dorcas, que se ajoelhou bem na sua frente sem dar a mínima para o vestido novo.
- Lene – ela segurou o rosto dela entre suas mãos – Pare de chorar. – ordenou, firmemente.
Ela só conseguiu fazer uma careta enquanto o fluxo dos soluços aumentava. Deus...
- Marlene, pelo amor de Deus, abra esses olhos e olhe pra mim – Dorcas começou a falar, e embora sua voz continuasse firme, Lene a percebeu um pouco embargada.
Abriu os olhos e encontrou os azuis de Dorcas tão brilhantes que chegaram a assustá-la. Seus soluços foram cessando gradativamente, enquanto a outra limpava as lágrimas em sua bochecha e tentava fingir que elas não estavam rolando no próprio rosto. Ótimo, Marlene, mais uma amiga para dividir a dor. Desde quando você é tão egoísta? Ela pensou, abraçando a si mesma. Dorcas empertigou-se para mais perto e colou a testa das duas, ainda com aquele olhar profundo que ela tinha quando ia dizer alguma coisa realmente importante.
- Ouça... com muita atenção, ok? Você vai lembrar disso quando estiver sã, porque eu conheço você – ela fungou levemente uma vez para continuar – Eu quero que me prometa uma coisa. Se lembra de quando eu estava assim por Remo e você falou a mesma coisa pra mim? Eu quero que prometa, Lene – ela repetiu, e Lene definitivamente parou de soluçar – Você não vai mais chorar por garoto algum, está me entendendo?
Sim, ela confiava plenamente em Dorcas. Confiaria sua própria vida àqueles olhos azuis preocupados demais e sinceros demais. E apenas por uma fração de segundo acreditou que seria possível prometer aquilo sem ao menos... desabou em soluços novamente, e Dorcas a abraçou, fazendo sons que a acalmavam. Lily fez o mesmo, afagando suas costas. James estava em silêncio, e ela só podia ouvir sua respiração pesada quando segurava o ar, tentando parar de chorar.
- Ele não presta, Marlene. Ele não merece que você chore por ele, não merece que você seja fiel a ele e nem que esteja gostando dele como nunca gostou de alguém, está ouvindo? Ele é um idiota cachorro, e você sabe disso. Puta merda, Lene, você sempre foi a menos desiludida quando o assunto era Sirius Black, tinha mesmo que se apaixonar por esse...
- Dorcas – Lílian repreendeu docemente. Dorcas respirou fundo e soltou-se do abraço, olhando para Marlene novamente.
Seu rosto estava ensopado e a maquiagem fazia enormes círculos escuros sob seus olhos brilhantes de lágrimas, como bolsas negras. Ela estava se segurando para não despencar no choro novamente.
- Me prometa agora – a loira pediu, dessa vez sem voz embargada e nem caretas de quem estava se segurando. – Como eu fiz uma vez, Lene, você sabe que vai ser pro seu bem, ok? – ela acariciou a bochecha da amiga ternamente – Você não vai mais chorar por garoto algum. Eu não quero mais ver você assim, está entendendo?
Um milhão de pensamentos rodaram sua cabeça – e ela não teve noção se era por causa da bebida ou se havia sido um brainstorm. Mas ele é Sirius Black! Sim, o canalha galinha que te traiu o ano todo com tantas que conseguia. E que você perdoou, de anta que é. Será que em alguma vida alguém já encontrou alguém como Dorcas para ser amiga? Ela cuida de mim. Eu devo isso não só a mim mesma, mas a ela e a todos os meus amigos.
Assentiu devagar, e segurou-se para não voltar a chorar. Fungou enquanto recebia um sorriso de lábios da loira, e então se abraçaram novamente. De repente, Marlene percebeu que estava falando.
- Vocês são tão bons comigo – ouviu-se – Eu realmente não sei como viverei sem vocês.
- O quê?! – assustou-se Lily, puxando-a pelo ombro – Como assim, viverei sem vocês?
Marlene suspirou, passando as mãos pelos cabelos e umedecendo os lábios. Olhou para o chão.
- Do que você está falando, Lene? – Dorcas continuou, a voz quase sussurrante.
- Ela está bêbada. – James falou pela primeira vez, aproximando-se delas. Sentou-se ao lado de Lil. Ela podia ver a sua expressão – parecendo tão inseguro do que estava falando. Apesar do tom acusativo, ela não ficou nervosa e nem respondeu com agressividade.
Talvez porque estivesse mesmo bêbada, ou porque quisesse apenas dizer o que estava se segurando há meses.
- Eu vou embora para a França – despejou – Meus pais estão se mudando para lá em novembro e eu vou junto.
Ela não se lembra do que aconteceu no resto da noite, e quando acordou estava tão atordoada, com tanta dor de cabeça, que pôde ter apenas uns flashes. Lily e Dorcas voltaram para o dormitório com ela, cedo demais para um pré-baile, e deram alguma coisa para ela tomar e acalmar seus nervos. Porque tinha recomeçado a chorar, dessa vez não por causa de Sirius, mas por causa de todo mundo. Por causa da escolha de deixar todo mundo pra trás e seguir em frente com uma vida nova. Ela ainda se lembrava de ouvir as amigas conversando baixinho, achando que ela já estava dormindo.
- Ela estava brincando, certo? – Lil foi a primeira que falou. Elas trocavam os vestidos por roupas macias de dormir. – Ela não pode... ir embora.
- É claro que só pode ter falado isso por causa da bebida. – Dor concordou, parecendo amedrontada – Eu não sei o que aconteceria se eu não tivesse essa criatura todo dia do meu lado.
- Eu sei, me senti assim também.
- Amanhã falamos com ela.
- Só pode ter sido o álcool.
- É, ela estava bêbada e tal.
- Boa noite, Dorcas.
To make it all okay
Lene ergueu os olhos de seu sanduíche, encontrando o olhar preocupado de Dorcas. A loira disfarçou e enrolou uma mecha do cabelo no dedo, sorrindo para ela e desviando o olhar para qualquer lado. Lily estava com James a algumas pessoas dali, e os dois pareciam mais silenciosos e menos risonhos do que sempre eram. Sirius estava do seu lado, comendo silenciosamente, de cabeça baixa. Remo tentava puxar um assunto com qualquer pessoa a seu alcance, sem entender o que estava acontecendo e sem sucesso algum. Pedro só sabia comer, despreocupado.
Ela desejou ter um ponto de fuga como ele tinha. Algo que a fizesse esquecer de todos os problemas – mas agora mal podia olhar aquela comida sem sentir-se tão vazia por dentro que a fazia querer gritar de dor. Sem suportar mais aquele clima, levantou-se delicadamente, sem fazer ruído algum, e saiu do Salão Principal lotado. As pessoas estavam eufóricas por causa do baile de formatura e tudo, e os grupinhos de garotas risonhas e escandalosas davam risadinhas e combinavam ansiosamente os detalhes do que aconteceria – principalmente no pós-baile. Se estivessem no ânimo como elas, Dorcas, ela e Lily também estariam daquela maneira, embora menos escandalosas e mais ousadas nos planos. “Leve James para a cozinha e o amarre no fogão”, Lene lembrou-se de quando deu essa idéia louca para Lily na festa de Páscoa, “depois faça um brigadeiro e jogue no corpo inteiro dele. Nu, é claro. E depois lamba tudo até qu...” “Cale essa boca, pervertida!” – uma Lil muito vermelha jogou uma almofada nela, enquanto Dorcas gargalhava sem fôlego.
Teria tanta saudade delas.
Depois do almoço, eles se juntaram no salão comunal, como era de costume. Lílian estava deitada no colo de James, e ele acariciava seus cabelos vermelhos encarando muito furiosamente o fogo da lareira. Dorcas fazia uma trança frouxa no cabelo cumprido de Lene, que estava sentada no chão na frente da poltrona dela.
- Hm, Marlene – James começou, não sem antes trocar olhar com as outras duas garotas no salão, que tentaram impedi-lo com aqueles olhares arregalados – Ontem... à noite. Você se lembra do que aconteceu, certo?
Ela ergueu os olhos para ele e assentiu com a cabeça: - É claro que eu me lembro, Jay.
- Você não estava falando sério sobre ir embora, né? – Lily perguntou com ar receoso.
- Estava – ela murmurou baixinho – Eu sei que deveria ter dito antes, mas eu não sabia como começar. Não foi por causa da bebida nem nada... eu vou mesmo pra França com meus pais.
Depois daquele momento eu não acredito que você não contou pra gente, e das outras milhares de perguntas do porquê dela ter decidido ir, e das várias tentativas de convencimento de fazê-la ficar, elas se abraçaram e pareceram estar assimilando a idéia de que Lene realmente ia embora. Foram se arrumar para o baile às três, quando James já tinha sumido para a última reunião do ano do time de quadribol.
You can't play our broken strings
Nem parecia que fazia meses que elas planejavam a formatura. Era como se ontem mesmo elas estivessem combinando as roupas, sapatos, cabelo. Ajudando Alice atrás da decoração e da melhor banda bruxa para tocar. E Lily tentando – mais para não dizer que não tentou do que tudo – convencer os Marotos a não fazerem uma pós-formatura com bebidas alcoólicas. Não porque era proibido – mas porque ela era monitora-chefe e se fosse pega ali estaria realmente ferrada.
- Ferrada? Qual é, ruiva – Sirius riu alto – Você vai estar fora daqui no outro dia, não é como se eles fossem te dar uma detenção por causa disso.
Lene se lembrava que a amiga suspirara alto e se rendera: - Ok, façam a sua festinha idiota, seus tapados hiperativos.
E foi lembrando esses dias que Marlene conseguiu sair do estado de letargia que a atingira como um soco pela manhã, quando se deu conta que havia mesmo terminado com Sirius e dessa vez era pra valer. Além, é claro, de tudo que Dorcas e Lílian falaram, sobre esse ser o último dia como estudante – e esse fato realmente esclareceu a mente dela, após repeti-lo como um mantra. O último dia em Hogwarts – para ela seria como o último dia de convivência, a última festa com todo mundo junto, a última lembrança para se agarrar. Por isso se empenharia ao máximo para tornar aquela noite ótima. Nada de bebedeiras até cair como na noite passada, nada de choradeiras nos ombros das amigas, nada de reencontros apaixonados com Sirius. Nada disso. Aquela noite tinha que ser memorável.
E mesmo tendo empinado o nariz diante de si mesma na frente do espelho com um sorriso quando estava pronta e segurava o vestido azul que se ajustava ao seu busto e quadril perfeitamente para que a barra longa não roçasse o chão, mesmo tendo dito em voz alta e sido abraçada pelas garotas enquanto davam risada, de uma maneira nada delicada para quem já estava maquiada e de cabelo muito minuciosamente arrumado; mesmo tendo considerado que já estava completamente convencida de que não se abalaria nem ao menos um pouquinho ao ver Sirius pela primeira vez no dia, ela ficou realmente surpresa quando isso aconteceu e sorriu pra ele. Afinal, ele era seu melhor amigo, de qualquer maneira. Ele sorriu de volta, daquela maneira linda, e aproximou-se para beijar seu rosto e dizer que ela estava linda.
- Nós estamos mesmo lindas, não é? – Dorcas enroscou um braço no dela ao terminar de descer a escada para o salão comunal – Ninguém no mundo tem amigas mais lindas do que eu.
Marlene riu, sentindo o peito leve, e os olhos azuis de Sirius brilharam para ela enquanto ele enfiava as mãos nos bolsos do paletó. Ah, droga, ele não estava nada mal também. Quer dizer, ele estava perfeito, com os cabelos penteados para trás, brilhantes, e Lene sempre podia afirmar que ele era mesmo um Black – não uma criança adotada por aquela família estranha – sempre que o via de roupa social, pela elegância que fluía de todos os poros. Assim como a maldita sensualidade.
- Você também está muito bem, Six. – ela falou, sorrindo torto.
- Vocês já estão descendo? – Dorcas continuou, perguntando para Remo e James, ainda agarrada à ela.
Enquanto Remo fazia piadinhas para ela – e Lene sabia que era porque ele estava sem-graça de ver Dorcas tão linda, ou apenas hipnotizado demais – e a amiga ria, ela observou enquanto seus cabelos dourados em cachos perfeitos molduravam seu rosto pálido com uma maquiagem clara. Ela estava mesmo linda. Lene se orgulhava tanto de ter uma amiga como ela. A mensagem daquele braço acoplado ao seu era bem clara: estamos aqui na defensiva, Black, avance na linha e acabamos com você.inteira. Sim, tinha quem estava lá por ela. Seus olhos marejaram antes que pudesse perceber que Dorcas já a puxava para fora do salão, longe daqueles olhares intensos que Sirius estava lançando nela
- Dorcas, eu vou te dizer, Remo estava totalmente secando você – Lene riu enquanto caminhavam pelos corredores para o Salão Principal desviando das pessoas muito bem arrumadas, acenando para algumas e fazendo comentários para outras.
- Ahm, Lene, você vai me matar – ela apertou levemente o braço da amiga para soltar e entrelaçar os dedos dela entre os seus, e foram indo de mãos dadas – Não deu tempo de te contar com todo o rolo com o Sirius e tals...
- O quê?
- Nós nos beijamos ontem – ela falou, as bochechas corando levemente – Ok, não foi só um “nós nos beijamos”, foi uma coisa totalmente intensa, sabe e... acho que a gente tá junto de novo.
- Uau! – Lene exclamou, sinceramente feliz pela amiga – Isso é ótimo, Dor! Ah, espera, sim, primeiro eu tenho que te matar, quer dizer, onde já se viu voc...
- Lene! – alguém a chamou no momento em que colocou os pés no saguão principal.
Ela procurou e Dorcas, rindo, deu um cutucão no braço dela, apontando a direção de onde aquela voz muito conhecia vinha. Marrie McKinnon estava com os braços esticados de quem esperava um abraço, com aquele sorriso maravilhoso de todos os dentes de quando se reencontravam no rosto. Ela abraçou a irmã delicadamente, mas com força, despejando perguntas sobre a França. Dorcas cumprimentou seus pais e correu para os dela. Marrie olhou por cima do ombro de Marlene como se procurasse alguém, e soltou:
- Cadê aquele seu namorado gato, pequena? Vocês não desgrudam um instante – e apertou a bochecha de Lene, onde sentiu esquentar.
Merda.
- Nada de namorados gatos, mais. – murmurou discretamente.
A celebração da formatura foi exatamente como elas haviam imaginado e ensaiado entre risos e piadas pervertidas – embora muito mais emocionante. O imenso salão principal foi transformado maravilhosamente, contando com um palco principal onde os formandos receberiam os diplomas, nome por nome, levantando-se de onde estavam sentados, todos com chapéus parecidos com o Seletor, em várias cadeiras posicionadas em meio círculo, diferente das cadeiras dos convidados que estavam todas diretamente de frente pro palco. Algum feitiço da professora Minerva havia feito com que em qualquer posição em que se sentasse a visão do palco seria perfeita.
O primeiro deles a ser chamado foi Sirius. Marlene tinha visto a família Black na recepção, um cortejo fúnebre, mas ao contrário deles os alunos fizeram grande estardalhaço quando ele subiu, com aquele sorriso de todos os dentes pregados no rosto. Ela teve certeza que ouviu umas quinze garotas gritando apelidos obscenos, e virou o rosto para Dorcas que estava ao seu lado, aplaudindo e rindo gostosamente. Depois foi Lily, vermelha como um pimentão, e todos fizeram um estardalhaço. James levantou-se e aplaudiu em pé enquanto assoviava – e nada na vida dela a deixou mais vermelha. Então veio Remo, um estardalhaço maior porque ele era um dos Marotos, e depois ela.
Marlene não pensou que fossem fazer tanto barulho. E nem que seus pais levantariam para aplaudir de pé, ou que sua irmã gritaria “Vai lá, garota!” e depois ficaria assoviando. Muito menos que Sirius levantaria e aplaudiria em pé como se ela tivesse acabado de receber um prêmio por salvar crianças da miséria. Aquele maldito brilho no olhar. O coração de Lene bateu loucamente e ela sorriu e acenou para eles enquanto recebia o diploma e parava para tirar a foto.
Então foi Dorcas, mais ou menos o mesmo barulho, Pedro, barulho demais para quem Lene considerava figurante ali, e James – o maior barulho entre todos os estudantes, sem dúvida alguma. Por sorte Lily convencera Sirius de última hora de desistir de soltar fogos dentro do salão, pois era bem capaz de causar um incêndio e estragar toda a decoração que além de não ser barata era a única, e isso acabaria completamente com a festa. Lílian tinha argumentos fortes, sim. Depois de toda a gritaria de James e do enfurecimento da ruiva quando uma atrevida gritou que ele era gostoso. E depois veio o jantar formal, onde Lene respondeu todas as perguntas dos pais e de Marrie sobre o término do namoro e atirou milhares sobre a França e como seria lá. Eles já a haviam matriculado em um curso de aurores, e aquilo caiu nela como um baque surdo – era mesmo real. Ela ia mesmo embora.
Levantou-se com a desculpa de que iria cumprimentar os Evans e, após realmente fazê-lo, subiu as escadarias para o saguão, onde a decoração da recepção ainda estava lá, o lugar quase vazio. Sentou-se em um sofá e fechou os olhos, suspirando profundamente. Tudo daria certo.
Não demorou muito para ele aparecer, com as mãos enfiadas nos bolsos e aquele olhar cinza rondando-a. Quando encontrou seu olhar, Lene sentiu aquele habitual desconforto no estômago e quis xingar-se. Mas não era possível. O canalha tinha um efeito terrível sobre ela, mesmo com todas as decisões e tudo e... ah, merda.
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n.a: SEGUUUNDA PARTE, enfim. obrigada a todos os comentários, agradeço a todos na próxima parte que pode crer que chega essa semana ainda :D beijo!
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