Feitiço de Proteção
Capítulo 24
Feitiço de Proteção
Eu sempre gostei dos verões franceses, ainda mais quando os dias terminavam com uma limonada fresca à sombra de uma frondosa faia nos jardins da casa de tia Françoise. Estávamos deitadas no chão, Aimèe e eu, enquanto minha tia tricotava. Eu tinha vindo para Paris há três dias, tão logo deixei Hogwarts, e minha intenção ao ir embora se baseava, principalmente, em ir atrás de Sebastian. Se ele fazia parte da família de meu pai, então minha tia poderia saber de algo. No entanto, eu não a questionara desde minha chegada.
Durante esses três dias, minha mente não conseguia pensar nas perguntas que eu poderia fazer sem comprometer minha tia ou Aimèe. Eu não queria deixar rastros para Sebastian; não queria me responsabilizar por suas mortes. E minha falta de concentração se devia ao que havia acontecido nas últimas semanas de aula, em Hogwarts.
Porém, eu não estava disposta a recordar o que havia acontecido. Respirei fundo, forçando as lembranças a ficarem no canto obscuro e esquecido de minha mente.
— Dina, você está bem? — Aimèe me olhava preocupada.
— Desculpe, o que você estava falando?
— Estou preocupada com você. Na verdade, nós estamos.
Acompanhei o olhar de minha prima e vi que tia Françoise voltava para dentro de casa. Suspirei, sem saber se essa era a hora ou não de finalmente colocar as cartas da mesa. Aimèe continuou:
— Nós não a esperávamos aqui, sabia? Maman jurou que você ficaria na Inglaterra.
— Eu realmente pensei nisso. Mas vir para cá foi uma decisão necessária, Aimèe.
— E essa necessidade de que você fala tem relação com o fato de você estar estranhamente pensativa desde que chegou?
Olhei para minha prima, surpresa pela abordagem. Ela sorriu.
— Não sou tão obtusa assim, Dina. Você sempre foi tão animada, alegre e, então, eu a vejo taciturna, pensativa... E sei que a falta de Arktos não tem muito a ver com isso.
— Você tem razão — disse, por fim. — Eu vim, pois preciso conversar com a tia.
— Sobre o quê?
— Um parente que temos em comum e espero muito que ela conheça.
— Quem?
— Sebastian. — Pela palidez de minha prima ao ouvir o nome do vampiro, ela o conhecia bem. — Como você o conhece?
Aimèe abriu a boca duas vezes antes de dizer que era melhor entramos e procurar por tia Françoise. Ela seria a melhor pessoa para responder minhas perguntas.
Então, em poucos minutos nós três estávamos sentadas na sala. De início, Françoise não disse nada que eu já não soubesse sobre Sebastian: que ele era um homem cruel, mesquinho e sórdido que almejava o poder que apenas Magia Negra era capaz de proporcionar. Ele buscava por uma longevidade surreal, uma vida eterna. E com uma companheira à sua altura. Enquanto minha tia falava, eu notava dor e tristeza em seu olhar, e a pena com que ela me olhava demonstrava que ela sabia muito bem quem Sebastian escolhera como companheira eterna.
— A senhora sabe que ele me escolheu, não sabe, tia? E também sabe por quê.
— Eu desconfiei há alguns meses quando Sebastian veio aqui em casa.
— Quando? — perguntei, surpresa.
—Em fevereiro. Elequeria um diário de Timoh que eu guardo. Mas, obviamente, ele não conseguiu pegar. Não sou bruxa como você ou Arktos, mas tenho meus truques. — Minha tia sorriu, orgulhosa por ter conseguido enganar o vampiro.
— Mas o que o diário do papa tem de tão importante? — Aimèe perguntou.
— Vou buscá-lo.
Assim que minha tia deixou a sala, Aimèe me olhou preocupada.
— Dina, o que Sebastian quer com você?
— O que sua mãe falou, Aimèe — respondi em meio a um suspiro. — Parece que ele me escolheu para ser sua companheira eterna.
— Por que você?
— Meus olhos, eu acho. Ou talvez meu temperamento meigo — falei zombeteira.
— Dina...
Não respondi ao seu apelo. Relembrar o conteúdo da carta de Arktos, onde ele me explicava tudo, assim como os papéis nos quais ele anotara o que havia encontrado em livros antigos, mostrava-me o tamanho de minha impotência diante de Sebastian. E, para mim, não havia sentimento pior do que a impotência. Então, para que minha prima percebesse que eu não queria conversar com ela sobre nada, levantei-me e fui até a janela. Só voltei a me sentar no sofá quando tia Françoise voltou.
— Aqui está.
— E o que há no diário que pode me ajudar? — perguntei quase sem esperança.
— Há feitiços e rituais, dos quais você pode precisar para se defender.
Peguei o diário das mãos dela e comecei a folheá-lo, buscando algo que pudesse me ajudar.
— Quando o tio Timoh escreveu essas coisas?
— Acho que ele o tinha desde sempre. Porém, eu só soube desse caderno uma semana antes de ele morrer. Timoh foi bem firme quando me disse para guardar este diário com a minha vida, se fosse preciso. Alguém precisaria dele, de suas informações. Alguém que Sebastian procuraria.
No diário havia tantos rituais de proteção de espaços maiores, como uma residência, quanto feitiços de preparação de amuletos para proteção pessoal.
— Posso ficar com isso?
— Évidemment, ma chérie.
Voltei a atenção para o diário, sabendo que agora eu tinha algo precioso e forte para enfrentar Sebastian finalmente. A sala ficou em silêncio, o qual só foi cortado por minha tia.
— O que você pretende fazer agora, Dina?
— Ver do que alguns desses feitiços são capazes, eu acho. — Olhei para minha tia. — Ele me deu um prazo. Vai me procurar apenas quando eu fizer dezoito anos.
— O que nos dá um mês, certo?
— Trinta e cinco dias, para ser mais exata.
— Por que esse prazo? — Aimèe perguntou. Foi sua mãe quem esclareceu:
— Todo ritual precisa de prazo e dia certos. E mesmo que Sebastian adore esses joguinhos psicológicos, creio que no caso de Dina seja isso.
Demorei a dormir àquela noite, pois estudei todo o diário de tio Timoh. Havia um feitiço de proteção que eu poderia usar para manter Sebastian longe de mim e, para minha sorte, não era algo difícil. Porém, eu deveria voltar para Londres, pois apenas em minha casa encontraria o essencial para o feitiço. De manhã disse minha decisão a tia Françoise e Aimèe, porém elas pediram que eu ficasse por mais uns dias.
— Será um pouco como antes — Aimèe disse, segurando minhas mãos como se implorasse. — Além disso, aqui você estará segura.
— Acho que seria melhor eu ir.
— Por favor, Dina! Eu gostaria muito que você ficasse.
Uma vez que a insistência de Aimèe me pareceu estranha, optei, então, por ficar. E tão logo ficamos sozinhas, a inquiri.
— Então? O que foi todo aquele show?
As bochechas de Aimèe ficaram vermelhas, mas ela sorriu.
— Alexey virá me ver, amanhã. E se eu for cavalgar sozinha, minha mãe controlará meu horário.
— Então você quer que eu vá com você e fique olhando vocês dois namorarem?
— Algo assim...
Rolei os olhos, mas não neguei o pedido de minha prima. Era o mínimo que eu poderia fazer.
A história de Aimèe e Alexey já tinha três anos. Ele fazia parte da nossa família, um primo de segundo grau, mas não era por isso que tia Françoise não aprovava esse relacionamento. O que Alexey fazia para viver que ela não gostava. Contudo, com aprovação ou não, Aimèe amava Alexey, e eles se viam escondido desde três anos atrás, quando se conheceram.
Após o almoço, Aimèe arrumou uma pequena cesta com comida e uma jarra de suco. Fomos até o pequeno estábulo e saímos com os dois cavalos. Eu adorava cavalgar, e quando Aimèe disse à mãe que iríamos passar a tarde fora, dizendo que era para eu me distrair dos problemas que envolviam Sebastian, tia Françoise não deu nenhuma recomendação, somente sorriu.
A preferência de minha tia pelo campo fora inteiramente influenciada por meu falecido tio. Eles moraram naquela casa desde que se casaram, cultivando um pequeno pomar e uma horta ao fundo da casa, enquanto na parte leste encontrava-se o estábulo com dois cavalos. E uma vez que a propriedade era grande e adoravelmente perto de um riacho, cavalgar durante horas chegava a ser quase uma obrigação no verão.
Aimèe e eu cavalgamos até estarmos longe o bastante da casa e alcançarmos o ponto de encontro. Minha prima nem se preocupou em amarrar seu cavalo, deixando essa tarefa, além de preparar o piquenique, a meu cargo. Ótimo. Eu era a serviçal do dia. Estendi a toalha na grama, embaixo de uma árvore grande e com sombra generosa, enquanto os dois pombinhos foram passear um pouco mais longe.
No fundo, eu sentia uma imensa inveja de Aimèe e Alexey. Olhar para os dois era a mesma coisa que ver a personificação da palavra amor. E aquilo me doía mais do que eu poderia admitir.
Sentada embaixo da árvore e usando seu tronco como encosto, deixei que as lembranças que eu havia refreado dias atrás voltassem, estimulada pelo amor de meus primos... Mesmo depois de quase um mês da separação, eu ainda conseguia ver com perfeição em minha mente a feição desesperada de Sirius, a tristeza em seu olhar e a descrença do que eu estava fazendo.
Apenas nas últimas semanas de aula que eu havia conseguido terminar nosso namoro. Perceber que o amava, entretanto, não tornou a tarefa fácil, e tudo só piorou quando ele começou a notar meu afastamento gradativo e a falta de paciência que eu demonstrava perto dele. O que culminou para eu finalmente terminar tudo foi uma conversa na semana em que aconteceram os NIEMs.
— Será que Peter tem razão? — Lily havia perguntando quando desistimos de estudar e fomos aproveitar o resto da tarde de domingo nos jardins, perto do lago.
— Sobre quê? — Potter retorquiu.
— Voldemort. Será que o que aprendemos nesta escola não nos ajudará em nada?
— Não seremos tão indefesos assim, Lily — Clair disse depois de alguns segundos de silêncio, uma vez que ninguém pareceu ter uma resposta.
— Mas, mesmo assim...
— Você é uma bruxa capaz, Lily — falei.
— Além disso — Sirius continuou enquanto nos sentávamos sob uma árvore —, nós sempre estaremos juntos, então poderemos proteger uns aos outros.
Senti meu estômago revirar em angústia ao ouvir Sirius. Ainda mais ao perceber que a pergunta de Lily tinha fundamentos, e não apenas sobre Voldemort. No meu caso ainda havia Sebastian. Como eu me imporia a ele, sendo que só em sonhar minhas pernas tremiam de medo? Eu precisava estar preparada, e tinha dúvidas de minha eficiência quando precisasse enfrentá-lo. Sabia que deveria fazê-lo sozinha; era minha responsabilidade, meu destino. Além disso, ninguém deveria descobrir o monstro que eu poderia me tornar caso os planos de Sebastian se concretizassem.
E a voz do vampiro martelava dia e noite em minha cabeça: Seu namorado será o próximo...
Levantei-me de supetão e, com a visão embaçada e sem dar atenção aos meus amigos, voltei para o castelo. Sirius me alcançou quando eu virava o corredor do Salão Principal em direção às masmorras.
— Ari, o que aconteceu?
— Nada — respondi, livrando-me de sua mão. Ele me agarrou novamente e eu me soltei mais uma vez. Sirius, então, segurou-me pelo pulso e me forçou a olhá-lo.
— Como assim, nada? Você se levanta de repente e sem dizer palavra alguma volta para o castelo?
— Eu não estava com paciência para ficar nos jardins com vocês.
— Você não está com paciência para muitas coisas, ultimamente. O que está acontecendo? — ele falou devagar, olhando-me como se quisesse me compreender.
— Nada que te interesse. Sirius, me solta! — exigi quando ele começou a me puxar para uma sala de aula vazia. Comecei a odiar os fundadores deste castelo por construírem tantas salas inúteis.
— Você está mentindo pra mim. Continua tendo aqueles pesadelos.
— E se estiver, o que você pode fazer a respeito? Nada! Você nunca pôde, Sirius.
— Isso não é verdade. Eu sempre estive ao seu lado, Ari!
Notei seu tom ofendido, assim como a mágoa que transparecia em cada traço de seu rosto. Contudo, esta era a oportunidade que eu esperava e precisava.
— Mas isso não é mais o bastante. — E dizer isso me doeu profundamente. O choque no rosto de Sirius era evidente.
— O que você quer dizer com isso?
— Exatamente o que eu disse. — Suspirei, aparentando cansaço. — Nosso namoro não é mais o bastante para mim, você não é mais necessário ao meu lado. Na verdade, você só atrapalhará.
— Espere um pouco. Você está terminando comigo, é isso? Está terminando nosso namoro?
— Exatamente. Estou terminando algo que nunca deveria ter começado.
Sirius riu. Uma gargalhada alta, sem felicidade.
— Você é inacreditável, sabia?
— Vou aceitar isso como um elogio. — Virei para ir embora, mas rapidamente Sirius estava à minha frente, impedindo que eu fugisse.
— Pois não é um elogio — ele disse entre os dentes. — Em que eu te atrapalharia, Ariadne?
— Simples: na minha vida. Desde que estamos juntos, eu deixei de lado tudo o que realmente me interessava. Eu preciso descobrir o motivo desses pesadelos, saber por que eles ocorrem e qual o fundamento de tudo isso. Além disso, preciso descobrir quem matou meu irmão. — Eu sabia a resposta para todos esses questionamentos, porém Sirius sequer suspeitava. — Ficar com você está me atrapalhando, Sirius, e eu não gosto que nada me atrapalhe.
— E de onde surgiu tudo isso? Desde quando eu te atrapalho?!
— Eu já disse, desde que estamos juntos. Namorar ocupa mais tempo do que eu imaginava. E não posso ficar perdendo tempo.
— Então eu sou uma perda de tempo?
— Basicamente? Sim.
Ele acenou afirmativamente, as mãos nos quadris como se não soubesse o que fazer com elas. Eu sabia que deveria aproveitar essa oportunidade e ir embora, mas não tive coragem de simplesmente deixá-lo ali naquela sala.
— Posso ao menos saber como você pretende fazer isso?
O controle em sua voz me deu vontade de gritar mais uma vez. Ele parecia tão obstinado a tirar tudo de mim, como se as verdades que eu lhe ocultava estivessem em uma caixa e bastava apenas girar a chave. Ele claramente tinha esperança de girar essa chave.
Fingindo que não me importava em lhe contar parte dos meus planos, falei, indiferente.
— Pretendo ir atrás de minha tia Françoise. Talvez ela saiba de alguma coisa. E tem também o tal primo com quem meu irmão iria conversar.
— Então você pretende viajar.
— Exato.
— E você acredita que eu atrapalharia.
— Você já me atrapalha, Sirius.
Antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, Sirius me agarrou pelos braços, cruzando a distância que havia entre nós em três passos. Havia raiva em seu olhar e gestos.
— Por que você não me diz toda a verdade? Por que você não confia em mim? — ele perguntou. Percebi que ele não gritava por puro controle. — Droga, Ari, eu gosto de você!
— Eu sei, mas...
— Sabe, mas, mesmo assim, quer ficar longe de mim? Qual o seu problema, afinal?
— Eu não sei! — gritei, soltando-me dele com um safanão. Joguei-me sentada em uma cadeira e procurei me acalmar, porém estava ficando difícil colocar minha cabeça no lugar com tanta mágoa que eu via em Sirius. — Se eu soubesse, não estaria programando a porcaria de uma viagem, Black! Não estaria terminando nosso namoro!
— Você não precisa acabar com nosso namoro porque vai viajar! Eu vou com você e pronto.
— Qual parte do “eu preciso ir sozinha” você não entendeu?
— Eu entendi essa parte — Sirius retorquiu, a voz firme. — Assim como também entendi a parte que você ocultou e que dizia claramente: “estou com medo”.
Hesitei apenas por um segundo. Então me levantei da cadeira e o olhei com desprezo.
— Pois eu não estou com medo. Além disso — continuei sem dar chance de Sirius retorquir —, eu não gosto mais de você. Não dei esse motivo antes, pois não queria machucá-lo.
— Como é? Magoar-me? — Sirius perguntou, rindo.
— É isso mesmo. E não precisa vir com ironias e sarcasmos para cima de mim. Não gosto mais de você, Sirius, e este é o principal motivo de eu não querê-lo ao meu lado, nessa viagem. Confesso que me assusta descobrir o que realmente está acontecendo comigo, mas você não tem mais nada a ver com minha vida.
— Não tenho?
— Não.
— Então prove.
— Eu não te...
Antes que eu alcançasse a porta e finalmente conseguisse fugir dali, Sirius me agarrou e me beijou. Ele sabia que me beijar diminuiria minhas forças sobre qualquer motivo torpe que me forçava a deixá-lo. No entanto, eu estava decidida daquela vez. Essa não seria mais uma briga da qual sairíamos trocando carinhos e sorrisos. Dessa vez, eu terminaria tudo.
Portanto, tão logo senti que ele aprofundava o beijo, empurrei Sirius com todas as forças que eu tinha e, sem nem pensar, apontei-lhe a varinha e lancei a primeira azaração que me veio à mente. Não esperei para ver as unhas dos pés de Sirius crescendo. Saí daquela sala e corri para as masmorras para me esconder na segurança de meu quarto.
Foi difícil manter a pose nos dias seguintes, mas eu consegui.
Até o último dia de aula, quando todas as minhas forças ruíram desastrosamente...
O som de risos, ao longe, despertou-me daquelas lembranças. Rapidamente enxuguei meus olhos, não querendo que nem Aimèe nem Alexey me vissem chorando.
— Então, Dina, quando você vai voltar pra Londres?
Ergui as sobrancelhas, não entendendo o tom direto de Alexey. Olhei para Aimèe e notei um leve rubor em suas bochechas.
— Achei que vocês tivessem algo melhor para fazer, ao invés de cuidarem da minha vida.
— Não estávamos cuidando de sua vida, o assunto apenas surgiu — defendeu-se Aimèe. Alexey sorriu, esperando uma resposta.
Suspirei.
— Provavelmente no fim da semana. Por mais que eu aprecie a companhia de vocês — falei, olhando para Aimèe —, tenho coisas a fazer em casa.
— Quer conversar comigo, antes? — Alexey retorquiu enquanto mordia um bolinho de chocolate.
— Sobre o quê?
— Sebastian.
O tom despreocupado dele era estranho. Será que Sebastian não o preocupava tanto? Ou a fixação do vampiro por mim era algo vulgar para Alexey?
— E o que você pode me informar que já não tenha feito a Arktos?
— Descobri umas coisas, uns dias atrás. — Então Alexey ficou sério. — Tome cuidado no seu aniversário. Na verdade, seria melhor se você estivesse junto de gente para te proteger.
— Por quê?
— No dia do seu aniversário será o dia perfeito para ele finalizar o ritual. Você já terá a maturidade necessária, tanto mágica quanto em poder vampírico e, então, Sebastian só precisará te encontrar.
— Mas eu já sou uma bruxa capaz, e creio que não há o que evoluir quando se é um vampiro.
— A coisa não é bem assim. Chega um momento que seus poderes de vampiro não evoluem mais, é verdade, o que chamamos de maturidade. Se você os tivesse trabalhado durante esses anos, nem Sebastian poderia te tocar. Mas você não fez nada, o que a deixa enferrujada, vulnerável. Claro que você ainda poderia trabalhar tudo isso, aprender com o que tem, contudo eu não conheço ninguém que poderia ajudá-la.
— Que tipo de poderes? — Aimèe perguntou mais rapidamente do que eu.
— Não sei. O meu é persuasão e envelhecimento retardatário. Aimèe tem poder de mexer com ervas; poções, como você conhece. Mas, e você? Para Sebastian querê-la, deve ser algo especial.
— Eu não tenho nada de especial — retruquei com azedume.
— Tem certeza?
— Tenho.
— Absoluta?
— Claro!
— Prove.
— Como assim, prove? Como vou provar que não tenho nada de especial?
— Você não tem nenhuma habilidade que parece mais trabalhada?
— Não.
— Não pode ser verdade. Todos nós temos um dom especial, digamos assim.
— Olha, Alexey — falei, saindo do sério —, eu não tenho nada de especial, a não ser o sangue da minha mãe, que vem de feiticeiros. Só isso. Por isso Sebastian me quer.
— Não estou falando de sua mãe. Falo do sangue do seu pai, sua anta. Ela é tão burra assim? — ele perguntou para Aimèe.
Irritada por ser ofendida, levantei-me com a intenção de sair de perto de Alexey antes que lhe desse um soco no meio daquela cara presunçosa. Porém, assim que me levantei, a jarra de suco estourou.
— Ótimo! — resmunguei. — Obrigada por me forçar a fazer magia sem intenção, Alexey.
— Isso não foi magia — Alexey retorquiu, sorrindo. — Quero dizer, foi sim, mas ampliada por causa do sangue do seu pai.
— Não é por causa do sangue do meu pai. Eu sou uma bruxa!
— Olha aqui, controle esse temperamento adolescente, pois é uma droga. Agora, sente-se. Sente-se — ele repetiu, ao que eu lhe obedeci. — Eu entendo disso há mais tempo que você, então não venha dizer se eu estou certo ou errado. Se eu digo que a magia que aconteceu aqui foi mais influenciada pelo sangue de Koira do que o de Lya, é porque é verdade.
— E como você sabe? — Aimèe perguntou.
— Anos de percepção. Não tenho vinte anos, como pareço. Você está apaixonada por um velho, chérie, já lhe digo.
Aimèe riu. Já eu revirei os olhos diante da gracinha.
— Então eu sou como Aimèe?
— Mais ou menos. Aimèe consegue manipular ervas, fazer remédios que pessoas comuns, ou até mesmo bruxos, não conseguiriam. Diga, Ariadne, em qual matéria você se sobressaía na escola?
— Feitiços, Defesa Contra as Artes das Trevas... Até para Aritmância eu tinha um condão.
— Como eu imaginei. Sempre que você se irrita, você estraga alguma coisa, certo?
— Óbvio que não. Eu consigo me controlar.
— Sim, tivemos um ótimo exemplo aqui. — Alexey indicou a jarra quebrada. — Pelo visto, o seu diferencial é algo relacionado a feitiços e rituais.
Então, o rosto de Alexey perdeu todo o traço de humor, o que não era algo normal.
— O que foi, Lex? — Aimèe perguntou.
— A característica da Dina é a mesma de Sebastian. — Então a leveza voltou para o rosto de Alexey mais uma vez. — Mas quem se importa? Você é metade feiticeira e é bruxa. Se quiser, Sebastian nunca a tocará. É só tomar as providências certas.
Minha mente foi para o diário de tio Timoh. Bem, talvez eu conseguisse ficar segura, ao fim de tudo.
XXX
Não foi fácil voltar para Londres, e minha agonia apenas aumentou quando encarei aquela enorme casa sabendo que nunca mais encontraria Arktos lá dentro. Passei pelos portões, respirando fundo, e os ouvi rangeram de leve ao serem abertos. O jardim estava horrível com a grama alta e muita sujeira. A casa não estava apresentável, também. Camada de poeira sobre os móveis e cheiro de lugar que ficara muito tempo fechado.
Fechei a porta atrás de mim e deixei minhas coisas no chão, ao lado do sofá. Com um aceno da varinha, abri as janelas e limpei todos os cômodos por qual passei. Deixei o quarto de Arktos por último e só não permaneci mais do que o necessário por sentir minha garganta se fechar. Eu não queria ter tempo para pensar na tristeza que aquela casa se encontrava. Aquela imensidão vazia que ela representava. A casa de meus pais havia sido construída para uma família grande, e não para apenas uma ocupante.
Quase ao fim da tarde desci as escadas e fui para a cozinha. Limpei-a e retirei tudo o que havia na geladeira para jogar fora. Vasculhei os armários, porém não havia coisa alguma para comer, pois aquela casa não era cuidada por quase sete meses. Fui e voltei o mais rápido que pude até um mercado que havia perto de minha casa. As coisas boas em se viver em um bairro trouxa era que eu não tinha amigos que sabiam o que se passava no mundo bruxo, então não havia perguntas ou censuras por eu estar andando sozinha.
Com a casa limpa e depois de tomar banho, sentei-me no sofá da sala e comi o sanduíche que havia preparado. O diário do tio Timoh já estava comigo, e entre uma mordida e outra no sanduíche, vasculhei minha mente a fim de organizar o feitiço que prepararia para minha proteção.
O amuleto era simples. Eu precisaria de algo que me ligasse à minha proteção inicial, que foram meus pais, e também a Arktos. Havia um colar que fora de minha mãe que servia perfeitamente: ele fora dado por meu pai no dia que a pediu em casamento, cujo interior oco guardava uma foto dos dois e, ao lado, uma foto minha, ainda bebê, no colo de Arktos. O feitiço deveria ser feito quando o sol estivesse à pino, então eu o deixaria para o dia seguinte.
Contudo, a proteção de minha casa seria uma preocupação. O ritual pedia algumas regras, como usar o primeiro dia do ciclo da lua cheia, que seria dois dias antes do meu aniversário, e a presença de duas pessoas que eu confiaria minha vida. Não que eu não conhecesse tais pessoas, no entanto, eu deveria explicar o motivo desse ritual. Assim que eu lera sobre esse ritual, meu pensamento foi para Severus e Lily. Meu primo sabia de meus problemas com Sebastian, pois ele praticamente me obrigara a falar dias antes de eu ir embora de Hogwarts. No entanto, envolver Lily seria o mesmo que envolver o Potter e, consequentemente, Sirius. Eu teria que dar uma bela desculpa para minha amiga para que ela não fosse dizer sobre os meus problemas a ele.
Preferi deixar tais preocupações para depois. Usando apenas os feitiços que eu conhecia, lacrei minha casa e a protegi de inimigos. Subi para o meu quarto e organizei minhas coisas, como o material de Hogwarts, uniforme e algumas roupas comuns que ainda estavam dentro do meu malão.
Sem querer pensar em nada, terminei rapidamente e me deitei. Cansada como estava, não demorei a dormir.
As duas semanas antes da lua cheia passaram rapidamente. Não me encontrei com Lily ou Severus durante esse tempo, embora tenha mandado carta via coruja aos dois, pedindo – ou melhor, praticamente implorando – que aparecessem no dia certo. À Lily pedi que aparecesse ainda à tarde, pois eu deveria dar-lhe explicações. Para Severus, pedi apenas que aparecesse quando o sol se pusesse. Recebi uma carta de resposta apenas de Lily, confirmando sua presença.
Assim que deu a hora que Lily falou que viria, esperei-a do lado de fora dos portões. Ver minha amiga mandou embora, mesmo que por um curto momento, minhas preocupações.
— Achei que você fosse ficar mais tempo na França com sua tia — Lily falou enquanto passávamos pelos jardins em direção à porta.
— Tenho algumas coisas para fazer em casa. E você, o que está fazendo, agora? Conseguiu algo no Ministério?
— Na verdade, não me interessei por nada. — Somente quando finalmente entramos e a porta estava seguramente fechada que Lily continuou. — O Ministério não é tão seguro para nascidos-trouxas ou quem luta contra Voldemort.
— Você está com seus pais?
— Sim. — Lily então suspirou e recostou-se no sofá, aparentando cansaço. — Estou preocupada com eles. Pedi que fossem ficar um tempo fora, pois seria mais seguro, mas minha mãe está muito doente. Não sei se aguentaria muito bem uma viagem longa.
Por um momento pensei em não jogar em Lily minhas preocupações. No entanto, por mais pena que eu sentisse dos problemas e preocupações dela, eu sabia que apenas ela poderia me ajudar. E ela pareceu perceber que eu não a chamaria para minha casa apenas para matar saudades, pois exigi que ela viesse sozinha.
— Mas, algo me diz que você não me chamou para saber se eu estava trabalhando ou não. Você pensou melhor, não foi? Quer entrar na Ordem?
— Não. Ao menos por agora.
— Mas você disse que queria ser Auror, ou até mesmo uma Inominável! E Aurores lutam contra Arte das Trevas.
— Tenho outras preocupações no momento além de Voldemort, Lily.
— E o que pode ser pior que Voldemort que requer sua atenção? — Lily perguntou quase ultrajada, não entendendo nada do que eu dizia.
Respirei fundo e, com calma, contei a Lily tudo sobre Sebastian. Comecei pelo assassinato dos meus pais, o que significou aquilo, meus sonhos nos últimos anos e terminei com o conteúdo da carta de Arktos. Já era noite quando ela conseguiu assimilar tudo.
— Por isso que você se afastou — a constatação de Lily não me pegou de surpresa. Eu sabia que ela era inteligente e, depois de saber de meus receios e do perigo que eu enfrentaria, não seria difícil que ela percebesse o motivo de eu ter terminado tudo com Sirius. — Por quê, Ari? Acha que Sirius não compreenderá o que se passa e que não é uma opção tua ser o que esse tal de Sebastian quer que você seja?
— Mas eu posso me tornar esse monstro, Lily.
— É a mesma coisa com Remus e Clair, não vê?
— Não tem nada a ver — irritei-me, pois este não era um assunto que eu gostaria de ter. — O Remus não será um monstro eternamente. Além disso, ele só se transforma no ápice da lua cheia, e pode muito bem se trancar para não machucar ninguém. Comigo não será assim. Nada me impedirá. Nem correntes, nem portas fechadas, nada! Por isso eu preciso estar segura, eu preciso acabar com tudo isso antes de envolver vocês todos!
— Mas você está me envolvendo.
— Apenas para um ritual. Eu consegui me proteger, mas isso não é o bastante. Esse amuleto — continuei, mostrando a Lily o colar que estava sob minha blusa — serve para me proteger. Mas o ritual que você fará parte servirá para proteger não só a mim, mas sempre que eu estiver em algum lugar. Pode ser minha casa, a sua quando eu estiver lá... qualquer lugar que eu seja bem-vinda e o dono da casa também seja bem-vindo na minha.
— E isso dará certo?
— Sim. Espero que sim, na verdade.
— E quando vamos começar?
— Quando as duas pessoas que eu confio minha vida estiverem aqui. Portanto, assim que Severus chegar.
Os olhos de Lily quase saltaram enquanto ela se erguia do sofá em um pulo.
— Snape?! Ari, sei que ele é seu primo, mas ele se tornou um Comensal da Morte! Você não pode confiar sua vida a ele!
— Lily, de uma maneira que ninguém entenderá, eu sei que posso confiar minha vida a Severus, da mesma maneira que ele confia a dele a mim.
— Fico feliz em ouvir isso.
A voz arrastada nos assustou, mas, assim como eu reagi ao ver Lily, fiz com Severus. O sorriso saiu automático, e sem nem perguntar como ele conseguira adentrar por minha proteção, corri até ele o abracei cheia de saudades. Ele resmungou alguma coisa, mas não me importei em responder, pois sabia que ele estava tão feliz como eu.
— E mesmo este sendo um bairro de trouxas, seria interessante você usar feitiços de proteção mais eficientes — ele disse quando nos soltamos.
— Eu sei. É por isso que vocês estão aqui.
A troca de olhares entre Severus e Lily não foi a mais amistosa do mundo, porém, assim que expliquei como o ritual funcionava e por que eles estavam ali, as animosidades sumiram. Assim como Lily, Severus faria de tudo para me ajudar e proteger. Não pude deixar de sorrir, mesmo com tantas preocupações; minhas esperanças estavam renovadas.
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NB: Mais um capítulo cheio de emoções e um toque de mistério. Fiquei com pena do Sirius, tadinho :( Desculpe a demora na betagem. Obrigada por me deixar ajudar. Bjs
N/A: Eu nunca fui muito boa com capítulos de transição, pois eles costumam pedir algumas explicações que ficaram pendentes ou que serão necessárias para o futuro. Neste caso, eu precisei explicar um pouco mais sobre o vampirismo que envolve meus personagens.
Espero que tenha agradado!
Beijos.
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