O pior cego é o que não quer v
Capítulo 09
O pior cego é o que não quer ver
(Fato Dois)
Suspirei, colocando um pouco de ditamno em meu caldeirão.
— Já é a segunda vez que você suspira, Ari, e não acho que seja por amor. Vamos, fale logo o que está acontecendo.
Parei de mexer minha poção e olhei para Lily. Minha amiga me encarava como se fosse uma mãe exigindo a confissão da travessura da filha. Senti vontade de suspirar novamente, mas não o fiz.
Duas semanas haviam passado desde que eu aceitara namorar Paul. Não foi uma opção muito inteligente, porém eu não mudaria o que fiz, uma vez que havia alcançado meu objetivo: Black não me importunava mais, o que era maravilhoso! Contudo, o custo de tal satisfação começava a me incomodar.
Paul era inteligente, charmoso e até divertido. Não era de todo ruim namorá-lo. Mas eu não gostava dele como devia, e isso era um enorme problema para nosso relacionamento. Enquanto ele queria andar abraçado, eu me limitava a dar-lhe a mão; ele gostava de ficar no vestiário após os treinos de quadribol, namorando, porém eu fazia de tudo para não ficar isolada com ele por tanto tempo.
Contudo, contar a Lily que eu havia cometido uma enorme burrada e estava arrependida desde o primeiro dia era mais difícil do que admitir a mim mesma.
— Não está acontecendo nada, Lily — falei, firme.
— Claro. É que... Bem, eu não estou acostumada a te ver suspirar pra cima e pra baixo, e fazer isso apenas quando está sem o Paul do teu lado. — Ela verificou a própria poção, apreciando o resultado, e voltou a me olhar. — E então, quando você está com ele, suspirar por estar morrendo de vontade de estar longe. Você está realmente apaixonada, Ari. Seus incontáveis suspiros são de deixar qualquer um com inveja. E o seu olhar também. Tão apaixonado que não sei como Paul ainda não a pediu em casamento.
Fiz uma careta. Lily devia ter ensaiado esse discurso para dizê-lo com tanto afinco e em um tom tão baixo que ninguém mais ouviu.
— E isso está uma droga — ela concluiu.
— E o que você quer que eu faça? — perguntei, irritada e sem encará-la.
— Acrescente mais casca de wiggentree.
Olhei para Lily. Ela sorria, parecendo vitoriosa.
— Tá legal, eu admito que sou uma imbecil. Satisfeita?
— Um pouco. Mas realmente está faltando wiggentree na sua poção, Ari.
Meneei a cabeça, aborrecida, porém acrescentei mais casca de wiggentree em minha poção. Enquanto a mexia, acabei sorrindo. Eu não precisava tornar minha situação tão trágica; ela poderia ser cômica, também. E Lily poderia muito bem me ajudar.
— Eu gosto do Paul, sabe? Mas... não sei. É como se faltasse algo.
— Atração, talvez?
— Se ele não fosse atraente, Lily, em nem sequer teria saído com ele, pra começar.
— Ele é simpático. Parece legal, também.
— E é! — E a olhei, aborrecida. — Por que você acha que pra mim está tão difícil de terminar? Fazer isso com duas semanas de namoro é cruel, Lily.
— E você vai esperar mais semanas e deixar que ele fique mais apaixonado por você?
Não consegui responder a essa pergunta. Eu me sentia entre a cruz e a caldeirinha. Se terminasse com Paul, o magoaria, mas eu me sentiria mais tranquila, além de não enganá-lo mais. Porém, com isso, o Black voltaria a me importunar. E eu era egoísta demais.
Recebi com alívio o sinal que indicava o término da aula. Seria almoço e eu poderia fugir do olhar perscrutador de Lily por algum tempo. Dei a ela um “até logo” e fui para meu salão comunal. Havia combinado com Paul que o encontraria por lá, uma vez que Poções era a única aula que eu não fazia com ele. Nesse momento, ele se encontrava nos jardins, tendo aula de Trato de Criaturas Mágicas.
— Dina!
Parei de andar e me virei para trás, vendo Severus aproximar-se de mim rapidamente. Meu primo também ficara diferente quando iniciei meu namoro. Nos primeiros dias, ele sentira uma raiva que eu não entendia. Somente depois fui perceber que era ciúme. Contudo, Severus não tinha admitido nada disso, eu que o conhecia bem para notar.
Quando eu não estava com Paul ou Lily e Clair, Severus se mostrava tão amoroso que eu sentia saudade da época em que éramos só nós dois, nas férias de verão. Ele me deu um dos poucos sorrisos sem sarcasmo ou ironia quando se aproximou. Porém em seus olhos havia um pouco de malícia; eu entendi o motivo quando ele disse:
— Cadê o namoradinho?
Rolei os olhos, mas sorri.
— Trato de Criaturas Mágicas.
— Ah, é... Esqueci que ele não tem inteligência bastante pra estar em Poções.
— Posso saber por que você está tão animado? — perguntei, querendo que Paul não fosse assunto de conversa.
Severus deu de ombros.
— Nada demais.
— Sei...
— Tem treino, hoje? — Confirmei com um aceno. — Mas por que tão desanimada, Dina? Achei que gostasse de quadribol.
— Só estou cansada. Ainda temos um jogo contra Gryffindor, e o Parkinson está nos matando.
— E com isso você não tem tempo de namorar?
Fechei a cara para Severus.
— Dirija seus sarcasmos e ironias para seus amiguinhos comensais, Severus. Para mim, eu dispenso.
— Isso é uma idiotice, Dina.
Parei de andar e suspirei. Encarei Severus seriamente.
— Eu não me meto em sua vida, Severus, então não se meta na minha. Você vem dizendo que meu namoro com Paul é uma idiotice desde o primeiro dia. Já estou perdendo a paciência.
— Pra ver se você se convence de vez. Ele é um idiota, nem em Poções ele passou!
— Ah, então eu devo estar com alguém bom o bastante para entender Poções?
— Pelo menos.
— Então eu vou ver se o Black está disponível. Ele parecia bem interessado, sabia?
Eu não sei por que Sirius Black foi o primeiro nome que me veio à mente. Bem, eu sabia sim: Severus o odiava. E eu estava com raiva do meu primo. Ao contrário de Lily que apenas me inquirira hoje, Severus estava falando há duas semanas que meu relacionamento com Paul era uma porcaria completa. E eu tinha minha dose – curta – de paciência. E, misto a isso, minha consciência pesava por eu saber que faria mal a Paul com meu egoísmo.
Severus me encarou por alguns segundos raivosamente, mas depois ele se acalmou. Sua expressão ficou fria, assim como sua voz.
— Você é inteligente, Ariadne, faça como quiser. Fique com o imbecil do Paul ou com o retardado do Black, não faz diferença pra mim se você quer ser igual a eles. — E então se afastou, encontrando seus amigos que o esperavam.
Paul me questionou por eu estar mal humorada, mas eu disse apenas que tinha discutido com Severus. Não conversamos muito nas aulas da tarde, que fizemos juntos, porém depois do treino de quadribol eu fiquei mais tranquila. Assim como os livros, o quadribol me tranquilizava.
Passeei com Paul nos jardins depois do treino e namoramos um pouco, sentados em baixo do carvalho perto do lago. Permiti que minha mente não se estressasse com meu namoro maluco ou meu elevado nível de egoísmo. Apenas relaxei e deixei as coisas acontecerem. Com isso, no jantar eu já estava com a cabeça leve e acenei feliz para Lily, sentada do outro lado do salão principal.
— Você tem ronda hoje? — Paul perguntou quando voltávamos para nossa Casa.
— Tenho. Assim que Daves e Wickham voltarem, eu começo.
— Isso quer dizer que só fico com você até às dez horas?
Sorri para Paul, não me importando que ele passasse seu braço sobre meus ombros.
— Exato. E como você quer passar essa última hora e meia?
— Não sei. Eu gosto de conversar com você, Ari, mas se o fizéssemos por mais de uma hora, eu me sentiria como uma velha mexeriqueira.
Eu ri. Entramos no salão comunal e peguei na mão de Paul, puxando-o.
— Bem, a gente pode se sentar em um dos cantos do salão comunal, onde ninguém pode nos ver direito.
— Hum... Interessante. O que mais você tem pra mim? — ele perguntou assim que nos sentamos em uma poltrona grande o bastante para nós.
— Tenho algo mais... — E sorri, permitindo que fosse beijada.
Entre conversas e beijos, o tempo passou rápido, e logo eu estava andando pelos corredores de Hogwarts.
Uma das coisas que eu adorava em ser monitora era o fato de eu ter momentos em que ficava sozinha. Eu conseguia colocar minha cabeça no lugar se estivesse com problemas, ou simplesmente apreciava o silêncio e os momentos de solidão. E ao contrário de alguns monitores, eu não fazia questão de encontrar infratores. Inspecionar detenções era uma perca de tempo e paciência, então, quando eu encontrava algo que não tinha tanta importância, eu disfarçava e fazia um grande barulho para ser notada antes de encontrar quem quer que estivesse andando em horário impróprio. Claro que, quando necessário, eu flagrava tais infratores.
Passando pelos corredores, agradeci mentalmente em não encontrar ninguém. Bocejei e olhei para o relógio, me certificando de que as horas estavam passando rapidamente.
Virei um corredor e tive o vislumbre, através da janela, da lua cheia brilhante. Automaticamente meus pensamentos foram para Lupin. Ele já devia estar na Casa dos Gritos, se contorcendo enquanto se transformava em lobisomem. Meu coração encheu-se de pena e compaixão pelo meu amigo. Ele não merecia nada disso. Por um momento, percebi que meus problemas não eram nada se comparados aos dele, e meu egoísmo em relação a Paul me pareceu ser algo muito mais mesquinho e baixo.
Suspirei e dei meia volta, pronta para voltar às masmorras. Contudo, ao virar a esquina do corredor, ouvi vozes irritadas. Como se pisasse em ovos, aproximei-me de uma sala, cuja porta estava entreaberta.
—... e a McGonagall vai me matar se dessa vez eu não fizer meu dever! — alguém chiou.
— Rabicho, deixa de ser medroso! — Outro censurou. Reconheci a voz do Potter.
— Não é medo, Pontas. Eu quero ir, mas é preciso um rolo de pergaminho! E meu último dever...
— Depois a gente te ajuda, cara. E a McGonagall que espere, pois hoje a prioridade é o Aluado e a Casa dos Gritos. — Dessa vez ouvi o Black. Ao contrário do Potter, a voz dele não estava apenas irritada, mas também firme.
— Vocês me ajudam mesmo?
— Claro! — os dois responderam ao mesmo tempo.
Eu até conseguia imaginar essa cena: Pettigrew segurando as mãos nervosamente enquanto o Potter e o Black quase o pressionavam para conseguir algo. Mas, por quer raios eles queriam ir para a Casa dos Gritos? Lupin estava lá! Transformado em lobisomem! Eles eram loucos ou suicidas? Bem, talvez os dois.
— Certo, então vamos. Almofadinhas, veja se tem alguém por perto.
Foi então que despertei. Se eles me vissem ali, eu não descobriria o que estava acontecendo, uma vez que pressioná-los usando minha autoridade de monitora seria ridículo. Caso Pettigrew estivesse sozinho, eu conseguiria algo, mas com o Potter e o Black junto, seria impossível. Então, corri para o outro corredor e comecei a me distanciar. Sabia que apenas por ali eles conseguiriam sair do castelo, embora eu não conseguisse saber como. Portanto, eu poderia segui-los para saber o que estavam aprontando.
Mas eu esperei e esperei até passar da hora de minha ronda e nada vi. Se eles conheciam outra saída, eu não sabia, porém só podia ser isso. Somente no dia seguinte eu conseguiria alguma coisa.
Quando amanheceu, eu já estava acordada, embora tivesse passado quase a noite toda acordada, pensando em uma maneira de descobrir algo. Como aqueles três fizeram para encontrar Lupin? Como ficaram em sua companhia, na Casa dos Gritos? E como conseguiram passar por mim? Eu sabia que o Potter tinha uma capa da invisibilidade, porém, nem sequer o som de passos eu ouvi.
Meneei a cabeça e me levantei. Troquei de roupa rapidamente e fui até o salão principal. Para que meu plano desse certo, primeiro eu tinha que me encontrar com Clair. Obviamente, minha amiga já estava acordada. Ela sempre acordava mais cedo quando seu namorado se encontrava na enfermaria. Sem me importar com os olhares estranhos, me sentei junto dela.
— Bom dia, Clair.
— Bom dia, Ari. Acordada tão cedo? — ela sorriu.
— Pois é. — Contei até cinco antes de continuar com a voz baixa. — Você está indo ver o Lupin?
Clair olhou para os lados, certificando-se de que estávamos isoladas, para só então responder:
— Estou. Madame Pomfrey termina de cuidar dele mais ou menos há essa hora, e então eu levo algo pra ele comer.
— Posso ir com você? Faz tempo que não converso com o Lupin.
O sorriso de Clair foi tão carinhoso que por um momento me senti mal por estar usando minha amiga.
— Ah, Ari, o Remus vai adorar te ver. Além disso, você pode me ajudar a levar essas coisas, embora que, dessa vez, o Remus tenha dito que estava se sentido mal e não que era sua mãe que estava doente e precisava dele. Portanto, ninguém vai estranhar se me vir levar comida para a enfermaria.
O Lupin, em alguns momentos, dissera que era sua mãe quem se sentia mal e deveria visitá-la. Essa desculpa foi usada mais frequentemente nos três primeiros anos da escola, porém, depois de algum tempo, era ele quem se dizia doente, pois eram apenas três dias que ficava na enfermaria. E uma vez que ele fazia de tudo para não chamar atenção no decorrer dos dias em que estava são, quase ninguém sentia a falta dele, e apenas pensava que ele era frágil demais e adoecia facilmente, como a mãe.
— Eu não me importo. — Então tive uma inspiração. — Que tal levar um pouco de suco, também? — E enchi um copo sem esperar a resposta de Clair.
Assim que chegamos à enfermaria, Clair pediu para eu segurar os bolos que ela trouxera para poder espiar se Madame Pomfrey estava perto de Lupin. Como não estava, entramos em seguida.
Quando Lupin chegara em Hogwarts, ele já possuía algumas cicatrizes discretas, mas com a palidez do dia seguinte à transformação elas ficavam evidentes de uma maneira arrepiante. Eu o tinha visto apenas uma vez depois que ele chegava das transformações. Por isso que, ao vê-lo hoje, notei que havia mais vida em seus olhos. A princípio achei que fosse a presença de Clair, mas depois lembrei que seus amigos haviam passado aquela noite com ele. Não sei como haviam feito aquilo, no entanto era para isso que eu estava ali.
Deixei que o casal se cumprimentasse antes de me fazer notar.
— Olá, Lupin. Você está bem?
Ele deu de ombros. Pareceu-me que esse gesto lhe doía os ossos.
— A Ari quis vir comigo hoje — sorriu Clair. — Ela até me ajudou a trazer bolo e suco de abóbora.
— Fazemos de tudo pelos amigos, não é, Lupin?
O sorriso dele em resposta foi sincero.
— Sim, é verdade. — A voz dele estava um pouco rouca. — O que vocês trouxeram pra mim?
— Bolo comum, que eu sei que você gosta — Clair respondeu, sentando-se ao lado dele, na cama — e também um recheado de creme.
— Obrigado, Clair.
Clair sorriu e se abaixou para dar um rápido beijo nos lábios de Lupin. Eu odiaria atrapalhar aquele momento que parecia um bálsamo para meu amigo, porém minha curiosidade era muito forte. Pigarreei discretamente e dei um passo em direção ao casal. No momento que Clair virou-se para mim, parecendo envergonhada como se tivesse se esquecido de minha presença, fingi tropeçar e derrubei todo o suco em seu uniforme.
— Oh, Clair! Me desculpe! Droga, que desastre — falei, gostando de minha atuação. — E não tem nada aqui pra você usar pra se secar.
— Tudo bem, Ari, não tem problema — minha amiga respondeu, educada, porém percebi que ficou aborrecida. Bem, eu não podia culpá-la. — Remus, vou trocar de blusa e volto em poucos minutos. Ari, você faz companhia a ele?
— Claro. É o mínimo que posso fazer, não?
Clair despediu-se do namorado e então nos deixou sozinhos. Acompanhei-a com o olhar e depois verifiquei se Madame Pomfrey estava perto. Como não a vi, me aproximei novamente de Lupin. Disfarcei meu nervosismo com embaraço. Eu precisava ser cuidadosa quando fosse rondá-lo com indiretas, pois Lupin não era nenhum idiota para cair em qualquer armadilha.
— Desculpe, Lupin. Agora você tem que ter minha companhia, e não a de Clair.
— Sem problemas, Lakerdos — ele sorriu.
— Me chame de Ariadne. Afinal, somos amigos, não, Remus?
— Bem, eu a considero uma amiga, uma vez que você guarda um segredo meu até mesmo de seu primo.
— O Severus nem sequer imagina que eu sei sobre você, Remus. Se ele desconfiasse, então nunca me perdoaria por não ter dito nada a ele. Por enquanto, você ser um lobisomem é apenas uma teoria que eu tento tirar da cabeça dele.
— Ele vai acabar descobrindo, já que está tão disposto a isso.
— Mas nunca por mim, tenha certeza.
— Eu confio em você, Ariadne.
Desviei os olhos, embaraçada. Remus confiava em mim, e aqui estava eu, tentando arrancar uma confissão sobre como seus amigos entravam na Casa dos Gritos.
— Sabe, não são todos que acham que somos dignos de confiança. Os slytherins, quero dizer. Aposto que seus amigos não pensam o mesmo que você.
Dessa vez foi Remus quem se mostrou embaraçado.
— Eles não sabem que você sabe.
— Oh... Claro. Afinal, por que você contaria, não é?
— Verdade. Não quero ser azarado por eles — Remus riu.
— E por que seria?
— Se eles desconfiassem que você guarda esse segredo há mais tempo que eles, eu seria um homem morto.
— Como assim?
— Eles descobriram apenas no terceiro ano.
— Quer dizer que eu tenho algo para me vangloriar com o Potter e o Black?
— Você é maluca por gostar disso — Remus meneou a cabeça. — Sabe, às vezes você me lembra muito o Sirius.
Fechei a cara.
— Eu não tenho nada a ver com o Black, obrigada.
— Se você diz... Porém eu ainda acho que vocês se merecem.
Sem me conter, senti meu rosto esquentar.
— Sabe, Remus, embora eu não goste dos seus amigos, eu devo tirar meu chapéu para eles.
— E por que você faria isso?
— Bem... — Olhei para os lados, fingindo verificar se havia alguém. Então baixei a voz. — Eles encontraram um jeito de ficar com você na Casa dos Gritos, durante a transformação. Eu nunca pensaria em algo assim. Realmente inteligente.
— Quem te disse que...
— Pode ficar tranquilo, não vou contar a ninguém — apressei-me a falar. — E por que eu faria, se isso te ajuda, Remus? Eu guardo seu segredo há tanto tempo, que mais esse não faz diferença, já que faz parte do mesmo segredo. É por isso que, nessa questão, eu os admiro. Quero dizer... Ter a oportunidade de estar com você em um momento tão difícil, não é? Eles são realmente espertos. Eu não acho que conseguiria realizar tanto.
— Eu ainda não entendo o que você quer dizer.
Eu sorri, indulgente. Tinha apenas mais uma tacada.
— Ontem, em minha ronda, eu ouvi seus amigos conversando. Foi sem querer, eu não estava espionando. Mas acabei ouvindo tudo.
Olhei Remus por um momento, querendo que ele se pronunciasse, que me desse uma dica, que todo meu plano não fosse em vão. Percebia sua cabeça funcionando, até que ele disse, como se fosse uma confissão:
— Sim, ontem era seu dia de ronda. Logo após o meu, não?
— Pois é.
Ele então fez uma expressão culpada.
— Eu não pedi que eles fizessem isso, sabe? Quebraria muitas regras.
— Entendo. Mas como você conseguiria ficar sozinho, não é mesmo? E se eles o ajudam com isso, como posso culpá-los?
Eu estava dando tantas voltas, que não sabia como Remus não notava. Ou ele estava necessitado em desabafar, ou eu era realmente muito boa em atuar.
— É que ao menos com eles por perto, eu não destruo muito ou fico me machucando. O James e o Sirius ajudam muito por serem maiores.
— Eu fico imaginando como fica a Casa dos Gritos — ri, tentando esconder minha ansiedade. Algo começava a se formular em minha cabeça, mas ainda não tinha certeza se essa perspectiva poderia ser verdadeira.
Remus apenas deu de ombros.
Fiquei em silêncio por um momento, tentando colocar minhas ideias em ordem. Porém, ouvi Clair voltar, então inventei uma desculpa qualquer e saí da enfermaria.
Uma coisa era certa: Remus recebia visita na Casa dos Gritos quando se transformava em lobisomem. No entanto, se humanos se aproximassem de um lobisomem seriam imediatamente mordidos. Apenas animais poderiam se aproximar sem correrem maiores riscos.
Estaquei no corredor.
Não. Absolutamente não! Como eles teriam conseguido isso, sendo que apenas no sexto e sétimo anos se aprofundava tal aprendizado? Além disso, seria necessário ficarem horas estudando na seção reservada da biblioteca. Fora o enorme risco que poderiam correr por fazerem algo sem supervisão especializada!
Como se fossem guiados por meus pensamentos, vislumbrei Black, Potter e Pettigrew no corredor. Com certeza eles estavam indo visitar Remus. Entreouvi o apelido deles, o que me fez imaginar outras coisas. Remus era chamado de Aluado. Obviamente era por se transformar em lobisomem, e a lua ser o centro de tudo. Quanto aos outros apelidos, Pontas, Almofadinhas e Rabicho, eu não fazia ideia de onde vinham, mas com certeza era por causa de seus animagos. Porém minha imaginação não era boa o bastante para associar os apelidos aos possíveis animais em que eles se transformavam.
Deus, aqueles três eram animagos! Se Dumbledore descobrisse, poderiam ser expulsos! E se Severus sequer sonhasse, seria um prato cheio!
Meneei a cabeça. Severus nunca descobriria. Ao menos não por mim. Como eu disse a Remus, não trairia sua confiança. E se eles ajudavam meu amigo em suas noites perturbadoras, eu não faria nada para causar-lhes problemas.
Fingi não ouvir quando perguntaram se eu estava bem, pois eu parecia uma maluca, parada naquele corredor, olhando para eles como se fossem uma visão do inferno. Fui para meu dormitório e peguei meus livros. Perdida em pensamentos, guiei-me para a primeira aula.
Vez ou outra, Paul me questionava, perguntando por que eu estava tão aérea. Quando ele fazia isso, eu desconversava, dizendo que era nada, estava apenas preocupada com as provas finais dali um mês; e sem me segurar, acabava lançando olhares para a mesa onde se sentavam Black e Potter.
Por um momento, isso passou despercebido, mas eles começaram a notar minha atenção. Decidi parar com isso. No entanto, a ideia de eles serem animagos me pegou tão de surpresa quanto Remus me confessar que eles iriam como humanos para a Casa dos Gritos.
O dia passou rapidamente. Eu consegui esquecer toda essa história de animagos e lobisomem quando percebi o tanto de deveres que deveria fazer. Refugiei-me na biblioteca quando pude juntamente com Paul, pegando primeiro o livro de Poções. Depois de um tempo suspirei.
— Algum problema, Ari? — Paul perguntou.
— Não. Só vou pegar outro livro. Quero melhorar minha dissertação sobre venenos. Já volto.
— Tudo bem.
Caminhei lentamente para uma estante perto da seção reservada, procurando por algo que me interessava. Entretanto, quando passei por alguns livros sobre transfiguração, não resisti. Peguei um que falava sobre animagia e comecei a lê-lo com afinco. Não notei que estava sendo observada, portanto quase pulei de susto quando Sirius Black materializou-se em minha frente.
— Black! — disse entre os dentes. — Por acaso isso vai virar alguma rotina? Pare de assustar os outros, pelo amor de Deus.
Intentei voltar para minha mesa, mas ele se colocou em minha frente. Abri a boca a fim de mandá-lo sair de minha frente, porém a feição séria dele me manteve quieta. Ele nunca me encarara daquela maneira antes. Entretanto me recuperei.
— O que você quer agora?
— Exigir que você guarde segredo.
— Sobre o quê, posso saber?
— Não somos idiotas, Ariadne, portanto não vamos nos tratar assim. A sua cara te condena, assim como esse livro.
Olhei para o livro que tinha em mãos. Dei de ombros.
— E não acho que a McGonagall tenha pedido um trabalho sobre animagia, e sim sobre as consequências danosas que uma transformação mal feita em humanos pode ocorrer com a mente.
— E quem é você para me pedir algo, Black?
Black então se aproximou de mim, de modo que eu conseguia sentir a respiração dele em meu rosto. Toda aquela altivez me deixou receosa, e acabei dando um passo para trás. Ele me segurou tão logo percebeu que eu pretendia me afastar.
— Não sei que tipo de artimanha você usou para tirar isso do Remus. Só saiba que nós não decidimos levianamente nos transformar em animagos, Ariadne. Fizemos isso, pura e simplesmente, para ajudar nosso amigo. Antes de fazermos isso, ele sempre voltava em um estado lamentável, depois das transformações. Agora, pelo menos ele consegue superar bem melhor. Sei que você tem o Remus em alta estima, então, para que ele não se sinta pior do que já se sente, não conte a ninguém.
Doeu ouvi-lo pedir que eu não contasse um segredo dele pelo bem de Remus. O Black poderia muito bem pedir por si mesmo. Eu atenderia da mesma maneira, uma vez que era para o bem de alguém. Por isso minha resposta saiu com mais agressividade do que eu pretendia.
— Pois é realmente pelo Remus que eu guardo esse segredo, Black. Ninguém mais. Por ele, entendeu? Não por você, ou seus amigos imbecis. Eu sei quando algo faz bem a alguém. Não sou tão mesquinha assim. — Então me soltei dele com um safanão.
— Você vai guardar esse segredo até de seu primo. Caso o Snape saiba disso, vocês dois se arrependerão.
— Está me ameaçando, Black?
— Não, Ariadne. Apenas dizendo que, se Remus se prejudicar, vocês não vão gostar das consequências de seus próprios atos.
Vi Black se distanciar, entretanto não permiti que ele saísse dessa maneira, com essa ameaça no ar. Quem ele pensava que era? Segurei-o pelo braço e o fiz me encarar.
— Para mim, isso foi uma ameaça, Black. E eu não admito ser ameaçada, ouviu?
— Estou apenas te pedindo que não diga nada. — Ele então suspirou. — Ariadne, se algo assim vazasse, Remus seria expulso da escola, seria a desculpa perfeita. Alienar três estudantes para que fiquem perto de um lobisomem.
— Que tipo de pessoa você pensa que eu sou? — perguntei, ofendida. — Eu nunca faria mal a alguém se pudesse evitar, Black! E Remus tem minha confiança, eu não vou traí-lo.
— Fico feliz por isso — ele sorriu. E então continuou, a voz amarga: — Ainda bem que nesse ponto você é diferente do seu primo.
— O que você quer dizer?
— Nada. Só diga para o Snape não ficar procurando.
Cruzei os braços.
— Pode ficar tranquilo. Snape nunca vai descobrir sobre vocês e o Remus, se isso depender de mim.
— Que bom. Afinal, penso que, caso eu tenha que ter uma conversa com ele sobre isso, não será nada boa. Principalmente o fim da conversa — ele sorriu.
— E o que aconteceria no final? — perguntei desconfiadamente, meu instinto protetor para com meu primo falando alto.
— Na conversa que eu teria com ele, não aconteceria isso.
Abri a boca para questioná-lo, pois não entendi. Porém antes que qualquer som saísse, Black me beijava novamente.
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N/B Pri: Nossa, eu amo esse Sirius Black determinado e leal. E adoro as discussões dele com a Ari. Não vejo a hora desses dois se entenderem. E para isso, eu preciso do próximo capítulo, kkkkk. Perfeito, Liv. Parabéns.
N/A: Sim, eu também gosto das discussões entre a Ari e o Sirius, pois nesses momentos ela costuma se mostrar mais verdadeira do que quando está esnobando ele.
E não se estresse, Beta, pois prometo que o próximo capítulo virá logo. =D
Beijos a todos.
Até mais,
Livinha.
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