Alcaçuz e Cereja



Capítulo 07


Alcaçuz e Cereja


 


Acordei no dia seguinte com Louise me chamando.


— Você ainda está dormindo?


Eu abri meus olhos preguiçosamente e ia perguntar por que raios ela estava me acordando tão cedo em pleno sábado. Então vi com que roupa minha amiga estava vestida: uma blusa de meu uniforme de quadribol que eu lhe dera há dois anos por não me servir mais.


Despertei na hora, xingando alto. Eu havia esquecido que tínhamos jogo hoje.


— O Parkinson vai me matar – resmunguei enquanto procurava meu uniforme para depois me enfiar no banheiro. Saí de lá em tempo recorde. — Quanto tempo tenho, Louise?


— Meia hora.


Eu xinguei de novo.


— Desculpe, Ari, achei que você tivesse saído, já que seu cortinado estava fechado – ela me explicou. — Mas quando saí, o Paul estava te esperando.


Parei de vestir meu tênis.


— O Paul? Como ele estava.


— Nervoso, claro.


— Como assim, nervoso?


— Bem, acho que ansioso é a palavra certa. Ande logo, Ari!


Cinco minutos depois, eu saí de nosso quarto e vi Paul. Ele estava bem agitado. Automaticamente lembrei nossa conversa de ontem e me senti um pouco constrangida. Eu havia ficado muito tempo pensando nessa conversa, o que rendera uma boa noite de insônia. Além disso, também havia as palavras do Black que martelavam e minha mente. Eu ainda não sabia dizer e nem entender por que as palavras daquele gryffindor idiota me afetaram.


Meneei a cabeça, querendo me livrar desse pensamento ,quando alcancei Paul. Sem parar de andar, peguei-o pelo braço para que me acompanhasse.


— O que aconteceu? – ele perguntou enquanto saíamos do salão comunal.


— Perdi a hora – falei simplesmente, relanceando seu rosto. Senti-me aliviada por ver a ansiedade dele sumir, substituída apenas por pressa; também havia espanto pelo que eu dissera.


— Você nunca perde a hora, Ariadne.


— É, é, eu sei. Vamos mais rápido? Não quero o Parkinson me enchendo a paciência.


— Ele vai encher.


Eu não respondi, apenas fiz uma careta. Parkinson era o tipo de capitão que queria ter seus jogadores agrupados no vestiário por pelo menos quinze minutos antes do jogo. Parecia que ele discursava pelo simples prazer de ouvir sua própria voz. De vez em quando, também, ele dava algumas dicas de jogadas de última hora que valia à pena ouvir.


Mesmo atrasada eu passei no salão principal e peguei uma maçã. Não queria desmaiar em pleno voo. Quando estávamos nos jardins, perguntei para Paul se fora o Parkinson quem falou para ele me chamar.


— Não. Quero dizer... Como você não tinha chegado ainda no salão principal, ele me perguntou sobre você. Então eu disse que iria te chamar.


— Ainda bem que a Louise estava lá, então. Caso contrário, eu ainda estaria dormindo, pois não há como você entrar no meu quarto.


— Eu daria um jeito de te acordar, mesmo assim – ele falou dando de ombros. — Não tenho interesse em perder o jogo, sabe?


— Sim, sim, eu sei que sou a jogadora fundamental desse time. – Embora eu falasse séria, Paul conseguiu perceber o humor escondido em minha frase arrogante.


— Sabe que eu acho engraçada essa sua prepotência fingida? Quero dizer, essa sua tão bela modéstia?


Eu ri e lhe fiz uma careta. Entretanto, me senti um pouco incomodada por ele me conhecer bem e conseguir interpretar tão bem meus atos. Não respondi nada a Paul, pois havíamos chegado ao vestiário. Assim que entrei, meus olhos foram para o relógio na parede. Eu estava muito atrasada.


— Merda – murmurei.


— Ah, finalmente você nos deu a graça de sua presença, Lakerdos. – Fiz uma careta de desgosto ao ouvir Parkinson. — Bem, agora que estamos todos aqui, tenho minhas últimas instruções.


Enquanto ouvíamos Parkinson dizer o quão forte o time da Ravenclaw estava, eu comecei a trançar meus cabelos para depois colocar minhas luvas e proteções. Não tinha novas instruções, mas ele falou o tempo todo. Como eu disse, ele gostava de ouvir o som da própria voz. Dois minutos depois de ele ter terminado o discurso – juro, aquilo não eram instruções, era um discurso! –, fomos para o campo.


O tempo estava um pouco quente, mas pelo menos o céu estava com nuvens suficientes para ocultar o sol a maior parte do tempo. Não haveria nada me atrapalhando a visão.


— Devo te desejar boa sorte? – Paul me perguntou quando o alcancei do lado de fora. Eu sempre era a última a deixar o vestiário.


Sorri para ele.


— Sorte é sempre bem-vinda. Só que eu acho que o Stanton precisará de muito mais – falei me referindo ao apanhador da Ravenclaw.


— Ah, mas não tem tanta graça desejar sorte para ele.


Paul colocou a mão em meu rosto e se inclinou, encostando nossos lábios. Foi um beijo curto, uma vez que não tínhamos tempo para prolongá-lo, mas apaixonado. Ao menos da parte dele.


— Boa sorte – ele falou. Sorri em resposta e me posicionei no campo.


Eu tentei esvaziar minha mente de tudo que não se referia ao jogo, como eu sempre costumava fazer , ma não obtive muito sucesso. Meus olhos procuravam pelo pomo-de-ouro, só que às vezes minha visão se embaçava por eu estar olhando muito para uma direção, porém sem realmente ver alguma coisa.


Estávamos no ar há poucos minutos, nenhum gol marcado, e minha cabeça continuava cheia de pensamentos. Eu pensava em meu sorriso forçado quando Paul me beijou, desejando sorte. Pensava no fato de ele estar me conhecendo e me entendendo bem demais para o meu gosto. E, mais que tudo, eu pensava em Paul estar apaixonado por mim. Sabia que não era o momento de estar pensando nisso tudo, porém não conseguia limpar minha mente.


Percorri meus olhos pelo campo, voando um pouco mais alto, a fim de procurar o pomo. Não me perdoaria se perdesse esse jogo por falta de concentração. Vi um brilho dourado perto da arquibancada onde estavam os alunos da Gryffindor e automaticamente dei uma guinada em minha vassoura. Porém percebi que era apenas o brilho de um relógio. Bufei alto, mas vi que Stanton também se confundira.


— Vendo demais, Lakerdos? – ele gracejou, parando ao meu lado.


Olhei-o com desdém.


— Como se você não tivesse visto também, Stanton. – Saí, então, de perto dele.


Decidi me concentrar mais, uma vez que eu parecia um arremedo e apanhadora nesse jogo. Porém minha atenção foi desviada novamente. Enquanto meus olhos passavam pela arquibancada perto de mim, visualizei Lily. Os cabelos dela, soltos, pareciam labaredas por causa do vento. E embora tivesse achado isso interessante, não levei nem dois segundos olhando-a. Fora Sirius Black quem capturara minha atenção.


Ele estava me encarando. Muito. Pelo seu olhar, ele devia estar fazendo isso há um bom tempo. Senti um arrepio correr pela minha coluna ao mesmo tempo em que um friozinho se alojava em minha barriga. Não desviei o olhar. Não conseguia. Havia algo naqueles olhos, uma intensidade tão estranha...


— Lakerdos! – Virei-me assustada. Era Crosmwell. — Que merda você está fazendo?


— Cuida da sua goles, Crosmwell!


— Então você trate de cuidar do seu pomo! Ou vai deixar o Stanton pegá-lo?


Olhei para onde ele apontava. Droga!


Durante o tempo que fiquei encarando Black e questionando o motivo daquele olhar, o apanhador da Ravenclaw parecia ter visto algo. Quando direcionei minha vassoura para perto dele, vi o pomo. No entanto, por mais rápida que eu conseguisse ser, ele estava mais perto da bolinha dourada. Ouvi a voz do locutor perfurar meus ouvidos ao mesmo tempo que a torcida da Ravenclaw gritava e aplaudia.


— E RAVENCLAW VENCE!


O placar final não fora tão ruim: 210 a 130. Poderíamos reverter e ganhar a taça se ganhássemos da Gryffindor no próximo jogo. Mas eu sabia que iria ouvir muita porcaria em alguns segundos. Então tratei logo de ir para o vestiário. Não queria ouvir sermão e repreensão em público.


A porta do vestiário pareceu explodir segundos depois que eu entrei.


— Qual é o seu problema, Lakerdos? Que droga aconteceu lá em cima? – Parkinson parecia espumar de raiva.


— Aconteceu que eu perdi o pomo-de-ouro, Parkinson. Foi isso.


Eu sabia que não havia explicação para como eu havia agido: esquecendo-me do jogo e ocupando minha mente com coisas irrelevantes para o momento. Por isso mesmo dei essa resposta. Além, claro, do fato de eu não conseguir ficar quieta quando me afrontavam.


— Foi isso?! É isso que você me diz, Lakerdos?


— Eu raramente perco o pomo, Parkinson, e essa não foi a primeira vez.


— Mas quando você perdia era porque realmente teve má sorte. Dessa vez, não foi assim. Você parecia dormir em cima daquela vassoura! Não dormiu o bastante noite passada, por acaso?


— Ela não parecia dormir, e sim pensar em algo – Richard Smith, um dos batedores, disse.


— E em quê você tanto pensava que não lhe permitia prestar atenção no jogo? – Parecia que Parkinson iria enfartar enquanto me perguntava essas coisas. O rosto dele mudava cada vez mais de tom. Daqui a pouco ficaria roxo. Ele então se virou para Paul. — Você não disse que havia conversado com ela, Paul?


Olhei para Paul, sem entender. A expressão dele era dura, embora suas bochechas estivessem levemente coradas.


— Eu disse que ela estava bem, não que tínhamos conversado.


— Mas quando eu estive mal? – perguntei ultrajada. Não gostei de saber que era assunto de conversa alheia.


— Quando você teve aquele pesadelo – Paul falou, tentando soar calmo e compreensivo.


— E passou quase todo o dia feito um zumbi – completou Crosmwell tão irritado quanto os outros.


Olhei para meus companheiros de time. Smith estava encostado na parede com os braços cruzados, me encarando; Sean White, o goleiro, e Ben Andersen, o terceiro artilheiro, pareciam entretidos em uma conversa. Pela suas feições, o assunto deveria ser eu.


— Isso é ridículo e sem fundamentos! – irritei-me.


— Verdade? – White perguntou sarcasticamente e andando em direção à saída. — Então eu acho bom você rever o que te fez bancar a idiota lá em cima, Lakerdos, pois não queremos perder a taça.


— Vocês falam como se fossem perfeitos – cuspi de volta e não deixando que aquele idiota saísse, me deixando falar sozinha. — O Smith quase acertou Paul com um balaço, hoje, e você – virei-me para Ben Andersen – falhou várias vezes. Por que eu devo ser sacrificada aqui?


— Porque ninguém, além de você, Lakerdos, ficou encarando a torcida da Gryffindor o tempo todo.


Olhei para Crosmwell quando o ouvi. Senti o olhar de Paul em mim enquanto eu me perguntava o que exatamente aquele artilheiro havia visto.


— Eu não encaro a torcida – falei entre os dentes. – Eu procuro o pomo, seu retardado.


— Claro... Olhando para apenas um lugar, certo? Boa apanhadora você é, Lakerdos. Vejo vocês lá dentro.


Fechei minhas mãos em punho. Minha vontade era mandá-los ao inferno e sair dali antes que todos deixassem o vestiário, mas preferi fechar os olhos e respirar fundo. Virei-me para a parede, preferindo encarar o nada a ver o olhar curioso e compreensivo de Paul. Será que Crosmwell percebera para quem eu olhava e contara para Paul?


Droga, além dos meus colegas de time, ainda tinha que lidar com um cara apaixonado. Grande!


— Ariadne, o que houve?


— Nada. – Minha voz saiu mais dura do que eu pretendia. Mais segura comigo mesma, virei para encará-lo. — O que Parkinson quis dizer com aquilo?


— Aquilo o quê?


— Sobre você conversar comigo.


— Ah... Ele queria que eu te perguntasse se você estava apta par ao jogo de hoje. Eu disse que conversaria com você, mas notei que você não queria conversar sobre aquele pesadelo. Então, você se mostrou mais disposta, e eu disse a ele que você estava bem.


Paul falou muito rápido, e eu notei que ele não se sentia à vontade em confessar isso. Porém um brilho de irritação perpassou pelos olhos dele.


— Eu posso saber o que você tanto observava na arquibancada da Gryffindor?


Olhei para ele surpresa com a pergunta.


— Ah, não! – irritei-me. — Você não vai ter crise de ciúmes, não é?


As bochechas de Paul ficaram incrivelmente vermelhas. Percebi que não foi apenas de vergonha.


— Não estou tendo uma crise de ciúmes. Mas sei que você não estava procurando o pomo, também. Percebi a insinuação na voz do Cros quando ele falou com você.


— Para o inferno, então, o Crosmwell e as insinuações dele! E eu não vou ficar aqui ouvindo porcarias de você, Paul.


Dirigi-me até a porta, contudo Paul me segurou pelo pulso. Livrei-me dele com facilidade.


— Nós temos que conversar. Para quem você estava olhando?


— Eu não vou te dar satisfação – falei óbvia. — Nós não namoramos, Paul, então não acho que tenha que lhe contar tudo.


— Então por nós não sermos namorados, você vai ficar olhando para outros garotos? Deixe de ser infantil, Ariadne.


— Deixe você de ser infantil, Paul, e me poupe desse ciúme idiota.


Então saí do vestiário, não deixando que Paul me irritasse mais ainda com essa conversa típica de namorados.


Eu não o vi o resto do dia, uma vez que me enfiei em meu quarto por quase toda a tarde, salvo quando tomei banho no banheiro dos monitores e fui até a cozinha pegar algo para comer, já que havia perdido o almoço.


Durante o tempo que fiquei sozinha, tentei, sem sucesso, não pensar no que acontecera mais cedo e na noite anterior. Contudo, percebi mais uma vez que meus pensamentos tinham vida e opiniões próprias.


O ciúme de Paul depois do jogo me irritou de maneiras diferentes, eu percebi. Primeiro foi por realmente nós não termos um relacionamento que desse espaço para ciúmes. Ainda estávamos na fase de nos conhecermos, e foi exatamente isso que eu lhe esclareci noite passada: sem pressa. Segundo por eu não gostar de ser cobrada. E a outra maneira que o ciúme dele me irritou foi justamente pelo motivo que o levara a sentir ciúme: eu encarando outro garoto. Eu encarando Sirius Black.


Com certeza eu estava louca por ter feito isso. Como se não bastasse eu achá-lo bonito, ontem, hoje eu o encarei demoradamente. E lembrar que eu o encarara fazia-me lembrar do estranho arrepio e frio na barriga que eu havia sentido.


Essas sensações eu só tinha quando sentia medo de algo, porém em que o Black me assustava? Ele era apenas um imbecil, não um cara perigoso procurado pelos aurores. E, por todos os deuses, por que me lembrar dele fazia algo frio se alojar em minha barriga?


Decidi sair do meu quarto e dar uma volta pelos corredores. Quem sabe com a caminhada minha cabeça parava de funcionar? Eu ainda tinha algum tempo antes do horário em que todos deveriam estar em seus salões comunais. Portanto, passei direto pelo meu salão, nem sequer olhando para os lados. No entanto pude relancear brevemente o grupo do time da minha Casa com outros colegas.


Preferi percorrer um atalho conhecido, mesmo os corredores estando vazios. Rapidamente cheguei ao segundo andar e em uma sala que não era usada. Eu havia me acostumado a vir aqui desde o ano anterior, quando comecei a ter meus pesadelos depois das férias do quinto para o sexto ano. Não era um lugar muito visitado, uma vez que a janela dessa sala ficava justamente embaixo da janela do dormitório do Prof. Donne. A certeza de que ninguém se aventuraria para essa sala era o que me fazia gostar dela.


Aproximei-me da janela e fechei um pouco meu casaco para me proteger do vento gelado, embora apreciasse a sensação dele em meus cabelos e rosto. Meus olhos se perderam na vista: um pedaço do lago e uma densa floresta que parecia esconder alguma coisa, porém de uma maneira diferente da Floresta Negra.


Contudo, depois de um tempo minha cabeça voltou a lembrar o que estava me atormentando. Eu não poderia mantê-la vazia por muito tempo. Muita coisa me perturbava, uma vez que nos meus problemas um levava ao outro. Por isso mesmo decidi definir prioridades.


Paul era o problema que eu deveria e conseguiria resolver primeiramente. O ciúme dele fora algo que havia me pegado de surpresa e me incomodado. Eu havia tentado de verdade gostar dele, me envolver, porém estava difícil. Havia atração entre nós sim, senão eu não estaria com ele por esse tempo, porém às vezes não gostava de estarmos juntos em determinados momentos, como se a companhia dele me incomodasse. Amanhã eu daria um ponto final em nosso relacionamento. Se é que eu pudesse chamar de relacionamento o que tínhamos...


O segundo problema eram meus pesadelos. Todavia eu não os entendia, não sabia de onde eles vinham. Havia algo estranho em tudo isso, pois como eu poderia sonhar com a morte dos meus pais ou com eles daquela maneira? Eles me lembravam inferis, mas ao mesmo tempo bem vivos. Eu conversaria com Arktos nas férias de verão, uma vez que, se meus pesadelos seguissem a constância desde que começaram, eu somente sonharia novamente neste verão. Realmente animador.


E ainda tinha um terceiro problema: Sirius Black. Eu não o entendia em absoluto. O que o levava, de um dia para o outro, a me perseguir? A me observar, como ele mesmo dissera? Não entendia qual o propósito disso, e me sentia incomodada e constrangida com aqueles olhares que ele me lançava e pareciam querer gravar cada parte de meu rosto. Ou então dizer alguma coisa.


Àquela manhã, durante o jogo quando Black me encarava, a intensidade de seu olhar tomou toda minha concentração. E ainda me perturbava.


Suspirei e passei as mãos cansadamente por meu rosto. Pesadelos estranhos, Paul com ciúme me fazendo querer mandá-lo procurar mantícoras, Black me encarando e dizendo coisas estranhas...


— Ariadne? Está tudo bem?


Minhas mãos, que ainda estavam em meu rosto, estacaram. Tive vontade de rir. Ótimo! Um de meus problemas me encontrara. E, para melhorar, estava preocupado comigo.


— O que você quer? – Cruzei os braços e focalizei a floresta do lado de fora.


— Saber se você está bem. Foi o que perguntei, não?


— Eu não estou com humor para discussão, Black. Portanto, você se incomodaria de ir embora? – falei,cansada.


— Também não quero discutir – o ouvi falar calmamente.


Respirei fundo, não dizendo nada. Continuei olhando pela janela, esperando que Black fosse embora tão silencioso quanto chegara. Eu realmente não queria brigar. Na verdade, eu estava cansada, as brigas pareciam querer entrar em minha rotina de maneira insuportável. Até as brigas que eu tinha a favor de Severus, defendendo-o de Black e Potter, estavam me cansando.


— O que você tanto pensa aqui, sozinha, e a essa hora?


Gemi por dentro. O que ele ainda fazia aqui, por Merlin?!


Respirei fundo e olhei para o Black, que estava ao meu lado.


— Eu acho que o que penso ou deixo de pensar é problema meu, não? – falei óbvia.


— Só fiquei curioso em te ver aqui por tanto tempo e sozinha – ele deu de ombros, olhando pela janela.


Abri a boca pronta para dizer a ele para pegar sua curiosidade e enfiá-la onde bem entendesse, porém outra coisa que ele me disse chamou minha atenção.


— Como assim? Você estava aqui há mais tempo? Você não tinha acabado de chegar?


— Assim que cheguei, me pronunciei.


— Então como você sabia que eu estava aqui há bastante tempo, sendo que você acabou de chegar?


Black deu um meio sorriso para mim; ele parecia divertir-se com minhas perguntas.


— Essa é uma pergunta interessante – ele zombou –, mas que ficará sem resposta.


Fiz uma careta e voltei a encarar a floresta do lado de fora.


— Severus tem razão. Vocês têm segredos demais.


— Quer dizer que sou assunto de suas conversas?


— Me referi a você e seus amigos, Black – falei simplesmente. — Além disso, não perco meu tempo falando apenas de você.


— Mas perde tempo falando comigo?


A presunção na voz dele me fez encará-lo, irritada.


— O que você está fazendo aqui, Black? De verdade?


— Estou tentando – ele hesitou, e pela sua feição parecia estudar as próximas palavras a serem ditas – levantar um ponto, aqui.


— Mais fatos? – perguntei. Virei-me totalmente para ele e coloquei as mãos no quadril.


— Acho que não. Quero dizer, sabe que agora você me deixou confuso? Talvez eu queira mesmo comprovar um fato – ele riu, parecendo sem graça. Vi Black passar as mãos em seus cabelos, e não entendi seu nervosismo. Ele sempre me pareceu ser tão seguro de si. Prepotentemente seguro. Essa reação despertou mais ainda minha curiosidade, mas fiquei quieta. — Sabia que atrás daquelas árvores tem um cemitério? – ele perguntou por fim, apontando a floresta que antes eu encarava. — Os fundadores de Hogwarts estão enterrados lá.


— Como você sabe disso?


— Explorando – ele disse, como se fosse óbvio. Depois me encarou. — É bom andar por terrenos diferentes, de vez em quando, sabe?


Novamente aquele olhar intenso. Senti meu rosto esquentar e algo gelado se alojar em meu estômago. Por sorte a luminosidade daquela sala era fraca para ele notar essas alterações.


— Pelo que sei de você, Black, você é o tipo que explora terrenos diferentes o tempo todo.


— E de onde você tirou isso? – Eu quase sorri quando o percebi na defensiva.


— O que você, o Potter e o Pettigrew fazem à noite quando o Lupin vai “visitar” a mãe doente?


Ele se surpreendeu com minha pergunta direta, mas logo a resposta, treinada, apareceu.


— O mesmo que você? Dormimos?


— Claro... Eu vou fingir que acredito.


Ele então riu.


— OK. A questão é que, se eu lhe disser, terei que te matar.


Rolei os olhos. Aquela resposta era ridícula. Por que cargas d’água eu estava dando tanta atenção para aquele idiota? No entanto, eu ainda ardia em curiosidade sobre o que ele e os outros faziam quando Lupin se refugiava na Casa dos Gritos em noite de lua cheia. Com certeza era algo ilegal, uma vez que Severus quase tinha um piripaque por nunca conseguir descobrir as atividades desses três irresponsáveis. O sonho de meu primo era denunciar, o que quer que acontecia, a Dumbledore. Meus olhos se ergueram automaticamente, vislumbrando a lua crescente.


— Fazendo cálculos, Ariadne? – Black me perguntou com ar de riso.


Fiz uma careta ao ouvir meu primeiro nome.


— É Lakerdos, Black, nós não-


— Nós não somos amigos sei, sei – ele me interrompeu, impaciente. — Você não muda o discurso, Ariadne?


— Boa noite, Black.


Minha paciência havia terminado e minha sensatez, voltado. Portanto, virei para ir embora. Ele não me segurou, como o esperei fazer. Ainda bem, pois pensei que fosse virar rotina o Black sempre me segurar quando eu pretendia ir embora.


Deixei a sala e segui em direção às masmorras. Assim que virei o primeiro corredor, entretanto, ouvi um chiado. Parei de andar, prendi a respiração e agucei meus ouvidos. O chiado não parecia humano, o que só poderia significar uma coisa: o ovo zelador, Argus Filch.


Filch era um maluco que Dumbledore convidara para trabalhar em Hogwarts. Alguns alunos que tiveram o desprazer de visitar a sala dele disseram que Filch guardava materiais de tortura do antigo zelador e era louco para usá-los.


Ouvi novamente o barulho que me fez estacar no corredor, um miado rouco. A gata de Filch, Madame Norra. O animal ainda era filhote, mas tinha uma arguta percepção que a fazia encontrar muitos alunos que se aventuravam fora de seus salões comunais em horário impróprio.


Comecei a retroceder meus passos. Encontrar-me com Filch era a última coisa que eu queria para encerrar meu sábado.


— Ariadne.


Eu pulei de susto e quase gritei também quando Black murmurou meu nome enquanto segurava meu braço e me virava para encará-lo.


— Black! Você me assustou, seu maluco! – falei brava, mas o tom baixo não foi muito intimidador. Olhei para trás, verificando se chamara a atenção de Filch. Nada. — O que você ainda quer comigo? Não acho que seja uma boa hora.


— Pois é, também não acho que seja uma boa hora para te responder. – ele disse enquanto pegava minha mão e me puxava para que o seguisse. — O que precisamos é nos esconder do louco do Filch.


— Mas, onde? A sala que estávamos não é um bom esconderijo. Filch nos encontraria.


Black parou de andar e eu quase trombei nele. Ele soltou minha mão para pegar sua varinha e um pedaço de pergaminho que tinha no bolso. Depois encostou a varinha no pergaminho e murmurou algo, ao que desenhos começaram a aparecer magicamente.


Eu me aproximei, curiosa, conseguindo ver alguma coisa.


— O que é isso? Um mapa?


— Algo assim – ele respondeu vagamente. — Droga, Filch está perto.


— Como você sabe?


— E o Diggory está fazendo ronda, virando aquele corredor – ele continuou, me ignorando. — Vem comigo.


Novamente ele pegou minha mão, puxando-me pelo caminho que levaria direto para Filch.


— Mas o Filch-


— Entre aqui – ele falou, me interrompendo de novo.


— Aqui onde?


— Atrás dessa tapeçaria. Alcaçuz e cereja – ele completou; a tapeçaria pode ser removida, revelando um nicho.


— Como você sabia disso? – perguntei espantada. — E como você sabe que o Filch estava se aproximando e o Diggory-


— O Filch está se aproximando, Ariadne – ele me interrompeu impacientemente. — Agora, pare de matraquear e se esconda aí!


Antes que eu dissesse que quem matraqueava era a avozinha dele, o Black já me empurrava para o nicho atrás da tapeçaria, escondendo-se comigo. Novamente ele repetiu a senha “alcaçuz e cereja”, tornando a tapeçaria, atrás dele, firme.


O nicho era apertado, o que me incomodou. Apenas uma pessoa caberia ali dentro. Respirei fundo, tentando me acalmar. Um gostoso cheiro de colônia encheu meus pulmões. Fiz uma careta


— Você deveria passar menos perfuma, sabia? – falei com azedume.


— Eu passo o necessário – Black me respondeu, dando de ombros.


— O necessário para sufocar alguém. Esse cheiro está me dando dor de cabeça.


Ele riu baixinho. Senti a respiração dele perto de minha orelha, o que me provocou um arrepio.


— Pare de ficar soltando esse bafo quente em mim feito um cão, Black, que droga!


Dessa vez, percebi que foi com custo que ele segurou a risada. Aquela alegria toda começou a me incomodar.


— Qual o motivo de tanta graça? – perguntei.


— Nada. Só uma coisa que você disse que me lembrou uma situação que envolvia um cão, um veadinho e-


— Quieto – ordenei, erguendo minha mão para calá-lo. — Filch – sussurrei quando vi seu olhar questionador.


Depois que ficamos absolutamente quietos foi mais fácil perceber a respiração asmática do zelador junto ao miado da gata.


— O que foi, Madame Norra? Ouviu algo, querida?


Prendemos a respiração quando o miado soou mais alto. Filch deveria estar além da tapeçaria. Por fim, percebemos que ele começou a se afastar.


Por um momento, achei essa situação incrivelmente ridícula: eu escondendo-me atrás de uma tapeçaria, juntamente com Sirius Black, para que Filch ou um outro monitor não me mandasse para detençã0o. Será que meus pesadelos haviam mesmo me enlouquecido?


— Acho que ele já foi – murmurei, concentrando-me para tentar ouvir algo mais. Porém só havia o silêncio.


Olhei para o Black, que em minha opinião estava quieto demais, e fiquei constrangida. Ele me encarava, risonho, as sobrancelhas erguidas em questionamento: eu ainda mantinha minha mão sobre a boca dele. Tirei-a como se tivesse me queimado em um explosivim.


— Acho que podemos ir – falei, tentando sair dali.


— Já eu acho que seria melhor esperarmos um pouco. Vai que o Filch passa aqui de novo, ou damos de cara com o Diggory? – Black retorquiu, segurando-me pelos braços para que eu não saísse do meu lugar.


No entanto eu não me importava mais que o zelador ou o monitor da Hufflepuff pudessem me pegar andando pelos corredores do castelo. Ficar naquele espaço apertado com Sirius Black me encarando me deixava nervosa, inquieta... me sentia sufocando mesmo com a circulação do ar estando perfeita.


— E-eles não vão passar. – Eu queria me juntar à parede. Transpassá-la como um fantasma também seria ótimo. Ah, bom Merlin, o que eu estava fazendo? O que eu não estava fazendo?


— Eu prefiro não arriscar meu pescoço, Ariadne.


Senti a respiração quente dele em minha bochecha e uma mão encostando levemente minha cintura. O cheiro de colônia não me dava mais dor de cabeça, na verdade eu queria...


Alcaçuz e cereja. – Minha voz saiu estrangulada, mas a senha fizera a tapeçaria tornar-se maleável novamente. Empurrei o Black para fora do nicho, saindo em seguida. — Boa noite, Black.


Não o olhei por mais de um segundo. A expressão de seu rosto seria cômica se, par Amim, a situação não fosse trágica.


Que raios havia acontecido atrás daquela tapeçaria?!


 


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N/A: Olá, queridos.


Bem, hoje não estou muito inspirada a escrever uma nota, então, apenas agradeço à minha querida Priscila Louredo pela betagem! E à Kellysds por sempre me dar uma força quando escrevo e ela está no MSN.


Beijos, amadas!


E a todos: VOTEM COM SABEDORIA. É o futuro de NOSSO PAÍS que está em jogo, e não pensem que o candidato que forneceu festinha pra fazer propaganda em sua cidade vai se lembrar que falta algo nela.


Até mais,


Livinha

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