Profecia
Outubro e novembro passaram tão rápido quanto o clima ameno do outono. O frio começava a assolar os campos abertos de Hogwarts, obrigando os alunos a se protegerem com cachecóis e casacos pesados. As aulas nas masmorras e as que aconteciam a céu aberto eram as que duravam menos, por causa do vento gelado e do frio encalacrado nas paredes, que entrava pelas mangas e pelas golas das vestes.
Todas as aulas que Rose fazia, começaram a sentir uma diferença. A menina não abria a boca para responder a nenhuma pergunta. Na realidade, ela parecia mais com uma dos Inferi que eles estudavam nas aulas de Defesa contra as Artes das Trevas do que com uma aluna inteligente. Estava cada vez mais longe do esteriótipo criado por todos para ela. Rose já não parecia a filha de Hermione Weasley.
O motivo de seu silêncio constante não era o frio, apesar do que se pode pensar. Ela não tinha a cabeça nos estudos há muito tempo. Seus olhos estavam fundos no rosto, agora mais magro, cobertos por olheiras de cansaço. Parecia não dormir bem há muito tempo. Seu rendimento estava caindo. Ela já não passava mais tempo algum com os amigos ou com Scorpius.
- Rose! – Chamou Scorpius durante o café da manhã. Ela estava distante, com as mãos enterradas nos bolsos. Parecia muito concentrada em alguma coisa.
- Sim? – A menina tinha a voz abatida. Ela não o olhou.
- Você está parecendo um vampiro! – Cecília soltou, remexendo no mingau.
- Cecília! – Scorpius ralhou.
- É verdade – A outra insistiu, colocando os cotovelos na mesa e se inclinando para os dois, sem nem se preocupar em baixar o volume da voz. – Parece que ela nem está aqui! – Cecília observava os olhos da amiga, que fitavam o nada. Bateu com o punho na mesa, provocando uma revolta nos copos de suco. Rose levantou os olhos para ela. – Você não come, não dorme, não estuda, não conversa – Ela baixou a voz, enfatizando cada palavra. – Você nem namora mais!
- Cecília! – Scorpius ralhou, novamente.
Rose suspirou, voltando a fitar o nada.
- Talvez porque tudo isso tenha perdido a graça.
- Perdeu a graça? – Cecília quase engasgou. – Talvez você tenha perdido a graça!
Ela cuspiu com raiva. Podia se ver em seus olhos castanhos aumentados pelas lentes grossas dos óculos que ela não estava nem um pouco satisfeita com as atitudes da amiga. Como era possível que alguém mudasse assim da noite para o dia? Essa não é a Rose, ela repetiu com a voz esganiçada dentro de si. Queria chorar. Sentiu as lágrimas de raiva lhe chegando aos olhos, mas se segurou.
- Você é uma idiota, Weasley.
Rose nem ao menos mexeu os olhos quando a outra levantou da mesa comprida, ajeitando os óculos, com a boca pressionada. Ela tinha mais coisas a dizer. Scorpius se levantou, tentando segurar Cecília onde estava, mas ela continuou seu caminho.
- O que está acontecendo? – Scorpius perguntou, voltando a sentar.
- Não sei – Rose remexeu no bolso. – Pergunte à ela.
Scorpius levantou-se da cadeira, sem dar mais atenção à menina. Ela tinha os olhos congelados no nada. Parecia obcecada por alguma coisa. Naqueles dois meses, Rose tinha agido exatamente assim. Mãos nos bolsos, aparência amalucada, silenciosa e distante.
A estranheza dela era mais do que eles podiam adivinhar. Nem Cecília, sendo a vidente que era, podia saber do que se tratava. As noites sem dormir enrolada nas cobertas com a mão fechada em volta do segredo. Os dias que ela passava com as mãos nos bolsos, preocupada em apalpar seu grande tesouro eram a parte mais estranha do dia dela.
Seu pequeno tesouro parecia lhe dar energia.
O anel em espiral que ela achara no lago de Hogwarts parecia lhe alimentar e lhe manter em pé. Ela não precisava dormir e nem comer. Não precisava de amigos. Precisava do anel e o anel precisava dela. Não era preciso sentir medo. Ela se sentia agraciada. Mesmo assim, o anel não saíra de seu bolso. Ele ainda não tinha sido usado em seu dedo. Ele parecia grandioso demais.
Rose se ergueu da mesa, sob os olhares atentos da família. Lílian a encarava por baixo dos cílios claros com medo. Era medo o que todos sentiam dessa nova e nada saudável Rose. Ela estava definhando.
- Olá amiguinho – Rose sussurrou, protegida de todos pelas cortinas azuis de sua cama, deitada de barriga para baixo na cama, observando o anel em espiral.
Ela podia experimentá-lo, só para ver como ele ficaria em sua mão. Provavelmente ficaria perfeito, ele fora feito para ela, logicamente. Ele viera até ela. Ele se mostrara no lago há dois meses. Era mais do que óbvio que ele era dela.
Rose esticou o dedo médio da mão direita e com a outra mão levou a espiral cravejada de pedras até seu lugar. O anel pareceu se ajeitar perfeitamente à largura do dedo dela. Antes de colocá-lo, era claro que sua medida era maior do que o dedo da garota, mas ele se encaixara perfeitamente. Mais uma prova de que ele a pertencia.
A safira interior brilhou intensamente mesmo sem ser atingida por luz nenhuma. Ela parecia menor agora que estava em seu lugar. Mas sua coloração muito azul continuou.
Rose se colocou de costas para o colchão, sentindo uma nova energia ao seu redor. Era quente, forte e a completava. Parecia que qualquer buraco que ela tivesse, seria tapado com aquela energia. Se fechasse os olhos e se concentrasse tinha certeza de que poderia enxergar aquela energia em forma de luz, numa espécie de aura ao seu redor.
- Rose! – Chamou a voz de uma menina desesperada tateando a abertura nas cortinas de sua cama. – É a Cecília, anda!
- O que? – Ela gaguejou, lembrando-se do rosto da amiga no café da manhã. A tristeza era mais do que evidente em seu olhar.
- Ela está tendo um ataque ou sei lá...
- Onde? – Rose se ergueu de um pulo. – Como?
- Ela estava subindo para cá e de repente seus olhos saíram de foco e ela se sentou nas escadas. – A menina correu atrás de Rose, enquanto ela andava para fora do dormitório. – Ela está se debatendo, não sei...
Cecília estava sentada nas escadas que davam acesso ao dormitório feminino. Ela tinha as pernas coladas ao corpo e a cabeça pousada sobre os joelhos. Seus olhos estavam fora de foco, como se ela estivesse muito distraída. Rose sabia que aquilo era mais do que distração. Ela não estava com os olhos no presente.
- Cecília? – Ela chamou, se aproximando. Cecília se balançava para frente e para trás, babulciando coisas sem o mínimo sentido. Pareciam palavras ditas em outro idioma. Ela mordiscava a boca nervosamente e contorcia os dedos entrelaçados em volta das pernas. - Cecília? – Rose chamou novamente, colocando as mãos nos ombros da amiga.
Cecília teve uma reação totalmente inesperada ao ser tocada. Seus olhos perderam totalmente o foco. As íris estavam quase invisíveis no tom de branco pérola que os olhos tinham tomado. Sua boca estava frouxa e ela parara de se mexer para frente e para trás. Começou um discurso muito rápido e difícil de entender; um tanto engasgado e com a voz rouca, como ela nunca tinha tido.
- Ele está de volta! – Ela começou e as meninas em volta delas chegaram mais perto. – Está para começar a tortura do escolhido. A verdadeira saberia pertence a quem conseguir descobrir o lar da maldição. O verdadeiro libertador deve levá-lo de volta! Algo grandioso, mas custoso e assustador.
Cecília terminou de falar com um tom muito engasgado na voz. Ela tossiu muito, largando as pernas e tendo os olhos de volta nas órbitas. As meninas em volta delas ficaram muito quietas. Cada uma com uma expressão diferente no rosto, mas todas beiravam o medo. Cecília piscou muito rápido, se levantando do chão com a ajuda de Rose.
- O que? – Ela sibilou, olhando para os rostos assustados.
- Acho que subestimei seu dom – Rose observou.
- O que eu fiz?
- Você é uma vidente!
- Não sou não!
- Você acabou de fazer uma previsão para mim.
Cecília arregalou os olhos, colando o corpo na parede.
- Como sabe que era para você? – Perguntou uma das meninas, enquanto as outras se dispersavam. – Podia muito bem ser uma previsão para a – A menina procurou com o olhar. - Tina.
- A Tina quer ser a torturada pela maldição? – Rose perguntou, irônica. Tina balançou a cabeça negativamente, se benzendo. – Então, foi para mim. E além do mais, ela só desatou a falar quando eu toquei nela.
- Vocês estão discutindo por uma maldição?
Rose rolou os olhos. Apesar de estar fazendo aquela brincadeira e sendo o mais irônica possível, tinha certeza de que aquela previsão tinha sido para ela. Mas, não fazia sentido algum... De que maldição Cecília estaria falando?
- O que eu disse exatamente?
- Hm – Rose pensou, tentando se lembrar das palavras exatas, enquanto as duas se enfiavam em um canto vazio do salão comunal. – palavras exatas, eu não conseguirei lembrar, mas você disse coisas como: - Rose agitou os olhos, modificando a voz. - Ele voltou! A sabedoria é de quem o devolver ao lar! Grandioso, mas malvado!
Cecília tremeu.
- Não precisa ficar com medo, Rose.
- Eu não estou.
E ela não estava mesmo. Suspirou, tentando esquecer a cena que vira. Os olhos castanhos de Cecília, por trás dos óculos grossos eram mais simpáticos do que os olhos leitosos que ela ganhara. A vidência dela já estava começando a assustar.
- Não estou com medo mesmo!
- Era uma previsão para você – Cecília apontou o dedo.
- Quem garante? – Rose brincou, deixando o salão.
Saiu para o corredor estreito da torre oeste, sentindo-se mais confiante. Nem uma previsão estranha que poderia não ter nada a ver com ela a deixaria desconfortável. Estava se sentindo mais forte e mais saudável do que se sentira nos dois meses anteriores. Precisava urgentemente de uma escova de cabelos. Porque aquela sensação estranha lhe dizia que a profecia era sobre a espiral?
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A sala mal iluminada improvisada para as aulas da professora Scamander enquanto durassem as tempestades de neve, estava gelada, mas mesmo assim aconchegante. As carteiras eram muito próximas na sala pequena lotada de alunos da Grifinória e da Corvinal. Rose estava sentada na carteira mais distante da professora com Scorpius ao seu lado. Ele suspirou, esticando a mão no banco duplo.
- Quero duas páginas sobre Manticoras para... – Ela consultou o relógio. – Agora!
- Agora? – Reclamou uma menina baixinha da Grifinória.
- Nós nem estudamos Manticoras ainda! – Outra menina reclamou.
- Boa oportunidade de conhecer.
- A senhora não quer para a próxima aula? – Scorpius instigou.
- Não – Ela insistiu, pousando o quadril sobre sua mesa. – A menos que alguém me diga o que são Manticoras.
A sala foi inundada por um silêncio monasterial.
- Podemos usar a biblioteca para pesquisa? – A baixinha perguntou, derrotada.
- O que são Manticoras? – Luna perguntou novamente, tamborilando os dedos.
- Manticora é uma perigosa criatura de cabeça humana, corpo de leão e rabo de escorpião – Rose começou, de cabeça baixa, com a pena de escrever trabalhando. Ela não parecia se dar conta de que estava falando. – É tão feroz quanto uma quimera e igualmente rara. Embora seja dotada de linguagem, tenta devorar qualquer humano que se aproxime, cantando baixo quando conquista uma vítima com sucesso. Sua pele repele todos os feitiços conhecidos e sua mordida causa morte instantânea.
Luna deixou que seu queixo caísse, encarando a menina.
- Weasley? – Ela chamou, franzindo a testa.
- Sim? – Rose ergueu o rosto, largando a pena sobre o caderno sem linhas. Tinha o rosto avermelhado e uma expressão de surpresa por ter sido chamada.
– O que são Occamis? – Luna parecia desconfiada.
Rose mordeu o lábio, ela não tinha ideia. Mesmo assim, as palavras saíram abafadas por sua boca. Luna apertou ainda mais as sobrancelhas ao ouvi-la. Ela parecia não se dar conta do que falava.
- São criaturas originárias da Ásia. É uma criatura bípede emplumada com corpo de serpente e asas. Pode alcançar até quatro metros e meio de comprimento e alimenta-se de ratos e aves. É agressivo com qualquer um que se aproximar. Protegendo seus ovos, cujas cascas são feitas da prata mais pura e maleável.
Luna ergueu os cantos dos lábios em um meio sorriso.
- Está bem preparada para os N.O.M.s, pelo que estou vendo.
- Estou?
- Já que pelo menos uma aluna sabe alguma coisa sobre Manticoras e também Occamis, não posso hesitar em deixar os trabalhos para hoje mesmo.
- Dois trabalhos? – Um menino perguntou. – Pra hoje?
- Porque não?
A sala explodiu em vaias e reclamações. A maioria deles era virado para Rose.
- Não entendi...
- Você acabou de nos dar um trabalho enorme sobre Manticoras e Occamis, é só isso! – Uma menina reclamou ao passar por ela com os cadernos em direção à biblioteca.
Scorpius tinha os olhos parados no caderno dela.
- Como você conseguiu responder a pergunta e escrever algo tão diferente?
- Como? – Rose explodiu numa pergunta.
As frases em seu caderno faziam menção a uma aula de aritimancia que ela tivera num período anterior. As palavras eram caprichadas e as contas estavam corretas. Era mais do que estranho que ela conseguisse responder à pergunta de Scamander e fazer aquelas contas ao mesmo tempo. Scorpius manteve os olhos no caderno rabiscado enquanto respondia à ela, sem ter certeza se devia responder alguma coisa.
- Você respondeu a pergunta que a Scamander fez sobre manticoras.
- Manticoras? – Rose arregalou os olhos.
- Vai fingir que não sabe?
- E não sei mesmo!
- Rose, você respondeu a pergunta dela, enquanto rabiscava seu caderno com contas de aritimancia. – Ele sibilou, nervoso. – Como você conseguiu?
Rose olhou para frente, enquanto ele mantinha os olhos nela.
- Eu fiz isso?
- Fez – Scorpius avançou com a mão e segurou a dela.
- Eu não consigo lembrar – Rose arregalou mais ainda os olhos, baixando a voz até atingir um tom de sussurro. Scorpius segurou forte a mão dela, sentindo a sua ser pressionada pelo anel em espiral.
- Você o colocou – Ele observou, levantando a mão dela até a linha de seus olhos. – Tenho a impressão de que eu já o vi.
- Sim, no dia em que eu o encontrei.
- Antes disso.
Scorpius franziu as sobrancelhas, segurando os cadernos nas mãos e se levantando para andar até a biblioteca e terminar o trabalho que Scamander pedira. Rose não deveria acompanhá-lo, porque afinal, ela sabia sobre manticoras, mas ela o acompanhou mesmo assim, quase correndo.
Não queria ficar sozinha.
Comentários (2)
iiiiiiii..isse misterio eh q mata..kkkk. \0/
2012-07-25OHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH Misteriooos ahhhhhhhhhh fica perfeiiiiiita *------------*
2011-09-26