Capítulo Três
Capítulo Três
- De onde você conh-conhecia o Jimmy, querida? – me perguntou Sarah Potter.
As familiares ondas de dor que perpassavam o meu corpo toda vez que alguém tocava no nome de James se fizeram presentes novamente. Era ainda mais insuportável ouvir falarem o nome dele com verbos no passado. James não estava morto!
O que era meio engraçado, de um jeito muito sem graça, eu estar falando isso, uma vez que tinha passado dois dias inteiros lutando contra o fato de ter me apaixonado por um fantasma. Mas isso pouco importava agora, porque era a mais pura verdade. Eu estava apaixonada por James de uma maneira que nunca estivera por nenhum outro garoto, e duvidava seriamente que um dia voltasse a sentir isso.
Mas James não iria morrer. Ele não se atreveria a isso!
Dois dias inteiros haviam se passado desde que James me beijara no meu quarto. A minha única vontade era jamais ter descido, podendo saborear a sua companhia por 48 horas ininterruptas. Eu só queria não estar ali, no meio de todo aquele desespero, sem ter a menor ideia do que aconteceria a seguir. Isso era ainda mais insuportável do que pensar que ele estava morto. Porque por mais que ele ainda estivesse vivo, a possibilidade de que eu poderia jamais voltar a ver seus olhos castanho-esverdeados era forte demais, e dolorosa demais. Não era uma esperança, era uma tortura lenta.
- Ja-James e eu nos encontramos na rua, um dia – omiti levemente que ele estava supostamente morto na ocasião – Nos tornamos a-amigos desde então.
Sarah Potter era a imagem do meu desespero. Havia ficado muito grata quando minha mãe me trouxera dizendo que eu era uma amiguinha de James que havia ficado chocada ao saber do acidente. Talvez ‘chocada’ fosse pouco para o tamanho do pânico que me assolara ao perceber que o paciente de minha mãe era James. O meu James.
- Que bom que está aqui então – ela sorriu lacrimosa – Você parece gostar muito dele.
Fiquei vermelha, o que acontecia com uma horrível frequência. Não queria que a mãe de James soubesse que eu era terrivelmente apaixonada por ele. Devia ser meio estranho, considerando como as coisas estavam agora. Talvez não passasse de um sonho ruim. Eu acordaria e perceberia que nada disso era real.
E o que significava James ter aparecido logo pra mim? A incerteza era o ponto mais cruel da história.
- Lily – minha mãe me chamou.
Estava dando muito apoio à família de James, ainda mais depois de perceber como eu me sentia em relação a ele. Graças a Deus não dera uma única palavra a respeito. Eu só queria abraçá-la novamente e ouvi-la dizer que tudo ficaria bem. Aquela situação trazia a tona feridas que a muito tempo eu decidira esquecer. Era como ver meu pai, meu amor, morrendo novamente.
Porque todas as pessoas que queriam me amar e proteger tinham que me deixar de maneira tão drástica? Eu nem tivera tempo de viver uma história com James!
- Você precisa sair daqui, querida – disse – Não gosto de vê-la assim, e as coisas já estão ruim o suficiente.
Suspirei. É claro que ela tinha razão, eu precisava ir pra casa, sair dali o mais rápido possível. Mas ver as coisas praticamente do jeito que eu deixara quando James ainda estava lá era bem mais do que eu podia aguentar. Me pedir aquilo era mais do que eu podia fazer, até mesmo por minha mãe. Aquilo tudo lhe lembrava tanto a morte do papai quando a mim.
- Desculpe – sussurrei – Eu só queria que nada disso tivesse acontecido.
Por que conhecer James ainda com um coração plenamente pulsante teria sido a maior das minhas realizações. Era doloroso demais, injusto demais tê-lo conhecido já em seu leito de morte.
Mas ele não estava morrendo. Ele não me deixaria aqui, só!
- Alô? Lily? – disse Marlene no dia seguinte, me ligando – Cadê você? Porque não veio pra escola?
Nos dias anteriores, eu tinha conseguido ir a aula, correndo logo em seguida para o hospital. Mas hoje era diferente. A angustia, a dor e a apreensão que me acordaram não me fariam ficar presa nos corredores daquela escola, com todas as pessoas alegres ao meu redor, rindo de coisas que já não me atingiam mais.
- Oi Lene – falei baixo. Sarah, como ela insistia em ser chamada, estava conversando com um dos médicos – Estou no hospital com um... com um amigo.
- O que eu não via? – perguntou com perspicácia.
- Esse mesmo – disse sem prolongar o assunto. Mais tarde explicaria tudo. E eu tinha esperanças de que estivesse com James ao meu lado.
Ao meu lado, Sarah Potter ofegou e caiu na cadeira com as mãos no chão. Seu gesto me fez pensar nas piores coisas possíveis. Com lagrimas antecipadas nos olhos, murmurei um até logo para Lene.
- O que houve? – perguntei com um pouco mais de desespero do que realmente queria deixar transparecer.
Sarah Potter não pareceu se surpreender nem um pouco ao chegar ao hospital com minha mãe, o que só fazia toda a situação parecer ainda mais constrangedora. Aos olhos dessa mulher, eu e seu filho deveríamos ter vivido a mais louca história de nossas adolescências. E ainda que isso não se afastasse muito da realidade, não era o que eu esperava. Não mesmo.
Minha mãe relutara muito em me deixar faltar aula e ficar no hospital. Aparentemente, havia algo de muito moribundo passar o dia inteiro no hospital velando um paciente em coma. Mas ela não entendia... Eu tinha que estar lá.
- James… acordo – e agora entendia por que.
De incio, a informação não teve nenhum efeito em mim. Não até ver minha mãe entrar correndo na sala de espera com uma feição apreensiva e gritando com doze pessoas ao mesmo tempo. James havia acordado! Meu James! Finalmente!
- Onde está Lily?! – gritou minha mãe.
Sarah chorava copiosamente, obviamente ciente de algo que eu não estava. James não havia acordado? Então porque tantas lagrimas de dor?
- Você é Lily Evans? – perguntou um enfermeiro que eu nunca vira antes.
Assenti com a cabeça, olhando para minha mãe. Porque todo mundo estava agindo tão entranho? Não entendiam que essa era a noticia mais maravilhosa que poderíamos receber? Meu desejo mais íntimo era sair dançando pelos corredores do hospital. Ele estava acordado!
Mas algo na expressão de minha mãe me fez parar, enquanto ela dizia ao enfermeiro que poderia deixar o caso por sua conta. Fazendo Sarah nos acompanhar, mamãe nos guiou por um corredor que parecia não ter fim.
- Ouçam – parou e nos encarou. Sarah ainda chorava desolada. Resisti ao impulso de lhe dar tapinhas nas costas – Sarah, me ouça, você precisa ser forte! – a Sr. Potter limpou os olhos, tentando acalmar ma série de soluços e me fazendo ficar cada vez mais apreensiva. O que estava realmente acontecendo? – James está sendo medicado agora, abriu os olhos há cinco minutos, mas a situação dele é muito grave. Sarah, me perdoe, mas eu tenho que ser sincera com você! O quadro é muito delicado, seus batimentos estão fracos e ele não está respirando direito nem com os aparelhos – ofeguei, completamente presa as palavras da minha mãe, tentando a todo custo assimilar o que estava ouvindo – Ele acordou chamando-a, Lily.
Demorei um certo tempo para entender porque todo mundo estava olhando pra mim, tão chocada com as palavras que minha mãe dizia. Ele ter acordado era, até então, uma coisa boa. Mas parecia que o esforço havia lhe custado forças além das que possuía. E agora ele queria falar comigo?! A possibilidade de ouvir a voz de James mais uma vez fez minhas pernas tremerem.
Se a realidade fosse fazer daquela uma última vez, então eu queria continuar sonhando para sempre.
- Comigo...? – ofeguei, olhando para sua mãe. Ela havia voltado a chorar copiosamente, murmurando o nome do filho e do marido.
Eu sabia muito pouco sobre o Sr. Potter, pouco o vira nesses dias. Ele era incapaz de ficar muito tempo na presença as mulher, absorto em sua própria dor. Passava os dias na capela do hospital, chorando quando achava estar sozinho. Eu o havia visto uma vez. Parecia muito com James, mais velho e mais sofrido. Sua tristeza parecia contaminar a todos, me fazendo perceber que por maior que fosse a minha dor, não chegava a um terço da que eles sentiam.
Tinha descoberto muitas coisas sobre James desde que começara a passar cada vez mais tempo no hospital. Ele era um ótimo jogador de basquete, do mesmo ano que eu. Não era um desconhecido completo, mas não era um daqueles populares absurdamente metidos. Estudava em uma escola que minha mãe cogitara seriamente me colocar. Ia fazer o último ano ma minha escola, onde certamente pegaria as mesmas aulas que eu. Gostava de música, tocara piano e adorava literatura. Cada um dos títulos que eu descobria serem seus favoritos era uma facada em meu peito: James lia os meus livros que eu.
E a cada segundo a injustiça do que acontecera parecia maior.
- Desaconselho totalmente – disse minha mãe, lançando um olhar de advertência em minha direção – James está muito fraco, um diálogo ira cansá-lo mais do que pode.
Ofeguei. Eu seria capaz de ver James numa cama de hospital, sua perfeição imaculada destruída por um acidente insano?
Se os garotos que estavam com ele não estivessem mortos, pensei diversas vezes com uma crueldade que até então não conhecia, eu faria questão de matá-los um por um. Sua irresponsabilidade me privara de conhecer – em plenas condições – o amor da minha vida.
- Não – disse Sarah de repente – Não, Claire, eu quero que ela vá – minha mãe começou a negar veementemente quando Sarah a interrompeu – Meu filho está m-morrendo, Claire, eu sei disso. Não o prive de ter seu último desejo realizado.
Eu queria negar suas palavras, agredir-lhe se fosse preciso, até que ela admitisse que estava enganada, que James não estava prestes a me deixar, a embarcar numa viagem onde nunca mais poderia tocar minha mão, meus lábios... Mas dureza de ver uma mãe admitir que perdera o filho era mais real do que minha vontade de negá-la. Sarah Potter era a verdadeira face do desespero.
- Venha comigo, Lily – disse minha mãe por fim.
As pessoas que passavam por mim pareciam feitas de tinta, tudo era um borrão de cores que eu não podia distinguir. Os enfermeiros lhe arrumavam em roupas especiais e sua mãe murmurava instruções rápidas de não tocar em nada e ficar o mínimo de tempo possível. Não podia dizer não à mãe do rapaz. Não quando sabia exatamente o que ela estava sentindo.
- Mãe – consegui dizer antes de entrar no quarto. Não queria ter uma visão pelo vidro, não conseguia – Ele vai mesmo morrer?
Ela passou as mãos pelos cabelos, desolada. Sua reação era o máximo que eu podia aguentar.
Quando fechei a porta atrás de mim, todo o mundo parecia ter desaparecido. James estava irreconhecível, o rosto desfigurado por inúmeros machucados, um aparelho que o ajudava a respirar. Toda a realidade parecera ficar para trás, presa a um mundo que, eu tinha certeza, jamais voltaria habitar. Porque James havia entrado em minha vida da maneira mais absurda possível, era verdade, mas toda a minha existência parecia ter sido escrita para aquele encontro, e por mais que os anos se passassem, eu tinha certeza que jamais seria a mesma se James me deixasse.
- Lily – disse numa voz muito fraca e abafada – Você veio!
James era ainda muito mais alto do que eu conseguia me lembrar. A última vez que o vira estava largado em minha cama lendo um dos meus livros favoritos. Eu só queria poder voltar a essa cena e nunca mais sair. Porque tinham que tirar James de mim assim?
- Sim, vim. Você se lembra de mim? – perguntei tolamente.
">- De cada pedaço – tentou sorrir.
Eu queria saber se ele estava sentindo dor, pedir para que não me deixasse. Mas tudo o que conseguia fazer era olhar seus olhos escurecidos, hipnotizada.
- Eu descobri.
- Descobriu o quê? – sussurrei.
- Porque você era a única que podia me ver.
- E por quê? – perguntei.
Uma lagrima escorreu por seu rosto machucado. Será que ele sentia um terço da dor que eu sentia? Era terrível, uma mistura de tudo o que sentira quando pai morrera. Seria mais uma ferida para levar por toda a vida. Não sabia se conseguiria fazer tudo isso cicatrizar uma segunda vez.
- Porque o meu destino era te conhecer.
A máquina que se ligava a ele fazia um ‘pipipipi’ estranho. Eu sabia que Sarah, seu pai John, minha mãe e mais uma série de enfermeiros estavam nos olhando, mas isso pouco me importava. James era minha única preocupação, minha única realidade. E o fato de que a vida se esvaia lentamente dele me fazia querer pular da beira de um abismo para, finalmente, estar junto a ele.
Me abaixando até tocar sua face, eu o beijei, desejando fazer isso em outra situação, uma onde os dois estivessem em um lugar bonito, ambos os corações batendo sem problema algum, sem nenhuma luta por sobreviver.
- Eu te amo, James – sussurrei – Eu vou ser sua pra sempre, até que um dia possamos viver tudo que deveríamos.
Estava chorando copiosamente, como Sarah, eu tinha certeza. Mas as palavras proferidas não poderiam ser mais reais. Não me importava quanta vida teria para sempre, eu deveria ter sido de James desde o inicio. E eu não seria de mais ninguém até que, um dia, pudesse tê-lo. Pouco me importava esperar uma próxima vida ou algo além para ter isso. Eu só queria que essa dor passasse.
Eu só queria viver a vida que me fora designada.
- Eu te amo, Lily – disse muito mais baixo – E eu vou esperar para viver isso.
Fechando os olhos lentamente, os olhos que eu jamais veria. Anos mais tarde eu não saberia dizer quem gritou primeiro ou quem me arrancou daquela sala, longe do corpo da única pessoa com quem eu queria estar no momento. Os médicos tentavam a todo custo reanimá-lo, mas James já não estava mais ali. Olhei para os lados desesperada, ansiosa em ver aquela sombra que só era minha, que vivera coisas somente comigo. Mas nem mesmo sua fraca impressão viria me visitar, habitar meu espaço ou dividir meu jardim. Porque James Potter havia ido embora para sempre, para um lugar que não retornaria, onde já não podia mais segurar minha mão e perguntar o que me havia acontecido.
Porque eu teria que esperar uma segunda vida para vê-lo novamente.
FIM
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n/a: DEMOROU MAIS CHEGOU. Gente, estou chorando muito, vocês não tem ideia. Eu não pretendia fazer o capítulo assim, mas me pareceu o caminho mais certo da fic. Ela é curtinha assim mesmo, meu plano era uma short. O capítulo não está betado, me perdoem os eventuais erros, ok? Quando a Mu entrar eu peço pra ela betar :$
Comentem muito, ok? Beijos!
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