Hostilidade à Flor da Pele
HOSTILIDADE À FLOR DA PELE
Depois do almoço, Lilian e eu tínhamos aula de Poções. Logo, atravessamos correndo a ponte do Viaduto e nos dirigimos à masmorra.
Entramos na sala de aula e de imediato reconheci o rosto do professor Slughorn. Se eu estivesse no futuro, com certeza passaria por isso, mas era um tanto incomum para mim, ter outro mestre de Poções que não o professor Snape.
Para minha surpresa, Lilian foi se sentar em uma carteira ao fundo, ao lado de outra garota. Ela já tinha um par. Na verdade, como percebi rapidamente, todas as carteiras estavam ocupadas, exceto uma: Ao lado do corredor central, reconheci Severus Snape por seu cabelo incomum, sentado ao lado daquele lugar vago.
Enquanto eu andava pelo corredor para me apresentar ao professor e conseguir que assinasse minha caderneta, eu observava Severus, furtivamente. Assim que passei, ele de repente ficou rígido em seu lugar. Me encarou novamente, encontrando meus olhos com a expressão hostil e furiosa. Desviei os olhos rapidamente, chocada, ruborizando de novo. Tropecei em um livro no caminho e tive que me apoiar na beira de uma mesa. A menina sentada ali riu.
- Desculpe... - falei, enquanto observava ainda, aqueles profundos olhos pretos feito carvão.
O professor Slughorn assinou minha caderneta e, sem alternativa, me mandou sentar no único lugar vago da classe: ao lado de Severus.
Mantive os olhos baixos enquanto fui sentar ao lado dele, desconcertada pelo olhar hostil que ele me lançava.
Não olhei para cima ao colocar os livros sobre a carteira e tomar meu lugar, mas pelo canto do olho, vi sua postura mudar. Ele estava inclinado para longe de mim, sentado na ponta da cadeira, e desviava o rosto como se sentisse algum fedor.
Imperceptivelmente, cheirei meu cabelo. Tinha cheiro de morango, o aroma do meu xampu preferido. Parecia um odor bem inocente. Deixei meu cabelo cair no ombro direito, criando uma cortina escura entre nós, e tentei prestar atenção no professor.
Para variar, eu já sabia tudo sobre o que ele estava falando. De qualquer modo, tomei notas cuidadosamente, sempre olhando para baixo.
Não conseguia deixar de espiar, de vez em quando, através da tela de meus cabelos, o estranho Snapezinho sentado ao meu lado. Durante toda a aula, ele não relaxou sequer um minuto e permaneceu sentando o mais distante possível de mim. Eu podia ver que suas mãos na perna esquerda estavam fechadas em punho, os tendões sobressaindo por baixo da pele clara.
A aula parecia se arrastar mais do que as outras. Seria porque o dia estava chegando ao fim ou porque eu esperava que o punho de Severus relaxasse? Não sei, mas de qualquer forma, eu mesma estava completamente tensa. Mal conseguia prestar atenção nas palavras do professor, nem tampouco respondi às perguntas que o mesmo fizera à classe.
O tempo continuava a passar vagarosamente. Snape realmente não parecia relaxar nunca. Ele continuou sentado, tão imóvel que nem parecia respirar. Qual era o problema dele? Será que este era seu comportamento normal?
Isto não podia ter nada a ver comigo... Antes do almoço ele nem sequer me conhecia...
Eu o espiei mais uma vez e me arrependi disso. Ele agora me encarava de cima, os olhos pretos cheios de repugnância. Enquanto eu me afastava, encolhendo-me na cadeira, de repente passou por minha cabeça a expressão como se pudesse me matar.
Naquele momento, o sinal tocou alto, fazendo-me pular.
Com fluidez, Severus se levantou de costas para mim - era muito mais alto do que eu pensava - e estava do lado de fora da porta antes que qualquer outro aluno tivesse saído da carteira.
Mas é claro... De repente ocorreu-me uma possível resposta: provavelmente ele era mais um daqueles sonserinos metidos a sangue puro, que detestam acima de tudo a Grifinória e as demais casas. Eu não devia me preocupar...
No entanto, ao me levantar, fiquei paralisada no lugar onde estava, encarando inexpressiva as costas dele. Era tão mesquinho. Não era justo. Ele não podia se julgar superior só porque...
- Você é Hermione Granger? - interrompeu-me uma voz de homem.
Olhei para cima e vi um rapaz bonitinho e de expressão suave. Tinha cabelos louro-escuros e seu uniforme era um tanto usado, mas ele sorria para mim de maneira simpática e com certeza não achava que eu cheirava mal. Em suas vestes reconheci um grifinório.
- Sim.
- Meu nome é Remo. Remo Lupin.
- Oi, Remo. (falei, tentando fingir que não o conhecia)
- Precisa de ajuda para encontrar sua próxima aula?
- Tenho aula de Herbologia. Acho que posso encontrar o caminho.
- É minha próxima aula também! - ele parecia impressionado.
Fomos para a aula juntos. Ele era super receptivo e simpático. A pessoa mais legal que eu havia conhecido hoje. Mas quando chegamos na estufa, ele perguntou:
- E aí, você furou o Snape com um lápis ou o que? Nunca o vi agir daquele jeito.
Eu me encolhi, constrangida. Ao que me pareceu, eu não fui a única a perceber o comportamento esquisito de Severus, e pelo visto as atitudes dele diante de mim não eram nada usuais. Decidi me fazer de burra.
- Está falando do garoto de cabelos compridos... Que estava sentado ao meu lado na aula de Poções?
- Sim... Você não viu a cara dele? Parecia estar sentindo dor ou alguma coisa do tipo.
- Não vi. Nem falei com ele. Ele não me pareceu muito receptivo.
- É. Ele é um garoto estranho. Se eu tivesse o prazer de me sentar ao seu lado, com certeza conversaria com você. - disse Lupin.
Lancei-lhe um sorriso tímido e entramos juntos na estufa.
**********
Quando todas as aulas do dia acabaram, resolvi ir até a sala da professora McGonagall esclarecer os fatos e me inscrever com mais formalidade nos N.I.E.M.S. pelos quais eu havia optado.
Foi o que me recomendara o professor Dumbledore: “Bom... Vejo que nosso tempo é curto, senhorita Granger. Logo não vejo problema algum se você assistir a algumas aulas antes de falar com a professora McGonagall. Mas lembre-se de relatar a ela todas as suas matérias antes do fim do dia...”
Como recomendado, encaminhei-me à sala de Transfiguração no fim da tarde. Ao chegar lá, deparei-me com a porta aberta e resolvi entrar.
Tarde demais, reconheci aquela figura hostil diante da professora.
- Mas professora McGonagall... Deve haver um jeito. - suplicava Snape, sem parecer ter notado a minha entrada - Eu não quero mais estudar Poções... Poderia trocar por uma outra matéria...
- Já disse que é tarde demais, senhor Snape. Deveria ter pensado nisso antes. Agora pare de me perturbar, antes que eu resolva descontar alguns pontos de sua casa por sua exacerbada impertinência. - retrucou a professora.
Snape parecia extremamente desesperado para deixar a matéria de Poções. Recusei a acreditar que a culpa fosse minha.
Derrotado, Severus se virou e ao perceber minha presença, seu rosto absurdamente lindo tornou-se ainda mais pálido e os olhos penetrantes encheram-se de ódio.
- Obrigado, professora McGonagall. - falou, num tom sombrio.
Por um momento, senti um arrepio de puro medo que eriçou os pêlos de meus braços.
Humildemente fui até a mesa da professora, enquanto ouvia o barulho da porta sendo fechada.
- Com licença, professora McGonagall... Queria apenas esclarecer o que aconteceu esta manhã.
Depois de contar toda a história à professora McGonagall ela me pediu desculpas e quis saber por quais matérias eu iria optar.
- Bom... Vou querer Poções, Feitiços, Defesa contra as Artes das Trevas, Herbologia, Runas Antigas, Aritmancia e... Poxa professora, havia muitas matérias que eu gostaria de estudar.
- Lamento, senhorita Granger - respondeu ela, percebendo aonde eu queria chegar - mas não poderei lhe dar outro vira-tempo depois do ocorrido. Imagine só... Depois dessa, sabe-se lá onde você pode parar...
- Compreendo, professora. - falei, antes de sair, cabisbaixa, de sua sala.
**********
Entrei no Salão Principal e logo vi Lilian abanando para mim, da ponta da grande mesa da Grifinória.
- Por que se atrasou, Hermione?
- Ah... Tive que resolver alguns problemas com a professora McGonagall...
Olhei para o lado e percebi Lupin, vindo em minha direção. Ele estava acompanhado por outros três garotos. Um eu reconheci, era Sirius. Havia um outro muito familiar: tinha cabelos escuros e usava óculos. De longe eu juraria que era Harry.
- Ah... Este é o Tiago, Hermione. - falou Lilian, com voz doce, apontando para o garoto de óculos. - e aquele é o Pedro. - concluiu, mostrando-me um garoto tímido e esquisito atrás de Sirius.
Todos foram muito amigáveis comigo. Inclusive Pedro. Era injusto e inacreditável pensar que um dia ele viria a trair os pais de Harry...
Diante de tanta conversa, eu estava até me divertindo, quando meus olhos foram atraídos para uma imagem que percorria o grande corredor. Era Severus. Havia entrado no salão com a pior expressão de mau-humor que eu já vira em sua face. Até o professor Snape parecia mais simpático.
Ele se encaminhou ao grupo de amigos, na ponta de sua mesa, e sentou ao lado deles sem cumprimentá-los.
- Ei... Lilian... Ele é sempre assim? - perguntei à garota.
- Ele quem, Hermione? - indagou ela.
- Aquele garoto... O Severus.
- Ai, Hermione...Ainda pensando nele! - disse ela, fazendo-me corar.
- Não! Só não entendo porque ele é tão arrogante. Isso é normal?
- Bom... Geralmente ele costuma ser mais simpático, sabe...
- Então você já falou com ele? - perguntei, deixando transparecer meu imenso interesse.
- Bom... Vou confessar a você, Hermione: antes Severus e eu éramos muito amigos e ele sempre foi um bom garoto, nos dávamos muito bem, até que...
- Até que o quê? - indaguei curiosa.
- Até que ele começou a andar com aqueles garotos estranhos... E começou a agir como eles. Olha, Hermione, eu falei para ele que Avery e Mulciber não eram boa influência. Ele não me ouviu e continuou ao lado deles... Então paramos de nos falar. Se eu fosse você parava de pensar nele também. Não vale a pena. - falou ela, antes de se virar para Tiago e me deixar pensando, sozinha, em Snape.
**********
Depois de jantar, encaminhei-me à sala comunal da Grifinória. Tirei do bolso uma pequenina chave. Com ela eu abriria a porta de meu exclusivo quarto! Maravilha... Pelo menos, apesar de tantas coisas ruins que me ocorreram naquele dia, eu havia ganhado um quarto privado. Seria o quarto da monitora-chefe caso ela fosse da Grifinória. Mas como não era o caso e todos os demais quartos estavam ocupados, Dumbledore fizera a gentileza de me ceder o cômodo “para compensar os imprevistos...”.
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