EXPRESSO DE DUELOS
Harry matou as horas que faltavam para o almoço sentado em frente ao lago, atirando pedras na superfície e observando a lula gigante rebatê-las de volta. A visão do corpo de Voldemort despertara confusos sentimentos no Garoto-que-Sobreviveu.
Sentia, claro, raiva. Raiva pelas mortes que o Lorde das Trevas causara direta ou indiretamente. Raiva pela sua infância destruída. Raiva pela vida de tantos outros destruídas.
Mas, curiosamente, sentia pena. Não de Lord Voldemort, aquele que aterrorizava o mundo da magia e até mesmo os trouxas. Não, sentia pena de Tom Riddle. Do garoto Riddle, abandonado pelo pai e privado do amor e conforto dos braços de uma mãe, que fora levada pela Morte assim que o garoto nascera.
Por fim, havia a dúvida. Será que um dia Tom Riddle tivera uma infância? Fora um garoto normal? Ou será que sempre fora malicioso? Mal-intencionado?
Essas, pensou ele, depois de muita reflexão, são lembranças que ficaram para sempre presas no passado. Não se pode mais ter certeza de mais nada da vida passada de Voldemort. Duvido que haja algum bruxo com um passado mais confuso e que saiba mais de Voldemort.
Por acaso, estava errado nas duas últimas afirmações.
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O homem parado em uma rua bem distante de Hogwarts estendeu a mão da varinha. Em poucos segundos, um ônibus de três andares, anormalmente pintado de negro, apareceu do nada. Um letreiro em sua fronte informava: Nôitibus Andante – Luto pelos mortos na Batalha Final.
O ônibus parou de chofre à frente do homem e um rapaz na casa dos vinte anos, ainda com algumas espinhas no rosto, saltou de dentro.
- Bom dia, senhor! Seja bem-vindo ao Nôitibus Andante, o transporte de emergência para bruxos. Meu nome é Stanislau, Lalau Shunpike, e serei seu...
Lalau parou abrutadamente ao perceber a aura maligna que a figura encapuzada à sua frente desprendia. Por um momento, pensou em dementadores, e ficou apavorado. Mas a figura falou. Dementadores não falavam.
- Leve-me ao Caldeirão Furado, Charing Cross – disse o desconhecido, sem apresentações ou rodeios.
- S-sim, senhor – gaguejou Lalau. – Me siga, por gentileza.
Lalau levou-o ao segundo andar do ônibus, conduzindo o homem a uma das cadeiras ao fundo. Infelizmente, o pobre rapaz tinha o dever de acompanhar os passageiros e acomoda-los o máximo possível. Portanto, Lalau teria que pelo menos tentar conversar com o estranho.
- Eh... o senhor ficou sabendo da última notícia que saiu no Profeta?
- Que notícia? – perguntou o outro, secamente.
- Bem... esta.
Lalau pegou um jornal dobrado em seu bolso e o pôs nas mãos dele. A manchete prinsipal, que ocupava metade da primeira página do jornal, era: ENCONTRADO CORPO COM MARCAS DE ARTES DAS TREVAS EM SURREY.
Não parava por ali, óbvio.
Ontem à noite o Sr. Angus Stoneheart, 45, foi encontrado morto em sua casa, com inconfundíveis marcas de tortura. Os vizinhos, trouxas em sua maioria, declararam aos seus jornais que ouviram alguns gritos e alguns minutos depois, um clarão verde relampejou.
“Foi realmente assustador. Parecia magia”, comentou um deles.
A Seção dos Aurores foi procurada, mas não quis dar entrevistas. Um dos funcionários disse apenas:
“Desculpe-nos, mas temos ordens superiores para não comentar nada com ninguém.”
Por outro lado, horas mais tarde um agitado funcionário, que prefere não se identificar, disse apenas:
“É claro que as pessoas temem tudo isso. Pode significar a volta dos Comensais da Morte, ou até mesmo de um novo bruxo das trevas.”.
O Ministro Shackelbolt não foi encontrado para dar entrevistas.
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Harry se levantou. Era melhor ir logo, ou acabaria perdendo o almoço. Sem dívida, Rony e Hermione o esperavam no Salão Principal.
Assim que o jovem olhou ao redor do Hall de Entrada, identificou Rony e Hermione esperando-o. Conversavam baixinho. Harry tentou se aproximar furtivamente, quando Hermione percebeu sua presença e discretamente cutucou Rony com o cotovelo. O ruivo se calou na hora.
- ... foi realmente... – dizia ele, antes que Hermione o alertasse da presença do amigo.
Rony pareceu um tanto desnorteado, fez-se um constrangedor silencio. Para quebrá-lo, Rony disse, hesitante:
- Harry, você viu?
Harry sentiu do nada uma louca vontade de se fazer de desentendido. Claro que sabia do que Rony estava falando, mas sentia-se um pouco despeitado com a atitude dos amigos de lhe esconder o que eles conversavam.
- Vi o quê, Rony?
- O corpo... dele – respondeu Rony, sussurrando a ultima parte.
- Vi... a profa. Minerva me mostrou.
- E então? Ahn... assustador, né?
Hermione interrompeu-os neste instante.
- Ah, Rony, pode parar com isso – disse ela com impaciência. – Não acredito que você esteja com medo dele. Primeiro: você destruiu uma Horcrux. Segundo: você enfrentou seus Comensais da Morte. Terceiro: ele está MORTO!
Ela disse tudo isso muito depressa. Harry lembrou-se eloquentemente do primeiro encontro de Rony e ele, no Expresso de Hogwarts, há quase oito anos, quando Hermione se apresentara aos dois. Naquela época, Hermione era apenas uma sabe-tudo. Ou, como diziam os trouxas, uma nerd.
- Agora – continuou ela com firmeza, agarrando a ele e Rony pelas mãos –, vamos.
Harry e Rony trocaram olhares exasperados às costas de Hermione. Harry tinha certeza que Rony pensava o mesmo que ele:
Acho que o calor não está fazendo bem à Mione. Está cozinhando os miolos dela.
Harry não comeu quase nada no almoço. Se sentia como se alguém que ele amasse muito estivesse prestes a morrer. Na verdade, ele já começava a sentir saudades de Hogwarts. Certamente, essa seria sua última refeição na escola.
A escola... que fora seu verdadeiro lar... sua verdadeira família... assim como para Tom Riddle...
E a curiosidade pela vida de Riddle mais uma vez possuiu Harry... precisava, tinha que saber...
A voz de Rony arrancou-o dos devaneios.
- Harry? Tudo bem aí?
- Ainda está conosco? – riu Hermione.
- Ande, Harry – disse Simas, sentado à sua frente na mesa. – A última refeição em Hogwarts. Aproveite.
Harry, porém, não conseguia aproveitar nada. Tentou comer algumas torradas, mas foi como mastigar tapete.
McGonagall se levantou e bateu palmas uma vez. A comida desapareceu instantaneamente do prato. Então, a bruxa deu um raro sorriso aos alunos.
- Muito bem, caros alunos. Já comemos, já bebemos, hora de alguns discursos – Ela voltou a ficar séria. – Não poderíamos dizer que este foi um ano de muito aprendizado, em matérias escolares – acrescentou, ao ouvir murmúrios indignados de estudantes. Lutamos o ano inteiro contra as trevas! Isso não serve como aprendizado?, diziam eles.
- Então, gostaria de recomendar aos alunos de primeiro a sexto ano que estudem muito nessas férias. Vale lembrar que, do contrário ao que pode parecer, os alunos do sétimo ano prestarão os exames de NIEM’s. Maiores informações – ela alteou a voz, porque mais uma vez murmúrios indignados percorriam o salão – estarão na carta que receberão durante as férias. Tenham uma boa viagem.
McGonagall se sentou. Houve imediatamente o ruído do atrito de bancos contra o chão, quando estes foram arrastados pelos estudantes ao se levantarem.
Então é isso, pensou Harry com tristeza. Estava deixando, talvez para sempre, a amada escola... enquanto saía, caminhando ao lado de Rony e Hermione, que pareciam mais interessados nos exames dos NIEM’s que na despedida da escola, passaram pela sua cabeça vislumbres de toda sua vida escolar...
Lembrou de quando Hagrid o revelara que era um bruxo. Lembrou- -se de quando salvara a Pedra Filosofal. Lembrou-se quando todos suspeitavam que ele era o herdeiro de Slytherin, e ele matara o monstro da Câmara Secreta. Lembrou-se da condenação de Bicuço à decapitação, de como descobrira a verdadeira identidade de Sirius.
Lembrou-se do Tribruxo, quando ele ganhara junto com Cedrico. Do retorno de Voldemort, quando o lufano fora morto. De seu quinto ano, quando todos o desacreditavam e ridicularizavam. Da profecia, do Departamento de Mistérios, da morte de Sirius.
Lembrou das aulas com Dumbledore, da caverna dos Inferi, do alto da mais alta torre. Dos acontecimentos do último e mais conturbado ano. Da luta contra as trevas. Da busca às Horcruxes. Da morte dos companheiros. E, por fim, da derrota final de seu rival, Lord Voldemort.
Harry, de repente, deu-se conta que já tinham chegado às carruagens atreladas aos Testrálios. Grandes Testrálios, também sentiria sua falta.
Olhou uma última vez para a cabana de Hagrid. Onde estaria o amigo, seu primeiro amigo? Harry o considerava como um parente, e agora na partida, ele não estava ali ao seu lado... onde estaria?
Uma palmada fortíssima em seu ombro quase o fez perder o equilíbrio.
- Então, Harry? Pensou que não viria me despedir?
Instantaneamente, o jovem olhou para cima. Lá estava Hagrid, cabelos e barba desgrenhados, os olhos enrugados em um sorriso.
- Hagrid! – disseram Rony e Hermione, sorrindo.
- Muito bem, eh, espertinhos? Partindo pela última vez?
Rony abaixou a cabeça, triste.
- É... voltaremos para visitar, talvez...
Hagrid sorriu ainda mais. Harry teve a sensação de que o meio-gigante sabia de alguma coisa que eles não sabiam, e não queria lhes contar.
Hermione pareceu perceber isso também, porque logo depois perguntou:
- Então, Hagrid? Tem alguma novidade para nós?
Como previram, ele pareceu embaraçado.
- Quê? Eu? Não! Eu vim... vim só me despedir de vocês...
Hermione fez cara de vou-fingir-que-acredito. Rony, por outro lado, pareceu acabar de entender toda a situação.
- Então, Hagrid? Tentando... ugh!
Rony parou no meio da frase, porque Hermione acabara de dar-lhe um belo chute na canela. Isso fica mais fácil de disfarçar quando se está usando vestes de bruxo. Em seguida, acenou quase imperceptivelmente para Rony, indicando a carruagem que estava à espera deles.
- Que? – sussurrou Rony, sem entender, e então: - Ah!
Silenciosamente, os dois saíram de cena, deixando Harry e Hagrid conversando. O meio-gigante, ao contrário de Harry, percebera que Rony e Hermione não estavam mais ali. Mesmo assim, se abaixou e sussurrou a Harry:
- Nem tudo é o que parece, lembre-se. Todo final é um novo começo. – E, levantando-se: - Agora, vá. Rony e Hermione já estão te esperando.
Rapidamente, Harry se virou para trás. Os amigos acenaram para ele de dentro da carruagem.
Quase que inconscientemente, Harry sentou-se ao lado dos amigos. Hagrid, sem dúvida, quisera revelá-lo alguma coisa. Lembrou-se do primeiro ano, quando tinham salvado a pedra filosofal em parte graças à língua solta de Hagrid. Estaria o mesmo acontecendo agora?
Imerso em pensamentos e suposições, Harry mal percebeu quando chegaram à estação de Hogsmeade. Rony e Hermione não faziam o menor esforço para quebrar o pesado silêncio.
Rony o cutucou nas costelas. Quando Harry virou a cabeça, ele apenas acenou em direção ao trem.
Harry virou-se para trás. Lá, longe, via as ameias da torre de Astronomia, a mais alta do castelo. O lugar onde Dumbledore...
Harry sentiu um aperto no coração. A Torre trouxera um fluxo de amargas lembranças. Snape com o rosto impassível, Dumbledore caindo... caindo...
- Harry? – ele ouviu a voz de Hermione vindo de muito longe, preocupada. – Você está bem?
Harry não se dera conta de que estava enconstado na porta do trem, como se estivesse se sentindo mal. Rony o encarava um tanto de longe, apreensivo.
- Ah – disse Harry, confuso. – Não, tudo bem. Foi só uma... tontura passageira.
Hermione continuava olhando-o como se ele pudesse cair de repente, enquanto procuravam um compartimento vazio no trem, coisa que já tinham feito tantas vezes... porém essa seria a última.
Mais uma vez, sentiu-se meio tonto. Que estava acontecendo? Ele voltaria outras vezes de visita, não voltaria? Não havia razão para tudo aquilo.
- Ei, um compartimento vazio – disse Rony bobamente, apenas para quebrar o silêncio. Ele entrou e se sentou, e olhou para os amigos, incentivando-os a fazer o mesmo.
Harry apressou-se a imitá-lo, assim como Hermione. Depois de alguns minutos em que apenas se ouvia o barulho do trem em movimento e das conversas nos outros compartimentos, novamente Rony tentou iniciar um assunto.
- Pois é – disse, como se estivesse concordando com alguém - , o Harry arrebentou no seu discurso. Até ganhou um beijinho de uma terceiranista, não foi? - E olhou Harry de modo insinuante.
Como se estivesse esperando o momento certo, foi justamente esta hora que Gina invadiu o compartimento. E não parecia feliz.
- Hein? Como? Quem o Harry beijou? - E então seu olhar fixou-se em Harry, que lembrou-se eloquentemente da expressão de Molly Weasley quando seus filhos faziam algo de errado. - Explique-se! - disse ela, o veneno se desprendendo a cada sílaba.
Harry sentiu-se imediatamente aturdido. Nem prestara atenção ao que Rony dizia, estava mergulhado em pensamentos. Na hora em que Gina o trouxera de volta à tona, estivera mais uma vez pensando em Lord Voldemort, e o desejo de conhecer seu passado o consumia mais uma vez... agora, ao seu lado, Harry sentia Rony e Hermione se sacudindo. Olhou-os e percebeu que na verdade eles se seguravam para não cair na gargalhada...
Olhou para cima, e Gina estava lá, encarando-o furiosamente. Rapidamente, tentou se lembrar do que ela falava, do porque de ela estar nervosa. Parecia ter algo a ver com beijos e terceiranistas.
- Er... Gina, não foi nada disso que o Rony falou, é que...
- Nem mais uma palavra! - gritou ela, e intimamente Harry se perguntou porque ela o questionara algo. Mas ficou de boca fechada, ainda mais porque esta parecia ter sido demais para seus dois melhores amigos. Eles explodiram em gargalhdas. Hermione se sacudia tanto que seu cabelo amarrado se soltou. Rony fora além, e estava caído no chão, com as mãos apertando a barriga dolorida de tanto rir. Gina não lhes deu atenção e continuou:
- Você vai ver só, nas férias, nós iremos ter uma conversinha. Não vai adiantar se esconder em Grimmauld Place ou em nenhum outro lugar, pois pode crer que, nem que seja no fim do mundo, eu irei te encontrar, Sr. Potter.
Harry esperava por mais, porém a caçula dos Weasley simplesmente deu-lhe as costas e saiu do compartimento. Os estudantes dos compartimentos vizinhos pareciam ter escutado a briga, porque ele pôde ouvir o grito de Gina “O que estão olhando, seus babacas?!”.
O Garoto que Sobreviveu olhou para baixo e viu Rony e Hermione ainda rindo. Então, ele não soube dizer mais tarde o que realmente aconteceu, mas em suas lembranças havia um borrão de tudo girando em volta enquanto ele se deixava cair no chão e acompanhar Rony e Hermione em suas gargalhdas.
Era tão enervante, tão reconfortante, depois de tudo o que ele passara, deixar-se rir junto com Rony e Mione, deixar que por um momento a loucura que estava ameaçando engolfá-lo tomasse conta de sua mente, esquecer todo o sofrimento da batalha...
Ali, rindo sabe-se lá do que junto com seus melhores amigos, Harry perdeu a noção do tempo. Ele só percebeu vagamente, assim que estava sentado novamente, pela janela, que o Sol parecia ter caído um pouco para o oeste. Harry ainda se sentia um tanto anestesiado, quando o Expresso deu um solavanco e parou de andar.
Harry, Rony e Hermione se sentiram imediatamente despertos. Sacaram as varinhas do bolso e as apontaram em volta, procurando a causa da interrupção da viagem. Poderia parecer exagero, mas os tres jovens bruxos tinham acabado de sair de uma guerra.
- Calma – disse Hermione, não parecendo nem um pouco calma. - Deve ter sido apenas um defeito, ou algum obstáculo nos tri...
Ela não disse mais nada, pois neste exato momento, de algum ponto no trem, longe deles, ouviu-se um grito feminino e esganiçado.
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Aiai, o que será que vai acontecer... Cap. 2 continua amanhã, aguardem e comentem!
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