CAPÍTULO 17



CAPÍTULO 17


 


- Já estamos com quase tudo pronto aqui, comandante. Se ele ligar, estaremos preparados.


- Se é que ele vai ligar, tenente, e se é que ele vai seguir os mesmos procedimentos que usou para seqüestrar Jenny O’Leary.


- Ele usou o mesmo método para entrar em contato com Brian Kelly hoje de manhã. - Fora do alcance da câmera, balançou a mão com raiva, mandando Ronald fechar a matraca. Nossa, o cara falava sem parar, mais que papagaio. - Temos condições de pegá-lo aqui, comandante. Tudo o que ele tem a fazer é vir em nossa direção.


- É melhor torcer para que ele faça isso, e depressa, Weasley, ou nós dois vamos ficar com o traseiro na reta.


- Já joguei a isca. Ele vai morder.


- Entre em contato no momento em que souber dele.


- O senhor será o primeiro a ser contatado. - murmurou quando a tela se apagou. - E vocês, querem calar a boca? Isso aqui não é uma festa!


Ronald e dois funcionários da Divisão de Detecção Eletrônica tagarelavam ao mesmo tempo em que instalavam equipamentos no quarto que ia servir de quartel-general provisório. Gina se preocupava com a possibilidade de ter montado aquela força-tarefa muito cedo, mas o tempo era inimigo deles. Havia rastreadores, unidades de atalho eletrônico, três aparelhos de tele-link portáteis, todos com fone de ouvido e misturadores de voz, além de gravadores sincronizados para serem ligados quando o primeiro tele-link tocasse. Ronald já havia programado uma interface para que as ligações destinadas à sua sala na central de polícia fossem direcionadas para aquele local.


Trouxera todo o equipamento da central usando uma van de entregas. Se o assassino estivesse com o hotel sob vigilância, tudo o que veria era um veículo comercial como outro qualquer entrando pela porta dos fundos do hotel.


Ninguém uniformizado, nenhuma farda.


Seis tiras estavam de tocaia no saguão, disfarçados de carregadores de malas, porteiros e funcionários da manutenção. Um detetive do esquadrão de Gina assumira o balcão da recepção. Ainda havia dois agentes na cozinha, trabalhando como chefs, e mais dois cobrindo o andar da cobertura como faxineiros.


A quantidade de homens e equipamentos extras ia provocar um rombo no orçamento da polícia. Se algo desse errado, alguém ia comer o pão que o diabo amassou, e esse alguém seria, provavelmente, ela.


Mas Gina não ia permitir que nada saísse errado.


Agitada, movimentava-se pela espaçosa sala de estar. As janelas ali estavam com a tela protetora de privacidade ativada, bem como as do quarto. Apenas Harry, que era dono do hotel, e o seu gerente geral sabiam que havia policiais infiltrados entre os funcionários. As duas da tarde, uma hora depois de o avião vindo de Dublin ter pousado no Aeroporto Kennedy, outro policial iria se apresentar como Brian Kelly e pegar a chave da suíte reservada para ele.


Tudo ia dar certo. Agora, era só esperar que o criminoso ligasse para o tele-link de Gina.


Por que diabos ele não ligava logo?


Harry entrou, vindo do segundo quarto, e a viu com o cenho franzido diante das janelas protegidas.


- Você já cuidou de todos os detalhes, Gina. - confortou ele.


- Já repassei tudo dezenas de vezes. Ele não pode esperar demais para atacar Brian. Não vai querer arriscar que Brian entre em contato com você por conta própria e descubra que foi tudo uma armação. Ao ligar para Jennie ele a fez prometer que não ia entrar em contato com ninguém, nem falar com ninguém, a não ser que fosse uma pessoa enviada por você. Só que Brian não ia se comprometer dessa forma, nem prometeria nada.


- E se o nosso homem o conhece o mínimo que seja, deve saber que Brian faz as coisas do jeito que bem entende.


- Isso mesmo e, portanto, deve estar armando tudo para o encontro ser imediato. Já deve estar com o local do crime preparado e não quer correr riscos. Brian é um sujeito durão, forte e em boa forma. E é malandro... seria um páreo duro de encarar.


- Ele tem que ser pego de surpresa. - concordou Harry. - Precisa ser apanhado com a guarda baixa.


- Exato. Meu palpite é que ele planeja fazer tudo bem aqui. Brian vai ficar à espera de um motorista, um mensageiro, um contato qualquer que o leve até você, e vai abrir a porta. Ele tem que lhe aplicar um tranqüilizante bem na hora, sem alarde, de forma rápida e silenciosa.


- Tenente. - disse Harry, levantando a mão e, quando Gina automaticamente colocou a dela sobre a dele, ele sorriu e a apertou. - Se eu tivesse uma pequena seringa na mão, você também ia entrar no mundo dos sonhos assim, desse jeito, bem depressa. Esse equipamento era muito popular em certas áreas conturbadas durante a década de 2020, só que geralmente a seringa estava carregada com estricnina, em vez de tranqüilizante. Apertar as mãos virou uma coisa totalmente fora de moda por muitos anos.


- Você é uma fonte interminável no fornecimento de todo tipo de informações preocupantes.


- Isso é maravilhoso para quebrar o gelo em reuniões formais.


- Ele já devia ter ligado... - Gina se afastou de Harry e voltou a andar de um lado para outro. - Em cada novo ataque ele diminui o tempo entre o assassinato e o momento do crime ser descoberto. Quer que eu chegue perto, bem perto. Isso o faz se sentir superior. A corrida é mais emocionante quando ele sabe que eu estou logo atrás e o sangue ainda está fresco.


- Talvez ele esteja planejando ligar daqui mesmo, já que está com o tempo tão apertado para esta rodada.


- Já pensei nisso... mas não importa. Vamos conseguir pegá-lo mesmo assim. Ele vai ter que ligar para este quarto. O colega que está se apresentando como Brian na recepção é bem parecido com ele, tanto na cor da pele quanto no tipo físico. Ronald já configurou um simulador vocal para que a voz dele também se pareça com a de Brian quando ele atender o tele-link. Estamos com tudo armado em vídeo também, mas ele não vai fazer nenhum movimento antes de ligar para mim. Quer ter certeza de que estou pronta.


Olhando para o pequeno aparelho em seu pulso, viu as horas e praguejou:


- Jackison vai entrar no hotel se passando por Brian em menos de quinze minutos. Onde está aquele filho-da...


No segundo em que o tele-link tocou, ela já estava fervilhando de agitação por dentro.


- Para trás todo mundo. - ordenou. - Todos os tele-links portáteis para a sala ao lado. Nada de papo! Prepare o holograma que vai aparecer atrás de mim, Ronald.


- Preparado! - confirmou ele, e uma imagem tridimensional da sala de Gina na central de polícia apareceu em volta dela. - Tudo em cima, Weasley!


- Consiga rastrear este canalha. - ordenou atendendo: - Aqui é da Divisão de Homicídios, tenente Weasley falando.


- Que bom que está se sentindo melhor, tenente.


- Sentiu saudades de mim? - perguntou Gina. A voz era a mesma, bem como as cores que dançavam na tela. - Enviar flores foi um gesto muito simpático, especialmente depois de você descobrir que me mandar pelos ares não deu muito certo.


- É que você foi tão... indelicada em suas declarações para a mídia. Achei a sua falta de modos uma coisa muito rude.


- Sabe o que eu acho rude, meu chapa? Jogar fora a vida de uma pessoa antes de acabar o prazo de validade. Esse tipo de coisa realmente me deixa pau da vida.


- Bem que nós poderíamos debater a importância das nossas irritações pessoais por algum tempo, mas sei o quanto você deve estar desesperada, tentando rastrear esta ligação com a ajuda dos seus equipamentos inferiores e dos seus técnicos pouco capacitados.


- Eu conheço alguns detetives eletrônicos que iam igualmente considerar essa afirmação muito indelicada.


Sua gargalhada veio pelo alto-falante, transmitindo uma sensação de diversão genuína. Virando a cabeça meio de lado, Gina notou que o riso parecia vir de alguém jovem.


- Sabe...? Sob diferentes condições, tenho certeza de que ia apreciá-la muito, tenente. O problema é o seu gosto, que é deplorável. O que viu naquele rato de rua irlandês com quem se casou?


- Ele é muito bom de cama. - Torcendo para que ele a estivesse vendo com toda a clareza, Gina se recostou na cadeira e sorriu. - Consegui um perfil psicológico seu, feito por um especialista fantástico, onde está escrito que você provavelmente é muito pífio nessa área de atuação. Talvez você devesse experimentar um pouco de Stay-Up para acabar com os seus problemas de ereção. Está à venda nas boas farmácias e drogarias.


- Eu sou puro de coração e de corpo. Sou santificado. - Sua respiração tornou-se ofegante por um instante e isso foi claramente transmitido pelos alto-falantes.


- Santificado... essa é uma forma diferente de falar... impotente?


- Sua piranha! Você não sabe de nada a meu respeito. Acha que eu quero me deitar com você, não é? Talvez eu faça isso quando tudo acabar, talvez Deus exija isso. “É melhor lançar o sêmen na barriga de uma prostituta do que jogá-lo fora.”


- Quer dizer que você também tem problemas de ejaculação? Nossa, isso é bravo... talvez, se tentasse tirar a imagem materna de sua cabeça quando está buscando o prazer solitário conseguisse ir até o fim, e isso lhe daria uma personalidade mais alegre.


- Não ouse falar da minha mãe! - Sua voz ficou entrecortada e mais fina, alcançando tons bem agudos.


Bingo, pensou Gina. Mamãe equivale à figura feminina de autoridade.


- Como ela é? Ainda traz você preso na coleira, filhinho, ou está em casa, cercada de velas acesas e sem ter a mínima noção de como você passa o tempo livre? - Gina se lembrou do ritual que presenciara naquela manhã em uma igrejinha junto dos penhascos. - Você ainda vai à missa com ela todo domingo? É lá que você vai para encontrar o seu deus vingativo?


- O sangue dos meus inimigos escorre lentamente como vinho tinto, a caminho do inferno. Você vai conhecer esta dor antes de eu matá-la.


- Você já tentou fazer isso uma vez. Deu errado! Por que não chega mais perto? Venha me pegar, cara a cara. Será que você tem colhões para isso?


- Quando a hora chegar, não vou me deixar seduzir pelas palavras de uma meretriz nem me desviar do caminho.


Sua voz ficou trêmula, entrecortada, e Gina virou um pouco a cabeça, tentando pegar a diferença sutil no tom. Será que ele estava chorando?


- O melhor momento para isso é agora. - afirmou ela.


- Minha missão ainda não foi completada. Ainda não acabou. Eu digo quando, eu determino quando. A quarta alma a caminho da danação vai enfrentar o julgamento de Deus hoje, daqui a duas horas. - Ofegou por alguns momentos. - Duas horas é tudo o que você tem para encontrar o porquinho e salvá-lo da morte. “O homem mau será preso por suas próprias iniqüidades, e pelas cordas do seu pecado será amarrado; morrerá por falta de disciplina e se perderá devido à sua grande insensatez.”


- Livro dos Provérbios, de novo? Você não varia muito, né?


- Tudo o que é necessário para a nossa vida está na Bíblia. Ele já está vindo para os meus braços; o porquinho já está esperneando na terra dos cãezinhos paparicados e elegantes, e em meio às babás mal remuneradas.


- Essa pista não é muito boa. Será que eu estou chegando perto demais para você se arriscar a jogar limpo?


- O jogo está bem limpo, mas aqui vai mais uma dica: o sol se põe por trás, e antes que a noite caia o próximo Judas vai pagar caro por sua traição. Duas horas. Liguei o cronômetro...


- Escute aqui, eu quero uma notícia boa, Ronald. - exigiu Gina quando a ligação caiu.


- Eu o localizei! - Ronald olhou para cima e seus olhos verdes pareceram sorrir.


- Não brinque comigo, Ronald. - avisou Gina, levantando-se devagar e desligando ela mesma a imagem holográfica.


- A ligação foi feita do setor D, quadrante 54. - Gina foi até o mapa e procurou o lugar.


- Filho-da-mãe, as Torres do Luxo ficam nesse quadrante. O safado está lá. Está trabalhando no prédio onde cometeu o primeiro crime.


- Devemos ir até lá? - quis saber Hermione.


Gina levantou a mão para fazer parar todas as perguntas enquanto tentava pensar com cuidado.


- Ele disse que eu tinha duas horas, e não costuma fazer seu trabalho às pressas, então pretende passar pelo menos uma dessas duas horas aqui. Vai entrar em contato com este quarto a qualquer minuto. Jackison já chegou?


- Está no quarto ao lado.


- Muito bem, então vamos dar um tempo ao nosso rapaz. Ele já deve estar com todas as suas ferramentas preparadas. Não deixa nada para a última hora. Vai usar o seu meio de transporte e não vai violar nenhuma lei de trânsito até chegar aqui. Tem um cronograma. Precisamos de uma segunda equipe nas Torres do Luxo, mas não quero que eles entrem no prédio. Se ele estiver trabalhando com alguém e os policiais forem atrás dele ao sair, esse alguém poderá contar isto a ele.


Pegando o comunicador, Gina entrou em contato com Lupin, a fim de fazer o relatório inicial e planejar uma estratégia para a próxima etapa. Parecia fria e com a mente clara ao começar a dar ordens.


Parou de falar quando o fax do quarto apitou.


- Ele fez contato, comandante, e eu estou lendo o texto enviado. Ele dá instruções para a vítima se aprontar para receber um motorista uniformizado em quinze minutos. Quer que a vítima espere por ele no quarto. Isso indica que o ataque ocorrerá aqui mesmo, como imaginávamos. A vítima deve liberar o elevador para que o motorista possa subir assim que receber uma ligação da recepção avisando que ele chegou. Três bipes finais, a transmissão do fax foi encerrada. Ele está vindo para cá.


- Uma segunda equipe estará vigiando a parte de fora das Torres do Luxo. - ofereceu Lupin. - Posso lhe mandar dois detetives da Divisão de Homicídios e três policiais.


- À paisana, comandante. E preciso também de pelo menos um homem da Divisão de Detecção Eletrônica para fazer um rastreamento.


- Mas você já está com três detetives eletrônicos aí, Weasley. Assim você vai desfalcar as fileiras.


Ela rangeu os dentes, desejando desesperadamente poder estar em dois lugares ao mesmo tempo.


- Então vou enviar Ronald para coordenar a ação da segunda equipe.


- E eu vou liberar uma van com os equipamentos necessários. Mantenha esta freqüência aberta.


- Sim, senhor. Ronald!


- Você vai me dispensar agora, bem na hora da onça beber água? - perguntou ele, com ar de insulto e indignação.


- Preciso que você descubra onde é o esconderijo dele.


- Mas ele está vindo para cá! Podemos pegá-lo aqui!


- Preciso que você descubra o esconderijo dele, - repetiu - para o caso de ele nos descobrir e recuar. Que Deus não permita que isso aconteça, mas, se acontecer, descubra onde ele está e bloqueie o seu acesso ao local. Isso é uma ordem, detetive!


Fumegando de raiva, ele agarrou o casaco, reclamando:


- Os oficiais da Divisão de Homicídios acham que todo detetive eletrônico só serve para fazer figuração. Precisam deles quando não encontram respostas, mas quando elas aparecem, os idiotas são mandados de volta para o estúdio.


- Olhe, não estou com tempo para chiliques não. Verifique se os outros detetives eletrônicos estão a postos e depois volte para cá. - Passando por ele, foi para a sala de estar da cobertura. - Todo mundo fora daqui, com exceção de Jackison. Tomem as suas posições. Mantenham as armas no modo de atordoamento leve. Precisamos que ele esteja consciente para poder falar. - Levantou as sobrancelhas ao olhar para Harry. - Os civis vão para a sala ao lado. - Pegou um dos monitores sem fio e o entregou a ele. - Você pode assistir.


- Tenho certeza de que vai ser interessante. Tenente, você acaba de ficar com um detetive eletrônico a menos. Eu assumo a posição. Quebre as regras um pouquinho. - sugeriu, antes que ela pudesse fazer alguma objeção. - Vou ser mais útil assim do que ficando aqui, de braços cruzados.


Ela tinha razões para desconfiar que ele era melhor com os equipamentos de ponta que os dois homens que sobraram.


- Vá para o primeiro quarto, então. - decidiu. - De qualquer modo, fique em uma posição onde eu possa vê-lo. Jackison, permaneça longe da porta. Quando ele tocar a campainha, não abra antes de eu dar o sinal. Hermione, quero você junto da porta na sala do outro quarto. Use o olho mágico para acompanhar tudo. Fique bem alerta.


Enquanto caminhava em direção à sala de controle, falou no comunicador:


- Equipe A em posição. Equipe B. Equipe C. Está chegando a hora! Observem com atenção, mas não se aproximem nem tentem abordar ninguém com uniforme de motorista. O suspeito vai utilizar um tele-link do hotel ou um aparelho portátil assim que chegar e vai direto para o elevador da cobertura. Repito: apenas observem. Ninguém faça um movimento sequer na direção dele. Quando ele estiver engaiolado, eu lhes dou passe livre e o fechamos aqui neste quadrante.


- Adoro quando você usa esse dialeto de tira. - murmurou Hermione no ouvido dela.


- Sem papo, civil! - Gina se colocou diante dos monitores, olhando cada um para se certificar de que suas tropas estavam todas em posição. - Ele está chegando. - murmurou. - A qualquer momento... Venha, seu babaquinha, venha para os meus braços.


Ela viu Ronald sair do elevador e seguir pelo saguão. Continuava pau da vida, pensou, reparando na sua cara amarrada e na sua postura rígida. Ele ia ter de aprender o valor do trabalho de equipe. Ela o viu olhar em volta por todo o saguão e fez o mesmo, através dos monitores.


Um andróide levava dois cães com orelhas compridas e pêlos longos para passear na rua, e vinha pelo saguão andando sobre o piso de lajotas. Uma mulher usando um sóbrio terninho executivo preto estava sentada no banco circular que rodeava a fonte central e esbravejava diante de um tele-link portátil. Um carregador de malas dirigia um pequeno veículo elétrico cheio de bagagens e ia em direção às portas principais. Nesse momento uma mulher passou pelas portas trazendo um poodle toy preso a uma coleira de prata. Tanto a dona do cão quanto o próprio estavam muito produzidos, e exibiam idênticas fitas de prata presas à cabeça. Logo atrás dela vinha um andróide doméstico, carregando um monte de sacolas e caixas.


Turista rica, imaginou Gina. Deve estar fazendo compras de Natal antecipadas.


Nesse momento ela o viu. Vinha logo atrás do andróide, envergando um casacão preto, um quepe de chofer puxado bem para baixo e óculos muito escuros que encobriam por completo os seus olhos.


- Ele entrou. - Ela mal conseguiu respirar. - Possível suspeito entrando pelas portas principais. Homem, um metro e sessenta e cinco, casacão preto, quepe cinza e óculos escuros. Carrega uma valise preta. Líderes de equipe confirmam a entrada?


- Positivo, tenente. Está bem à vista. Nesse instante, o suspeito está pegando um tele-link portátil no bolso esquerdo do casaco e vai passar à esquerda da fonte.


Então tudo saiu errado. O poodle deu início à confusão. Gina acompanhou tudo com atenção. O cãozinho começou a latir de forma agressiva e histérica, escapou da coleira e atacou a dupla de afghans entre ganidos e rosnados.


Uma violenta batalha aconteceu entre os cães, uma briga cheia de barulho e fúria. Em sua corrida desabalada para salvar o poodle a dona do cão, cheia de laços prateados no cabelo, tropeçou nas lajotas e empurrou a mulher de negócios, que se levantara para assistir à comoção e acabou quase caindo dentro da fonte.


O tele-link da executiva voou-lhe da mão e atingiu o policial disfarçado de carregador de malas bem no meio da testa. O rapaz, ao receber o forte e inesperado golpe, caiu como uma árvore cortada.


Então vieram os gritos, xingamentos e um barulho gigantesco no momento em que um dos participantes da confusão acabou sendo empurrado sobre uma mesa onde havia dois vasos de cristal, que se espatifaram com estardalhaço. Três porteiros correram para ajudar a separar os cães, e o primeiro a chegar ao local foi recebido com uma dentada profunda em agradecimento pelo seu trabalho. Um dos afghans se viu livre da coleira, correu em direção às portas de entrada e desapareceu na calçada.


Em sua corrida frenética, o cão pegou Ronald por trás, fazendo-o se desequilibrar e atirando-o de cabeça na porta da qual se aproximava. Do lado de fora, Gina notou o momento exato em que um de seus homens enfiou a mão por dentro do casaco em busca da arma.


- Mantenham suas armas fora de vista! - berrou ela. - Droga, não saquem as armas, é apenas uma briga de cães!


Como continuava com a atenção focada no suspeito durante os trinta segundos que o caos levou para se instalar no saguão, Gina reparou o instante exato em que tudo foi por água abaixo. O tele-link que ele segurava foi atirado de volta para o fundo do bolso, sua postura assumiu uma rigidez repentina e ele disparou na direção da porta mais próxima.


- Ele descobriu tudo! O suspeito está tentando sair do prédio a pé, pela entrada sul. Bloqueiem a entrada sul! - ordenou ela enquanto saía correndo da suíte em direção ao elevador. - Repetindo... bloqueiem a entrada sul! O suspeito está em rota de fuga... Lembrem-se de que está armado e é perigoso! - Continuou a gritar no comunicador, entrando no elevador sem olhar para trás e sem reparar que Harry entrara junto com ela.


- Ele já está alcançando as portas. - disse-lhe Harry, e ela viu então que ele tivera a lembrança de levar com ele um dos minimonitores.


- Ellsworth, ele vai passar por você.


- Já estou vendo, Weasley. Vou pegá-lo!


No instante em que as portas se abriram, ela já estava correndo em direção ao saguão. Ellsworth estava do lado de dentro da entrada sul, caído durinho no chão.


- Ele atingiu Ellsworth com um tranqüilizante. - Puxando a arma, ela atravessou a porta e foi para a rua. - Atenção!... O suspeito está fora da área de controle. Um policial foi atingido, está caído junto à porta da entrada sul. O suspeito saiu a pé...


Ela ouviu um grito agudo e correu em direção à esquina. Ele estava arrancando uma mulher de dentro do carro. No momento em que Gina chegou junto do meio-fio, levantou a arma e mirou, ele já jogara a mulher no meio da rua e se instalara atrás do volante.


Girando o corpo, Gina saiu correndo em direção ao carro esporte azul que deixara estacionado na entrada.


- Eu dirijo! - gritou Harry, chegando junto do carro um passo antes dela. - Conheço este carro melhor do que você.


Sem tempo para argumentar, ela pulou no banco do carona e comunicou pelo aparelho:


- O suspeito acaba de roubar um veículo e está indo a toda em direção à rua 47 leste. O carro é um minijato branco com licença de Nova York. A placa é C-H-A-R-L-I-E... Carro, hélio, amora, roda, limão, ilha, eco. Aqui fala a tenente Gina Weasley, perseguindo o suspeito. Preciso de apoio em terra e no ar. Ele está com quatro quarteirões de dianteira, aproximando-se agora da avenida Lexington.


Harry ligou o sistema turbo e acelerou como um foguete.


- Está a três quarteirões agora. - murmurou, grudando os olhos à sua frente no momento em que o carro deu uma guinada para a esquerda, desviando de um imenso bonde aéreo e tirando um fino do veículo.


- Ele é esperto, não roubou uma carroça não... - comentou Harry, ziguezagueando loucamente através do tráfego sem nem mesmo encostar nos freios. - Esses minijatos têm uma boa potência para quem sabe usá-los. Só que ele não vai conseguir ir mais rápido do que nós a essa velocidade.


Ao se aproximar de um sinal vermelho, Harry calculou o tempo, deu mais potência no motor e passou ventando entre o tráfego que atravessava o cruzamento, deixando atrás de si um rastro de pneus cantando e buzinas indignadas.


-... Não vai conseguir se nós conseguirmos sobreviver à perseguição. O suspeito está virando na Lexington sul, em direção ao centro! Onde está a porcaria do meu reforço aéreo? - berrou ela no comunicador.


- O reforço aéreo está sendo enviado. - As palavras de Lupin vinham como cacos de vidro. — As unidades de campo estão indo nessa direção, de leste e de oeste, e devem juntar-se a vocês na esquina da avenida Lexington com a rua 45.


- Estamos em um veículo civil, comandante. - avisou ela, fornecendo-lhe uma descrição detalhada. - Nossa distância é de dois quarteirões dele, e nos aproximando. O suspeito está cruzando a rua 50 neste instante.


Gina bufou baixinho quando um maxiônibus surgiu, arrastando-se na frente deles. Harry apertou o modo vertical, lançando o carro em uma decolagem brusca que quase fez o estômago de Gina parar no fundo do carro. Depois de passar por cima do ônibus, tornou a mergulhar em direção à rua.


Apesar da manobra, o ônibus conseguira bloquear sua visão por tempo suficiente para o suspeito desaparecer.


- Ele virou em alguma rua... para onde? - especulou Gina.


- Para a direita. - decidiu Harry. - Ele estava pegando a pista da direita antes daquela droga de ônibus surgir.


- Acreditamos que o suspeito está indo em direção oeste, pela rua 49. Reforços aéreo e terrestre, reajustem a sua direção para continuar a perseguição.


O sinal ficou amarelo quando eles estavam quase na esquina. Harry acelerou para virar à direta antes de a luz vermelha surgir. Os pedestres, no entanto, como típicos nova-iorquinos, invadiram o cruzamento ainda com a luz amarela e, em franco desafio ao bólido azul que se aproximava velozmente, não se abalaram, continuando a atravessar a rua com bravura.


Idiotas... babacas! Gina nem tivera tempo de completar o pensamento e Harry já tornara a decolar, tirando fino da calçada.


- Não mate ninguém, pelo amor de Deus.


Ele quase arrancou o guarda-sol de uma carrocinha de lanches e aterrorizou três judeus hassídicos que levavam suas pastas tipo executivo cheias de pedras preciosas para comercialização. Uma pêra atirada com fúria pelo dono da carrocinha passou ao lado de Gina, voando pela janela.


Ela avistou a traseira em estilo rabo-de-peixe do minijato quando ele se aproximava da curva com a Quinta Avenida. A carrocinha dessa esquina não teve tanta sorte. Gina observou o instante em que o carrinho virou de rodas para cima, atirando o vendedor longe.


- Estamos perdendo terreno. Ele está na Quinta Avenida agora. - Olhando para o céu com atenção, rangeu os dentes ao avistar míni-helicópteros da mídia, em vez dos da polícia. - Comandante, preciso do meu reforço aéreo!


- Houve problemas na saída e o esquadrão sofreu um ligeiro atraso. A liberação se dará em cinco minutos.


- Isso vai ser muito tarde. Tarde demais, aliás! - murmurou e sentiu uma pontada de satisfação ao ouvir o som das sirenes que se aproximavam por trás.


- Vamos fazer uma abordagem cruzada. - decidiu Harry. Seu sorriso era penetrante e mortal como um laser no instante em que ligou o jato, levando o carro esporte a uma decolagem rápida e vertiginosa, em tanta velocidade que Gina sentiu todo o seu sangue ser drenado de repente da cabeça, indo se alojar no macio estofamento de couro do assento.


- Ai, meu Cristo, eu odeio isso!


- Segure firme! Estamos subindo e avançando na diagonal. Vamos cortar a passagem dele ao tornar a descer.


E seguiram, acima de prédios de vinte andares e a mais de cento e sessenta quilômetros por hora.


As ruas pareceram ficar mais longe enquanto eles alcançavam a altura dos dirigíveis turísticos e bondes aéreos para grandes distâncias. Gina conseguiu uma vista muito próxima de um dirigível gigantesco, uma das jóias do Departamento de Turismo da cidade de Nova York. Na verdade, ela o viu mais de perto do que gostaria. A monótona gravação que apregoava as atrações da famosa região de venda de diamantes explodiu em seus ouvidos.


- Lá está! - Ela teve que gritar para ser ouvida em meio ao barulho ensurdecedor e apontou para o oeste. - Um minijato branco. Ele ficou preso em um engarrafamento na Quinta Avenida, entre as ruas 46 e 45. - Nesse momento ela avistou outro, a meio quarteirão do primeiro. - Merda, temos dois deles! Aterrisse o carro, estacione na calçada, se precisar. Atenção todas as unidades: dois minijatos brancos na Quinta Avenida, ambos parados. Um está entre as ruas 46 e 45, e o outro entre as 45 e 44. Bloqueiem o tráfego para o sul na esquina de Quinta Avenida com a rua 43!


Seu estômago foi parar na garganta quando Harry deu um mergulho enlouquecido com o carro. Nivelou o veículo três metros acima do nível da rua até aterrissar com o mínimo de vibração sobre uma pista exclusiva para maxiônibus, quase ao lado do minijato que estava mais ao norte.


Gina saltou do veículo já com a arma apontada para o motorista.


- Polícia! - berrou ela. - Fora do carro e mantenha as mãos onde eu possa vê-las.


O motorista, um homem de vinte e poucos anos, usava um paletó amarelo-limão fluorescente e uma calça apertada no mesmo tom. Suava em bicas ao sair do carro.


- Não me atordoe, pelo amor de Deus! Eu não vendo drogas, sou apenas um intermediário tentando ganhar a vida.


- Abra as pernas! - ela ordenou, girando o corpo dele e colocando-o de costas. - Mãos sobre a capota do carro!


- Não quero que minha mulher descubra. Exijo um advogado! - impôs ele enquanto Gina o revistava. - Estou trabalhando nisso há menos de seis meses. Dá um tempo!


Pegando as algemas no bolso, puxou os braços dele e os prendeu junto às costas. Ao fechar as algemas, já sabia que ele não era o homem que procurava.


- Se você se mover um centímetro que seja, vou atordoá-lo com isso aqui e deixá-lo cair durinho no chão.


Ensaiou uma corrida, mas diminuiu o passo ao ver Harry, que já voltava do outro carro.


- Tudo o que consegui foi prender um sujeito servindo de avião com algumas drogas. - informou ela. - O cara tem cérebro de minhoca.


- O outro carro estava vazio. - disse-lhe Harry. - Ele o abandonou e fugiu a pé. - Com os maxilares apertados, olhou para as ruas lotadas de gente, com um tráfego pesado de pedestres e veículos. As passarelas aéreas que se estendiam ao lado dos prédios e sobre as calçadas, em ziguezague, apresentavam um engarrafamento de pessoas. A Estação Central estava a apenas um quarteirão dali. - Nós o perdemos.


 


 


 


Agradecimentos especiais:


 


Bianca: Foi mal mesmo, pulei o capitulo 14 sem querer, mas já foi remediado. Abraços.


 


Ana Eulina: Ah, o Harry é o Harry não é mesmo? A garagem do Harry é de dar inveja mesmo, até eu estava querendo pelo menos uns dois daqueles, sonhar faz bem.... Não, o Rony e a Hermione não estavam dormindo juntos e nem vão dormir juntos por um tempo, mas em breve quem sabe... Realmente eu sem querer postei o capitulo 15 ao invés do quatorze, mas não se preocupe que já está postado. Abraços.


 


 


 

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