Adeus



Harry nunca fora bom com as palavras, no entanto, em muitos de seus momentos de aperto, as mesmas saíam com uma facilidade inacreditável. Uma prova concreta disso era o que ele havia acabado de dizer para Lupin sobre como se sentia péssimo quando não podia ajudar e sim só observar o problema se alastrar.
Era curioso pensar que sempre que o menino estava em apuros ou precisava de certa espiritualidade, ou seja, dizer a coisa na certa na hora certa, o seu próprio eu interior agia por conta própria sem que ele nem ao menos tivesse um conhecimento completo e claro disso. Como por exemplo, na câmara secreta, quando Harry destruiu impulsivamente o diário de Tom Riddle e algo semelhante ocorreu também no cemitério quando a sua varinha e a Voldemort se cruzaram, de modo que os espíritos de algumas pessoas que o Lorde matou (como o pai e a mãe de Harry, Cedrico, etc.) apareceram e ajudaram Harry a se salvar. Já estava mais do que claro que o menino possuía mais sorte do que qualquer outra coisa ou até mesmo algo como um auxílio do além.
- Meninos! Voltem aqui agora! – bradou a senhora Weasley do corredor – Ele ainda está se recuperando!
- Harry! – exclamou Hermione radiante, escancarando a porta do quarto – Mas você mal sai de Hogwarts e já procura encrenca!
- Na verdade Hermione, foi a encrenca quem procurou Harry lembra? – comentou Rony dando um sorriso discreto para o amigo.
- Ah, certo. – resmungou ela se aproximando de Harry e lhe dando um beijo na testa – Mas como está se sentindo agora? – Ela colocou a mão na testa do amigo com uma expressão de preocupação – A senhora Weasley disse que Rabicho pegou pesado com você...
- Estou ótimo. – assegurou Harry com uma vitalidade aparente – Graças a Lupin estou muito melhor do que poderia estar.
- Isso é verdade cara... Foi muita sorte mesmo ele ter chegado a tempo. – comentou Rony aliviado.
- Como vocês chegaram aqui? – perguntou Harry querendo mudar o foco do assunto.
- Não lhe contei Harry? – indagou Hermione surpresa – Os membros da Ordem acham melhor que eu more com Rony para que eu e meus pais fiquemos mais seguros.
- E você está gostando? – quis saber Harry.
Hermione assentiu, porém Harry não se convenceu por completo, afinal, Rony não era uma das melhores companhias para se dividir um lar.
- Mas quantas coisas aconteceram nesses três dias em que nós nos separamos em Hogwarts... Mal dá para acreditar! – comentou Harry pensando em como as coisas estavam acontecendo rápido em sua vida. Ele ainda se lembrava da primeira vez em que entrara nos lustrosos portões do castelo, e para Harry, nem parecia que já fazia quase sete anos desde que aquilo acontecera.
- Com licença meninos, - interrompeu o professor Lupin entrando discretamente na sala – Receio que Harry terá de se arrumar agora.
- Você conseguiu convencer a senhora Weasley? – perguntou o menino quase não conseguindo conter a sua satisfação.
Lupin assentiu timidamente e antes de sair, acrescentou:
- Encontro você no jardim dentro de quinze minutos.
Harry concordou e logo começou a explicar o que estava acontecendo para Rony e Hermione.
- E agora eu vou à reunião da Ordem da Fênix com Lupin. – terminou ele por fim.
- Isso é fantástico! – comemorou Hermione – Então você é um membro oficial da Ordem?
- Não exatamente - respondeu Harry –, mas pretendo ser em breve!
- E será que nós podemos ir junto à essa reunião? – perguntou Rony animado.
- Não sei - começou a dizer Harry –, vamos falar com Lupin e depois...
- Nem pensem nisso! – gritou a senhora Weasley do outro lado da sala, de modo que Harry nem teve coragem de terminar a frase.
- Sinto muito. – lamentou ele decepcionado, pois afinal, ter Hermione e Rony ao seu lado em um momento daqueles seria de grande ajuda – Eu vou voltar logo, prometo.
- Isso não é justo Harry! – reclamou Hermione – Nós devíamos ajudar você com tudo isso.
- E vocês vão me ajudar – rebateu Harry -, esqueceu da caça às Horcuxes? Assim que eu voltar nós já vamos partir para a busca.
Rony pareceu um pouco mais entusiasmado com a notícia, já Hermione ainda não havia se conformado com o fato de não poder acompanhar Harry a reunião, de modo que saiu carrancuda do quarto, obrigando Rony a segui-la.


 
Minutos depois, Harry apareceu no jardim de banho tomado, cabelo penteado e malas prontas, ele queria estar mais do que apresentável a todos.
- O que você entendeu quando Lupin disse quinze minutos? – perguntou Jorge sarcástico.
- Desculpe pelo atraso. – respondeu ele encabulado enquanto procurava com o olhar Rony e Hermione, porém os dois amigos não se encontravam ali – Onde estão Rony e Hermione?
- Eles ainda estão bravos por não poder acompanhar você. – respondeu Fred indiferente – Mas pediram que eu lhe entregasse isso e que só abrisse quando chegasse à reunião. – Fred entregou a Harry a bolsinha de contas de Hermione, logo em seguida dando de ombros – Não me pergunte o porquê disso...
- Hum, obrigado. – agradeceu Harry guardando a pequena bolsinha, que apesar do tamanho, possuía um peso totalmente desproporcional e que fazia ele se questionar sobre o que se encontrava ali dentro.
- Já está na hora. – avisou Lupin tocando no ombro do menino – Nós vamos aparatar até lá.
- Então isso é um adeus? – perguntou Harry observando os rostos carinhosos dos Weasley, que sempre o recebiam no calor de sua família.
- Receio que sim. – respondeu Lupin – Mas nós voltaremos em dois dias.
- Tenha uma boa viagem querido. – desejou a senhora Weasley lhe dando um abraço fraternal – Acho isso uma péssima ideia, porém entendo a sua situação.
- Obrigada senhora Weasley.
- E não se esqueça de ter juízo. – completou Arthur Weasley apertando a mão do menino.
- Pode deixar. – E após Harry se despedir de cada um deles, seu olhar parou no último rosto que ele ainda não dera um adeus: Gina. Suas feições perfeitas e expressão branda faziam com que Harry quisesse esquecer tudo e se entregar a seus braços. No entanto, ele não poderia saciar o seu desejo, pois tinha um propósito a cumprir.
- Tchau Gina. – disse ele quando finalmente conseguiu engolir o nó em sua garganta e falar alguma coisa.
- Tenha cuidado. – respondeu ela por fim. Sua voz macia misturada com a leve fragrância que provinha de seu pescoço tornava-na irresistível em todos os sentidos. Harry ficou alguns segundos só observando Gina, até que foi interrompido por Lupin perguntando se eles já podiam ir.
- Sim, acho que sim. – respondeu Harry com os pensamentos ainda voltados para a ruiva a sua frente.
- Segure-se em mim. – pediu Lupin. Harry obedeceu sem pestanejar, e segundos depois, ele já estava aparatando em direção a sua próxima e incerta jornada, ainda com o aroma de Gina surtindo efeito em todos os seus nervos conscientes.


Assim que Harry e Lupin pisaram em terra firme, uma brisa fresca soprou do leste refrescando os dois viajantes antes mesmo de eles abrirem os olhos e se darem conta de que já haviam terminado de aparatar. O menino sentiu o cheiro de água salgada misturado a um aroma doce de cerejal, e a vontade de acordar e descobrir o que se ocultava por de trás do mundo para qual ele acabara de aparatar, moveu seus atos seguintes. Harry abriu os olhos, respirou fundo a abraçou a vida como nunca havia feito antes. Ele sentia  sensações mais vivas do que nunca, era como se aquele lugar até então desconhecido, despertasse todos os aspectos bons que a vida tinha a oferecer.
 - Onde estamos? - perguntou ele extasiado.
- Em algum lugar no litoral da Califórnia. - respondeu o professor Lupin também sentindo e admirando a natureza – Nós da Ordem, estamos sempre diversificando os locais das reuniões para não ter a chance de Voldemort nos descobrir. Essa foi a vez de nos reunirmos na casa de campo do Lorde Tensill em Londres.
- Esse lugar é maravilhoso. - concluiu Harry após vislumbrar a área em que se encontrava, onde imensas colinas verdes se estendiam atrás das majestosas plantações de  cerejas. Uma deslumbrante mansão branca cor de neve se colocava a frente da paisagem silvestre, fazendo com que o sol de fim de tarde refletisse um arco-íris de cores sobre o céu azul anil. Do lado oposto às colinas e à plantação, mais abaixo a inclinação em declive, se apresentava um pequeno e adorável vilarejo, porém, isso pouco tinha importância se comparado ao imensurável Oceano Atlântico. Atrás de toda a propriedade habitada, aquela grande porção de água salgada hipnotizava os olhos de qualquer um que observasse. O sol estava se pondo, de modo que o azul límpido da água se chocava com o amarelo alaranjado da grande estrela que sustenta a terra, desenvolvendo a vida e assim por diante. Gaivotas voavam por todos os cantos, completando a vista mais divina já presenciada.
- É inacreditável não é, Harry? - perguntou Lupin suavemente – Olhando para tudo isso, podemos esquecer um pouco o que nos aguarda no mundo dos bruxos e simplesmente ser um pouco trouxa para variar.
- É muito mais do que esquecer o que nos aguarda Lupin – comentou Harry já totalmente persuadido pelo lugar -, é como se existisse muito mais do que nós estamos limitados a saber.
- Professor Lupin? - perguntou uma voz feminina extremamente conhecida, vindo de trás deles, ou seja, da ilustre mansão branca neve.
Os dois se viraram simultaneamente, e logo Harry reconheceu a dona da voz suave e familiar.
- Olá Luna. – cumprimentou Lupin sorridente – Seu pai resolveu trazê-la junto a reunião?
- Sim. - respondeu ela radiante – E o que Harry faz aqui?
- Ele quis vir também. -  respondeu Lupin rapidamente.
- Mas não é perigoso? - perguntou ela um pouco apreensiva.
- Acho que ele está ciente dos riscos que está correndo. - respondeu Lupin por fim.
- E você Luna? Vai se juntar a nós na reunião? - indagou Harry entrando na conversa.
- Infelizmente não posso. - respondeu ela tristonha – Só estou acompanhando meu pai mesmo.
- Bom, agora que você já tem com quem conversar, vou dar uma passada lá dentro e dar a notícia de que você está comigo. - disse Lupin – Você pode esperar aqui Harry?
- Sem problemas. - respondeu ele voltando sua atenção unicamente para Luna que sorria debilmente a sua frente.
- Onde estão Rony e Hermione, seus fiéis escudeiros?  - perguntou ela enquanto Lupin entrava acompanhado de um mordomo na grande mansão.
- Tiveram que ficar na casa de Rony. - respondeu Harry se lembrando do pedido de Hermione para que ele abrisse sua bolsinha de contas assim que chegasse no local da reunião – A senhora Weasley não permitiu que eles viessem junto comigo.
- É uma pena... - refletiu Luna – Garanto que eles teriam gostado dessa linda vista.
- Eles decididamente teriam amado essa vista. - concordou Harry tirando a mochila das costas e colocando-a em cima da grama para abri-la.
- O que você vai fazer? - perguntou Luna cheia de expectativa.
- Hermione pediu para que eu abrisse sua bolsinha de contas assim que chegasse aqui. - respondeu ele enquanto retirava da mochila a bolsinha da amiga – Quero saber porquê.
- É um tanto curioso ela pedir a você uma coisa dessas... - comentou Luna pensativa – Vamos ver o que ela queria dizer com isso! Abra a bolsinha!
Harry não esperou Luna pedir duas vezes, abrindo logo em seguida, o zíper da pequena bolsinha de contas. E foi então que duas coisas aconteceram no mesmo minuto.
Primeiro, a bolsinha de contas começou a tremer consideravelmente, e Harry logo se desvencilhou dela, de modo que a mesma foi parar no chão, ainda sacudindo freneticamente. Logo em seguida, a abertura da bolsinha começou a aumentar e segundos depois, um par de braços começou a sair de dentro, dando continuidade com o pedaço de uma cabeça, cujo cabelo era castanho claro bem armado e um tanto desgrenhado.
- Me ajudem! - pediu a voz aguda e feminina que provinha daquele corpo.
Harry e Luna trocaram olhares, os dois perplexos demais para se quer respirar, de modo que eles só continuaram observando aquela cena bizarra.
- Mas que droga! - reclamou a mesma voz, porém segundos depois, a sua mão direita, que antes estava agarrada a borda da bolsa, agora estava com uma varinha na mão.
- “Ascentium” - De repente, Hermione saltou inesperadamente de dentro da bolsa e aterrizou bruscamente nos pés de Luna.
- H-Hermione? - gaguejou Luna apavorada.
-  Sim, sou eu. - respondeu ela irritada – Agora venham me ajudar a tirar o Rony lá de dentro!
Hermione se levantou e logo foi socorrer Rony, que segundo ela, estava preso dentro da bolsinha de contas. Harry e Luna não mexeram nenhum músculo assim como da outra vez.
- Estou vendo que vou ter que fazer tudo sozinha! - reclamou Hermione enfiando o braço dentro da bolsinha que mais parecia ter o tamanho de um poço – Rony! - gritou ela – Segure a minha mão!
Todos ouviram um murmúrio provindo de dentro da bolsinha, e logo a mão de Rony segurou a mão de Hermione, e segundos depois, já se conseguia ver um pedaço da cabeleira ruiva do menino.
- Você está indo bem! - encorajou Hermione – Continue assim!
Depois de mais alguns segundos, a metade do tronco de Rony já estava para fora da bolsa, porém ele parecia estar preso a alguma coisa.
- Por que você não tenta o feitiço que eu usei? - perguntou Hermione cansada.
- Não sei como fazer... - admitiu ele com o rosto corado – Por que aqueles dois não estão ajudando?
- Acho que estão em estado de choque ou algo assim. - respondeu Hermione dando de ombros.
- Pois trate de acordá-los senão eu nunca vou sair daqui! - gritou Rony totalmente sem paciência.
- Vou tentar. - concordou Hermione enquanto sacava a varinha e logo em seguida estuporava Harry e Luna.
- Ai minha cabeça! -  gemeu Harry após ser atingido – Por que você fez isso?
- Para que você acordasse desse seu transe idiota! - respondeu ela  – Agora vem me ajudar!
Harry cutucou Luna, que também estava toda dolorida devido o feitiço de Hermione, e os dois foram ao encontro da amiga para ajudá-la a desenterrar Rony da bolsa.
- Só mais um pouquinho! - dizia o ruivo quando os três amigos chegaram ao quase auge de suas forças.
- Estamos fazendo o melhor que podemos Ronald! - reclamou Hermione vermelha.
- Mas não está funcionando! - continuou a gritar ele.
- Que droga cara! - bradou Harry que, cansado de puxar e ouvir as reclamações de Rony, reuniu toda a força que pôde, e em um excesso de adrenalina, fez com que o amigo saísse voando da bolsinha de contas de Hermione.
- Não sabia que você era tão forte assim Harry! - comentou Luna impressionada.
- Ele não é – esclareceu Hermione olhando feio para o amigo -, ele poderia ter feito isso antes, só estava com preguiça.
- Não acho que preguiça seja o termo certo... - interrompeu Harry – Digamos que eu estava me subestimando.
- Ah claro. - ironizou Hermione - Você está bem Rony?
- Eu estou todo dolorido! -  guinchou ele se levantando do chão e sacudindo as roupas para tirar a terra.
- Harry havia dito que vocês não tiveram permissão para acompanhá-lo. - disse Luna olhando de Hermione para Rony – O que fazem aqui?
Harry abriu a boca para concordar com Luna, porém, foi interrompido por Hermione e sua explicação para todo aquele impasse.
- Nós não podíamos deixar você ir sozinho Harry! - começou a dizer Hermione com sua atenção voltada mais para Harry do que para Luna, que fora quem realmente fizera a pergunta – Eu e Rony achávamos que você não iria mais voltar para casa e que ia direto procurar as Horcruxes!
- Nós sabemos que você prefere que nós não viajemos com você... - disse Rony não conseguindo olhar diretamente para Harry – Mas você não pode fazer tudo sozinho, e por mais que seja difícil de admitir, você precisa da gente! Tudo bem, talvez você não precise tanto assim de mim, mas você com certeza precisa de Hermione!
- Acho que ele já entendeu Ronald! - interrompeu Hermione abespinhada – Mas então Harry, você está bravo com a gente?
- Como eu poderia estar bravo com vocês? - retrucou Harry perplexo – Vocês são meus melhores amigos e eu não poderia estar mais feliz que vocês estejam aqui! - Ele abraçou os dois amigos com a felicidade evidente em sua face -  E por mais que eu não queira arriscar a vida de vocês nessa viagem, eu acho que não conseguiria grande coisa sem a inteligência de Hermione e, bem... a companhia de Rony.
- Viu Hermione? A minha companhia é útil! - comentou Rony fazendo com que todos começassem a rir deliciosamente.
- Isso é tão emocionante. - disse Luna se acabando em lágrimas – A ligação entre vocês três é tão linda que me vez chorar!
- Ligação? - repetiu Hermione
- Linda? - retrucou Harry
- Chorar? - indagou Rony
Os três deram de ombros, afinal, a última coisa que eles gostariam de fazer naquele momento era tentar entender Luna Lovegood e suas emoções singulares.
- Mas e a senhora Weasley? - perguntou Harry voltando à realidade de que seus amigos de fato haviam fugido de casa.
- Nós deixamos um bilhete para ela. - explicou Rony - Mamãe vai ficar bem.
- E que ideia brilhante foi essa de se colocar dentro de uma bolsinha de contas? - indagou Luna encarando a bolsinha toda desgastada devido ao fato de que duas pessoas haviam acabado de sair de dentro dela.
- Eu já tinha comprado essa bolsinha para a viagem das Horcruxes porque ela é pequena mas guarda mais coisas do que Rony pode contar. - respondeu Hermione - E eu já tinha ouvido falar sobre esse feitiço que eu usei também, de modo que tudo foi surpreendentemente fácil.
- Surpreendentemente fácil pra você! - retrucou Rony - Eu quase vomitei quando você aparatou com Lupin, Harry.
- Eu não esperava nada menos de você Rony... - comentou Harry ainda não acreditando em como as coisas estavam perfeitas em sua vida naquele momento, porém, ele nunca esquecia o fato de que o assassino de seus pais estava a solta e queria matá-lo mais do que qualquer coisa em sua existência.

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