Capitulo 4
Em meio ao silêncio empoeirado do escritório, os dois homens olhavam-se.
— Veja bem, Harry — disse Raoul. — Sei o que você deve estar pensando, mas prometo que tudo dará certo. Eu conversarei com Gina e ela acabará aceitando, você vai ver. Mas claro que se você fosse um pouco mais... amigável com ela, digamos assim, isso facilitaria as coisas. Não há uma mulher no planeta que não ceda com um pouco de bajulação.
Em silêncio, Harry ficou olhando para Raoul até que disse:
— Amigável? Bem, você deve conhecer sua prima muito melhor do que eu, Raoul. Embora eu nunca fosse imaginar...
— A Gina é legal — disse Raoul. — Claro que ela foi um pouco mimada e é um tanto teimosa. Sua avó contribuiu para isso. Ela se casou com um homem de uma família inglesa muito rica.
Ele ignorou o fato de que toda a riqueza deles foi perdida muito antes do nascimento de Gina.
— Não há por que se preocupar, Harry — continuou Raoul. — A Gina é um pouco ingênua, um pouco antiquada, mas daremos um jeito nela. Deixe tudo comigo, Harry — disse ele arrogantemente.
— E... Acho que isso explica o comportamento dela — disse Harry com sarcasmo.
— Deixe comigo, Harry. Pode deixar! — repetiu Raoul arrogantemente.
Harry ergueu as sobrancelhas. Estava ficando óbvio que Gina estava numa posição bastante vulnerável em relação a Raoul e aos negócios. Se ela fosse de sua família... Mas ela não era. E ele não a defenderia, não depois da hostilidade com a qual ela o tratou.
Ele não estava acostumado com hostilidade vinda de mulheres. Pelo contrário, ele nunca precisava correr atrás delas e ele não tentaria nada justamente com a que demonstrou não gostar dele. Ele não perderia seu tempo com isso.
O mais importante agora era garantir a aquisição da Francine. Harry achou que ao comprar a loja, também teria direito sobre as fórmulas dos perfumes, incluindo a do Myrrh, bem como sobre Gina que era quem os criava. Agora parecia que Raoul não havia sido cem por cento honesto com ele.
— Tudo dará certo, Harry. Posso assegurar-lhe. Só temos que convencer Gina e dizer-lhe que você concorda que ela use os tão falados ingredientes naturais.
— Mas temo que não podemos fazer isso, Raoul. Todos da diretoria da minha empresa teriam um ataque do coração só de ouvir falar no preço de tais ingredientes.
— Mas você não precisa dizer isso a Gina, precisa?
— Você está sugerindo que eu minta para ela?
— Você quer a fórmula do Myrrh e quer que ela trabalhe para você, não é mesmo?
— Raoul, por que você não me disse nada sobre a opinião da sua prima? E por que não me falou que ela era quem detinha a fórmula do Myrrh?
— Não achei que fosse tão importante. E tenho certeza de que você poderá provar que as fórmulas pertencem à loja. Afinal de contas, um homem como você tem acesso aos melhores advogados. Gina não tem dinheiro para brigar com você no tribunal e além disso você poderia poupar muito trabalho e confusão se agisse como eu estou lhe dizendo.
— Você parece não se importar o mínimo com sua prima, Raoul.
Sem nenhum embaraço, Raoul respondeu:
— Definitivamente me importo mais comigo mesmo do que com ela. Eu preciso vender a Francine, Harry. E se não for para você, será para outro cliente. E não vou deixar Gina interferir.
— Acho que eu preferiria falar com a sua prima pessoalmente — disse Harry. — Porque é claro que quero comprar a Francine e claro que desejo aproveitar os conhecimentos de Gina, mas nunca a enganaria com relação aos meus planos para os negócios.
Quando Harry viu Gina na feira de negócios, ele teve a impressão de que ela era exatamente igual ao primo. Mas agora estava mudando de idéia.
Mas isso não era hora de ser solidário com ela. Até porque, pelo temperamento dela, Harry desconfiava que ela não aceitaria nenhum tipo de solidariedade vinda dele.
— Tudo bem, se é isso que você quer fazer... Afinal, você vai ser o chefe!
Vai ser, pensou ele, mas ainda não é.
Ele não deixaria Gina estragar seus negócios e não deixaria nas mãos de Harry a missão de fazer a cabeça de sua prima. Não sabendo que ele podia fazer isso de forma muito mais rápida e simples.
Em sua elegante suíte de hotel, Harry falava no telefone com um de seus funcionários em Sidney. Ao desligar, ele foi até a varanda.
O fato de Gina ser a dona da fórmula do Myrrh era um problema que ele não havia previsto. Mas ele nem chegou a pensar em usar as táticas de Raoul! Mentiras e trapaças eram armas não utilizadas no império dos Stapinopolous, embora uma vez elas tenham sido usadas contra ele o que teve um efeito devastador e quase destruiu os negócios da família por completo.
O rosto de Harry ficou sério de repente. Aqueles olhos verdes estavam lembrando-se da época em que sua família quase perdeu tudo. Estava lembrando o quão duro foi para todos eles. Sem dúvida, aquele episódio deixara uma marca triste e profunda nele. Mas ele não queria pensar no passado. Não quando seus pensamentos tomavam um rumo muito mais interessante.
Um leve sorriso apareceu no rosto dele enquanto pensava no que teria chamado mais sua atenção: as pernas longas de Gina naquele jeans justo ou a intensidade com a qual seus olhos revelavam suas emoções.
Ela era teimosa ao extremo, impetuosa e idealista, pensou ele. Uma mulher disposta a lutar com unhas e dentes pelo que acreditava. Uma estranha no mundo convencional dos negócios que só visa ao lucro. Uma mulher com idéias próprias. Era sinônimo de confusão.
Harry ficou imaginando o estardalhaço que ela provocaria em sua diretoria. Com certeza eles questionariam se valeria mesmo a pena enfrentar tanta confusão para comprar a Francine.
Mas será que ela realmente acreditava que era possível produzir um perfume em quantidade suficiente para atender ao mercado, por um preço acessível, usando apenas ingredientes naturais?
Seria viável fazer uma coisa dessas?
Ele já vinha sofrendo com a oposição de alguns membros da diretoria que questionavam a compra da Francine. Mas era uma oposição que ele tinha a intenção de eliminar. Uma oposição que ele tinha que eliminar de qualquer jeito.
— Por que justo a Francine? — perguntou um dos diretores. — Há várias outras lojas de perfume em melhor condição financeira.
— Porque é a Francine que eu quero — rebateu Harry. — Ela tem um nome. Um nome que atrai. E justamente por causa de sua condição financeira, podemos comprá-la por um preço razoável e remodelá-la a nosso gosto. O lançamento de um novo perfume da Francine será um grande sucesso! Podem acreditar!
— O novo perfume da Francine? — questionou um outro diretor. — Mas porque fazer tudo isso? Podemos simplesmente pedir a um químico que crie um novo perfume e contratamos uma modelo para fazer a propaganda dele. É isso que todos estão fazendo.
— E é exatamente por causa disso que nós faremos diferente.
Harry sabia que corria um grande risco. Definitivamente, ele sabia disso. Para se conseguir lançar um perfume de sucesso, lançava-se vários que eram esquecidos até se conseguir emplacar com uma fragrância. Lançar um perfume sempre era um grande risco mesmo para uma loja de perfumes estabelecida, com produtos já conhecidos no mercado. O que a Francine tinha era o nome e algumas fórmulas de perfumes famosos.
Mas não a fórmula do Myrrh...
Em seguida, Harry virou-se de costas para a vista. Na mesinha de cabeceira, entre seus objetos pessoais, havia um porta-retratos com uma foto. Ele o pegou e começou a analisar os traços delicados e femininos da mulher na fotografia. Ele parecia emocionado ao olhá-la.
As Ginas do mundo não conheciam nada da vida, pensou ele consigo mesmo. Bem-nascidas, elas acham que a vida é fácil, que a vida está ganha.
Será que ela nunca pensou que apenas algumas poucas mulheres podem se dar ao luxo de comprar os perfumes que ela fabricava? Será que ela já tinha pensado nisso, mas não se importava?
Bom, mas ele certamente se importava. E se importava muito, como ela iria descobrir em breve.
(...)
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