Capitulo 2
Eles viajaram em silêncio por diversas horas, e as costas de Gina passaram de dor à agonia e, finalmente, a uma abençoada dormência. Suspirando, movimentou os ombros. Se algum dia conseguisse sair daquela carroça, nunca mais ia querer se sentar.
Estavam se dirigindo para o oeste, seguindo uma fileira de morros baixos, quando ela se deu conta de que se encontravam muito próximos da água. Nuvens peroladas empilhavam-se diante deles, e o sol, quase se pondo, estendia-se como uma faixa cor de laranja acima dos morros escuros. Ela inalou o ar úmido. O lugar era certamente selvagem, mas tinha de admitir que a paisagem era maravilhosa.
Começaram a descer uma ladeira íngreme de lama, e ela ouviu o som de água corrente. Proferindo algumas palavras em gaélico, Harry conduziu o cavalo ao redor das pedras e raízes da estrada. Fizeram uma curva, e o som de água corrente aumentou. Então, um rio apareceu através das árvores.
Os lábios de Gina secaram. Obviamente, Harry não pretendia atravessar aquilo. Antes que pudesse falar, ele envolveu as rédeas na vara de madeira usada como um breque e pulou, seguido por Hugh. Um galho de árvore esbarrou na lama corrente. O cavalo relinchou.
Ela afastou uma mecha de cabelos dos olhos.
— Harry...
— Você sabe conduzir um cavalo, mo druidh — Harry encontrou o olhar de Hugh por sobre a cabeça do animal.
— Sim, mas...
— A chuva da noite passada foi muito forte, e a água está mais alta do que quando atravessamos ontem. Hugh e eu teremos que liberar o caminho para Gray.
0 pulso de Gina acelerou. Ela abriu a boca para protestar, mas Hugh falou primeiro:
— Estamos correndo um sério risco, Harry. A moça não parece saber lidar com um cavalo, e a carroça não está muito pesada. Podemos facilmente ser levados pela correnteza.
— Sim, mas precisamos chegar até Draco, não concorda, Srta. Weasley? — Harry deslizou a mão grande ao longo do cavalo e levantou os olhos verdes para ela. O cavalo se acalmou sob o toque.
Gina fitou a água escura e pensou em Draco, e também na caixa de ervas e remédios que tinha na mala.
— Bem, se você acha que conseguiremos...
Harry assentiu.
— Temos uma manta, mo druidh
Levou apenas alguns momentos para remover uma manta de lã da mala de Gina. Harry colocou-a sobre os olhos de cavalo, então ele e Hugh agarraram as crinas do percheron, puxando-o para frente. Gina segurou as rédeas como se fossem cordas de salvamento. Não podia demonstrar medo, ou o animal perceberia. Lentamente, respirou fundo e relaxou os pulsos. O animal pisou na água agitada.
A força da correnteza empurrou Harry para o ombro de Gray, e o cavalo empinou. Harry conversou em tom baixo com o animal, encorajando-o a prosseguir. As rodas da frente da carroça penetraram a água, e os pequenos degraus de madeira estalaram sob a pressão. Gina tremeu. Por um terrível momento, pensou que o rio lamacento os tragaria para seu leito de maneira inexorável. Então o ruído de cascalhos sólidos vibrou contra a estrutura de madeira.
— Temos que ir mais rápido — gritou Harry. — Caso contrário, seremos levados pela correnteza. Use as rédeas, Srta. Weasley. Hugh, prepare-se para correr. Prontos agora? Um, dois, três...
— Hyaaah! — Gina bateu no lombo de Gray. Hugh e Harry empurraram a parede de água. Com um relincho assustado, Gray abaixou-se sobre as ancas, depois, se movimentou para a frente, arrastando Hugh e Harry no seu rastro. A carroça agitou-se no meio do rio. As rodas de trás se levantaram e flutuaram. O coração de Gina quase parou.
Uma onda estourou em cima da cabeça de Hugh, e ele agarrou-se às crinas de Gray.
Harry balançava o corpo de um lado para o outro e conseguiu fazer progresso contra a implacável correnteza.
Gray deu outro mergulho heróico, e Gina suspirou aliviada quando a água de repente ficou mais rasa. A carroça ainda desviava perigosamente, mas a margem do rio estava tão perto. Após arranhar as patas no fundo nas pedras, o pobre animal saltou para a frente como se estivesse sendo perseguido por demónios. Um súbito estalo fez o veículo vibrar com força. Todos os movimentos avante pararam, a carroça inclinou para o lado, e Gray ergueu-se, relinchando e espirrando água em todas as direções.
Hugh perdeu o apoio da crina, e o rio lançou-o em direção à estrutura de madeira, Com um grito, ele desapareceu embaixo da água.
— Hugh — gritou Gina, levantando-se e puxando as rédeas. A roda traseira da carroça bateu numa pedra, e ela balançou. De súbito, Harry estava lá, os cabelos escuros brilhavam como seda molhada. Com mãos firmes, ajudou o cavalo aterrorizado a escalar o banco de pedras do rio.
— Fique aqui — Harry falou para Gina. — A carroça está presa, e você está segura. — Ele olhou por sobre a água, então mergulhou, freneticamente procurando Hugh.
— Estou aqui! — Hugh tirou a cabeça e os ombros debaixo da água e agarrou-se na parte traseira da carroça. Uma pedra cortara a testa e a cabeça dele. O sangue escorria-lhe sobre os olhos, enquanto ele se esforçava para subir na carroça.
— Mantenha-se firme, amigo — soou a voz de Harry. Ele posicionou um ombro largo sobre a parte inferior do corpo de Hugh, erguendo-o da água. Em poucos instantes, o velho senhor estava seguro na margem do rio. Harry rasgou o kilt de Hugh e enrolou-o na testa ensanguentada do amigo.
— Harry — chamou Gina. — Não agora. Mas...
— Fique quieta. Preciso deter o sangue. Você está segura onde está.
— Harry Tiago Potter, escute-me um instante! — Furiosa, ela levantou a saia e pulou no rio.
A água gelada lhe tirou o fôlego. Lama com gosto de algas espirrou em sua boca. Ela resmungou qualquer coisa e deu um passo na direção aos homens. O pesado vestido de musseline foi sugado pela correnteza e arrastou-a para trás.
Ela praguejou em voz alta.
— Sua tola! O que você está fazendo? — Harry a pegou nos braços e colocou-a na margem do rio. Os olhos verdes faiscavam, e, em um louco momento, ele a pressionou contra o peito. Então a sacudiu.
— Solte-me! O único jeito de deter o sangramento de Hugh é dando pontos, e eu gostaria de ver suas grandes mãos fazendo isso. — Gina afastou seu rosto do dele, desafiando-o. — Agora, pegue a minha mala. Há uma caixa de madeira em cima. Traga-a para mim.
Ela virou-se e foi em direção a Hugh.
Harry praguejou em gaélico, entrou no rio e foi para a carroça.
Gina agachou-se ao lado do escocês mais velho e examinou o ferimento, enquanto o sangue escorria entre seus dedos. Felizmente, o corte da cabeça não era tão profundo. Mantendo o semblante calmo, ela viu que a pele que se soltara estava suja de lama.
— Eu vou sobreviver, moça? — Perguntou Hugh com um sorriso fraco.
— Sim — respondeu e deu um sorriso e um tapinha carinhoso no rosto pálido.
Harry colocou a caixa de medicamentos a seu lado. Ela abriu a tampa de madeira e, como sempre, uma onda de alegria a percorreu. Sua vida na Inglaterra podia ter terminado, seu futuro com Draco podia ser tão incerto quanto as chances de sobrevivência, mas aquilo sempre estaria com ela. As ervas, os instrumentos de ouro, as receitas e os segredos da cura. Isso sempre lhe daria a segurança de que precisava.
Continua....
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