Tudo novo



Um lado bom de virar noiva? Ah, sim. Claro que tem um lado bom. Eu não tenho mais tantas aulas de piano e não preciso ficar toda hora em casa, onde eu só tenho a escolha de me trancafiar no meu quarto ou andar pela casa e correr o risco de esbarrar com minha mãe.


E a companhia de Harry estava mostrando-se cada vez mais agradável. Ele nunca mencionava o casamento e sempre conversávamos apenas como amigos. Hoje o convite foi para tomarmos um sorvete. Eu adoro sorvete!


_Já escolheu o seu, Ginny? – Ele perguntou após uns dez minutos em que estávamos sentados frente a frente na mesa da soverteria e eu com o cardápio na mão.


_Ai... São tantos... – Eu disse confusa.


_Vou te ajudar então. – Ele disse pacientemente, sorrindo. Olhei desesperada para o cardápio novamente em busca de algum sabor que me chamasse a atenção, enquanto ele trouxe a cadeira para o meu lado.


_Gosta de morango?


_Gosto.


_Leite condensado?


_Gosto também.


_Que tal um Sunday de leite condensado e morango?


_Isso! – Eu sorri para ele. Harry riu e acenou para um rapaz, que veio nos atender. Ele voltou para o seu lugar e ficou olhando para mim.


_O que foi? – Eu perguntei, sentindo meu rosto esquentar.


_Nada.


_Para de me olhar então. – Falei, subindo o cardápio até que tampasse meu rosto e o escutei rir.


_Ginny, queria te fazer um convite. – Ele disse e eu voltei a colocar objeto na mesa, olhando-o. – Você gosta de cavalos, né?


_Gosto. – Eu respondi. Existe animal mais magnífico e lindo e forte e...


_Minha família tem uma fazenda a mais ou menos um dia de cavalgada daqui. Se você quiser, podemos passar uns dois dias lá.


_Fazenda? – Meus olhos de esbugalharam. – Quero sim. Mas não tem como irmos...


_O que te faz pensar assim? – Ele olhava-me interessado.


_Uhm... Acredito que não deixarão viajarmos antes... do... casamento. – Minha voz ia sumindo enquanto eu escorregava o olhar para as minhas mãos em cima da mesa. Será que meu rosto tinha que esquentar todas as vezes que surgiam esse assunto?


_Se você quiser, tem como irmos sim. Acredito que seus pais não irão se importar de passarmos uns quatro dias fora. E eu te garanto que você não ficará mal falada.


_Se for assim, eu quero sim. – Sorri para ele.


_Ótimo. Que tal amanhã?


_AMANHÃ?


_É Ginny. – Ele riu. – Amanhã é sábado e então perderei apenas dois dias de trabalho.


Eu apenas acenei com a cabeça enquanto o garçom colocava as taças de sorvete à nossa frente.


 


 


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Os cavalos já nos aguardavam na saída da cidade como eu havia solicitado a um dos homens que trabalhavam em minha casa. Algo me dizia que íamos apenas precisar de um, mas quem sabe Ginny já não teve aulas de equitação também, junto com as tantas outras.


Busquei-a em sua casa com o meu carro. Seus pais não mostraram a simpatia que costumavam quando me viram. Já era de se esperar. Eles eram contra a nossa estadia fora e não poderiam fazer nada. Não liguei. Eu só queria passar um pouco mais de tempo com Ginny, para dar-lhe a oportunidade de, quem sabe, aceitar nosso casamento.


Ela já me trata bem melhor do que no início e isso me deixa cada vez mais feliz e apaixonado por essa moça. Além de linda, ela tinha um jeitinho diferente, espontâneo. Não era comedida igual as outras damas, que faziam de tudo para agradar a um homem. Ela agia conforme as suas emoções, e isso me agradava. Muito.


         Vi que ela lançava um olhar encantado para os cavalos quando chegamos, mas logo foi substituída por preocupação quando ela se deu conta que tinham dois.


         _Sabe montar, Ginny?


         _Sei subir e cair do outro lado. – Ela respondeu com um sorriso divertido. Eu ri.


         _Então montaremos juntos. – Eu disse, já me virando para o rapaz que nos aguardava. – Francis, retire a sela do cavalo, leve o carro até minha casa e depois mande alguém buscar o outro.


         _Sim, senhor.


         _Não vai ficar muito pesado pro cavalinho? – Escutei a voz de Ginny perguntar a uma certa distância. Vir-me-ei a tempo de vê-la encostar o rosto no pescoço do cavalo, que estava de olhos fechados aprovando a carícia em sua cabeça. Sorri. A cena era graciosa.


         _Não, Ginny. Esse cavalo é treinado e não tardaremos a parar para descansar.


         _Dormiremos na estrada? – Ela perguntou de olhos arregalados, desencostando do animal.


         _Sim. Para chegarmos hoje teríamos que sair a galope e pra quem não está acostumado é difícil.


         _Ah... – Ela me pareceu desapontada. Realmente, quem está acostumado com o conforto não iria gostar dessa parte.


         _Vamos? – Eu perguntei me aproximando. Amarrei as trouxas com as nossas coisas no pescoço do cavalo e subi, estendendo uma mão para ela. Ela me olhou incerta e eu apenas sorri para confortá-la. – Prometo que não te deixarei cair do outro lado.


         _Se eu for cair, eu te levo junto. – Ela ameaçou e então pegou minha mão e se impulsionou para cima. Como não havia nenhum apoio para seu pé, ela não conseguiu subir o suficiente para sentar-se mesmo com a minha ajuda e escorregou de volta para o chão. Então eu achei melhor tentar de outro jeito. Desci e, em um movimento rápido, segurei-a pela cintura e coloquei-a em seu lugar sobre o cavalo. Ginny soltou um grito de susto e logo ficou vermelha. Era adorável vê-la com vergonha. Subi novamente. – Com licença. – Eu pedi e a enlacei com um braço pela cintura fina. Senti-a enrijecer. Com a outra mão, peguei a rédea do cavalo, que começou a caminhar para a saída da cidade.


         Caminhamos em silencio até sairmos totalmente da cidade e entrarmos na larga estrada de chão rodeada por árvores em ambos os lados. Eu já estava ficando incomodado com pose dela. Dava a impressão que suas costas iriam se romper a qualquer momento.


         _Ginny, vou acelerar o cavalo e você vai ficar com dor nas costas se continuar ereta desse jeito. – Eu alertei.


         _Eu estou bem. – Ela respondeu baixinho. Então eu apenas a puxei para mais perto, eliminando o espaço entre nós, para fazê-la encostar-se em meu peito. Senti-a ofegar e remexer-se desconfortavelmente. Fiquei com um pouco de pena. Eu nunca havia tocado-a mais do que o necessário para enlaçarmos nossos braços. Mas, definitivamente, um mau jeito na coluna iria estragar a sua estadia na fazenda. Encostei meu queixo no topo de sua cabeça e acelerei o cavalo. Ela assustou e segurou a minha mão que a mantinha segura pela cintura e eu logo virei-a para poder enlaçar-la na dela, afagando-a com o dedo. Aos poucos Ginny moldou o seu corpo no meu, deixando a rigidez de lado e relaxando em meu colo.


         Eu deixei o cavalo galopar no ritmo dele. Nem rápido, nem devagar. Se fôssemos no trote, a moça logo se cansaria. Senti sua pequenina mão afagar a minha timidamente, o que me fez perguntar sobre o que ela estaria pensando. Logo o cheiro de umidade invadiu o local e eu sabia que, se atravessássemos as árvores do lado direito, encontraríamos um comprido lago, que nos acompanharia até perto da fazenda.


         _Harry.


         _Oi.


         _O que é que tem pra fazer na fazenda?


         _Lá tem um lago, tem vários animais, inclusive cavalos. Se quiser eu te ensino a montar.


         _Eu quero. – Ela respondeu sonolenta.


         _Pode dormir, Ginny. O caminho hoje vai ser longo. Eu te acordo quando formos parar.


         _Não estou com sono. – Eu apenas sorri. Não dava poucos minutos para ela adormecer.


 


         O sol já se escondia no horizonte. Desacelerei o cavalo e sai da estrada, indo para perto das árvores.


         _Vamos parar?


         _Você estava acordada? – Eu me espantei. Dês de quando? – Sim, já vai escurecer.


         Havia uma grande árvore aqui que poderia nos abrigar seguramente por uma noite. Desci do cavalo e ajudei Ginny.


         _ Tem um lago do outro lado dessas árvores, se quiser tomar um banho, eu vou arrumar as coisas para comermos. – Ela me pareceu preocupada.


         _Pode ir. Eu arrumo as coisas.


         _Você quem sabe. – Peguei a roupa e entreguei a ela a trouxa com comida. – Qualquer coisa chama. Da pra escutar lá do lago. – Ela concordou e encaminhei-me para lá. A água estava em uma temperatura agradável. Tomei meu banho e, quando voltei para onde o cavalo fora amarrado, Ginny já tinha preparado as coisas para comermos.


         Havia pães, queijos e vinho. Comemos trocando poucas palavras. A moça estava muito pensativa, dando atenção apenas à sua comida. Terminamos e guardamos as coisas. Vi-a hesitar enquanto pegava sua roupa e só então me dei conta de qual era a sua preocupação.


         _Ginny. Vai tomar seu banho tranqüila. Dou a minha palavra que não vou te espiar. – Ela sorriu para mim e então se foi. Sentei-me no gramado entre as grandes e grossas raízes da árvore que havia me chamado a atenção anteriormente. Uma brisa fresca soprava denunciando uma noite fria. Eu conseguia escutar o barulho que Ginny fazia ao se movimentar na água. Será que ela havia trazido agasalhos? Teria pensado nisso?


         A moça demorara pra voltar. Eu havia fechado os olhos e apenas escutei-a se aproximar. A claridade era quase inexistente e a lua cheia já havia aparecido. Podia supor que ela estava guardando suas coisas na trouxa e amarrando-a no cavalo. Logo ela se sentou ao meu lado na árvore, mas eu não podia sentir sua presença. Fora o barulho do farfalhar de sua roupa que a denunciava.


         A noite esfriava e eu fiquei preocupado com o estado de Ginny. Semicerrando os olhos, à minha direita, vi que ela usava um vestido bem mais leve do que os que sempre vestia e estava sentada abraçando os joelhos, o rosto escondido neles, toda encolhida. Quando cogitei em fazer algo para esquentá-la, vi que ela levantava a cabeça e não tardei em fechar os olhos.


         _Harry. – Escutei-a me chamar.  Abri os olhos e vi que ela tinha engatinhado até mim. Poderia esperar para que ela dissesse ou pedisse o que queria, mas seus olhos estavam cheios de lágrimas. Eu retirei meu terno, escorreguei para ficar em uma posição mais confortável e abri-o sobre um braço e metade de meu corpo para que ela pudesse deitar-se sobre ele. Ela não hesitou e se aconchegou, encostando a cabeça no meu peito e eu abracei-a. Estava gelada e tremia. Seus cabelos, agora soltos, estavam molhados. Não liguei que eles pudessem me molhar. O cheiro que emanavam me inebriava.


_Obrigada. – Ela agradeceu baixinho, algum tempo depois, quando parou de tremer.


         _Ginny.


         _Uhm?


         _Você está sob meus braços...


 


 


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         <i>O homem era um porco!</i>


         Virei minha cabeça para cima e vi seus olhos esmeraldas brilharem quando encontraram com os meus. Tentei me afastar, mas seus braços estavam presos firmemente ao meu redor. O desespero começou a tomar conta de mim.


         Ele retirou-me de cima dele com facilidade e me colocou deitada no gramado, apoiando-se em um de seus braços enquanto segurava-me firmemente pela cintura. A luz da lua revelava apenas a sua silhueta.  Seu olhar me distraiu por alguns segundos, havia carinho neles. Desejei poder mergulhar naquela imensidão. Ele começou a inclinar-se em minha direção e me despertou. Tentei empurrá-lo com as duas mãos.


         _O que você teme?


         _Eu... – Por um instante quis dizer que eu não temia a nada, mas seria uma mentira óbvia. Em algum instante eu conseguiria enganá-lo? Encarando um ponto qualquer ao lado da cabeça de Harry, sentindo meu rosto esquentar, eu finalmente disse: - ...Não sei o que fazer. – Contemplei então a sua silhueta desenhar um sorriso.


         Perto demais... Eu fechei os olhos bem apertados e esperei. Sua respiração ia ao encontro do meu rosto e minha se acelerou. Senti então seus lábios macios e quentes encostarem nos meus.


         _Solte os lábios, Ginny. – Só então notei que minha boca estava apertada. Pra que soltá-la? Ele já não estava me beijando? O que ele queria agora? Eu neguei levemente com a cabeça, temendo me mexer demais. Então senti a mão dele fazer o caminho da minha cintura até a nuca e seus dedos começaram a brincar com meus cabelos. Quando sua língua invadiu suavemente minha boca eu percebi que havia relaxado os lábios. 


         Tudo ao meu redor desapareceu. A única coisa a qual eu prestava atenção era em Harry. Nos seus lábios acariciando os meus. Em sua mão afagando meus cabelos. No seu cheiro. No sentimento que nascia em meu peito...


         Separamo-nos e eu fiquei com medo de abrir meus olhos e descobrir que tudo fora um sonho. A mão do Harry do meu sonho havia passado de minha nuca até meu rosto, acariciando-o.


         _Você é muito linda, Ginny. E minha. – Ele falou em um tom possessivo, mas eu não fiquei brava. Abri meus olhos e vi que ele me olhava. Em um impulso, abracei-o escondendo meu rosto rubro. Ele riu e voltou a encostar-se na árvore, me puxando junto. Ele acariciava meus cabelos calmamente.


         _Jura que acha isso de mim?


         _Juro. Mas acho que isso não é novidade pra você, né? – Ele perguntou-me em um tom divertido.


         _É novidade sim. Minha mãe sempre me influenciou a passar maquiagem pesada pra esconder meu rosto sem graça. – Eu relembrei, utilizando-me do mesmo adjetivo que ela usava.


         _Você devia aprender a não acreditar em tudo o que ela te fala. – A mão dele estava deixando-me sonolenta. Era tão bom ser acariciada. Aconcheguei-me mais em seu peito e senti-o arrumar o casaco sobre mim. Meus dedos brincavam com um botão de sua camisa e então tudo ficou agradavelmente escuro.


 

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