Capitulo 2
Parado diante da cabine de Gina, Harry esboçou um gesto para bater à porta... Mas não chegou a completá-lo. Era a terceira vez que isso acontecia.
Chamando-se de tolo, ele consultou o relógio. Já havia dado tempo de sobra para que Gina Weasley tomasse banho, vestisse roupas secas e até desfizesse a bagagem.
Era verdade que, em geral, as mulheres levavam séculos para fazer essas coisas tâo simples...
Mas, afinal, quase uma hora havia se passado, desde que Gina Weasley pisara no convés do Xmarks Explorer.
Com uma expressão de contrariedade, Harry lembrou-se da dura conversa que havia tido com aquela mulher.
Era óbvio que a deixara constrangida, em maus lençóis, como se costumava dizer... E, francamente, não se sentia nada orgulhoso por tê-la desafiado e humilhado, diante da tripulação.
Mas, por outro lado, fora pego de surpresa. Nada o havia preparado para defrontar-se com Gina Weasley... Que, aliás, era bem diferente do que ele esperava. Isso não apenas o aborrecia, mas também o deixava frustrado, tanto sob o aspecto pessoal, como profissional.
Pessoalmente, Harry detestava situações embaraçosas como aquela. Não gostava de ofender as pessoas, nem de deixá-las constrangidas. Só fazia isso quando não havia outra alternativa. No caso de Gina Weasley, ele bem que gostaria de voltar atrás e poupá-la... Mas era tarde. O máximo que poderia fazer, agora, seria pedir-lhe desculpas.
Quanto ao aspecto profissional da questão... Bem, esse era um outro problema. E bastante sério, por sinal.
Já fazia algum tempo que Harry se considerava auto-suficiente para realizar seu trabalho sozinho. Não precisava, nem gostava, de parcerias.
Irritado, ele se perguntou por que o Museu de História Marítima de Portland resolvera mandar Gina Weasley para fiscalizá-lo.
"Mais do que lamentável, essa atitude é injusta", Harry pensou.
Afinal, ele fizera um vasto trabalho de pesquisa sobre o lsabella.
Agora, depois de tanto tempo e dedicação, de tanta luta para conseguir o apoio do Museu e de alguns patrocinadores, ele teria de se sujeitar à presença de Gina Weaslei... Que certamente nada entendia sobre o assunto.
Mas até mesmo o incômodo de ter um burocrata a bordo do Xmarks Explorer, Harry poderia suportar.
O que lhe parecia inadmissível era que esse burocrata se chamasse Gina Weasley.
Nem ele mesmo saberia explicar por que aquela mulher lhe despertava tanta antipatia.
Era verdade que, pesando os prós e contras da situação, ela possuía todos os contras...
O modo como havia andado sobre a prancha, por exemplo, demonstrava sua total ignorância a respeito da vida no mar... Outro ponto negativo era seu gênio difícil. Esse ponto havia ficado óbvio, devido à teimosia e à atitude desafiadora que Gina Weasley assumira, logo ao pisar no Xmarks Explorer.
Isso o obrigara a colocá-la em seu devido lugar.
Mas o fato de ter vencido um round contra ela não o deixava orgulhoso e sim preocupado.
Dirigir uma tripulação de dez homens, com firmeza e justiça, não era fácil.
Porém, mais difícil era ter a bordo uma mulher voluntariosa, que não fazia a menor idéia de como se portar, numa embarcação.
Harry meneou a cabeça, num gesto de desalento. Havia, também, uma outra questão... Que talvez o preocupasse mais do que tudo. Mas, quanto a isso, ele não podia censurar Gina Weasley.
Afinal, ela não tinha culpa de ser bonita, de possuir um rosto angelical, um corpo de proporções perfeitas, um encanto ao qual parecia impossível resistir... E uma expressão de pureza nos olhos verde-acinzentados, que havia muito ele não encontrava.
Tratava-se de uma expressão sonhadora, típica das pessoas que jamais perdiam a esperança.
Um profundo suspiro brotou do peito de Harry.
Se houvesse conhecido Gina Weasley em qualquer outra circunstância, talvez se interessasse por ela. Mas ali, a bordo do Xmarks Explorer, tudo o que ele desejava com respeito àquela mulher era uma distância prudente.
Não havia espaço, em sua vida, para idílios amorosos. No momento, nem mesmo para casos passageiros.
Ele tinha uma meta a cumprir, um navio naufragado a encontrar. E era nisso, apenas nisso, que pretendia se concentrar.
A pequena Madison, bem como toda a tripulação, confiavam plenamente nele. E a última coisa que Harry faria, no mundo, seria decepcioná-los... Ou permitir que alguém o atrapalhasse.
Por tudo isso, Gina Weasley teria de sair de seu caminho, Harry decidiu.
O problema era que os patrocinadores, bem como o pessoal do Museu de História Marítima de Portland, faziam questão da presença dela na expedição.
"Portanto, só resta uma saída...", Harry concluiu. "Convencê-la a desistir."
A idéia não era muito louvável. Mas a presença de Gina, no Xmarks Explorer, representava um sério risco... Que ele não desejava correr.
Além do mais, já estava óbvio que ela não pertencia ao mundo dos navegantes, dos aventureiros... A perspectiva de participar de uma expedição de busca a um navio naufragado poderia parecer romântica e atraente para a maioria das pessoas. A realidade, porém, era bem outra.
Gina Weasley com certeza pensava que a vida no Xmarks Explorer resumia-se a dias ensolarados e noites de luar, a descobertas de tesouros que renderiam dinheiro e fama.
Harry sorriu, intimamente. Se ela soubesse o quanto a rotina no Xmarks Explorer era árdua...
Quantas vezes ele não arriscara a própria vida, para atender a um pedido de salvamento! Quantas vezes seus tripulantes não haviam se atirado ao mar, para ajudar náufragos? Isso sem contar as muitas ocasiões em que, sob ventanias e tempestades, ele conduzira o Xmarks Explorer em águas revoltas, com perigo de bater em arrecifes, ou bancos de areia... Somente para atender a chamados de socorro, ou para realizar pesquisas.
Também Gina Weasley representava um risco... Que ele estava firmemente resolvido a evitar.
Entretanto, não poderia expulsá-la da expedição.
A decisão teria de vir dela própria.
Alguns dias de desconforto no Xmarks Explorer e ela ficaria ansiosa para voltar a seu mundinho confortável, em terra firme.
"E quanto mais rápido isso acontecer", Harry pensou, "melhores serão minhas chances de encontrar o Isabella".
Essa conclusão o tranqüilizou. Pela quarta vez, ele ergueu a mão para bater à porta da cabine de Gina Weasley. E concluiu o gesto.
Após alguns segundos, ela atendeu.
Estava tão bela e sedutora quanto uma sereia, Harry constatou, decidido a não demonstrar sua admiração.
Gina Weasley usava jeans, uma camiseta cor de canela, bastante justa, e tênis. Os cabelos avermelhados e longos, ainda úmidos, estavam soltos, formando uma espécie de moldura para o rosto de traços delicados, sem nenhuma maquiagem.
Por alguns instantes, ambos se olharam, em silêncio.
"É como a calmaria que precede a tempestade", Harry refletiu, antes de perguntar:
— E então? Você está bem instalada?
— Sim — ela respondeu, num tom seco.
— Precisa de alguma coisa?
— Não.
Bem, era natural que ela o tratasse dessa maneira, Harry pensou. Sobretudo depois das duras palavras que ele lhe dissera. Aliás, era sobre isso que ele pretendia conversar:
— A respeito do que aconteceu no convés, agora há pouco, quando você embarcou...
— Sim? — Ela o encarava, com ar de desafio.
— Creio que agi de um modo...
— Desprezível — ela completou.
Harry não queria, mas desatou a rir:
— Puxa, você sabe ser franca e direta quando quer — comentou, entre surpreso e divertido.
— Eu sempre sou assim, capitão — Gina Weasley afirmou, com severidade. — Bem, devo tomar sua vinda até aqui como uma demonstração de boa vontade?
— Sim — ele respondeu. — Sugiro que comecemos tudo de novo. — E estendeu a mão. — Sou o capitão Harry Potter, às suas ordens.
Ela relutou, mas acabou retribuindo o cumprimento:
— Gina Weasley — disse, como se estivesse se apresentando. Um tanto constrangida, acrescentou: — É um prazer conhecê-lo.
— O prazer é meu. Seja bem-vinda a bordo do Xmarks Explorer. — Com um sorriso, Harry comentou: — Parece que estamos indo bem desta vez.
Naquele momento, descobriu que não tinha nada contra Gina Weasley, a nível pessoal... Mas sim contra o que ela representava na expedição. Portanto, precisava fazê-la desistir daquela empreitada.
— Papai! — Uma voz infantil soou, no corredor.
Continua...
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