Terceira carta de Hermione
Meu amor,
Estou neste preciso momento fechada no quarto para te escrever esta carta. E a cada linha sinto as lágrimas mancharem o pergaminho e caírem dolorosamente sobre o vestido branco. E de pensar que faltam apenas três horas para sair daqui… Para seguir para o altar onde me espera um homem que eu gosto, mas que não amo. Pois o homem que amo, esse está a ler esta carta agora, achando-me provavelmente uma completa cobarde. Eu não mereço o nome que em breve vou passar a ter. Porque Weasley soa a coragem, soa a vida, soa a força. E eu continuo apenas a ser a Granger. A Granger demasiado racional, a Granger demasiado cobarde, a Granger que mais uma vez escolheu o caminho mais fácil. E isto faz-me lembrar as palavras de Dumbledore no quarto ano. Quando ele falava de Cedric, ele disse Draco, não sei se te lembras, para pensarmos bem antes de escolhermos entre o que é fácil e o que é certo. E eu hoje escolho o que é fácil. Perdoa-me se tenho medo mas há feridas que deixam cicatrizes demasiado profundas. E eu tenho medo porque um dia confiei em ti e tu abalaste a minha confiança, tenho medo porque tu não estiveste ao meu lado quando eu mais precisei, tenho medo porque desististe de mim por dois longos anos… Por tudo isso eu tenho medo. E por mais que digas que me amas ao ouvir-te falar na tua tia Bellatrix eu penso: “Porque não fizeste o mesmo?”. Tu sabias que no fundo Voldemort nunca perdoaria o teu pai. Tu eras apenas um escudo. Um escudo de protecção ao Snape. E então tu abandonaste-me. E eu fiquei sozinha… E naqueles dois anos que passei sem ti eu sonhava todos os dias com o dia em que entrarias por aquela porta e me pedirias mil desculpas. Então eu perdoaria-te e ficaríamos juntos para sempre. Mas isso nunca aconteceu. Porque tu nunca vieste. Tu nunca voltaste. Mas o Ron não. É por isso que o Ron é estável. Porque eu sei com o que posso contar. Porque o Ron será sempre o Ron mesmo depois do mundo deixar de ser mundo. E eu sei que ele estará sempre lá. Sempre, como tu nunca tiveste… É esse o problema do amor. Eu precisei de acreditar em ti e acreditei. Entreguei-te todo o meu ser, prisioneira dos teus instintos e das tuas vontades.
E é esse o mal maior quando se ama alguém. Porque um dia caímos. Um dia desiludimo-nos e sofremos. Juramos então nunca mais o fazer. Nunca mais acreditar, nunca mais sofrer. Para quê? Para passado algum tempo nos voltarmos a deixar inebriar pelos bons momentos, esquecendo completamente os maus e afundando-nos de novo nesta loucura. E é isso que eu faço hoje. Porque naqueles dois anos em que esperei por ti eu jurei não voltar a cair. As esperas são sofrimento, sabias? Rebentamo-nos por dentro nas noites que seguem os dias em que não há uma voz, um estar perto. Nada. Há apenas nada. E talvez o que custou mais foi que durante esse tempo eu precisei de sorrir ao mundo como se fosse a mulher mais feliz, quando me sentia a mais vazia.
Quanto mais te queria esquecer, mais te lembrava. Eras tu em tudo. Nas musicas, nos lugares, nas palavras, nos sorrisos. Sempre tu. E o que mais custa dizer é que um dia eu me rendi a isso entendes? Deixei de te procurar, deixei de esperar, abandonei-te… não porque não te amava mais mas sim porque precisava. Porque o tempo passava e comecei a consciencializar-me que a minha vida nunca mais passaria por ti.
Lá em baixo começo a ouvir vozes. Os músicos devem ter chegado e os últimos preparativos estão a ser realizados. Por muito que me tente abstrair desses sons começo a ouvir a marcha nupcial a tocar. Os músicos devem estar a ensaiar. As lágrimas correm-me mais intensamente ao ouvi-la. Como se essa musica fosse a fatídica. Aquela que me conduzirá a uma prisão. Estranho como aquela carpete vermelha e macia que vou pisar a caminho do altar me lembra terrivelmente um chão de mármore frio de um corredor da morte. Isto não é a minha escolha Draco. Não fui eu que escolhi casar. Eu não preferi o Ron a ti. Eu simplesmente estou a deixar o destino levar-me. Porque eu quero ficar contigo. Eu quero fugir e enfrentar todos para podermos ficar juntos. É que simplesmente eu não consigo. Porque estou cansada. Porque posso ter apenas 21 anos mas sinto-me como se tivesse 60. Não sinto o corpo cansado mas a alma está. Porque estou cansada de tudo isto. Porque eu não tenho mais a vivacidade de uma adolescente. Eu não tenho mais forças para lutar porque eu lutei já demasiado. Eu não tenho mais forças para enfrentar o que quer que seja porque já enfrentei demais na vida. Eu tinha apenas 11 anos quando me vi confrontada com o verdadeiro sentido do sacrifício pelos amigos, quando senti a morte rasar a minha vida no resgate da Pedra Filosofal. Com 12 anos, eu era apenas uma criança, e fui petrificada pelos estúpidos ideias de sangues-de-lama e sangue-puro. Aos 13 eu lutei contra o tempo para salvar alguém que mal conhecia mas que o meu coração me dizia que tinha de o fazer. No 4ºano eu passei noites sem dormir, chorei incansavelmente pelo medo de perder o meu melhor amigo e tive que aceitar o retorno de Voldemort sabendo que isso teria piores consequências para mim do que para muitos dos outros. Com 15 eu criei uma equipa de estudo e defesa contra o Ministério e Voldemort, enfrentei centauros com a ajuda de um gigante, entrei no Departamento dos Ministérios, enfrentei Devoradores da Morte e vi o meu melhor amigo quase sucumbir a Voldemort. Além disso tive de assistir á morte daquele que havia salvado no 3ºano e assisti ao sofrimento e á angustia dos que o amavam. No 6ºano eu perdi-te a ti, deixei de acreditar no amor, envolvi-me numa batalha de vida e morte, e aceitei partir da escola numa missão da qual eu não sabia se voltaria apenas pela única coisa em que eu ainda acreditava: a amizade. E depois foi um ano em que tive que tirar a memória dos meus pais ao ponto de eles nem sequer saberem que tinham uma filha, confrontei-me com a morte de um homem que u julgava tão forte, vi a Toca e a família que eu mais adorava ser atacada, em que fugi e me escondia todos os dias em sítios diferentes, ataquei pessoal do Ministério e lá me infiltrei, vi o meu grupo desmoronar, a amizade vacilar, fui quase apanhada por Voldemort, fui capturada e levada aos Devoradores da Morte que me torturaram até que já nenhuma força restava em mim, assisti o Dobby morrer e participei numa batalha que me tirou todas as forças. Eu vi coisas horríveis aí. Vi amigos morrerem agonizando no chão, lutei e magoei-me e assisti a algo que estava muito além daquilo que a minha alma era capaz de aguentar: a morte do Harry. Porque eu ainda sinto hoje aquela sensação de ver o seu corpo flácido nas mãos do Hagrid. Senti que todo o meu corpo gritava como se lhe espetassem mil agulhas seguidas acompanhadas de mil Crucios. E quando ele se levantou eu pensei que tudo ficaria bem mas depois tive que ainda assistir aquela luta entre ele e Voldemort do qual aí eu saberia que a sua morte seria eterna…
E então tudo acabou… e o Harry venceu. Acabou a dor latejante no peito, o medo em cada esquina, o pavor e a sensação de nunca saber o que ia acontecer em seguida. Mas ficou então aquela dor que nem bem dor é… é mais um moer devagarinho… algo que nos destrói lentamente. Eu fui obrigada a crescer demasiado rápido, eu fui obrigada a assistir a coisas horríveis… E eu estou simplesmente cansada. Porque estou farta de luta, de enfrentar objectivos… porque eu quero ter uma vida feliz sem problemas. Eu sei que poderíamos ser felizes meu amor e eu quero tanto ir ter contigo. Tu foste a minha escolha mas eu simplesmente não tenho forças para a executar. Por isso vem se quiseres e impede-me de cometer esta loucura para poder cometer a loucura ainda maior de ficar contigo. Vem buscar-me e impede o meu corpo de se unir ao de outro para a eternidade. Eu simplesmente não tenho mais vida em mim que chegue para isto. Eu ficarei á tua espera. Ficarei á espera que entres por aqui e me leves contigo. Para me trazeres de novo á vida. Vem Draco se quiseres porque tu ainda tens as forças que eu não tenho. Impede este casamento e eu prometo que se o impedires eu vou contigo. Se apareceres eu simplesmente dou-te a mão e vamos embora. Mas pedires-me que o faça sozinha eu não consigo… E se não o fizeres eu vou compreender. Se preferires não intervir eu entendo pois talvez seja pedir demais. Mas quero que saibas que nunca te esquecerei. Porque não esqueço do bater do teu peito. Não esqueço os teus abraços nem o teu riso. Não esqueço que me fizeste sentir alguém mesmo muito especial, na parte do tempo em que me lembravas que pensavas em mim. Não esqueço que me fizeste sentir o sangue correr nas veias e fazer loucuras. E cá por dentro, os dias felizes, mesmo assim, tornam-se maiores que os meses tristes.
Fica um peito de coração comprimido e os olhos que transbordam a saudade do que nunca nos foi permitido viver. Peço-te então que se não vieres impedir esta loucura por menos aí dentro de ti não me deixes morrer. Lembra-te de nós e do que costumávamos ser…
Um dia já não sentiremos o peito apertado. Já não teremos os olhos rasos de água. Já é um doer devagar, que mói mas não magoa tanto. Já não sentimos o coração a soluçar baixinho.
Eu sei que será eterno. Sei que se não vieres viverei para sempre com a certeza que estou com alguém que não amo mas mesmo assim tentarei ser feliz. E desculpa se as palavras não fazem mais sentido e se a pena já não corre livremente pelo papel. A carta já vai longa e peço perdão mas é que a esta hora eu ainda sinto os cheiros, ainda oiço os sons, ainda necessito daquele te abraço. Porque o que vivi e o que senti foi grandioso de mais e sobretudo porque me custa escrever quando o coração sangra por dentro. Talvez o aches desnecessário meu amor mas escrevi-te um poema…
Hoje o coração chora,
Por aquilo que fomos um dia,
Eu relembro quando não cá estavas,
Oh, a forma como eu sofria.
E talvez a dor seja muita,
Mas eu preciso de a escrever,
Já que nem forças me restam,
Para sequer te a poder dizer.
Apenas quero que saibas,
Que de ti não me esquecerei,
E que serás eternamente,
O único que eu sempre amarei.
Salva-me daqui e foge comigo,
Eu esperarei sempre por ti,
Se não vieres meu amor eu só te peço:
Nunca te esqueças de mim.
Eu esperarei por ti mas quero se saibas que a partir do momento em que eu saia dali já casada não haverá voltas a dar. Não trairei o Ron dessa forma. Se vieres vem agora… peço-te por mim. Se não o fizeres eu compreenderei. Seguirei em frente e recomporei aos poucos o meu coração. Sorrirei nuns dias e nos outros… bom, nos outros lutarei por isso.
Beijos meu amor de quem te amará para toda a eternidade,
Hermione Jane Granger
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