Encontre o Chão



Turno te poções. Tudo o que uma pessoa precisa para relaxar em uma tarde de terça-feira, principalmente com a ajuda daquele cheiro de ovos podres misturado com meleca de trasgo.

Ron chegou com Harry uns dois minutos depois do horário, mas Slughorn os deixou entrar com um imenso sorriso. – Vamos logo, sentem-se.

E superando todas as expectativas, a tarde piorou ao lembrar de que a aula seria com os Ravenclawn. Luna estava sentada com outra garota, e não o esperara com ela geralmente fazia quando Ron chegava atrasado. Ele ainda não se acostumara com o fato de que Luna não queria conversar com ele.

Ele lembrou-se de sua investida no dia passado. E da marca que ficara na sua testa depois de uma série de livradas. E Ron acumulava razões para odiar Xenófilo, imaginando o que ele dissera pra Luna para ela ficar tão brava com ele.

“Acorda, Ron, você beijou a Hermione!”
“Não, foi ela que me beijou!”
“Ah sim, tenta explicar isso pra Luna!”
“Eu tentei e você sabe o que aconteceu.”
“É, é melhor você não tentar de novo.”

Ron também mandara bilhetes e pequenas cartas para Luna, que devolvera com palavras... Não-amistosas.

Quando ele sentou-se a algumas carteiras de diferença de Luna, na frente de Ginny e Hermione, Ela o olhou com desprezo. Ele sorriu encabulado e ela virou-se decidida para frente.

Foi assim também na aula de Transfiguração e no jantar.

-O que eu fiz pra merecer isso? – Disse Ron, sentando-se ao lado de Harry no salão comunal da Griffindor.

-Você beijou a Hermione. – Respondeu Harry, de pronto.

-Foi ela quem me beijou!

-Sim, eu sei, mas o Xenófilo não!

-Isso só pode ter a ver com aquela droga de maldição de Slytherin.

-Ah tá. – Disse Harry. Ginny chegou e abraçou carinhosamente Harry e o beijou. A cena embrulhou o estômago de Ron, mas ele manteu-se impassível. – Há alguns segundos você debochou de Luna por que ela acreditara nesse feitiço!

-Mas cara, faz sentido! Veja você e a Cho! Eu e a Luna! Eu digo, não existe um casal Ravenclawn e Griffindor em Hogwarts, enquanto incrívelmente tem aquela quintanista da Slytherin que dá uns amassos atrás das armaduras do sexto andar com o Jill do quinto ano, Griffindor.

-É, as evidências são muitas. – Brincou Ginny. – Mas supondo que a maldição seja verdadeira, como você espera quebrá-lo?

-Sei lá, deve ter alguém que saiba quebrar.

-Por que você não chega pro professor Flitwick amanhã e pergunta “Hey, o senhor não saberia por algum acaso como eu poderia quebrar o feitiço que Salazar Slytherin lançou na Luna?” – Sugeriu Harry.

-Muito gracioso, Harry. Mas talvez eu pergunte pra algum professor, mesmo. – Disse Ron, ponderando. Quem? Tinha de ser alguém confiável, que não fizesse muitas perguntas e que respondesse objetivamente às suas.



-Diretora McGonagall? – Chamou ele, correndo atrás da bruxa à sua frente no corredor do primeiro andar. Talvez ela não detivesse todos aqueles adjetivos que ele usara noite passada, mas fora o melhor que conseguira pensar. McGonagall era uma pessoa puramente amedrontadora. Ela usava um coque apertado para prender seus cabelos cinzentos, e um chapéu verde e pontudo; Ela usava vestes verdes e fluídas – “Para dar um efeito bonito quando ela gira nos calcanhares.” – e sua expressão era sempre severa, fechada, mas nos oito anos de convivência, em muitas ocasiões, Minerva McGonagall se mostrou uma pessoa de bom e enorme coração.

Ela girou nos calcanhares quando ouviu seu nome. Suas vestes acompanharam seu movimento.

-Sr. Weasley? Hoje é quarta! O Sr. não devia estar na sua aula de poções?

-Na verdade, profa. McGonagall, não. Prof. Slughorn está doente, e no dispensou após uma série de espirros assustadores.

-Ah sim, então eu me pergunto o que você quer.

-Hum, eu gostaria da sua opinião sobre uma questão que imagino eu é subjetiva. – Disse, talvez forçando um pouquinho o vocabulário para acompanhar a diretora.

-Vamos ver o quanto eu posso lhe auxiliar, Weasley. – Disse McGonagall começando a andar.

-Bem, professora. Eu estava lendo um livro da biblioteca esses dias – E ela arqueou uma sobrancelha. “Isso, mostre sua descrença quanto o fato de eu ter lido um livro.” –, e a história terminou antes que o mocinho quebrasse o feitiço que era o epicentro da trama.

-Bem, é encantador, senhor Weasley. – Disse McGonagall. – Mas temo que eu não tenho tempo para uma narração exata de um romance.

-Acredito que não, mas eu queria que a senhora me explicasse racionalmente como ele poderia quebrar este feitiço, pois acredito que a senhora tem um bocado a mais de conhecimento que o jovem do romance.

-Provavelmente, senhor Weasley. – Disse ela, corando levemente.

-Hum, na história o feitiço havia sido lançado há muito, muito, muito, muito tempo atrás. E era um feitiço que corria pelas paredes do castelo em que ele vivia, e coisas e tal.

-É realmente muito... subjetivo. Há várias formas, como poções, contra-feitiços, mas tudo muito além do nível de um estudante.

-Bem, eu não estava procurando praticar. – Disse, engolindo em seco. – Apenas compreender.

Ela talvez tenha reparado na sua hesitação, e ponderou. Ela suspirou e cautelosamente falou: - Ele também poderia ter encontrado um descendente deste bruxo que lançou o feitiço. Ele teria de dizer as palavras que quebrariam o feitiço, e selá-lo.

Ron hesitou, e nenhuma idéia lhe surgiu. Um herdeiro de Slytherin? O único que conhecera fora Voldemort e ele não estava em condições de... Ajudá-lo. Reconhecendo que era uma causa perdida, ele baixou os olhos.

-Tenho certeza que não seria uma tarefa tão... Difícil assim. – Disse McGonagall, empertigando-se e parecendo claramente envergonhada. – E não faça nenhuma... Bobagem, senhor Weasley. E mande lembranças à senhorita Lovegood, pois há tempos não a vejo pelos corredores. Tinha especial carinho por ela. Agora vá, vá.

Ela inesperadamente dobrou um corredor, e deixou Ron parado, estupefato encarando suas costas.

Será que ela entendera o que Ron queria com aquelas perguntas? Como? Ron sorriu, admirado, e foi para o Salão Principal, onde encontrou Harry, Ginny e Hermione jantando.

-Ora, você e Luna eram carne e unha, e vocês nem andam mais juntos, como toda a escola já notou. – Dizia Hermione, depois que Ron contara à eles o que acontecera.

-Tente se lembrar do que Luna lhe falou sobre Slytherin. – Disse Harry.

-Hãm, ela falou sobre um sobrinho, que usou sua influência pra alguma coisa, não lembro.

Hermione e Ginny pareceram entrar no mesmo transe.

-Ele tinha influência. – Falou Ginny.

-Um... Barão? – Completou Hermione.

-Ah não! – Exclamou Ron, entendendo o que elas quiseram insinuar. – Antes não ter ninguém para me ajudar do que pedir ajuda para o Barão Sangrento! E além do mais, é improvável que ele seja herdeiro de Slytherin sem que saibamos!

-Também não sabíamos que a dama cinzenta era filha de Rowena. E do jeito que ele socializa, é bem capaz de que ninguém do colégio saiba. – Disse Harry.

-Não custa nada tentar. – Disse Ginny, apontando para o fantasma da Slytherin. – Ele não pode nem te tocar.

-Mas pode me assombrar enquanto eu estiver dormindo. – Choramingou. Ele respirou fundo, e se levantou. Andou em passos trêmulos até o Barão Sangrento. Em vida ele fora um homem magrelo, de aspecto péssimo. Seu fantasma tinha manchas de sangue, prateado, em todo o corpo e correntes presas aos seus ombros. As pessoas mal acreditaram quando Ron foi até a mesa da Slytherin e se dirigiu ao Barão Sangrento. Nem os habitantes daquela casa falavam muito com ele.

-Hãm... Senhor Barão Sangrento?

Ele também não pareceu acreditar nele. Ele o encarou furiosamente e voltou seu rosto para frente, sem responder.

-Eu gostaria... De pedir sua ajuda.

Ele soltou uma risadinha desdenhosa que foi acompanhada por um sextanista.

-É sobre Salazar Slytherin. – Disse Ron, já impaciente.

Ele olhou um pouco mais curioso, mas ainda o ignorou.

-E é sobre Helena Ravenclawn!

O Barão Sangrento o olhou furioso, e se levantou – flutuou alguns metros. – O que você sabe? – Ele perguntou. Ele nunca ouvira sua voz, mas simplesmente não combinava com o aspecto demoníaco de seu fantasma, ou com o que imaginara.

-Eu sei tudo! Como você a amava, e como você a matou!

Agora, já de volta ao chão, seu olhar se transformou do mais puro ódio para a mais pura culpa.

-Eu... Eu não queria. Essas correntes eu uso como punição por ter cometido este ato hediondo! Eu não queria!

Ron quase caiu no chão de alívio por ter transposto a barreira do Barão Sangrento. – Acredito em você.

-Ela simplesmente me esnobava! Ela ignorava todo o amor que eu sentia por ela, me tratava como lixo! Quando sua mãe mandou que eu a trouxesse para o castelo, viajei meio mundo até encontrá-la, mas ela se negou a vir comigo. Fui tomado pela cólera! Compreensível, nem um pouco repreensível!

-Claro que não. – Concordou pacientemente Ron.

-Eu me matei logo após, mas não pude suportar a culpa. Não pude seguir adiante, eu simplesmente... Voltei. Não por medo do desconhecido, mas eu quis me privar da paz, ou de qualquer coisa que me aguardasse do outro lado. Viver eternamente como fantasma... Mas eu não esperava que Helena voltasse também. Se bem que também é compreensível, já que sua vida foi tirada tão... Inesperadamente, brutalmente! Agora, séculos depois ainda sou obrigado a cruzar com ela pelos corredores, sem nunca falar com ela.

-Vocês nunca conversaram depois de suas mortes?

-Ah sim, cumprimentos como “Como vai a vida? Ah, é mesmo, eu te matei.”. – Disse ele, quase displicente. – Claro que não, garoto estúpido.

-Ah, claro. – Disse Ron, se contraindo. – Mas você ainda não me respondeu se irá me ajudar.

-Em que, afinal? – Perguntou, irritado.

-Você em vida foi... Sobrinho de Slytherin, certo?

-Reginald Slytherin Weepyburn. Perfeitamente.

-Portanto você é considerado descendente de Slytherin.

-Não diretamente, mas sim.

-Você saberia como... Quebrar um feitiço específico que ele lançara?

-Sei de todos os feitiços perenes que ele lançou, criança, mas preciso saber qual.

-Ele lançou um sobre Rowena Ravenclawn quando... Bem, as circunstâncias são relevantes, mas o caso é que seu feitiço impedia o amor entre uma Ravenclawn e um Griffindor.

-Ah, lembro bem deste episódio. Foram tempos negros aqui em Hogwarts. Assustadores, até para alguém como eu. Todos achavam que meu tio ia cometer algum ato... Perigoso, ou que Rowena se mataria, mas enfim. – Ele deu uma risadinha. – Eu sou a pessoa perfeita para quebrar este feitiço, mas não vou.

-Por que? – Perguntou Ron, desapontado.

-Por que o modo de quebrar o feitiço é um descendente de Salazar Slytherin negar seu amor por uma descendente de Ravenclawn, por que desta maneira, ele estaria “libertando” Ravenclawn para amar quem quisesse. Por acaso eu sou um descendente dele, e amo perdidamente Helena Ravenclawn.

-Você ainda a ama? – Pergunto Ron, não conseguindo conter o espanto.

O Barão ignorou seu comentário e continuou – E não estou disposto a ajudar um aluno que eu nem conheço na verdade, por uma causa que eu não estou disposto a lutar, e de quebra tendo que encarar de frente Helena Ravenclawn.

-Você a ama ou não a ama, afinal?

-Claro que a amo!

-E não quer falar com ela?

-Para ela me matar se pudesse?

-Você não notou que essa é a questão que te prende ao mundo? Sua culpa pela morte de Helena Ravenclawn? Sua culpa e o feitiço que só você agora pode quebrar! E se ela te desculpar, ela também se libertará! Não é isso que você quer para sua amada?

-Se... eu fizer isso estarei a ajudando!

-Claro que sim. – “Assim espero.”

O Barão Sangrento parecia estar travando uma furiosa luta interna, e finalmente falou: - E-Eu faço isso.

-Isso, muito bem! – Disse Ron, quase pulando. -Sábado, meia noite, no banheiro masculino do quinto andar. Que tal?

-Rowena estará lá?

-Sim, e sugiro usar sua melhor roupa.

-Vou fazer isso, vou fazer isso. – Disse o Barão, voando cada vez mais alto e atravessando o teto, sumindo. Ron apoiou-se na mesa, e suspirou, pernas tremendo, e respiração fraca.

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