Capitulo 32 - O GRANDE DEGELO

Capitulo 32 - O GRANDE DEGELO



Capitulo 32 - O GRANDE DEGELO

No dia seguinte à partida do Rato Mensageiro, começou o Grande Degelo. E começou em primeiro lugar nos Pântanos Marram, onde fazia sempre um pouco mais de calor do que nas outras partes, e depois espalhou-se rio acima, através da Floresta e até o Castelo. Foi um grande alívio para aqueles que estavam no Castelo, pois estavam ficando sem reservas de comida depois que o Exército dos Guardiães saqueou a maioria dos armazéns de Inverno para prover Voldemort dos ingredientes necessários aos seus muitos e freqüentes banquetes.
O Grande Degelo também foi um grande alívio para um certo Rato Mensageiro que estava tremendo sombriamente numa ratoeira sob o solo da Casinha das Senhoras. Stanley tinha sido posto ali por causa de sua recusa em divulgar a localização da choupana de Tia Zelda.
Não podia saber que o Caçador já tinha descoberto isso através do que Guilherme tinha dito ao Supremo Guardião, tal como não sabia que ninguém tinha a intenção de libertá-lo, embora Stanley já andasse por ali há tempo suficiente para contar com isso. O Rato Mensageiro procurava manter-se o melhor que podia: comia o que conseguia apanhar, que eram principalmente aranhas e baratas; lambia as fugas do dreno de degelo; e deu consigo a pensar com saudades no João Tolo. Dawnie, entretanto, tinha desistido dele e tinha ido viver com a irmã.
Os Pântanos Marram estavam agora inundados pela água abundante da neve que derretia rapidamente. Em pouco tempo começou a surgir o verde da erva e o solo tornou-se pesado e úmido. O gelo no Mott e nos canais foi o último a desaparecer, mas logo que a Píton dos Pântanos sentiu a temperatura subir, começou a agitar-se, sacudindo a cauda impacientemente e flexionando as suas centenas de costelas enrijecidas. Todos na choupana esperavam com a respiração suspensa que a serpente gigante se libertasse. Não faziam idéia do quanto esfomeada ou furiosa pudesse estar. Para se certificar de que Max ficaria dentro de casa, Rony tinha amarrado o cão lobo a uma das pernas da mesa com uma corda bem grossa. Tinha certeza de que um cão lobo fresquinho era um dos pratos favoritos no menu da Píton dos Pântanos logo que conseguisse se libertar de sua prisão de gelo.
O que aconteceu, finalmente, na terceira tarde do Grande Degelo. Ouviu-se um inesperado e violento crás! e o gelo por cima da poderosa cabeça da Píton dos Pântanos quebrou-se e saltou no ar. A serpente ergueu a cabeça bem alto e Gina, que era a única que estava por ali, foi se esconder atrás do barco das galinhas. A Píton dos Pântanos lançou um olhar na sua direção, mas não se sentiu com vontade de ter que mastigar através de suas grossas botas, e por isso começou a deslizar, lenta e dolorosamente em torno do Mott até ter encontrado a saída. E foi nessa altura que se viu numa situação delicada: a serpente gigante estava com cãibras. Estava presa num círculo.
Quando tentou se dobrar na outra direção, nada parecia funcionar. Não podia fazer mais do que nadar em voltas no Mott. A cada vez que tentava voltar para o canal que levava ao paul, os seus músculos recusavam-se a trabalhar.
A serpente foi obrigada a ficar no Mott durante dias, tentando morder aos peixes e olhando furiosamente para quem quer que se aproximasse. Coisa que ninguém fazia, pelo menos depois da serpente ter acometido com a língua bifurcada contra o Garoto 412 e tê-lo atirado pelos ares. Por fim, numa daquelas manhãs, o sol do começo da Primavera resolveu espreitar das nuvens e aqueceu a serpente o suficiente para poder relaxar os músculos enrijecidos. Chiando como um portão enferrujado, lá foi ela a nadar dolorosamente em busca de algumas cabras e, lentamente, ao longo dos dias seguintes, quase conseguiu se esticar por completo. Quase. Mas não completamente.
Até o fim dos seus dias, a Píton dos Pântanos ficou com a tendência de nadar para a direita.
Quando o Grande Degelo chegou ao Castelo, Voldemort levou os seus dois Magogs rio acima até o Ribeiro Ermo onde, a altas horas da noite, os três seres atravessaram uma estreita prancha de madeira coberta de hera e entraram a bordo do seu navio Negro, o Vingança.
Ali aguardaram alguns dias até que a maré alta de Primavera de que Voldemort necessitava para retirar o navio do Ribeiro os libertou.
Na manhã do Grande Degelo, o Supremo Guardião convocou uma reunião do Conselho dos Guardiães, sem saber que no dia anterior tinha se esquecido de fechar a porta da Casinha das Senhoras. Guilherme já não estava acorrentado a um cano, já que o Supremo Guardião o encarava agora mais como um companheiro do que como um prisioneiro, e Gui estava sentado à espera de sua habitual visita do meio da manhã. Gui gostava de ouvir os mexericos sobre as extravagantes exigências e as constantes birras de Voldemort e ficou desapontado quando o Supremo Guardião não apareceu na hora de costume. O que ele não sabia era que, a essa mesma hora, o Supremo Guardião, que começava a se sentir um bocado farto da companhia de Gui Potter, estava alegremente planejando aquilo a que Voldemort chamava «Operação Adubo Potter», que incluía a eliminação não só de Gina, mas de toda a família Potter, incluindo Gui.
Depois de um tempo, e mais por tédio do que por qualquer desejo de fuga, Gui experimentou a porta. Para seu grande espanto, esta abriu-se, e ele estava inesperadamente frente a um corredor vazio. Voltou a recuar para o interior da Casinha e fechou a porta com força, em pânico. O que deveria fazer? Deveria escapar? Quereria escapar?
Encostou-se contra a porta e recapitulou as coisas.
O único motivo para ficar era a promessa vaga do Supremo Guardião de que um dia poderia se tornar Aprendiz de Voldemort. Mas tal promessa nunca mais lhe fora repetida. E Guilherme Potter tinha aprendido muitas coisas sobre o Supremo Guardião nas seis semanas que passara na Casinha das Senhoras. E em primeiro lugar da lista estava: nunca confiar em nada que o Supremo Guardião diga. Em segundo lugar vinha: prestar atenção ao Número Um. E dali em diante, o Número Um na vida de Guilherme Potter era claramente o próprio Guilherme Potter.
Gui voltou a abrir a porta. O corredor continuava vazio. Tomou uma decisão e abandonou a Casinha.
Tiago vagueava melancólico ao longo da Via dos Feiticeiros, olhando para cima, para as janelas engorduradas por cima das lojas e dos escritórios que ladeavam a Via, interrogando-se se Gui ainda se encontraria prisioneiro nalgum recesso das trevas que se acobertavam para além delas. Um pelotão de Guardiães passou por ele marchando rapidamente, e Tiago encolheu-se contra uma entrada, agarrado ao FicaEmSegurança de Marcia, esperando que ainda funcionasse.
- Psiu. - chamou Alther.
- O quê? - Tiago até pulou de susto. Já há algum tempo que não via Alther, já que o fantasma estava passando a maior parte do tempo com Marcia na Masmorra Número Um. - Como está Marcia hoje? - sussurrou Tiago.
- Já esteve melhor. - respondeu Alther, sombriamente.
- Ainda acho que deveríamos dizer à Zelda. - disse Tiago.
- Siga o meu conselho, Tiago, e nem se aproxime do Gabinete dos Ratos. Está sendo controlado pelos ratos de Voldemort, vindos das Terras Más. Um grupo de brutamontes violentos. Mas não se preocupe, há de me ocorrer alguma coisa. - disse Alther. - Tem que haver uma maneira de tirá-la de lá.
Tiago tinha um aspecto deprimido. Sentia mais saudades de Marcia do que queria admitir.
- Anime-se, Tiago. - disse Alther. - Há uma pessoa à sua espera na Taverna. Encontrei-o vagueando perto do Tribunal quando vinha da masmorra de Marcia. Tirei-o de lá através do túnel. É melhor apressar-se, antes que ele mude de idéia e resolva pôr-se outra vez a descoberto. É matreiro, esse seu Guilherme.
- Gui! - O rosto de Tiago abriu-se num sorriso radiante. - Alther, por que não disse antes? Ele está bem?
- Parece bem. - respondeu Alther, de forma polida.
Gui já tinha passado duas semanas com sua família quando, no dia anterior à Lua Cheia, Tia Zelda interrompeu o que estava fazendo para Ouvir qualquer coisa longínqua.
- Meninos, meninos, agora não. - disse ela a Rony e ao Garoto 412, que estavam travando um duelo com dois cabos de vassoura. - Preciso me concentrar.
Rony e o Garoto 412 suspenderam seu combate enquanto Tia Zelda ficava muito quieta, e seus olhos adquiriam um aspecto distante.
- Vem alguém aí. - avisou ela, depois de um tempo. - Vou enviar o Boggart.
- Até que enfim! - disse Gina. - Será o Papai ou a Marcia? Talvez o Gui venha com eles? Ou a mamãe? Talvez venham todos!
Max levantou-se de um salto e trotou até perto de Gina, com a cauda abanando furiosamente. Às vezes até parecia que entendia exatamente o que Gina estava dizendo. Exceto quando era qualquer coisa do gênero - é hora do banho, Max! — ou — não coma mais biscoitos, Max!
- Acalme-se, Max. - disse Tia Zelda, acariciando as orelhas sedosas do cão lobo. - O problema é que não sinto a aproximação de ninguém que eu conheça.
- Oh. - fez Gina. - Mas quem mais sabe que estamos aqui?
- Não sei. - respondeu Tia Zelda. - Mas quem quer que seja, neste momento já está nos pântanos. Acabaram de chegar. Consigo senti-lo. Vamos, deite-se, Max. Lindo menino. Agora, onde está o Boggart?
Tia Zelda soltou um assobio ensurdecedor. A atarracada figura castanha arrastou-se para fora do Mott e cambaleou pelo caminho acima, até à choupana.
- Assim tão alto, não. - queixou-se, esfregando as pequenas orelhas redondas. - Atravessa-me dum lado ao outro, ‘travessa mesmo. - cumprimentou Gina com um aceno de cabeça. - B’Noite, m’nina.
- Olá, Boggart. - Gina sorriu. O Boggart fazia-a sempre sorrir.
- Boggart, - disse Tia Zelda - vem alguém aí através dos pântanos. Mais do que uma pessoa, talvez. Não tenho certeza. Será que podia dar um pulinho lá, e descobrir quem é?
- Sem problemas. Uma nadadinha até cai bem. Num d’moro. - disse o Boggart. Gina viu-o balancear-se até o Mott e desaparecer debaixo d’água com um ligeiro chapinhar.
- Enquanto esperamos pelo Boggart deveríamos ter os Potes de Conserva a postos. - disse Tia Zelda. - Para o caso...
- Mas o Papai disse que você tinha Encantado a choupana depois do ataque dos Duendes. - observou Gina. - Quer dizer que não estamos seguros?
- Só contra os Duendes, - explicou Tia Zelda - e mesmo isso já deve estar se desvanecendo a essa hora. Seja como for, quem quer que seja que vem através dos pântanos, parece-me muito maior que um Duende.
Tia Zelda foi à procura do livro de feitiços das Conservas de Besouros Escudo.
Gina olhou para os Potes de Conserva, que ainda estavam alinhados nos parapeitos. No interior da espessa gosma verde, os Besouros Escudo estavam à espera. A maior parte estava dormindo, mas alguns agitavam-se lentamente, como se soubessem que podiam ser chamados a qualquer hora. Contra quem?, perguntou-se Gina. Ou contra o quê?
- Aqui estamos. - disse Tia Zelda ao aparecer com o livro de feitiços, e pousando-o com estrondo sobre a mesa. Abriu-o na primeira página e retirou de lá um pequeno martelo prateado, que entregou a Gina. - Ora, aqui está a Ativação. - disse ela. - Se não se importar bata em cada Frasco com isto, para eles ficarem Prontos.
Gina pegou o martelinho de prata e percorreu as filas de Frascos, martelando a tampa de cada um deles.
Ao fazê-lo, o ocupante de cada um dos Frascos despertou e colocou-se em sentido. Em menos de um nada um exército de cinqüenta e seis Besouros Escudo estavam a postos à espera de serem libertos. Gina chegou ao último Frasco, que continha a ex-centopéia. Martelou a tampa com o martelinho de prata. Para sua surpresa, a tampa saiu disparada, e o Besouro Escudo pulou para fora num chuveiro de gosma verde. E aterrissou no braço de Gina.
Gina gritou.
O Besouro Escudo solto agachou-se no antebraço de Gina, com a espada preparada. A menina ficou paralisada onde estava, esperando que o Besouro se voltasse e a atacasse, esquecendo que a única missão do Besouro é proteger o seu Libertador contra os inimigos. Os quais procurava ansiosamente.
As escamas verdes blindadas do Escudo moviam-se de forma fluida enquanto se voltava de um lado para o outro, abarcando todo o compartimento com um olhar atento. O seu braço direito segurava uma espada afiada que reluzia sob a luz das velas, e as suas curtas, mas poderosas pernas moviam-se nervosas, enquanto passava o peso de uma para outra, avaliando os potenciais inimigos.
Mas os potenciais inimigos não eram grande coisa. Havia uma enorme tenda azul, de retalhos, com olhos azuis brilhantes que o fitavam diretamente.
- Só tem que pousar a mão sobre o besouro. - sussurrou a tenda à sua Libertadora. - Assim ele se enrola como uma bola. Depois tentamos metê-lo outra vez no Frasco.
A Libertadora olhou para a pequena espada afiada que o besouro sacudia no ar, e hesitou.
- Se quiser, faço eu. - disse a tenda, e avançou em direção ao besouro. O besouro voltou-se, ameaçador, e a tenda deteve-se imediatamente, sem saber o que poderia estar acontecendo. Tinham Gravado todos os besouros, não tinham? Então o besouro devia saber que nenhum deles era parte do inimigo. Mas este besouro não sabia nada disso. Continuava agachado no braço de Gina, prosseguindo a sua busca.
Agora tinha encontrado o que estava procurando.
Dois jovens guerreiros portando lanças, prontos para o ataque. E um deles usava um boné vermelho. De uma tênue e distante vida passada, o Besouro Escudo recordava aquele boné vermelho. Tinha lhe feito mal. O besouro não sabia exatamente que mal tinha sido esse, mas não fazia qualquer diferença.
Tinha avistado o inimigo.
Com um guincho temível, o besouro pulou do braço de Gina, batendo as asas pesadonas, e atravessou o ar com um ruído metálico. O besouro estava se dirigindo diretamente para o Garoto 412 como um minúsculo míssil teleguiado, a espada erguida bem alto acima da cabeça.
Berrava bem alto, a boquinha bem aberta mostrando fileiras de pequenos dentinhos verdes e afiados.
- Acerte-o! - gritou Tia Zelda. - Depressa, dê-lhe uma pancada na cabeça!
O Garoto 412 desferiu um golpe bem forte com o cabo da vassoura, mas falhou. Rony fez pontaria com o seu, mas o besouro desviou-se no último momento, gritando e agitando a espada em direção do Garoto 412. O Garoto 412 olhava para o besouro sem querer acreditar, consciente demais da espada afiada.
- Não se mexa! - disse Tia Zelda num sussurro rouco. - Faça o que fizer, não se mexa.
O Garoto 412 viu, horrorizado, o besouro pousar-lhe no ombro e avançar determinado em direção ao pescoço, erguendo a espada como se fosse um punhal.
Gina saltou em frente.
- Não! - gritou. O besouro voltou-se para sua Libertadora. Não entendia o que Gina dizia, mas quando ela fechou a mão sobre si, o besouro embainhou a espada e enrolou-se obediente como uma bola. O Garoto 412 deixou-se sentar no chão com estrondo.
Tia Zelda já estava preparada com o Frasco vazio, e Gina tentou enfiar o Besouro Escudo enrolado no seu interior. Mas não entrava. Primeiro era um braço que ficava de fora, depois o outro. Gina dobrou ambos os braços, apenas para descobrir que um grande pé verde tinha se estendido para fora do Frasco. Gina apertou e empurrou, mas o Besouro Escudo debateu-se e lutou com todas as forças contra a reentrada no Frasco.
Gina tinha medo que ele se tornasse inesperadamente furioso e se servisse da espada, mas por muito desesperado que o Besouro estivesse para ficar fora do Frasco, nunca desembainhou a espada. A segurança de sua Libertadora era a sua principal preocupação. E como podia sua Libertadora estar a salvo, se o protetor estivesse fechado no Frasco?
- Vai ter que deixá-lo ir. - suspirou Tia Zelda. - Nunca conheci ninguém que conseguisse voltar a fechar algum. Às vezes chego a pensar que dão mais trabalho do que valem a pena. Mas Marcia foi muito insistente. Como sempre.
- Mas e o Garoto 412? - perguntou Gina. - Se ele ficar em liberdade, vai continuar a atacá-lo?
- Agora que o tirou de cima dele, não. Deve estar a salvo.
O Garoto 412 não pareceu ficar muito impressionado. «Deve» não era bem o que ele queria ouvir. Antes preferia ouvir um «Com certeza».
O Besouro Escudo acabou pousando no ombro de Gina. Por momentos, olhou para todo mundo com desconfiança no olhar, mas a cada vez que esboçava um movimento, Gina punha-lhe a mão por cima, e o besouro não demorou a se acalmar.
Até alguma coisa arranhar a porta.
Todos se detiveram.
Lá fora, à porta, alguma coisa arrastava suas garras pela porta abaixo.
Scriitch... scraaatch... scritch.
Max ganiu.
O Besouro Escudo levantou-se e desembainhou a espada. Desta vez Gina não o impediu. O besouro pairou sobre seu ombro, preparado para saltar.
- Vá ver se é um amigo, Berta. - disse Tia Zelda calmamente. A pata balançou-se até à porta, inclinou a cabeça de lado e pôs-se à escuta, antes de soltar um breve miado.
- É um amigo. - disse Tia Zelda. - Deve ser o Boggart. Mas não sei por que é que está arranhando assim.
Tia Zelda abriu a porta e gritou:
- Boggart! Oh, Boggart!
O Boggart estava caído e sangrando no degrau da entrada. Tia Zelda ajoelhou-se junto dele, e todos os outros se reuniram em volta.
- Boggart, Boggart, querido. O que aconteceu?
O Boggart não disse nada. Tinha os olhos fechados, o pêlo baço e colado pelo sangue. Escorregou ainda mais para o chão, tendo esgotado as suas últimas forças para chegar à choupana.
- Oh, Boggart... abra os olhos, Boggart... - pediu Tia Zelda. Não houve resposta. - Alguém, ajude-me a pegá-lo. Depressa.
Rony saltou em frente e ajudou Tia Zelda a sentar o Boggart, mas ele era uma criatura pesada e escorregadia, e foi preciso a ajuda de todos para levá-lo para dentro.
Levaram o Boggart para a cozinha, procurando não notar o rastro de sangue que pingava no chão enquanto andavam, e deitaram-no na mesa da cozinha.
Tia Zelda pousou a mão no peito de Boggart.
- Ainda respira, - disse ela - mas mal se nota. E o coração dele está batendo como um passarinho. Está muito fraco. - Tentou conter um soluço, depois controlou-se e obrigou-se a fazer alguma coisa. - Gina, fale com ele enquanto eu vou buscar a arca Médica. Continue falando com ele e faça-o saber que estamos aqui. Não o deixe desfalecer. Rony, traga água quente da panela.
O Garoto 412 foi ajudar Tia Zelda com a arca Médica, enquanto Gina segurava nas patas úmidas e enlameadas do Boggart, e falava com ele em voz baixa, esperando soar mais calma do que se sentia.
- Boggart, está tudo bem, Boggart. Logo já vai estar melhor. Você vai ver. Boggart? Boggart? Aperte-me a mão se consegue me ouvir.
Um movimento quase imperceptível dos dedos palmípedes do Boggart aflorou a mão de Gina.
- Isso, Boggart. Ainda estamos aqui. Você vai ficar bem. Vai...
Tia Zelda e o Garoto 412 voltaram com uma enorme arca de madeira, a qual pousaram no chão. Rony pousou uma bacia com água quente sobre a mesa da cozinha.
- Bom. - disse Tia Zelda. - Obrigada a todos. Agora gostaria que nos deixassem a sós, a mim e ao Boggart, para tratarmos disto. Vão e façam companhia à Berta e ao Max.
Mas eles não queriam deixar o Boggart.
- Vão. - insistiu Tia Zelda.
Gina largou relutantemente a pata mole do Boggart, e depois seguiu Rony e o Garoto 412 para fora da cozinha. A porta fechou-se com firmeza por trás deles.
Gina, Rony e o Garoto 412 sentaram-se sombriamente no chão, perto da lareira. Rony aninhou-se contra Max. Gina e o Garoto 412 ficaram só olhando para o fogo, imersos nos seus próprios pensamentos.
O Garoto 412 estava pensando no seu anel Mágyko. Talvez se desse o anel à Tia Zelda, pensou ele, pudesse curar o Boggart. Mas se lhe desse o anel, ela ia querer saber onde o tinha encontrado. E alguma coisa lhe dizia que se ela soubesse onde ele o tinha encontrado, ia ficar muito zangada. Muito, muito zangada. E talvez o expulsasse dali.
Fosse como fosse, era roubar, não era? Tinha roubado o anel. Não era dele. Mas podia salvar o Boggart...
Quanto mais o Garoto 412 pensava sobre tudo aquilo, mais se convencia do que tinha de fazer. Tinha que dar o anel-dragão à Tia Zelda.
- Tia Zelda disse que a deixassem sozinha. - declarou Gina quando o Garoto 412 se levantou e caminhou para a porta fechada da cozinha.
O Garoto 412 nem percebeu.
- Não vá. - gritou Gina, e levantou-se de um salto para impedi-lo, mas nessa hora a porta da cozinha se abriu.
Tia Zelda saiu de lá. Seu rosto estava pálido e encanecido, e tinha o avental coberto de sangue.
- O Boggart levou um tiro. - disse ela.


Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.