Capitulo 9 – O Café de Molly W
Capitulo 9 – O Café de Molly Weasley
Era uma típica noite calma de Inverno no café de Molly Weasley. Um constante zumbido de conversas enchia o ar, enquanto clientes habituais e viajantes partilhavam as largas mesas de madeira em torno do pequeno forno à lenha. Molly tinha acabado de passar pelas mesas, partilhando piadas, oferecendo fatias de bolo de cevada acabado de fazer, e trocando o óleo das lamparinas que tinham estado acesas durante toda aquela aborrecida tarde de Inverno. Agora estava de volta ao seu lugar atrás do balcão, enchendo cuidadosamente cinco medidas de Cerveja Especial Primaveril para uns Mercadores Nortenhos acabados de chegar.
Quando Molly deu uma olhada nos Mercadores percebeu com surpresa que o seu característico ar de desolação e triste resignação tinha sido substituído por amplos sorrisos. Molly sorriu. Orgulhava-se de explorar um café feliz, e se conseguia que cinco Mercadores Nortenhos rissem ainda antes de beberem a primeira caneca da Especial Primaveril, então não havia dúvidas de que estava fazendo as coisas bem.
Molly levou as cervejas até à mesa dos Mercadores, junto da janela, e pousou-as habilmente na frente deles sem entornar a menor gota. Mas os Mercadores não prestaram qualquer atenção à cerveja, pois estavam ocupados demais esfregando os vidros embaçados da janela com as suas mangas sujas e espreitando a escuridão exterior. Um deles apontou para qualquer coisa lá fora, e desataram todos em sonoras gargalhadas.
O riso estava a alastrar-se pelo café. Outros clientes estavam se aproximando das janelas e espiando para o exterior, até que em pouco tempo toda a clientela estava tentando arranjar um lugar para espiar da longa fileira de janelas que corria ao longo dos fundos do café.
Molly Weasley espiou para fora, tentando descobrir o que causava toda aquela diversão.
Ficou de boca aberta.
À luz brilhante da lua cheia, a Feiticeira ExtraOrdinária, Madame Marcia Overstrand, estava coberta de lixo e dançando como uma maluquinha no topo da lixeira municipal.
Não, pensou Molly, não é possível.
Espreitou outra vez pela janela besuntada. Molly não podia acreditar no que estava vendo. Lá estava de fato a Madame Marcia com três crianças - três crianças? Todos sabiam que Madame Marcia não suportava crianças. Havia também um lobo e alguém que Molly achava vagamente familiar. Mas quem?
O marido que não prestava para nada de Lílian, Tiago Faço-Amanhã Potter, era quem era.
O que Tiago Potter estaria fazendo com Marcia Overstrand? Com três das crianças? Na lixeira? Será que Lílian sabia disso?
Bem, em breve saberia.
Como boa amiga de Lílian Potter, Molly achava que era seu dever tratar de tirar tudo a limpo. Por isso pôs o Garoto-da-Limpeza para tomar conta do café, e saiu correndo para o luar.
Molly desceu com estrépito o portaló do pontão do café e correu através da neve, colina acima até à lixeira. Enquanto corria, sua mente ditou-lhe uma inevitável conclusão.
Tiago Potter estava fugindo com Marcia Overstrand.
Fazia todo sentido. Lílian queixara-se várias vezes de como Tiago era obcecado por Marcia. Desde que tinha desistido de sua Aprendizagem com Alther Mella e Marcia o tinha substituído, Tiago tinha acompanhado o seu espantoso progresso com um misto de horror e fascínio, sempre pensando que podia ter sido ele. E, desde que ela se tornara Feiticeira ExtraOrdinária, há dez anos, Tiago, se possível, ficou ainda pior.
Completamente obcecado com o que Marcia fazia, fora o que Lílian lhe dissera.
Mas claro, cogitou Molly, que tinha chegado ao fundo da enorme pilha de lixo e começava a subi-la com dificuldade, Lílian também não era completamente inocente.
Qualquer um podia ver que a sua menina não era filha de Tiago. Era tão diferente dos outros. E certa vez, quando Molly tentara abordar discretamente o assunto do pai de Gina, Lílian tinha mudado bruscamente de assunto. Oh sim, algo se passava entre os Potter há anos. Mas isso não servia de desculpa para o que Tiago estava fazendo agora.
Não serve mesmo de desculpa, pensou Molly mal-humorada, subindo aos tropeções para o topo da pilha de entulho.
As figuras enlameadas tinham começado a descida e dirigiam-se para Molly. Molly agitou os braços na direção deles, mas pareciam não tê-la visto. Pareciam preocupados e cambaleavam um bocado, como se estivessem tontos.
Agora que estavam mais perto, Molly podia ver que não tinha se enganado quanto às suas identidades.
- Tiago Potter! - gritou Molly zangada.
As cinco figuras deram um pulo e ficaram olhando para Molly.
- Chhhhh! - sussurraram quatro vozes, tão alto quanto se atreviam.
- Nada de chhs! - declarou Molly. - O que pensa que está fazendo, Tiago Potter? Trocando sua mulher por esta... assanhada? - Molly agitou reprovadoramente o indicador em direção de Marcia.
- Assanhada? - exclamou Marcia.
- E levar estas pobres crianças com você. - ralhou a Tiago. - Como pode?
Tiago patinhou pelo lixo em direção a Molly.
- Do que está falando? - exigiu saber. - E, por favor, pode falar mais baixo?
- Chh! - disseram três vozes por trás dele. Por fim Molly acalmou-se.
- Não faça isso, Tiago. - sussurrou com voz rouca. - Não abandone sua mulher e sua família adoráveis. Por favor.
Tiago pareceu estupefato.
- Não vou abandonar. - disse ele. - Quem te disse uma coisa dessas?
- Não vai?
- Não!
- Chhhh!
Levou a maior parte da descida da lixeira para explicar a Molly o que tinha acontecido. Seus olhos esbugalharam-se e a boca escancarou-se quando Tiago lhe contou tudo o que foi preciso para pôr Molly do lado deles - que foi praticamente tudo o que aconteceu. Tiago compreendeu que não precisavam só do silêncio de Molly; a ajuda dela também seria bem vinda. Mas Marcia não tinha tanta certeza assim. Molly Weasley não era propriamente a primeira pessoa que Marcia teria escolhido para pedir ajuda. Por isso decidiu avançar e tomar conta da situação.
- Bom. - disse ela com autoridade, quando pisaram terra firme na base da lixeira. - Acho que podemos contar que o Caçador e sua Matilha sejam enviados atrás de nós a qualquer momento.
Uma expressão de medo atravessou o rosto de Tiago. Já tinha ouvido falar do Caçador.
Marcia mantinha se calma e pragmática.
- Voltei a encher a calha com lixo e fiz um Feitiço de Fecha Depressa e Solda na porta dos ratos. - disse. - Por isso, com sorte, ele vai pensar que continuamos presos lá dentro.
Rony estremeceu só de pensar nisso.
- Mas isso não vai atrasá-lo muito. - prosseguiu Marcia. - E nessa altura ele há de vir à nossa procura. - E há de fazer perguntas. - Marcia olhou para Molly como se estivesse dizendo, E vai ser a você que vai fazê-las.
Todos se calaram.
Molly devolveu com firmeza o olhar de Marcia. Sabia perfeitamente no que estava se metendo. Sabia que ia ter muitas chateações por isso, mas Molly era uma amiga leal.
Ia fazê-lo.
- Muito bem, então. - disse Molly espevitada. - Quer dizer que quando essa altura chegar, vocês e estes diabinhos já têm que estar bem longe daqui, não é?
Molly levou-os para o dormitório nos fundos do café, onde muitos viajantes estourados costumavam encontrar uma cama quentinha para passar a noite, e também roupas lavadas se precisassem. O dormitório estava vazio àquela hora do dia. Molly mostrou-lhes onde guardava as roupas e disse-lhes que levassem todas as que precisassem.
Ia ser uma noite longa e fria. Encheu rapidamente um balde de água quente para que pudessem lavar a maior parte da porcaria da calha, e depois saiu correndo, dizendo:
- Encontro-os lá em baixo no cais daqui a dez minutos. Podem levar o meu barco.
Gina e Rony ficaram mais do que satisfeitos por poderem se livrar daquelas roupas imundas, mas o Garoto 412 recusou-se a fazer o que quer que fosse. Já tinha sofrido trocas de roupa demais num só dia, e mostrava-se determinado a agarrar-se ao que tinha, mesmo que fosse apenas um imundo e ensopado pijama de Feiticeiro.
Por fim Marcia viu-se obrigada a servir-se de um Feitiço de Limpeza sobre ele, seguido de um Feitiço de Troca de Roupa para enfiá-lo numa blusa de pescador, calças e casaco de lã, além de uma boina de um vermelho vivo que Tiago tinha encontrado para ele.
Marcia estava irritada por ter que recorrer a um feitiço para as roupas do Garoto 412. Queria poupar energias para mais tarde, já que tinha o desagradável pressentimento de que ia precisar de toda a energia de que pudesse dispor para se porem a salvo. É certo que tinha gasto alguma energia no Feitiço de Lava a Seco Num Segundo, o qual, dado o estado de sua capa, tinha se convertido num Feitiço de Lava a Seco Num Minuto, e mesmo assim não tinha conseguido se livrar de todas as nódoas. Na opinião de Marcia, a capa da Feiticeira ExtraOrdinária era mais do que uma mera capa; era um instrumento de Magya perfeitamente afinado e que devia ser tratado com respeito.
Dez minutos mais tarde estavam reunidos no molhe.
Molly estava à espera deles com o seu barco à vela.
Rony olhou aprovadoramente para o pequeno barco verde. Adorava barcos. Na verdade, não havia nada de que Rony gostasse mais do que estar num barco sobre a água, e este parecia ser bom. Era largo e equilibrado, flutuava perfeitamente e tinha um par novo de velas vermelhas. E tinha um nome agradável: Muriel. Rony gostou do nome.
Marcia olhou para o barco, desconfiada.
- Como é que funciona? - perguntou a Molly.
Rony adiantou-se.
- Veleja. - disse ele. - Veleja.
- Quem é que veleja? - perguntou Marcia, confusa. Rony era paciente.
- O barco veleja.
Molly começava a ficar agitada.
- É melhor porem-se a caminho. - disse ela, lançando um olhar à lixeira. - Pus remos ali, para o caso de precisarem. E alguma comida. Vão, eu solto as amarras enquanto vocês sobem a bordo.
Gina foi a primeira a subir para o barco, agarrando o Garoto 412 por um braço e arrastando-o com ela. Ele procurou resistir durante um breve momento, mas depois cedeu. O Garoto 412 estava ficando muito cansado.
Rony saltou logo a seguir, depois Tiago empurrou uma Marcia algo relutante para fora do molhe e para o interior do barco. Sentou-se hesitante perto da barra do leme e cheirou o ar.
- Que cheiro horrível é este? - murmurou.
- Peixe. - respondeu Rony, interrogando-se sobre se Marcia saberia velejar.
Tiago saltou para o barco com Max, e Muriel afundou-se um pouco mais.
- Vou empurrá-los. - disse Molly ansiosa.
Atirou a corda a Rony, que a apanhou habilmente e a enrolou meticulosamente na proa do barco.
Marcia agarrou o timão, as velas a sacudirem-se violentamente, e Muriel descreveu uma inesperada curva para a esquerda.
- Não seria melhor eu levar o leme? - perguntou Rony.
- Levar o quê? Oh, esta coisa aqui? Muito bem, Rony. Não quero me cansar. - Marcia embrulhou-se na sua capa e, com o máximo de dignidade que conseguiu reunir, arrastou-se acanhada para o lado da embarcação.
Marcia não estava nada contente. Nunca tinha estado num barco antes, e não tinha intenção de voltar a pôr os pés num, se pudesse evitar. Para começar, não havia cadeiras. Nem tapetes, nem coxins, nem sequer um telhado.
Não só havia água demais no exterior do barco, como havia alguma água a mais no interior. Isso queria dizer que estavam afundando? E o cheiro era insuportável.
Max estava todo entusiasmado. Conseguiu pisar os preciosos sapatos de Marcia, e esfregar-lhe a cauda na cara ao mesmo tempo.
- Chega para lá, cão pateta. - disse Tiago, empurrando Max para a proa onde podia espetar o nariz ao vento e cheirar todos os odores da água. Depois Tiago apertou-se ao lado de Marcia, para grande desagrado dela, enquanto Gina e o Garoto 412 se enroscavam no outro lado do barco.
Rony estava todo feliz à popa, agarrado ao timão do leme e, confiante, dirigiu o barco para a foz do rio.
- Para onde vamos? - perguntou.
Marcia ainda estava preocupada demais com a sua proximidade de uma quantidade tão grande de água para poder responder.
- Para casa de Tia Zelda. - disse Tiago, que tinha decidido tudo com Lílian depois de Gina ter partido nessa manhã. - Vamos ficar com a Tia Zelda.
O vento enfunou as velas do Muriel e o barco ganhou velocidade, dirigindo-se para a forte correnteza no meio do rio. Marcia fechou os olhos e sentiu-se tonta. Interrogava-se se seria normal o barco inclinar-se tanto assim.
- A Guardiã nos Pântanos Marram? - perguntou Marcia num fio de voz.
- Sim. - respondeu Taigo. - Ali estaremos a salvo. Ela agora tem a cabana permanentemente Encantada, depois de ter sido saqueada pelos Duendes da Lama Gelatinosa no último Inverno. Agora, ninguém consegue encontrá-la.
- Muito bem. - concordou Marcia. - Vamos para casa de Tia Zelda.
Tiago pareceu surpreendido. Marcia tinha concordado com ele, e sem ser preciso discutir. Mas também, pensou para consigo, agora estavam todos no mesmo barco.
E assim o pequeno barco verde desapareceu na noite, deixando Molly uma figura distante na costa, a acenar corajosamente.
Quando perdeu o Muriel de vista, Molly ficou no cais a ouvir a água marulhar contra as pedras frias. Subitamente, sentiu-se muito só. Voltou-se, começando a voltar pela margem coberta de neve, o caminho iluminado pela luz amarelada que brilhava desde as janelas do seu café, não longe dali. Os rostos de alguns clientes espreitaram para a noite enquanto Molly se apressava para regressar ao calor e burburinho do café, mas pareceram não perceber sua pequena figura a caminhar sobre a neve e a percorrer o portaló até ao pontão.
Quando Molly abriu a porta do café e escorregou para o confortável burburinho, seus clientes mais habituais repararam que Molly não estava ela mesma. E tinham razão; ao contrário do que era habitual, Molly só tinha um pensamento em mente.
Quanto tempo faltaria para o Caçador chegar?
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