CAPÍTULO VII
CAPÍTULO VII
Rony foi subindo a escada, pisando firme para espantar a confusão da mente. Não devia ter feito aquela viagem. Ou, melhor: não devia ter obrigado sua mulher a acompanhá-lo! Nos últimos meses havia se acostumado com o comportamento louco da esposa, mas agora a via como ela de fato era, uma mulher temperamental, desbocada, um monstro ingrato.
Resumindo: Hermione era tudo o que ele abominava.
Mesmo assim, vira-se olhando para as pernas dela como um adolescente excitado! Rony fez uma careta. Estaria enlouquecendo? Esfregando os olhos ele saiu caminhando pelo largo corredor na direção do quarto que já havia ocupado. Por alguns instantes, lembrou-se do tempo passado em Wessex depois que os Potter haviam retomado o castelo de Harry. Embora tivesse sido uma época de muita luta, aquele período parecia prazeroso em comparação com o momento atual. Agora ele se sentia sobrecarregado, e o fardo mais pesado era a esposa!
Enraivecido, Rony abriu a porta do quarto e viu Hermione passar por ele como um furacão. O que ela pretendia fazer agora? Rapidamente ele fechou a porta, prevendo a possibilidade de que estivesse para começar mais uma gritaria. O comportamento dela no salão tinha sido absurdo e felizmente eles agora estavam sozinhos. Aliviado, Rony passou o trinco na porta e voltou-se. Então conteve a respiração.
Ela estava com a espada dele.
A poucos passos de distância, com as pernas apartadas na tradicional postura de combate, Hermione brandia no ar a pesada arma, com impressionante facilidade, finalmente apontando-a para o peito dele. Abaixando um pouco a cabeça, olhou-o de uma forma ameaçadora.
- Devolva-me os punhais, Potter.
Rony sentiu o coração palpitar, mas não foi de medo. Embora não quisesse reconhecer, via alguma coisa de excitante na audácia, na agilidade, na presença de espírito dela… Ah, estava enlouquecendo mesmo! Rony pigarreou antes de falar.
- Você me mataria aqui, na casa-do meu irmão? Está querendo morrer, Hermione?
- Talvez. - ela respondeu. - Talvez seja melhor morrer do que ficar desarmada.
Rony sentiu-se tocado, não tanto pelas palavras quanto pela vulnerabilidade que pensou ver naqueles olhos negros. Por Deus, ele não havia querido privá-la dos preciosos punhais, apenas concordando com o desejo do irmão. Afinal de contas, era na casa de Harry que eles estavam. E, na ocasião, tinha ficado furioso com a esposa por embaraçá-lo na frente de todos. Devia ter previsto isso, era bem verdade, mas ultimamente ela vinha tendo um comportamento tão calmo que ele até… Não, devia ter previsto, sim. Hermione nunca mudaria. Era uma rebelde que nada nem ninguém conseguiria domar.
Os últimos vestígios da raiva de Rony desapareceram de pronto, restando apenas um frio desapontamento. Como os outros Potter costumavam dizer, ele não conseguia guardar rancor de ninguém por muito tempo. Com a esposa não seria diferente. Por mais barulhenta e irritante que fosse, Hermione nunca o havia prejudicado muito seriamente. E agora ele não acreditava que ela faria mais do que vociferar os costumeiros impropérios e ameaças.
Rony olhou-a da cabeça aos pés e reparou no esforço que ela fazia, evidente na tensão dos braços e do rosto. Podia tomar a arma dela, mas alguém poderia acabar se ferindo. No caso, esse alguém seria Hermione. E alguma coisa que ele não conseguia entender o convenceu a não superá-la fisicamente. O que conseguiria provar com isso, além de que era mais forte?
- Pois muito bem. - disse Rony, com brandura, reparando que os ombros dela cediam levemente, uma indicação de alívio.
Evidentemente a pesada espada exigia um esforço muito grande dela. Então ele tirou de uma bolsa pendurada na cintura os dois punhais e a faca, que apresentou com o cabo virado para ela. Logo depois viu a espada ser soltada no chão.
- Mas não ponha esse seu punhal preferido na cintura enquanto estiver aqui. - recomendou, enquanto se abaixava para apanhar a própria arma. - Se Harry a vir com ele, será um inferno.
Hermione assentiu enquanto encostava no peito as três armas juntas, o que fez Rony sentir vontade de abraçá-la. Ela parecia tão só e indefesa, uma criatura assustada que buscava conforto na lâmina fria de uma arma. Então ele se arrependeu de tê-la levado ao local onde o pai dela tinha sido morto, à casa de um homem que não fazia segredo do desprezo que sentia por ela. Sem pensar no que fazia, Rony adiantou-se com a os braços abertos, mas ela prontamente recuou, erguendo a cabeça para encará-lo.
- Vou esconder os punhais, mas não espere que eu goste daqui. Deixei bem claro que não devia me trazer. Eu avisei, Potter!
Rony suspirou ao sentir nas têmporas o começo de uma dor de cabeça. Depois de pôr a espada outra vez na bainha, olhou novamente para a criatura que agora esbravejava como uma megera. E ainda há pouco ele havia pensado nela como alguém vulnerável. Oh, Deus… Aquilo era loucura. Rony voltou-se para sair, deixando-a com seus punhais e seu ódio.
Hermione passou as horas que antecederam o jantar andando de um lado para outro dentro do estreito quarto, remoendo-se com uma suspeita.
Tinha sido fácil demais.
O triunfo inicial por pegar Rony desatento havia desaparecido no instante em que ela apontou a espada para o peito dele. Tinha sido muito simples pegar a arma, confirmando que ele precisava de alguém para protegê-lo. Ah, o estúpido! Logo em seguida, quando ela brandiu a pesada espada, sentiu novamente a dor imaginária, como se a falha deixada por um dente arrancado voltasse a doer. Ela havia vacilado. Apesar de todos os medos que tinha, não queria feri-lo. Na verdade quase havia suplicado para que ele não a obrigasse a feri-lo. A submissão de Rony aconteceu quase imediatamente, sem que ele ao menos tentasse desarmá-la ou sugerisse um acordo. Entregou todos os punhais, apenas recomendando que os mantivesse escondidos. Aquilo deixou Hermione tão surpresa que quase a fez cair de joelhos, aliviada. Obviamente ele não tinha intenção de jogá-la no calabouço ou deixar que o Lobo a atacasse.
Como não queria estar ali ela havia tentado apresentar os motivos que tinha, mas Rony simplesmente se retirara, com aquele olhar triste. Procurando afastar o sentimento de culpa causado pela lembrança, Hermione esforçou-se para se concentrar. Ele havia devolvido as armas, mas ela continuava em Wessex. Além disso, não confiava no marido nem no demônio do irmão dele.
Tinha sido fácil demais… Teria Rony algum outro motivo para devolver os punhais dela? Talvez ele apenas gostasse de desafiar o irmão, pensou Hermione, logo balançando a cabeça. O santo não teria tal mesquinhez. E o que dizer dos horríveis planos que ela havia pensado estar na cabeça dele? Comparar a um calabouço aquele pequeno, mas confortável lugar onde eles haviam se instalado seria no mínimo injusto. Embora nuas, as paredes eram limpas e havia pregos fincados na pedra para que ela pendurasse o manto perto da lareira. O enorme baú que eles haviam trazido do castelo Granger estava encostado na parede, por baixo da estreita janela, transformando-se em assento.
E havia a cama.
Hermione olhou para o pesado móvel, que parecia ocupar a maior parte do quarto. Em cima do colchão macio estavam dobrados e empilhados vários cobertores.
Não era uma cama muito grande, nem chegando a ter o tamanho da que havia no quarto principal do castelo dela, mas mesmo assim atulhava o pequeno quarto. Onde Rony encontraria espaço para improvisar uma cama no chão? Outra vez ela ficou desconfiada. Talvez fosse esse o plano… violentá-la ali, onde as grossas paredes impediriam que outras pessoas ouvissem os gritos dela. Longe de casa, ela não teria nenhum aliado na toca do Lobo, onde uma Granger sempre seria considerada inimiga.
Procurando se acalmar, Hermione considerou a idéia e balançou a cabeça. Não acreditava num plano como aquele, porque mais de uma vez Rony já havia deixado claro que não tinha nenhum interesse por ela… como mulher. Soltando um demorando suspiro ao pensar naquilo, Hermione sentou-se na beirada da cama e considerou as mais desencontradas possibilidades, até se fixar numa conjectura que se recusava a ser descartada.
Talvez não houvesse plano nenhum.
Talvez Rony houvesse ido a Wessex simplesmente para ver o filho do irmão, fazendo-se acompanhar por ela porque… porque não confiava na esposa o suficiente para deixá-la sozinha em casa. Hermione achou que devia ficar revoltada com aquilo, mas não pôde. Sentia-se cansada, mental e fisicamente, mas mesmo assim sabia que não podia sucumbir à exaustão. Precisava estar alerta. Devia haver alguma coisa que ela não estava percebendo, algum plano para ser posto em prática ali, na toca do Lobo.
Hermione afundou a cabeça nas mãos, mas uma batida na porta a fez levantar-se de chofre. A porta se abriu, revelando a figura enorme de Rony. Com a aparência calma de sempre, ele usava uma túnica verde que o tornava tão misterioso e envolvente quanto uma floresta.
As pontas dos compridos cabelos estavam úmidas. Obviamente havia tomado banho e trocado de roupa, e Hermione melindrou-se por não fazer a mesma coisa. Bem, não podia reclamar. Não lhe ofereciam tais confortos porque não esperavam que ela aceitasse. Isso era até bom, pensou, alisando a grosseira túnica marrom de lã. Precisava manter a reputação de mulher inflexível.
Hermione reparou que o marido estava esperando por ela, com uma expressão tão confiável que ela quase se deixou conduzir por ele. Logo depois, pensando melhor, aprumou o corpo e marchou para a porta. Quem estava ali era um homem, além de ser um Potter. Portanto, não merecia confiança.
Rapidamente ela desceu a escada e entrou no enorme salão. O lugar estava outra vez cheio de gente, o que a fez sentir-se mais deslocada do que nunca. Deliciosos aromas de comida enchiam o ar e Rony a levou até um lugar à mesa do lorde do castelo. Quando diligentes servos puseram bandejas de comida diante deles, Hermione sentiu-se duplamente constrangida. Jamais havia comido uma refeição na companhia do marido, embora fosse esse o costume.
Quando Rony se acomodou no lugar ao lado, ela se sentiu oprimida pelo corpanzil dele e afastou-se um pouco no banco. Mesmo assim a coxa musculosa dele pareceu muito perto da dela. Percebendo que não teria como resolver aquele problema, Hermione olhou em volta, procurando pensar em outra coisa. Além daquela mesa grande, onde estavam os donos da casa e vários agregados, havia muitas outras espalhadas pelo salão. Aparentemente todos os habitantes do castelo tomavam a refeição juntos. A constatação seguinte a surpreendeu ainda mais.
Todos ali pareciam felizes.
As pessoas nas mesas menores conversavam entre si e riam, enquanto os servos ocupados em servir as mesas faziam com eficiência seu trabalho, sem aquela expressão de enfado que Hermione estava acostumada a ver no castelo dela. E todos pareciam ter respeito e afeição pelo lorde e pela lady. .
Foi isso o que mais a surpreendeu, porque, quando o pai dela dava uma ordem, os servos se encolhiam, temerosos de não agradá-lo. O Lobo, no entanto, embora fosse um homem ainda mais forte, parecia inspirar mais lealdade do que medo.
- Hermione.
Quando ouviu a voz de Rony ela levou um susto e se voltou, como se precisasse se defender de algum ataque, mas ele apenas mostrava as fatias de carne que havia cortado na bandeja, uma das quais oferecia a ela. Hermione aceitou a oferta sem agradecer. Estava mastigando a deliciosa carne quando teve a atenção chamada para outra cena.
O lorde e a lady comiam na mesma bandeja. O Lobo cortou um pequeno pedaço de pombo assado e ofereceu-o a esposa. Com a mão. Em vez de recuar, Gina aproximou o rosto e pegou a carne com os dentes. Depois segurou no punho do marido para lamber os dedos dele. Finalmente sorriu, mostrando as covinhas do rosto.
Gina conteve a respiração. Nunca tinha visto nada parecido. Aquilo chegava a ser repulsivo, no entanto… Disfarçadamente ela olhou para as mãos de Rony, mãos de dedos longos e fortes. Que gosto teriam aqueles dedos? Seriam doces, como parecia ser o próprio Rony?
Assustada com aqueles pensamentos, Hermione abaixou a cabeça, quase fazendo com que os cabelos caíssem na comida. Queria se esconder do mundo… e que o mundo fosse para longe dela. Enquanto comia, observava as pessoas em volta protegida pelos cabelos.
Várias vezes o Lobo e a esposa tentaram envolvê-la na conversa, mas ela respondia com resmungos. Detestava aquele lugar, onde as pessoas não pareciam se sentir ameaçadas pelo vizinho. Achando isso um absurdo, várias vezes ela reclamou da comida, só para ver a reação da dona da casa.
Mas Gina não se mostrava ofendida, apenas sorrindo naquele seu jeito compreensivo. Até que Hermione ficou confusa. Como aquela doce criatura podia sentir afeição pelo Lobo? Antes de chegar ali, Hermione havia imaginado a lady Wessex como uma mulher tão abrutalhada e assustadora quando o mais velho dos Potter. Alguém como… como ela própria? Hermione olhou para a pequena e delicada Gina e sacudiu a cabeça. Obviamente a mulher não era tão inofensiva quanto parecia. De outra forma, como conseguiria conter o marido, às vezes sem ao menos tocar nele?
Era estranho, muito estranho. Mais estranho ainda era Gina parecer feliz com sua sina. E a mulherzinha era muito convincente nisso. Bem, devia ser louca. A existência de qualquer mulher consistia apenas em sofrimentos, do nascimento à morte. No entanto, Gina de Wessex dava a entender o contrário. Parecia considerar o filho recém-nascido uma bênção, e não um fardo dificil que, para ser trazido ao mundo, quase havia custado a vida dela.
Mas tratava-se de um menino, o que fazia muita diferença. A mãe de Hermione não havia conseguido produzir o desejado herdeiro, enfraquecendo-se a cada gravidez, até ficar tão debilitada que o marido a expulsou do quarto. A mulher passou a dividir um outro quarto menor com Hermione, mas Voldemort continuou querendo um filho e freqüentemente a procurava, nessas ocasiões mandando que a filha saísse… Hermione estremeceu. As meninas que iam nascendo eram banidas da casa antes mesmo de serem amamentadas pela mãe, indo ela não sabia para onde. Talvez fossem entregues a famílias humildes para que as criassem, talvez fossem mortas…
Hermione sentiu um toque no braço e voltou-se para o lado. Por um longo momento pensou estar encarando o pai, até afastar os cabelos do rosto e perceber que se tratava de um jovem servo. O rapaz parecia muito espantado com a reação dela.
- Só quero recolher sua bandeja, minha lady. - disse.
Soltando um suspiro exasperado, Rony puxou a bandeja dela e entregou-a ao servo.
- Desculpe se o garoto a assustou. - disse Gina. - Sempre mandamos as sobras de comida para os portões do castelo para que sejam distribuídas às pessoas famintas.
- Meu povo sofreu muito com a guerra. - acrescentou o Lobo, olhando de forma significativa para Hermione.
- Mas as coisas estão melhorando. - apressou-se em dizer Gina. - Agora o Lobo está em casa e não precisará mais viajar.
Dito isso ela mostrou um luminoso sorriso, o que imediatamente fez com que o marido desfizesse a carranca. Hermione ficou muito espantada. Como ela conseguiu isso?
O Lobo mexeu a cabeça para o lado.
- Já que você e o nosso filho estão passando bem, poderei fazer alguma viagem, se houver necessidade.
Gina franziu a testa e Hermione viu determinação no semblante dela.
- Mas háverá outros bebês. - protestou a lady.
- Não! - discordou o Lobo, com uma ênfase que quase assustou Hermione. - Foi muito doloroso para você.
Doloroso para Gina? Estaria aquele gigante realmente preocupado com o bem-estar da esposa? O espanto de Hermione aumentou ainda mais.
- Bobagem! - minimizou Gina. - Foi um parto fácil e…
O lorde empurrou a cadeira e ficou sentado de frente para a esposa.
- Um parto fácil? Você chama de parto fácil um dia e meio de sofrimento?
- O primeiro parto é sempre mais difícil, mas os seguintes serão…
Desta vez o Lobo se pôs de pé.
- Já disse que não haverá mais filhos! - Hermione inclinou-se para a frente e tocou com os dedos no cabo do punhal que tinha escondido na bota. Aquele homem falava com tanta ênfase que parecia disposto a agredir a franzina esposa na frente de todos. Forte como era, certamente a mataria. Hermione não sentia nenhuma simpatia por Gina, mas não ficaria parada vendo uma mulher indefesa ser morta por um brutamontes. Quando ela já ia puxar o punhal, Gina se levantou num salto.
- Haverá mais filhos, sim, senhor! - declarou, com convicção. Depois, avançando um passo, cutucou com a ponta do dedo o peito musculoso do marido. - Se acha que não conseguirei fazê-lo mudar de idéia, vamos até o nosso quarto e você verá!
Agora era demais! Certamente o Lobo castigaria a esposa por desafiá-lo daquele jeito. No entanto, para surpresa maior de Hermione, a reação do homem foi mostrar um sorriso malicioso antes de abraçar a mulher e beijá-la na boca.
Outro fato surpreendente era que ninguém ali parecia reparar no que estava acontecendo, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Ali perto mesmo um sujeito gordo continuava comendo, com toda tranqüilidade.
Hermione olhou novamente para o lorde e a lady de Wessex, que continuaram se beijando por mais alguns segundos. Finalmente ele recuou e piscou o olho para a esposa.
- Talvez devamos procurar um pouco de privacidade para terminar nossa conversa.
A mulher assentiu e eles pediram licença aos presentes para se retirar. Em vez de se mostrar apavorada com a perspectiva do que estava para acontecer, Gina tinha as faces afogueadas e parecia ansiosa. Ansiosa?
Hermione balançou a cabeça. Aqueles dois só podiam estar loucos para ter tal comportamento. No entanto… Subitamente ela se lembrou de quando Rony havia encostado os lábios nos dela. Saberia o santo beijar daquele jeito? Mexendo-se no banco, Hermione procurou acreditar que estava com o coração palpitando tanto por causa da perigosa situação que havia presenciado. Não tinha nada a ver com o marido dela nem com pensamentos carnais contra os quais Edred sempre a advertia.
Com a mente confusa, Hermione levou um susto quando ouviu a voz de Rony.
- Bem, já é tarde e tivemos um longo dia. Acho que também vou me recolher. E você, Hermione?
Como se quisesse mostrar que se tratava de um convite ele estendeu a mão, para a qual Hermione olhou com desdém. Se achava que ela teria o mesmo comportamento da louca lady Wessex, ele estava tristemente enganado.
- Não estou com sono.
Rony suspirou.
- Mas eu estou. E acho melhor você me acompanhar do que ficar aqui assustando os servos.
Hermione não gostou de ouvir aquilo. Não tinha tido a intenção de assustar o garoto, mas… E se tivesse? Era uma Granger e podia assustar quem bem quisesse.
- Vamos, Hermione. - insistiu Rony.
Ele estava com aquela expressão paciente, como se quisesse dizer a ela que, se fosse preciso, passaria a noite toda ali, com a mão estendida.
- Ora, está bem. - despachou Hermione.
Ignorando a mão oferecida ela se levantou e marchou para a escada, que subiu com passos firmes. Quando entrou no quarto, reparou novamente, o quanto ele era apertado. Então encostou-se na parede e lançou um olhar de advertência a Rony.
- Você vai precisar de mais cobertores para fazer sua cama no chão.
Depois de trancar a porta ele olhou para ela.
- Não há espaço suficiente no chão, Hermione. Vou dormir na cama.
Apesar do pânico, Hermione decidiu que não cederia. Abaixou-se vagarosamente e tirou o punhal da bota. Depois olhou novamente para ele, triunfante.
- Acho que não.
Rony empertigou-se ao ver o brilho da lâmina.
- Vou dormir na cama. - repetiu. - Decida você onde quer dormir. Se resolver se espichar no chão com os pés dentro da lareira, não fará diferença para mim. Ou será que prefere abrir o baú para se encolher lá dentro? Quanto a mim, sou muito alto e não posso fazer nada disso!
As últimas palavras ele disse quase gritando. Depois, ignorando a postura ameaçadora dela, contornou a cama e sentou-se. Perplexa, Hermione ficou olhando enquanto ele tirava as botas e a espada, pondo tudo aos pés da cama. Sem se despir, deitou-se com os braços por baixo da cabeça, naquela pose arrogante que tanto a irritava.
- Não vai cortar minha garganta? - desafiou-a. - Estou tão cansado que provavelmente nem vou reparar.
Logo depois, para maior fúria dela, simplesmente fechou os olhos. Hermione ficou olhando para ele durante um bom tempo, até finalmente abaixar a mão. Sentia-se uma idiota por ter brandido uma arma contra um homem adormecido. E, pelo ritmo da respiração, Rony estava mesmo dormindo, tendo se esquecido inteiramente da presença dela.
Diabo. Hermione não estava acostumada com aquilo. Olhou novamente para o marido, sem saber o que fazer, mas estava certa de que não se deitaria na mesma cama com ele. Franzindo a testa, examinou o chão e chegou à conclusão de que passaria uma péssima noite se resolvesse dormir ali. Depois caminhou até o baú. Talvez Rony tivesse razão e ela pudesse dormir lá dentro.
Erguendo a tampa, sentiu um certo prazer com a perspectiva de deixar amarrotadas as roupas do marido. Então pegou um dos cobertores da cama, entrou no baú e procurou se acomodar, apenas para constatar que o espaço era muito apertado. Seria insuportável passar a noite toda com as pernas dobradas daquele jeito. Além disso, sentia-se confinada, correndo também o perigo de que a tampa caísse, deixando-a presa. Elene sentiu um arrepio. Talvez fosse justamente essa a intenção de Rony. Logo que ela dormisse, ele abaixaria a tampa e a carregaria o baú até a cova que o Lobo havia mandado cavar… Hermione ergueu-se, subitamente vendo aquele baú como um esquife.
Finalmente pegou um travesseiro na cama e sentou-se no chão, com as costas na parede. Por mais exausta que estivesse, porém, não conseguia adormecer. Ressentida, ficou olhando para Rony, iluminado pelo fogo que queimava na lareira, o vagaroso subir e descer do peito dele comprovando um tranqüilo repouso. Observando-o, Hermione teve a distinta sensação de que alguma coisa havia mudado entre eles de forma irrevogável, uma transferência de poder que não voltaria mais para as mãos dela. Se não fosse assim, por que Rony estava dormindo na cama, quase ressonando, enquanto ela sofria naquele desconforto? De alguma forma, quando ela não estava prestando atenção, o santo havia levado a melhor sobre ela. E agora? O que ela poderia fazer?
Hermione mexeu-se e bateu com a cabeça em alguma coisa de madeira. Sentando-se imediatamente, percebeu que estava com as pernas dobradas e um dos braços para fora de uma beirada dura. Mas onde estava, afinal? Num baú? Balançando a cabeça para clarear as idéias, imediatamente se arrependeu do movimento quando o pescoço protestou por causa da dor. Obrigada a ficar na posição desconfortável, agora estava com um torcicolo como nunca havia conhecido.
Soltando um gemido, Hermione tentou se levantar para sair daquela prisão, apenas para voltar à posição de antes por causa da dormência nas pernas. Depois de respirar fundo, pôs as duas mãos nas bordas do baú e esforçou-se para sair, apesar das dores que sentia pelo corpo todo. Um minuto depois desabou na cama, de bruços, a maciez do colchão parecendo caçoar dos sensíveis membros dela. Por algum tempo ficou ali, prostrada, como um peixe morto na praia. Pouco a pouco, porém, a raiva a dominou.
Devia ter cortado a garganta do cretino. Hermione imaginou Rony dormindo tranqüilamente enquanto ela se sentava na cama no meio da noite. Nem por um milagre o santo escaparia.
Depois de algum tempo encontrou forças para rolar o corpo e ficar deitada de costas. Apertou os olhos quando sentiu no rosto os raios de sol que entravam pela janela, uma indicação de que o dia já havia amanhecido há um bom tempo. Deus do céu! Ela nunca havia se levantado tão tarde! Provavelmente, em algum momento antes do amanhecer, havia sucumbido aos apelos do corpo cansado, ignorando a dureza do chão e o vento frio que entrava pela janela. Em vez de estar descansada, porém, agora sentia o corpo moído.
Embora soubesse estar precisando de um bom banho, Hermione apenas jogou os cabelos por cima dos ombros, recusando-se a escová-los e a trocar a amarrotada túnica. Agora mais do que nunca, estava decidida a deixar aquele lugar, o que não conseguiria se pensasse na aparência ou quisesse ser agradável. Olhando para as roupas de Rony empilhadas no chão, nem se preocupou em guardá-las no baú e marchou para a porta.
Enraivecida, desceu a escada ignorando os olhares curiosos dos moradores do castelo, embora o corpo dolorido protestasse a cada passo que ela dava. Hermione olhou em volta e ficou ainda mais enraivecida quando percebeu que havia perdido o café da manhã. Por acaso seria obrigada a ficar em jejum até a hora do almoço? Depois de abrir a boca para gritar uma praga, ela imediatamente a fechou quando ouviu um som de riso. Parou para prestar atenção, a contragosto fascinada pelo tom musical daquela voz, que era conhecida mas agora soava de uma forma diferente e encantadora.
Era a voz de Rony.
Ah, aquele riso foi como um tônico para os músculos doloridos de Hermione, deixando-a com o coração leve. A carranca desapareceu e ela se deu conta de que era a primeira vez que ouvia o marido rir de verdade. Momentaneamente esquecida do plano de fuga, viu a figura de Rony no salão, debruçado sobre a mesa, de costas para ela.
Adiantando-se ela foi chegando perto e percebeu que ele não estava sozinho. Mas claro. O homem não era um idiota para ficar rindo sozinho. No instante seguinte Hermione parou, vendo quem se divertia com ele. Sentada bem ao lado de Rony estava Gina, brindando-o com aquele sorriso de covinhas, enquanto o Lobo não estava à vista.
Hermione sentiu um estranho aperto no peio ao ver Gina tão à vontade com o marido dela, fazendo-o rir com sua fala mansa. Enquanto ela os observava, eles trocaram algumas palavras cochicando e Hermione viu Rony erguer a cabeça de cabelos escuros, as feições relaxadas como nunca. Então sentiu a garganta apertada, o que até tornava difícil a respiração. E pensar que havia se decidido até a enfrentar o lorde de Wessex para salvar a vida daquela mulher! Hermione arregalou os olhos quando o mistério que a esposa do Lobo representava se resolveu por si.
Gina era uma prostituta.
Hermione tinha conhecimento de tais mulheres, porque Edred falava delas com constância, sempre as censurando. Elas vendiam seus favores aos homens ou se entregavam ansiosamente à luxúria em troca de poder ou atenção. Muitas faziam essas coias simplesmente por serem devassas por natureza. Obviamente Gina havia seduzido o Lobo usando de algum estratagema desse tipo, porque os homens sempre se sentiam atraídos por aquelas que fingem sentir prazer com o que eles faziam. Mas por que ela agora flertava com Rony? Estaria pretendendo estabelecer a discórdia entre os irmãos ou apenas queria satisfazer seus corrompidos desejos?
Bem, isso não era da conta dela, pensou Hermione, sentindo um amargor na boca cuja origem não saberia explicar. O juramento que Rony tinha feito de ser fiel à esposa não significava nada e ela nunca o obrigaria a cumpri-lo. No entanto, enquanto procurava se convencer de que acreditava mesmo naquele pensamento, viu Gina pôr as mãos delicadas no braço de Rony.
Subitamente, Hermione querendo ou não, foi a filha de Voldemort quem reagiu.
- Sua vagabunda! - ela vociferou, avançando. - Tire essas mãos de cima do meu marido!
Gina recuou, muito assustada. Antes que Hermione pudesse alcançar a miúda mulher, porém, Rony ergueu seu corpo enorme e postou-se entre as duas. Com apenas um movimento rápido, agarrou-a e a pôs no ombro, como se ela fosse um saco de batatas. O ar fugiu dos pulmões de Hermione e ela não pôde falar, sentindo o corpo já dolorido se comprimir contra o duro ombro dele.
- Com licença, Gina. - pediu Rony, a voz melodiosa transformada pela raiva. - Preciso ter uma conversa com minha esposa. Em particular.
Hermione abriu e fechou os olhos, sentindo-se tonta por causa do aparente movimento dos ladrilhos do chão. A idéia de liquidar com Gina havia desaparecido por completo, sendo agora o marido quem ela queria matar. Reunindo todas as forças, tentou pegar um dos punhais, mas um deles estava na bota e o outro se encontrava por baixo da saia, locais de acesso proibido pelo musculoso braço de Rony. Quando ela se debateu, a mão esquerda dele plantou-se com firmeza nas nádegas dela, impedindo-a de sair dali. Hermione sentiu a garganta seca.
Rony não retardou o passo nem mesmo quando começou a subir a escada a caminho do quarto. Hermione sentiu o pânico subir pela espinha quando pensou na força daquele homem. Outra vez o santo que ela havia conhecido era substituído por um implacável guerreiro, por um Potter. E, finalmente, ela o deixava enfurecido.
Rony havia perdido a paciência.
N/A: Mais um capitulo postado. Espero que continuem gostando. Abraços.
Agradecimentos especiais:
Clara Eringer: Que bom que gostou, espero que curta mais esse. Abraços.
Luliee Malfoy: que bom que gostou da fic, espero que continue gostando. Abraços.
(-( Duda Pirini )-): É bom saber que está gostando. A Hermione é durona mesmo, o Rony vai ter que batalhar muito para amançar a fera. Quanto a divulgação, é claro que pode, é bom saber que os leitores gostam das história. Estou lendo sua fic “O Chefe e a Secretária”, ontem a noite li até o capitulo 12. Está muito boa a história, estou adorando, assim que eu terminar de ler eu comento na sua fic. Abraços.
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!