Caem as máscaras



CAPÍTULO 42 - Caem as máscaras


-Foi uma idéia perfeita a de Voldemort de prender a alma de um servo seu dentro de um amuleto, conservando-o dentro dos limites de Hogwarts – começou Harry, deliciado pelo impacto que cada sílaba que pronunciava causava em cada um dos presentes. – Um servo que, como todos nós pudemos presenciar, não era nada, nada bobo... Um servo astuto, inteligente, capaz de se passar por outra pessoa sem que os próprios amigos dessa pessoa desconfiassem...


                “Um plano muito astucioso. Um plano em que ele estaria na lista de vítimas, não apenas para que ficasse livre de desconfianças, mas porque habitava um corpo de alguém que devia estar nesta lista”.


                -Harry... Como assim? – perguntou Rony.


                -Vou chegar daqui a pouco ao ponto, Rony – e fez um sinal com a mão para que o amigo aguardasse. – A maldição de Michael é conhecida por bruxos que estudaram em Hogwarts há muito tempo, como os livros que li me mostraram. Voldemort prendeu a alma de Michael num amuleto, condenando quem o enconstrasse a ficar com a alma presa dentro do amuleto e ceder o corpo para Michael. Tudo devia ser feito numa noite de lua cheia, e tudo isso ocorreu na noite de Halloween.


                “Michael começou a matar naquela mesma noite. Primeira vítima: Pansy Parkinson. Deixou um cenário coberto de sangue, e deixou suas iniciais na parede. Um círculo rodeado de desenhos estranhos também deve ter sido deixado no corpo de Pansy, talvez pequeno demais... E desde o início nos perguntávamos por que Michael só matava com as próprias mãos, com facas, deixando lugares cheios de sangue... O pensamento lógico era de que ele tinha medo de uma verificação nas varinhas, que averiguasse qual o último feitiço lançado por cada uma delas. Mas esse argumento começou a perder o efeito com o tempo”.


                “Por que continuar evitando o uso de feitiços sendo que não houve qualquer verificação nas varinhas após as primeiras mortes?”.


                -Mas, Harry... – falou Gina. – Ele nunca matou usando a varinha, por isso não houve verificação na escola.


                -Usou sim. Fomos tolos em não perceber... Na morte de Dino Thomas, por exemplo, ele conjurou cordas para amarrá-lo. Em alguns casos, assinalava suas marcas com feitiços de varinha. Percebi com o tempo que ele não usava a varinha por algum outro motivo, mas só me toquei realmente quando vi o corpo de James Smith no matagal, a primeira vítima morta por um feitiço.


                “James foi assassinado por um Avada Kedavra. Por um momento tive a impressão de que Michael se desse ao atrevimento por estar dentro dos seus limites, e não em Hogwarts. Mas um detalhe no cadáver chamou minha atenção. Um dos dedos da mão de James estava furado, e gotejava sangue”.


                -Isso quer dizer que ele precisava do sangue de cada uma das vítimas? – perguntou rapidamente Hermione, antes que Úrsula lhe gritasse um CALE A BOCA.


                -Exatamente. Esse mausoléu confirmou minha teoria. Pois o que está dentro desse caixão de vidro, o que foi guardado nesse mausoléu secreto, é nada menos que o cadáver do verdadeiro Michael Evans.


                Rony espichou o pescoço para o caixão, temeroso, mas com a curiosidade a mil. Hermione quis olhar, mas Úrsula não permitiu. Padma e Draco aproximaram-se e olharam por alguns segundos, depois se afastaram do rosto putrefato.


                -É nojento – murmurou Padma, com uma careta de repugnância.


                -Por enquanto é, porque ele ainda não terminou o serviço – continuou Harry. – Está quase, se vocês olharem bem. Metade do rosto está quase completo, a outra está totalmente desfigurada. Mas se ele nos matar hoje, o corpo voltará ao aspecto normal e jovial que Michael Evans tinha em vida.


                -Então cada gota do sangue das vítimas vai recompondo o corpo dele? – indagou Rony.


                -Fazia parte da maldição. Um tópico desconhecido, mas fazia parte. A alma de Michael ficaria presa no amuleto, enquanto seu corpo iria jazer dentro de um mausoléu secreto, num jardim secreto, que ficava dentro de uma mata secreta. Ali ficaria apodrecendo. Quando retornasse no corpo de outra pessoa, deveria matar cada um do grupo dos Jovens Anti-Trevas, conseguir sangue de cada um deles, e ele teria de volta seu corpo original.


                -Como ele não tinha perto dele os integrantes do grupo, utilizou os herdeiros? – sugeriu Gina.


                -Isso mesmo. Afinal, o sangue que corre nas veias é o mesmo.


                -Por isso ele sempre precisava de sangue – falou Rony. – Quando matou Dino afogado, ele o cortou em diversos pontos. Podia ser sadismo em ver o lago vermelho, mas não: ele precisava do sangue!


                -Ele não conseguirá cumprir a maldição – surgeriu Mione, e dessa vez Úrsula não a repreendeu. – Mesmo se nos matar. Houve vítimas que ele não retirou o sangue, como Charles Sheppard e o Crabbe...


                -Algo me diz que esses dois eram exceções – falou Harry. – Vejam bem: ele precisava matar cada uma das pessoas que estavam naquela lista. Esses dois não sangraram, porém na noite dos heliopatas Michael estava trazendo um corpo nessa direção. E já devia ter pegado outros. Pode ser que ele precise de outra coisa desses dois.


-E os que não estão aqui? Ainda falta o Hagrid.


                -Provavelmente ele dará um jeito de atacar Hagrid.


-Mas, de qualquer forma, faltam outras pessoas.


-Lupin, mas ele vai dar um jeito, existem muitos servos lá fora no ataque em Hogsmeade. E Sirius... Bom, eu não sei como ele vai fazer para conseguir o sangue...


                “Mas eu sei”, pensou Hermione, sorrindo por dentro.


                Hermione olhou para Úrsula com os olhos mais inocentes do mundo. Mas era puro fingimento. Uma coragem que havia brotado subitamente, ela não sabia de onde. Ela deu um chute em Úrsula, que cambaleou e levantou a varinha. Mas não teve tempo de reagir.


                Mione foi mais rápida e estuporou a garota. Úrsula voou e caiu esparramada no chão, batendo a cabeça na parede e perdendo os sentidos.


                -Assim está melhor – falou Mione, guardando a varinha. – Harry, continue, desculpe pela interrupção.


-A identidade de Michael já está descoberta desde que uma pessoa me procurou. Claro que não pude acreditar de cara na pessoa, afinal, poderia ser um aviso falso. Porém, após prestar atenção em alguns fatos, e até considerando o mausoléu e uma frase vaga que o professor Salles me disse sobre como as coisas podem ser como a poção da ilusão, tenho a mais absoluta certeza.


                “O caso tinha tudo para se complicar, talvez alcançássemos a resposta somente no momento de nossas mortes. Michael foi demasiado astuto em tudo, nos mínimos detalhes. Conseguiu, inclusive, fazer-nos acreditar que já tinha passado desta pra uma melhor...”.


                -Harry... O que quer dizer? – indagou Gina.


                -Que o Michael atual não está entre os sobreviventes, e sim entre as vítimas.


 


* * *


 


                -O QUE? – foi a pergunta que saiu da boca de Hermione e Rony ao mesmo tempo, formando um coro de espanto de duas pessoas que ajudaram na investigação, e nunca imaginaram algo tão maluco.


                -Isso mesmo que vocês ouviram – falou Harry para eles. – Ele tentou nos enganar. Fingiu a própria morte para atrapalhar nossa investigação.


                -Mas nós sabemos que todas as vítimas realmente morreram – disse Rony. – Vimos até muitos corpos. Crabbe, Miss Reynolds, Cho Chang, essa então, temos certeza mesmo, tivemos que carregá-la por corredores em cima da carteira, o aspecto era horrível, assim como James na mata, com olhos esbugalhados, Parvati sem cabeça... Enfim, vários, até mais que esses... Não é possível que um deles tenha conseguido fingir a própria morte!


                Hermione olhava Harry como se pensasse a mesma coisa que Rony.


                -Foi tudo muito real não foi? Muito sangue, maldição da morte, cabeças decepadas, lago cheio de sangue, picada de cobra... Uma lista incrível! E... – ele fez um certo suspense, para depois dizer. – Realmente foi tudo real.


                -Peraí! – exclamou Rony. – Vai dizer que ele se matou e agora estamos lidando com um fantasma?


                -Não, seu bobo – disse Harry. – Michael não teve a alma presa num amuleto? E essa alma entrou no corpo de outra pessoa? O que o impediria de transferir essa alma para um novo corpo?


                -Então ele passou a alma dele para o corpo de outra pessoa, e matou a pessoa pela qual vinha utilizando o corpo?


                -Isso mesmo, Mione. Mas devia haver alguma regrinha para ele ter feito isso somente agora, para ter demorado tanto para transferir a alma para outra pessoa. Talvez isso se torne possível nas proximidades do território dele, o Jardim das Ilusões.


                Quando ele terminou a frase, Mione estava muito entusiasmada, como se houvesse descoberto a resposta que Harry iria dizer.


                -Se essa pessoa morreu nas proximidades, ou é James Smith, ou Kevin Wallace ou Christian Baker.


                -Sim – respondeu Harry. – Está entre esses. Quem libertou a alma de Michael Evans, quem começou com tudo isso, foi James Smith.


                Um grito encheu o mausoléu. Um grito de Padma Patil. Um grito estridente, que por sorte durou poucos segundos – se durasse um pouco mais, Harry não se surpreenderia se os seus tímpanos explodissem.


                O grito cessou e mergulhou a sala num silêncio estranho. Todos agora estavam a par de quem era Michael Evans – isso antes de ele passar a alma para outra pessoa, que devia estar entre eles.


                -Zacarias Smith me procurou – continuou Harry, sobrepondo-se aos gritos histéricos de Padma. – Me contou que seu primo andava fazendo pedidos estranhos ultimamente, como pedir para Draco encontrar-se com Gina, quando ele visse o garoto.


“Eu raciocinei um pouco após ele me procurar e realmente cheguei ao nome de James. Todas as pistas afastavam-se dele”.


“E, pra completar, após sair do incêndio na sala dos Jovens Anti-Trevas, eu vislumbrei um círculo quadriculado quebrado no chão. Rony viu um no arsenal de Michael e disse o nome: Círculo Hipnótico. É o que eu precisava pra imaginar como Michael se movimentava sem despertar atenção dos ‘amigos’. Ele precisou utilizar círculos hipnóticos após matar Laurie, que era a garantia de mobilidade pelo castelo até ele matá-la”.


                Padma se contorcia num choro baixo, passando a mão pelos cabelos desgrenhados. A outra mão apertava com força as dobras das vestes, arranhava o próprio rosto, numa sensação de desespero. Era uma batalha interna que estava sendo travada dentro dela. O sentimento de paixão pelo namorado e o sentimento de revolta por ele ter matado todos, inclusive sua irmã gêmea. Um conflito entre sentimentos opostos, um conflito sendo travado dentro do mesmo coração.


Harry aproximou-se dela lentamente. O rosto de Padma não se levantou para fitá-lo. A garota continuou mergulhada naquela angústia.


                -Coitada – murmurou Gina. – Era o namorado dela. Perdeu ele e ainda descobre que ele era um assassino.


                -Mas ela sabia disso – falou Harry calmamente, para não pressionar Padma, ou deixá-la nervosa. – Você sabia quem ele era, não sabia, Padma?


                A garota continuou calada, mas finalmente respondeu, com a voz fraca:


                -No começo não... Eu não fazia idéia. Mostrei a foto de minha mãe com Michael Evans por inocência... Não sabia que o retratado estava bem ali do meu lado.


                Ela levantou-se, meio cambaleante, e Harry amparou-a com a mão. Finalmente, Padma se ergueu, afastou uma mecha do cabelo desgrenhado que lhe cobria o olho e disse, num tom muito mais audível:


                -Apaixonei-me realmente por James – falou ela. – Os olhos azuis penetrantes, a atitude de chegar até mim e dizer o que sentia... O carinho que ele tinha por mim quando começamos a namorar...


                -Isso foi interessante – comentou Mione. – Afinal, Ludmylla Patil teve um relacionamento com Michael, e agora a filha se apaixona por ele, mas sem saber quem ele era...


                -Mas ele sabia quem ela era – disse Harry. – Por isso aproximou-se de Padma. Eu considerei muito isso quando Zacarias Smith me contou que achava que James era o assassino. Sendo Ludmylla o grande amor de Michael, talvez a única pessoa que ele tenha amado em vida, quem mais ele iria querer conquistar do que uma das gêmeas Patil?


                -Eu fiquei muito chateada quando ele me contou tudo isso – soluçou Padma. – Logo após ele trocar de corpo ele confessou o que tinha feito. Estou apaixonada, jurei que não contaria a ninguém. E aprenderia a amá-lo naquele novo corpo, naquele novo rosto, esquecendo o de James Smith. Ah, foi um choque descobrir que estava apaixonada por Michael Evans, mas... Não mando em meu coração...


                Ela deu três soluços altos e depois levantou os olhos novamente.


                -Falta uma pergunta interessante – disse ele, olhando com interesse para Padma. – Laurie Sawyer, agora morta, disse ter visto você saindo de sua sala comunal com uma faca na mão; a mesma foi encontrada em seus pertences suja de sangue. Naquela mesma noite, Dino Thomas foi assassinado. Você chegou a pagar pelo silêncio de Padma... Agora que sabemos que você não cometeu nenhum crime, nos responda o que você fazia com uma faca na mão naquela noite?


                Um flash-back passou pela mente de Padma. Suas sobrancelhas se franziram, enquanto sua mente evocava aquela noite.


                -O maior problema é que eu não me lembrava de ter saído naquela noite – respondeu, ainda olhando para cima, em direção ao teto azulado, mas todos sabiam que sua mente estava completamente desligada. – A única coisa que lembrava era de entrar no salão comunal escuro, por estar sem sono... Depois, mais nada... Acho que meio que dormi. Quando voltei a mim, já era dia.


                “Quando soube que estava sendo acusada, fiquei apavorada”, continuou ela, agora olhando para os ouvintes que a observavam com interesse. “Ninguém acreditaria em mim se dissesse que não tinha saído. Era a minha palavra contra a de Laurie, Jennifer, Christian... No entanto, tentei uma alternativa. Conversei com Laurie e ofereci galeões para que ela desmentisse o que vira no dia do interrogatório que Harry fez. Não adiantou muito no final... Mesmo assim continuei pagando. Mas Laurie estava tornando-se impossível... Pedia mais e mais galeões, sugando tudo o que podia de mim. Fui avisá-la de que não dava para pagar sempre, e ela acusou de ser difícil enganá-lo, Potter, por isso precisava de uma boa recompensa. Aí você ouviu tudo... Naquela noite me descontrolei... Achei que você me denunciaria, que eu seria presa... Presa por algo que nunca havia cometido...”.


                -Eu lamento ter desconfiado de você, Padma – desculpou-se Harry. – Mas, realmente, todas as evidências levavam ao seu nome. E creio que não foi por acaso...


                “James era do grupo de amigos de Laurie, então Michael, dentro do corpo dele, sabia dos chiliques da garota e sabia que alguém sairia atrás dela. Ou seja, não seria o único suspeito se alguém notasse seu desaparecimento”.


“Christian saiu e os outros foram dormir. James saiu do dormitório e encontrou na sala comunal algo que o ajudaria muito: você. Isso aumentaria o álibi dele, passando as desconfianças para você. Ele a surpreendeu com uma Maldição Imperius e a controlou. Só pode ter sido isso... Afinal você não lembra de nada. Colocou uma faca em sua mão e a mandou sair pelo castelo. Saiu logo em seguida, mas Laurie não viu nada de suspeito nele. Fingiu que saía para procurá-la também. Mas, pombas, quem iria se preocupar com ele sendo que Padma Patil saíra com uma faca? Provavelmente ele voltaria dizendo ter visto Padma com uma faca, e depois faria com que os amigos abrissem os pertences dela. Mas nem foi preciso. A sorte realmente esteve do lado dele naquela noite. Laurie viu tudo, e dali em diante não havia só o testemunho dele de que vira Padma, mas o de Laurie também. Ele deve ter mandado você caminhar até um determinado lugar, e aguardar ali”.


“Após assassinar Dino, ele foi ao seu encontro, passando a faca suja para as suas mãos e apanhando a limpa. Escondeu-a, ordenou que você fosse até o dormitório, guardar a faca na mala, dormir. Ele começou a caminhar, encontrando Jennifer e fingindo surpresa pelas marcas de sangue no saguão de entrada”.


“E depois Christian e Jennifer encontraram a faca suja de sangue. Todas as evidências caíram nos seus ombros. E você, Padma, colaborou ainda mais, pagando pelo silêncio de Laurie... E essa possibilidade nunca nos ocorreu, a possibilidade da Imperius, porque achávamos que ele não usava magia”.


O olhar de Padma vagueou novamente pelas paredes do mausoléu.


-Foi tudo culpa dele... Eu sei como fui tola! Ele matou minha irmã, meteu-me numa enrascada em torno da morte do Thomas e eu... Apaixonada por ele. Uma tola!


Padma parecia finalmente despertar da idiotice que cometera apoiando Michael, mesmo após descobrir que ele era seu namorado.


-Com quem Michael trocou de corpo? – adiantou-se Rony, olhando de Harry para Padma, fazendo a pergunta que Hermione tanto desejava fazer. – Ele saiu de James e foi para...?


Naquele instante, eles ouviram passos arrastados fazerem ruídos contra o chão de pedra. A porta camuflada havia sido deixada aberta. Harry arregalou os olhos na direção do portal e Hermione, Gina e Draco levaram as mãos imediatamente até as varinhas.


Dedos sujos de sangue apareceram pela abertura da porta, segurando com força as dobradiças. Depois, outra mão, igualmente suja de vermelho seco. Uma respiração ofegante chegava aos ouvidos deles, uma respiração forçada, como se um pulmão afetado gravemente tentasse trabalhar...


As pernas foram as partes que surgiram em seguida. Rasgos cobriam grande parte das jeans. Um corte profundo era bem visível, e havia dado uma tonalidade vermelho-escura ao jeans azulado. Depois o tronco apareceu, acompanhado em seguida de mechas de cabelo negro e liso. Finalmente, o rosto pálido, agora salpicado de vermelho, surgiu. Era Kevin Wallace.


-Kevin! – exclamou Malfoy, olhando incrédulo para o amigo. – Como...? Aquele monstro havia lhe pegado, como você conseguiu escapar com vida?


Kevin cambaleou e estatelou-se no chão do mausoléu, ainda com a respiração ofegante. Ele olhou com os olhos esgazeados para as pessoas ao redor, e finalmente, com um esforço sobrenatural, conseguiu falar – mas com uma voz bem diferente:


-Ele largou-me... Ia matar-me, mas, de repente... Largou-me... Recebia ordens de alguém... Parecia que estava ouvindo alguma coisa... Inaudível para mim... Saiu obedientemente... Prestes a dar o golpe final...


-Ordens? – perguntou Harry. – Muito curioso...


-Por que Harry? – indagou Rony, não entendendo o interesse do garoto.


Harry, porém, não respondeu, deixando que Kevin continuasse a contar tudo o que ocorrera com ele após ser atacado por um dos monstros do templo.


-Eu estava fraco... Mas consegui arrastar-me até aqui, torcendo para que o assassino não aparecesse... E aquela coisa também...


-Harry – cutucou Rony, tentando cochichar, mas não conseguindo, afinal o silêncio na sala era muito grande. – Ele está mentindo, não está? Ele é Michael Evans agora?


-Eu não sou Michael Evans – reorquiu Kevin, alteando a voz. – Não tenho nada a ver com nenhum crime... Eu não matei ninguém, Miss Reynolds, não, eu não tenho culpa, foi por acaso que estava ali, não sou ele, não tem Michael Evans algum dentro do meu corpo e...


-Calma Kevin – pediu Harry. O garoto calou-se. – Eu sei que você não é Michael Evans.


-Ah, então o descobriram? – e ele sorriu meio torto sobre a boca mais vermelha do que de costume devido ao sangue. – Finalmente...


-Mas... O que disse sobre Miss Reynolds? Foi por acaso que estava ali...?


-Sim – um suspiro prolongado escapou do rapaz. – Lamento não ter lhe contado nada antes, mas não queria que a coisa complicasse pro meu lado... Ai!


Kevin soltou o lamento de dor por uma tentativa infrutífera de levantar o corpo dolorido enquanto falava. Ele desistiu e esparramou-se novamente no chão.


- Miss Reynolds foi assassinada pouco antes do pôr do sol – falou ele, agora com a voz recuperada. – Eu subi até o corujal bem cedo naquele dia, despachar uma carta para meu pai... E vi uma pessoa com uma capa negra andando pelos jardins, puxando Miss Reynolds pelos cabelos.


“Fiquei horrorizado, paralisado... Saí em disparada do corujal e voltei para a sala comunal. Afinal, poderiam desconfiar de mim. Mas não devo esconder que senti uma certa satisfação... Sei que é errado, mas, aquela professora me detestava, e uma pontinha de satisfação percorreu minha mente. Encontraram o corpo um pouco mais tarde... Christian Baker se não me engano... Eu vi as duas macas sendo retiradas, e constatei que o corpo da professora havia sido encontrado”.


-Nossa – falou Harry. – Todo mundo revelando os segredos que esconderam para não se tornarem suspeitos! Mais alguém? – brincou ele.


Para sua surpresa, Gina adiantou-se, nervosa:


-Eu tenho sim... Lamento não ter lhe contado antes, Harry, aliás, nem me lembrei... Quero dizer, no começo omiti de propósito, mas depois daquele flagrante em Hogsmeade eu podia ter contado...


-Contado o que? – peguntou Harry.


-Que eu também saí na noite da morte do Dino Thomas. Saí escondida para encontrar com Draco. Ele combinou comigo, um encontro rápido nos corredores. Ele disse que eu tinha que esperar um pouquinho, mas na verdade ele tinha ido antes atrás de Kevin e Úrsula para mais uma armação... Acho que ele conseguiu afastar-se de Kevin e se encontrar comigo, pois chegou ofegante ao encontro. Bom, essa é a verdade. Eu saí do salão comunal naquela noite.


-Nossa... Revelações e revelações... Mais alguém?


Ninguém se manifestou. Harry, então, podia chegar ao ponto em que queria.


-Para aliviar a ansiedade geral, vou anunciar a minha conclusão. Michael saiu do corpo de James Smith. Largou-o lá, sem vida, tendo o cuidado de retirar uma gota de sangue. Tudo isso na sua frente, não é, Padma?


A garota, agora controlada, olhou para Harry, séria.


-Sim... Na minha frente...


-O que um coração apaixonado não é capaz de fazer? Até de mentir por amor. James realmente levou-os até a mata, dizendo que vira duas pessoas correndo – Draco e Kevin. Você saiu com ele e Christian. Mas, ao chegarem na mata, nada puxou James para o matagal. Você e Christian não correram para buscá-lo.


“Suponho que James tenha imobilizado Christian, enquanto você observou tudo. Ele passou a alma dele para Christian, e a alma de Christian foi para o corpo de James. Mas o pobre coitado não teve tempo de reagir. Foi fulminado com um Avada Kedavra. Rapidamente Michael prendeu James a uma árvore e furou o dedo dele, pegando o sangue. E depois nós chegamos e você, Padma, nos contou aquela história”.


-Sim... Foi isso que aconteceu... O sangue foi guardado num frasquinho...


-Então isso significa que Michael está no corpo de Christian Baker desde que o encontramos na mata? – perguntou Hermione.


-Sim – respondeu Harry. – Eu caí com ele na hora que o chão se abriu. Mas, por incrível que pareça, nada aconteceu conosco enquanto eu estava com ele. Lembrei-me do que as estátuas na entrada do templo alertaram, de que quem tivesse sentimentos contrários ao mestre e ao Michael correria perigo. E, enquanto estive com ele, estive muito seguro.


“Ele tentou fingir a morte novamente. Convocou uma de suas criaturas, por isso, aliás, que ela abandonou Kevin, deve ter recebido alguma ordem mental, e com o auxílio da magia ilusionária desse lugar, que pude conferir pessoalmente enquanto via meus pais, pois estava indo a direção do poço de espinhos, ele encheu-se de sangue e fingiu estar morto. Lembrei das palavras de Salles”.


“Mas não foi somente isso que me levou a esta conclusão. Quando conheci Christian, ele me tratava com ignorância, lançando comentários do tipo o famoso Potter, etc, etc... Mas tinha parado de fazer isso. Michael quis provar que era Christian e me tratou com ignorância. Logo notei que comentários grosseiros não faziam parte do comportamento de Christian. Confirmei assim que ele estava dentro de Christian Baker”.


Harry calou-se. Mione percebeu que o amigo havia terminado e adiantou-se, puxando um pergaminho do bolso. Ela o desdobrou lentamente. Depois mostrou para todos. Era a folha com a canção tema dos Jovens Anti-Trevas.


                -Finalmente vai nos dizer o que você achou nessa folha – suspirou Rony.


                -Sim. Foi uma surpresa para mim ao constatar que vocês não tinham percebido isso. Afinal, é tão óbvio. Muito óbvio. Vou ler novamente para vocês:


 


MARCHA


 


 A cada um que se alista


 Coloca em risco a própria vida


 Loucos, insanos, aventureiros?


  Bobos, malucos? Ou, como diria,


Karkylus, o velho bobão: Idiota é o bruxo que arrisca a sua bunda,


Pode ficar com uma dor profunda.


* * *              


O brado ecoa, e a marcha se inicia.


E o penúltimo da fila, pula o primeiro


Logo o de cima se adianta, seguido do primeiro, do seguinte e do “lanterninha”


Riam quando o último mole desmaia, risadas, risadas na marcha dos Jovens Anti-Trevas, pois


Um do centro fura o outro, salta um, segue dois embaixo, dois encima, um desmaia, que agonia!


Gritaria, algazarra, varinhas em punho.


Contra as trevas marchemos, e jamais perderemos.


 


                -Perceberam? – perguntou ela. – Perceberam como os Jovens Anti-Trevas queriam ajudar quem posteriormente fizesse parte da mira de Michael Evans?


                -Não – responderam Harry, Rony, Gina, Draco e Padma.


                -Essa última estrofe é, claramente, um enigma de lógica. Para ajudar-nos a desvendar uma das maiores bombas desse caso.


                -Um enigma de lógica... – murmurou Harry.


                -Sim. E dos mais fáceis. Acompanhem: a marcha se inicia... O penúltimo da fila pula o primeiro... Pela lógica eu fui no K, B, A, C, P. Mas isso não formou palavra alguma, e a marcha dizia que riam quando o ÚLTIMO mole desmaia... Ou seja, a última letra não conta. Então comecei de novo.


                “Penúltimo da fila... B. O de cima, L. Seguido do primeiro e do seguinte... A e C. E o ‘lanterninha’, que seria o K. O que formou? BLACK!”.


                -Black? – perguntou Harry, sentindo-se um idiota por não ter notado o que se escondia por trás daquela marcha, e surpreso pelo sobrenome que havia surgido. – Black? Mas... O que Sirius teria a ver com isso?


                -Tente você mesmo resolver a última estrofe – sugeriu Mione, dobrando a parte de suas anotações.


                Harry apanhou o pedaço de papel e começou. Um do centro fura o outro, R, salta um, G, dois embaixo...


                -Não existem dois embaixo do G – reclamou ele, e passou o papel para Mione. – Ah, desisto. É muito confuso.


                -É simples. Um do centro realmente é o R, salta um, mas salta para cima, justamente porque com o G não tem dois embaixo, então vem o E; dois embaixo, U e G, porque o último desmaia no final, assim eliminamos o C; dois encima sobram o L e O porque o E já foi. No fim temos REUGLO, isso se seguirmos erroneamente a lógica – eu particularmente matei na hora... Se chegar em REUGLO está errado. Isso não faz sentido. Se você seguir corretamente a lógica ou desembaralhar as letras podemos ter: um do centro, R, salta um para cima, vem o E, dois embaixo, G e depois o U e dois em cima, os que sobraram, L e O. R-E-G-U-L-O. Regulo ou com um acento, vira um nome próprio, Régulo.


                -Black – murmurou Harry pasmo. – Black, Régulo. RÉGULO BLACK! O irmão mais novo de Sirius, que foi assassinado pelos Comensais da Morte há dezesseis anos.


                -O irmão de Sirius? – indagou Hermione.


                -Exatamente. Sirius mostrou-me na casa do Largo Grimmauld sua árvore genealógica, e Régulo Black, seu irmão estava lá. Sirius contou que Régulo juntou-se aos Comensais, mas logo foi assassinado, talvez por ter fraquejado e tentado recuar. Mas Sirius disse que ninguém simplesmente entrega um pedido de demissão a Voldemort. Quando ele quis sair, foi morto, provavelmente por ordens explícitas de Voldemort.


                -Mas o que Régulo Black poderia ter a ver com Michael Evans e toda essa história? – perguntou Rony.


                -Eu disse que essa era a maior bomba desse caso porque eu analisei a situação da maldição de Michael, mesmo sem ter conhecimento sobre a vida de Régulo Black – falou Hermione. – Apesar de estar nas mãos de Úrsula, na minha mente ninguém consegue segurar. Eu analisei algo muito relevante: essa é ou não é a maldição de Michael?


                Harry ficou quieto, indeciso se aquela pergunta necessitava de resposta.


                -Sim – disse Hermione, evidentemente. – A maldição de Michael... Ou seja, Michael foi amaldiçoado. Condenado a ficar preso num amuleto. Não podemos encarar esse fato como uma vitória ou uma bênção para ele, como estávamos encarando. Foi um castigo.


                “Pelo que o Harry acabou de dizer, que o Régulo Black provavelmente tentou recuar, e foi assassinado por Voldemort, o que podemos concluir?”.


                Ninguém respondeu.


                -Régulo era muito leal a Voldemort, Harry? – perguntou ela.


                -Sim, pelo que o Sirius me contou. Tanto os pais dele quanto o irmão mais novo achavam que Voldemort estava certo em purificar a raça bruxa.


                -Bingo! – exclamou Mione, eufórica. O seqüestro que tinha acabado de passar parecia ter se dissipado de sua mente. – Régulo era mais novo do que Sirius?


                -Sim, mas...


                -Então! Régulo era um servo fiel, mas com medo tentou recuar, ou outra coisa que ainda não sabemos; Voldemort não permitiu, mas ao invés de matá-lo, resolveu prendê-lo em um amuleto por muitos anos talvez, até alguém libertá-lo. E mesmo liberto ele teria que matar um a um dos integrantes dos Jovens Anti-Trevas, utilizar o sangue e reconstituir seu corpo.


                -Mione, você está sugerindo que...?


                -Sim, Harry. Michael Evans é, na realidade, Régulo Black.


 


* * *


 


O baque da afirmação de Hermione demorou alguns segundos para ser digerido por Harry. Ali estava sua melhor amiga dizendo que quem estava cometendo todos aqueles crimes na escola não era Michael Evans e sim Régulo Black, o irmão de seu falecido padrinho. Alguém que era dado como morto há dezesseis anos. E, por mais incrível que pudesse parecer, ali estava Mione com argumentos fortíssimos, difíceis – ou impossíveis – de serem derrubados. Uma pista deixada por um integrante dos Jovens Anti-Trevas dentro de um esboço de música-tema; o fato de Régulo ter sido castigado com uma maldição, sendo obrigado a reconstituir seu corpo, guardado nesse mausoléu por muito tempo.


                Mesmo assim, Harry custou a acreditar. E, quando conseguiu aceitar, fez as perguntas que faltavam sobre a maior bomba desse caso:


                -Se ele é Régulo Black, por que assinar todos os crimes com as iniciais M.E.? Por que a lenda diz ser a maldição de Michael e não a de Régulo?


                -Michael Evans nunca existiu – falou Mione. – Nunca estudou sequer um Michael Evans em Hogwarts.


                -Por isso que quando fomos até a Sala de Arquivo procurar pelo nome dele dentro do Livro da História não o encontramos! – intrometeu-se Rony, dirigindo-se a Hermione. – Não havia nenhum Evans, Michael.


                -Mas o Livro da História estava aberto – completou Hermione, firmando sua afirmação – como se tivesse sido verificado há pouco tempo, e estava aberto bem na página com os sobrenomes de letra B; Black, Régulo provavelmente se encontrava naquela página. Suponho que um dos professores tenha dado uma passada lá antes de nós, para verificar.


                -Faz sentido – suspirou Harry, pasmo.


                -Claro que faz! – exclamou Mione. – Harry, naquele dia pensei que tivessem excluído o nome de Michael para abafar o caso, dizer que ele nunca existiu. Pensei, mas achei quase impossível que qualquer bruxo pudesse alterar o Livro da História. E, realmente, ele não foi alterado. Para que eles iriam alterar, se a identidade de Régulo Black já estava sendo preservada por um pseudônimo?


                -Espera um pouco – replicou Harry. – Aí começou a não fazer sentido. Se esse nome falso foi usado para abafar o caso, por que Régulo o utilizou para deixar suas marcas nos corpos das vítimas? Não seria mais fácil deixar as iniciais R.B.? E por que todas as pessoas do passado, que conviveram na época do crime, também o chamam de Michael Evans e dizem a maldição de Michael e não a de Régulo?


                Hermione considerou a questão.


                -E se... O próprio Régulo criou esse pseudônimo ainda em vida?


                -Mas por que ele faria uma coisa tão inútil? – perguntou Harry. – Por que achava o nome Régulo um tanto esquisito?


                -Não – retorquiu Mione. – Simplesmente para fazer como Tom Riddle fizera. Usar um nome falso, imitando o ídolo Voldemort. Criar um nome que, no futuro, todos temessem!


                Harry permaneceu quieto. Todos no mausoléu encontravam-se assim – Rony lançando olhares de repulsa em alguns momentos para o corpo que repousava no caixão.


                Rony lembou-se de um fato curioso e resolveu colaborar.


-Aquelas árvores que vimos cortadas naquele jardim subterrâneo – disse Rony para Padma. – Diziam R e L. Você disse que o L era de Ludmylla, e pensamos erroneamente que o R era de algum inimigo de Michael... Pombas! Ali estava Régulo e Ludmylla!


                “E em outra árvore”, continuou Rony, agora olhando para Harry, “tinha um corte que dizia ‘L é minha, matar o R’... o que será que isso queria dizer? Alguma outra pessoa era apaixonada por Ludmylla, e adentrou o território de Régulo dizendo que queria matá-lo? Pode ser... Mas, pelo menos, podemos ter certeza que o R era de RÉGULO”.


                -Agora tudo se encaixa, Harry – falou Mione. – Eles não precisaram criar um novo nome. Michael era um aluno quieto, reservado, como os livros mesmo dizem. Talvez poucas pessoas, apenas os de sua série, soubessem que se chamava Régulo Black. Alguém deveria conhecer o nome falso e avisou para a direção, que o tratou por este nome para deixar os Black em total privacidade. O próprio Sirius pode ter tomado essa providência com vergonha do irmão.


                Novo momento de silêncio. Harry quebrou-o com passos lentos em direção ao caixão, onde o corpo verdadeiro de Régulo Black repousava, metade carne-viva, metade carne humana. Harry o fitou quieto, procurando nele semelhanças com Sirius. De fato, os cabelos negros lembravam os do padrinho, assim como o nariz. Mas Harry sabia, desde que ouvira a história sobre Régulo na casa dos Black, que a alma dos dois era bem diferente.


                -Por que Sirius não me contou? – falou Harry em voz alta, embora aquilo fosse mais para si próprio. – Por que, ao falar de Régulo, ele não me contou sobre essa maldição?


                -A veracidade sobre a maldição nunca foi comprovada, Harry – disse Hermione. – Sirius devia considerar essa história uma baboseira. Acreditava apenas que seu irmão havia sido morto, talvez por Voldemort ou talvez não, apenas isso.


                -Então é a alma do irmão de meu padrinho que está por aí – falou Harry, elevando a voz.


-Sim.


-Então, finalmente, descobrimos tudo – suspirou Harry. – E ele está aqui dentro ouvindo tudo. Por isso que eu disse que o assassino estava aqui dentro. Como um monte de bosta de dragão se estiver errado em pensar que, na parede por trás do caixão, existe uma parede falsa.


Clap-Clap-Clap-Clap...


O som de palmas seguidas lentamente invadiu o lugar. Nenhum deles pôde descrever a sensação que aquele som, fortemente ampliado pelos ecos do mausoléu, produziram em cada um. Harry notou pela primeira vez o quanto o som de palmas podia ser assustador...


Eles procuraram a origem do som. Harry olhou diretamente para a parede. Para os outros, era difícil localizar a origem baseando-se no som, pois a ampliação acústica causada pelos ecos fazia parecer que as palmas vinham de todos os lados, como se várias pessoas aplaudissem, criando o espetáculo dos horrores, coroado pela apresentação de um cadáver em parcial decomposição dentro de um caixão.


Mas Harry nunca pensou que o espetáculo dos horrores ficaria pior.


Sim, agora para a apresentação, o cenário se transformou. Lentamente, as pedras preciosas azuis, a parede azul cintilante, foram se decompondo. O brilho ia desaparecendo, e as pedras azuis se transformavam em rochas cinzentas. Para enfeitar ainda mais o espetáculo horrendo, apareceram guirlandas sobre as rochas – mas não eram guirlandas, e sim folhas mortas. A claridade e a beleza do mausoléu foram embora.


O caixão continuava no mesmo lugar.


Mas as cortinas do espetáculo dos horrores só foram abertas quando a origem das palmas apareceu. A parede por trás do caixão subitamente revelou Christian Baker. Ou melhor, Michael Evans.


Agora, concluiu Harry, o cenário estava completo. E tudo indicava que ali seria encenado o ato final, que, possivelmente, acabaria com um final trágico. Ele torceu em silêncio pela vida de todos ali, e também para a sua. Não queria que o espetáculo acabasse com o fechar das cortinas dos seus olhos, mergulhando-o na escuridão da morte, ajudando, com o seu sangue, a trazer de volta o corpo de Michael Evans.


Não. Ele não permitiria. Por mais que estivesse com as costelas esfoladas, com a mão direita quebrada, sem condições de praticar sequer um feitiço de levitação, ele não permitiria.


E a voz de Christian ecoou pela sala. Não, não era a voz de Christian. Era a voz original de Michael Evans.


-Parabéns, Potter. Parabéns, Granger. Parabéns, Weasley.


Um calafrio percorreu o corpo dele. A voz de Michael era semelhante à de Sirius, só que mais jovem. E mais fria. Harry lembrou-se da primeira vez que ouvira aquela voz. Desafiando Snape no vestiário, evocando nele a semelhança de uma briga em que um filho adolescente desafiasse o pai.


-Vejo que descobriu tudo, Potter... Ou melhor, quase tudo – ele deu uma risadinha irônica. – Me surpreendeu desde o início. Querendo resolver o caso a qualquer custo.


“Ouvi muitas coisas sobre você quando saí do amuleto, mas ninguém mencionou que sua capacidade de dedução também era surpreendente. A sua e a de Hermione Granger, é claro, que descobriu meu nome horrível”.


-Seu nome verdadeiro – retorquiu Harry. – Black. Régulo Black.


-CALE A BOCA – vociferou ele. – Não diga esse nome horrível perto de mim. Esse sobrenome horrendo. Esse sobrenome que desprezo. Eu sou Evans, Michael Evans!


-Não dê as costas para o seu passado, Régulo – falou Harry. – Você é um Black, não tem como negar. Está no seu sangue.


-Uma cambada de fracos, os Black... Minha vergonha... Sirius, então, era o mais fraco, o mais tonto, o mais certinho, e veja só! Onde está ele? Passou anos trancafiado numa prisão...


-PARE DE OFENDER O SIRIUS! – berrou Harry, o nervosismo subindo.


-...sim, fiquei sabendo, anos em Azkaban... Se tivesse seguido o meu caminho, se tivesse seguido o Lorde, estaria vivo...


-PARE!


-...assim como eu... Sim, não estou no meu corpo, mas estou vivo. E onde está ele? Hein? Mortinho, sem vida alguma!


-QUER CALAR ESSA BOCA IMUNDA – vociferou Harry, revoltado.


Régulo realmente parou de falar e o fitou, calado. Seus olhos, rodeados por um brilho vermelho, sinistros, subiram para a cicatriz do garoto.


-Fiquei surpreso ao saber que Lord Voldemort havia sido derrotado um ano após eu ter sido amaldiçoado – falava Michael, sem tirar os olhos da cicatriz. – Derrotado por um reles bebê. Pensei que fosse uma piada da Úrsula, mas logo descobri pelos amigos roubados de James que...


-Úrsula? – perguntou Harry, indignado. – Não me diga que... Você teve o apoio dela?


-Sim, Harry Potter. Sua mente foi surpreendentemente ágil em descobrir minha identidade, assim como a de Hermione Granger em descobrir meu nome pagão, mas as duas mentes foram demasiado lentas ao não perceberem que eu jamais poderia agir sozinho.


-Por que?


-Eis a pergunta que coroa a sua lentidão – debochou Michael. – Se você leu tanto sobre a história da minha maldição, deve ter lido que a alma da pessoa que me libertasse iria direto para o amuleto. E eu tomaria o corpo daquela pessoa. Imediatamente. Será que você pensou durante tanto tempo que eu entraria num novo corpo e saberia me localizar pelo imenso castelo de Hogwarts? A Casa, o salão comunal, afinal eu fui de Lufa-Lufa e não de Corvinal como James, os melhores amigos dele, o jeito dele ser...?


-Então a Úrsula o ajudou quando você saiu do amuleto? – perguntou Harry.


-Não somente quando eu saí, mas antes também.


Harry lançou um olhar de fúria para o corpo desmaiado da jovem. Deitada ali, com os cabelos dourados esparramados pelo chão, parecia uma bruxa extremamente bondosa.


-Como antes? – ele indagou. – Úrsula não o libertou, e sim James.


-Mas ela guiou James. Não fazendo a vontade dele, é claro. Mas impondo a sua vontade com falsas promessas, conforme ela mesma me contou.


“Já que essa é a hora das revelações, acredito que vocês gostariam de ver certas imagens da noite do Dia das Bruxas em que fui liberto. Afinal, vocês não irão mais sair daqui”.


“Tudo começou por conta desse objeto”.


Ele apanhou alguma coisa de dentro das vestes. Era o bastão. O bastão prateado que Harry, Rony e Hermione viram na noite da morte de Charles Sheppard. O bastão com o crânio na ponta.


                Harry lembrou-se da forma fanstasmagória que saíra de dentro dele.


                -O bastão do fantasma – murmurou.


                -Ah, aquela noite... Tudo porque sua amiga tocou nele. Tudo porque uma pessoa de coração limpo tocou no bastão... Aí, ela não agüenta... E quer ajudar...


                -Ela quem? – perguntou Harry em voz alta. – Quem está dentro desse bastão?


-A mãe de Úrsula.


Harry lembrou que o fantasma do bastão havia parado antes de concluir Minha... FILHA.


-Foi assim que Voldemort a convenceu a participar dos planos... Ele precisava que alguém de Hogwarts encontrasse o amuleto, quando se lembrou de mim... E achou os Hubbard com sua filha adorável, que não quis colaborar. Mas o que Voldemort quer ele consegue. Então prendeu a alma da mãe de Úrsula aqui dentro, e prometeu libertar somente quando eu conseguisse matar todos. Úrsula foi obrigada a ajudar, mas não quis ser tomada pela minha alma, então persuadiu James, uma pessoa que estava na minha lista de vítimas... Mas vamos acompanhar a história de perto! Antes, lamento, mas...


Com um estalo de dedos, as varinhas de cada um deles pousaram próximas aos pés de Michael, saindo dos bolsos das vestes.


-Esse é o Jardim das Ilusões – falou ele, com uma pontada de orgulho na voz. – O que eu quiser aparecerá.


Michael tocou a varinha na têmpora de Úrsula. Depois, ele a apontou para a parede ao fundo do mausoléu. A parede negra tornou-se liquída num estalo, e imagens começaram a surgir.


Eles estavam vendo o que os olhos de Úrsula enxergaram durante a noite do Dia das Bruxas. Era bem tarde, pela aparência deserta do castelo. Ela estava num canto escuro do saguão de entrada. Passos subitamente ecoaram na escadaria de mármore. Era James Smith.


                -E então? – soou a voz de Úrsula ao ficar frente a frente com o garoto. – Preparado?


                -Acho que sim – respondeu James, tentando demonstrar segurança, mas falhando no sim, que saiu um pouco trêmulo.


                Úrsula puxou a varinha do bolso e a apontou para o garoto.


                -Eu preciso que você pegue aquela porcaria de amuleto para mim.


                -Eu sei, Úrsula, mas... E se acontecer alguma coisa comigo?


-Todos já estão dormindo, ninguém vai lhe ver...  O amuleto que você pegará para mim dá poder absoluto. Tem uma magia antiga guardada dentro dele...


-Meu amigo Christian disse que existe um amuleto aqui na escola... Um que guarda a maldição de Michael e é muito perigoso... E que a pessoa que se encosta ao amuleto é...


                -Não seja infantil! – resmungou ela. – Eu quero o amuleto, e não é esse amuleto da babaquice do Michael Evans! Isso tudo é uma baboseira.


                -Eu também acho, mas... Sei que não é o amuleto da maldição, mas...  Se é algo tão bobo, por que você não se arrisca então?


                -Pensei que estava fazendo um trato com o garoto mais corajoso dessa escola! – ironizou Úrsula. – Sempre ouvi dizer que você adora enfrentar o perigo, o desconhecido.


                -E gosto mesmo – James a olhou decidido, fazendo uma pose de corajoso.


                -Então, o que está esperando? – perguntou Úrsula. – Traga a porcaria do amuleto para mim. Eu garanto que nada de mal lhe acontecerá. O amuleto traz é sorte... E podemos até vendê-lo. Podemos porque, afinal, após esse favorzinho, dividirei tudo com você.


                “Prometo muito dinheiro para você, James, e até um emprego na loja do meu pai para pessoas da sua família”.


                -Eu vou indo então – suspirou James, vacilando na encenação de corajoso, mas sentindo uma pontada de esperança no peito pela recompensa que ganharia. – é um amuleto normal mesmo, não é? E eu também vou me dar bem... Espero que ninguém me veja perambulando por aí. E espero que nada de mal me aconteça.


                -Vá. E não se esqueça: para o poder acumulado no amuleto se libertar, a lua cheia precisa estar brilhando com força total. E espere alguns segundos após pegá-lo. Todos os seus desejos poderão ser realizados... Nada lhe acontecerá, e prometo a você que a recompensa será generosa – Úrsula sorriu.


                James sumiu na escuridão, e o campo de visão de Úrsula mirou o vazio.


                Michael apontou a varinha para a tela na parede e a imagem se desbotou no mesmo instante, desaparecendo por completo poucos segundos depois.


-E onde estava escondido o amuleto? – perguntou Hermione.


-Próximo ao salão comunal da Corvinal – respondeu Michael. – Dentro da placa de prata da estátua de Salazar Slytherin. Ela abre. Lá dentro estava o amuleto.


-E quem o colocou ali? – perguntou Harry. – No seu tempo... Quem de Hogwarts levou o amuleto até lá?


-Talvez vocês queiram acompanhar a história de perto, não é? – falou Michael, e um sorriso crispou os lábios finos do corpo de Christian. – Assim como acompanharam a maldição finalmente se cumprindo, creio que vocês gostariam de acompanhar de perto o começo de tudo.


Todos permaneceram em silêncio, e Michael pareceu entender como uma afirmação, pois levou a própria varinha à tempora e apontou-a para a parede líquida.


-Tudo tem início na casa da família Black.


O raio de luz que voou para a parede líquida espalhou-se pela mesma e sumiu em curtas ondas de luz. Imagens se formaram. Harry via


 a casa do Largo Grimmauld, mas estava diferente; estava transbordando vida e alegria.


Estavam vendo através da visão de Régulo. Um outro garoto, mais velho – podia-se perceber devido à altura do garoto em comparação a de Régulo – apareceu no campo de visão:


Ele devia ter uns treze anos.


-Esse é o seu primeiro ano em Hogwarts, pirralho – zombou o adolescente Sirius. – Veja se aprende a se comportar...


-Olha quem fala – respondeu a voz de Régulo, nitidamente infantil. – Mamãe está quase louca de tanto receber reclamações...


A expressão no rosto do jovem Sirius contorceu-se, tornando-se mais séria:


-Um pé fora da linha e você está lascado, Régulo – e Sirius apontava um dedo ameaçador no ar. – Você pode enganar muita gente com essas suas atitudes boazinhas, mas não a mim.


Sirius afastou-se. Levava um malão consigo. Harry supôs que estavam prestes a embarcar para Hogwarts, Sirius no terceiro ano e Régulo, obviamente, no primeiro.


A imagem apagou-se, com novas ondas percorrendo a tela líquida, dessa vez em cores, desbotando as imagens da lembrança. Michael fez comentários, falando lentamente:


-Sirius... Sirius... Meu pobre irmão. O único que conseguiu notar minhas verdadeiras intenções...


-Não posso acreditar que uma criança de onze anos já tinha planos maldosos... – disse Mione, perplexa e ousada.


-A maldade com capa de inocência é um triunfo muito grande – comentou Régulo. – Mas até ali não passava de ambição, de desejo de seguir o Lorde das Trevas, o meu ídolo, como toda criança tem... Meus pais falavam muito bem dele. Da extinção dos sangues-ruins, um dos princípios do Lorde das Trevas. Eu percebi que eles estavam certos. Sirius já tinha opinião contrária, aquele tolo...  E, vendo minha admiração pelo Lorde, deu-me aquele aviso. Paspalho... Bom, mas, voltando, eu cheguei em Hogwarts...


Ele apontou a varinha novamente. Novas imagens. Dessa vez, numa cabine do Expresso de Hogwarts. Dentro do campo de visão, eles viam que quatro crianças conversavam em frente a Régulo, animadas.


-Quieto... Reservado... – murmurou ele, vendo a lembrança. – Esse era o meu jeito. Não queria relacionar-me com outras crianças. Crianças que ainda viviam a infância, que não gostavam de Voldemort...


Novamente, a varinha foi apontada. Enquanto as cores de uma lembrança se desbotavam, novas iam formando outra.


-Eu estava sempre na minha! – exclamou ele, passando a mão pelos cabelos, nervosamente. – Que droga! Pretendia continuar estudando, transformar-me num grande bruxo para me aliar a Voldemort... Mas meus planos foram interrompidos num terrível passeio em Hogsmeade, quando eu estava no quinto ano e Sirius no sétimo...


Absortos em ver as reações de Michael, eles esqueceram-se das imagens. Mas logo viraram quando ele se calou, e viram


 o conhecido vilarejo de Hogsmeade há anos atrás.


Um jovem olhava para a tela, com um sorriso irônico nos lábios. Devia ter a mesma idade de Michael naquela época.


-Por que essa idéia de não ser mais chamado por Régulo? – perguntou o garoto.


-Ah... – a voz dele pareceu hesitar. – Não gosto muito do nome...


-Pois fique sabendo que mudar de nome assim não é um bom sinal – disse o garoto, olhando enviesado para ele. – Michael Evans... – ele deu uma risadinha. – Pra mim é normal, mas... Você-Sabe-Quem também trocou de nome... Parece que aquele nome que ele costuma utilizar não é o verdadeiro...


-Ah, agora isso é um crime?


-Não, mas... As pessoas podem estranhar. Há assassinatos ocorrendo...


                -Besteira – replicou Michael. – Voldemort não está matando ninguém. Ele só quer purificar os bruxos.


                -E como você acha que ele se livra dos outros? – perguntou o garoto. – Como ele faz para se livar dos mestiços?


                -Não sei... Como poderia saber? – um tom irônico pontuou a voz dele. – Acontece que... Uau!


                Uma garota passou por trás, andando pela rua do povoado, os cabelos esvoaçando com o movimento do vento. Todos constataram de cara que aquela era Ludmylla Patil. Os traços dela eram muito semelhantes com os das gêmeas.


                -O que tem? Ludmylla? – perguntou o outro garoto, olhando para trás.


                -Não... Nada não... – disfarçou Michael. Realmente, ele não mentira ao dizer que era uma pessoa reservada.


                As cores se desbotaram na tela líquida.


                -Ele não acreditou que eu não estava fascinado por Ludmylla... Eu estava mesmo, e, naquela semana fui atrás dela. Começamos a namorar. Um namoro secreto, sigiloso, que só eu e ela sabíamos. Eu tinha vergonha de que se espalhasse pelos corredores da escola. Mas, claro, garotas abrem a boca, não conseguem ficar quietas, não conseguem esconder nada das melhores amigas. Eu fui um tolo ao pensar que Ludmylla esconderia de todos. Ela foi e contou para uma amiga, Marta Cooper.


                “Esse foi o grande erro. O garotinho da imagem estava desconfiado. Ele também gostava de Ludmylla. Estranhava os sumiços da garota. E foi perguntar para Marta Cooper o que estava acontecendo... Claro que ela não segurou aquela língua enorme e contou para ele que eu e Ludmylla estávamos namorando”.


                “Ele ficou uma fera. Um dia haveria um passeio em Hogsmeade, e eu e Ludmylla entramos na mata da estrada, nos embrenhando. Ah, aquele foi um dia muito bom. Estávamos felizes. E ela só me chamava de Michael Evans, do jeito que eu queria. Encontramos um buraco no fim da mata e, curiosos, entramos por ele e demos com esse jardim”.


                “Pronto. Tínhamos encontrado o lugar de nossos sonhos. Um riacho, muito verde, um templo. Claro que não oferecia perigo algum naquela época... Tiramos algumas fotos, uma das quais Padma mostrou-me, deixando-me emocionado. No templo, vasculhamos tudo e encontramos o jardim subterrâneo. Gravamos as nossas iniciais na árvore. O que não sabíamos e que estávamos sendo seguidos por aquele garotinho”.


                “Ele se escondeu, enquanto nós saímos do jardim. Depois entrou no templo sozinho, foi até o jardim subterrâneo, e ameaçou-me, escrevendo na outra árvore que Ludmylla era dele, e ele iria matar o R, ou seja, eu”.


                “Quando eu e Ludmylla voltamos ao jardim, levamos um susto. Eu fingi que não sabia quem tinha feito tal coisa, mas eu sabia muito bem quem era. Só podia ter sido ele. Senti uma fúria avassaladora, mas controlei-me ao máximo na frente de Ludmylla”.


                “Eu resolvi aguardar para dar uma surra no infeliz. Enquanto isso, Ludmylla entrou para o grupo secreto que o meu irmão tinha criado com os amigos, os Jovens Anti-Trevas. Ela quem me contou sobre eles, senão eu nem saberia... Sirius não me queria no grupo, tampouco seus amigos”.


                “Aí veio o outro passeio a Hogsmeade. Estava preparado para acabar com ele, mas só nos socos, é claro, não iria fazer mal algum... Pedi para que Ludmylla passeasse com Marta, que eu iria logo depois. Aguardei num beco do povoado, esperei ele passar e o encostei na parede com fúria”.


                “Ele encarou-me por uns momentos, mas o meu ataque foi inesperado. Apontei a varinha para ele e o obriguei a caminhar comigo até um lugar um pouco afastado do povoado, onde havia um precipício. Iria pregar um susto nele que ele nunca esqueceria”.


                Ele apontou a varinha e a tela líquida, que permanecia escura sem imagens, subitamente clareou novamente, revelando um céu azul e os cabelos trêmulos do rapaz que estava em frente ao campo de visão, com uma varinha apontada na cabeça.


                “Chegamos ao precipício, e o levei até a ponta. Os pés dele chutaram umas pedrinhas, que sumiram na escuridão da fenda do precipício... E eu dei risada...”.


                Na tela, a voz de Michael soou, provocativa.


                -Está vendo onde você vai parar? Vai ser igual a essas pedrinhas... Sumir na escuridão... (Não, Michael, por favor, não) Ir para a morte... Mas fique tranqüilo... Dizem que os precipícios são infinitos. Quem sabe você não fique caindo por toda a eternidade...


                -Não faça isso, Michael, por favor – pedia o outro.


                -Michael? Agora me chama de Michael, não é? O que o medo não faz...


-Até que eu ouvi passos subindo a encosta – narrou Michael, enquanto o campo de visão do seu eu passado olhava para trás. – Nisso, ele aproveitou e tentou puxar a minha varinha. Eu não deixei, tentei tomar... – eles viam a batalha na borda do precipício pela tela – e... Quando consegui, o corpo dele foi para trás e desabou...


                Eles viram o olhar de pânico do garoto, e a queda brusca para a morte. Passos soaram e Michael virou-se para trás. Na encosta, pouco depois da queda do garoto, apareceram Sirius, Tiago, Lupin e Pettigrew.


                -O que faz por aqui, Régulo? – perguntou Sirius, encarando-o com frieza.


                -Nada, só... passeando – respondeu ele, com a voz fraca. – E não é Régulo, e sim Michael.


                Sirius ignorou o comentário do irmão. Aproximou-se mais dele, desconfiado, olhando-o de cima a baixo.


                -Por que está tremendo tanto? – perguntou, com uma sobrancelha erguida. Tiago, Lupin e Pedro também se aproximaram, fechando o círculo ao redor do garoto.


                A tela realmente tremia muito. O corpo de Michael devia estar tremendo compulsivamente.


                -Estou com um pouco de frio – mentiu ele, mas com uma voz que chegava a passar veracidade. – Só isso... Ou será que eu não posso sentir frio?


                Tiago afastou-se dos amigos e espiou para baixo, olhando a fenda que formava o precipício. A visão de Michael virou-se lentamente para o rapaz. Provavelmente temia que Tiago visse alguma coisa, ou ouvisse algum grito vindo das profundezas. Afinal, Michael não sabia se o precipício era realmente fundo.


                Sirius nem ligou para o que Tiago estava fazendo. Apenas levantou o indicador bem em frente ao rosto do irmão, e tocou-o na ponta do nariz, ameaçando.


                -Estamos de olho em você – disse Sirius. Fez um sinal para os amigos e o quarteto saiu, desconfiado.


                As cores se desbotaram e novas imagens se formaram, obedecendo a ordem dada pela varinha de Michael.


                -Eu fiquei muito preocupado – falou Michael, enquanto as imagens se formavam. – Aquela coisa de Jovens Anti-Trevas que eles tinham criado... Fiquei morrendo de medo. Não era minha intenção matar o garoto. Eu tinha apenas quinze anos, só queria assustá-lo... E foi mais um acidente do que qualquer coisa...


                “Bom, voltei para Hogwarts, pasmo pelo que tinha acontecido. No outro dia, já notaram o sumiço dele. O garoto foi dado como desaparecido. Acontece que Sirius sabia que eu era amigo dele, e começou a desconfiar de mim”.


                “Ludmylla serviu-me como uma espiã dentro dos Jovens Anti-Trevas. Eu disse a ela que meu irmão queria que os outros achassem que eu era ruim, e que se ele citasse meu nome numa das reuniões era para ela me contar. Bom, ela contou”.


                Na tela, Ludmylla falava:


                -Sirius nos contou que viu você num local muito suspeito em Hogsmeade. Na beira de um precipício. E eles acham que você teve alguma coisa a ver com o sumiço do Tommy.


                -E eles realmente estavam desconfiando de mim – explicou Michael, apagando a imagem. – Naquela noite, Sirius e os amigos olhavam desconfiados para mim. E não eram somente eles não. Severo Snape também. Queria culpar-me, achando que dessa forma atingiria meu irmão... Tolinho, mal sabia que Sirius nem gostava de mim.


                “Vi que não tinha mais jeito. Iriam contar a Dumbledore. Teria que sumir, evaporar... Fugir de alguma maneira. E para longe de Hogwarts. Lembrei-me do jardim, e que ninguém mais o conhecia. Então, durante a noite, sem pegar nada, somente com a roupa do corpo, fugi da escola”.


                “O que eu não esperava era o que eu encontraria perto da mata que dava acesso ao jardim”.


                Harry engoliu em seco. Não sabia como, mas a resposta veio-lhe a mente antes que as novas ondas de cor se juntassem para mostrar uma nova cena, antes que Michael pudesse dizer...


                -Os Comensais da Morte. Encapuzados, mascarados, rostos em incógnita, debaixo das capas. Quase fui fulminado ao aparecer, mas manifestei meu desejo de se juntar ao Lorde das Trevas.


                Na tela eles viam Michael conversando com os Comensais, e eles dizendo que o levariam para Voldemort. Precisaria ser avaliado antes, testado.


                -Fiquei com um pouco de medo, mas aceitei. Eu almejava tornar-me poderoso, e, de qualquer forma, seria uma espécie de fuga. Passei pela avaliação de Voldemort. Ganhei a Marca no braço – ele olhou para o próprio corpo que repousava no caixão, e levantou a manga do braço que já estava completo. Lá estava o desenho do crânio. – Era o começo da era Voldemort. Ninguém sabia muito bem quais eram as verdadeiras intenções dele. Nem eu. Eu não sabia que iam tão longe...


                “Mortes... Torturas... Aos poucos, Voldemort mostrava quem era. Eu escrevi para meus pais contando que havia me alistado. Eles devem ter ficado orgulhosos... Mas... Não sabiam ainda até onde Voldemort iria em seus planos. Tudo era meio na surdina. Mas foi se revelando... E rapidamente, a ameaça ao mundo bruxo tornou-se maior. O número de Comensais aumentava... Até no Ministério tinha alguns infiltrados... E as mortes começaram... E eu tinha que participar, afinal, era um Comensal. Tentava ficar apenas na tortura, mas os outros matavam sem dó nem piedade. Claro que uma hora eles perceberam que eu não gostava de matar como eles. Quatro anos após eu ter me infiltrado, quando tinha 19 anos, quando o império do Lord estava no auge, ele ficou sabendo...”.


                Uma nota de desespero foi percebida em sua voz. Ele tocou a varinha na cabeça e apontou-a para a tela líquida. Voldemort surgira na tela, olhando para ele. Harry surpreendeu-se ao ver ao fundo o Jardim das Ilusões.


                -Michael, você está me decepcionando... Não está sendo um servo fiel. Não está seguindo meus princípios.


                -Milorde, por favor, tenha piedade – pedia a voz em desespero.


                -Tem receio de usar a Maldição da Morte... Não, não pode ter medo... Os Comensais da Morte devem matar aqueles que são contra o seu mestre...


                -Milorde, não me mate...


                -Matar? É, é o que eu devia fazer. Matá-lo... Mas fico feliz por ter mostrado-me este lugar tão interessante. Ajudou-nos muito. Tem uma proteção fantástica... Principalmente agora com esse tipo de magia que conseguimos implantar nesse lugar. Essas ilusões tão reais – ele deu uma risada fria. – Bruxos antigos devem ter criado esse templo e tudo o mais. O nosso empurrãozinho o tornou melhor. É, realmente são ótimos esse jardim e o templo... Temos até armas de trouxas dentro do templo... Facas, machados, venenos... Um verdadeiro arsenal maligno.


                -Milorde irá matar-me com uma daquelas coisas?


                -Não, Michael... Não será tão drástico assim. Seu castigo será difícil de suportar, mas não será a morte... Um novo amigo meu em Hogwarts contou-me porque você saiu de lá há quatro anos. Por causa de um tal grupinho chamado Jovens Anti-Trevas.


                A tela tremeu com o estremecimento que percorreu Michael naquele instante. As fendas vermelhas dos olhos de Voldemort o encaravam com firmeza.


                -Exilado por causa de um reles grupo de jovens – zombou Voldemort. – Que coisa estranha. E que surpresa, suspeito de assassinato.


                -Viu como sou capaz de matar, milorde?


                -Não... Você não é capaz. Suponho que tenha sido um acidente, Michael Evans.


                -Não... Não faça nenhum mal a mim, milorde, por favor, eu lhe imploro. Eu faço qualquer coisa...


                -Faz mesmo? – perguntou Voldemort, a voz subindo um grau acima em matéria de frieza. Ele levou a mão para dentro da capa e puxou um pedaço de papel. Examinou-o com atenção. – Tenho uma pequena lista aqui, com os nomes dos integrantes do grupo dos Jovens Anti-Trevas. Você os odeia, Michael?


                -Sim... Odeio...


                -E tenho até a lista de inimigos desse grupinho patético. Que surpresa! Estou aqui... E outros nomes também... Crabbe... Será que a minha doutrina já entrou em Hogwarts? Lúcio também, espere só eu mostrar a ele... E, para minha surpresa, dois filhos de servos meus, Wallace e Sheppard...


                A mão de Voldemort entrou novamente num dos bolsos da longa capa, e puxou um amuleto de bronze de dentro. Era amarrado por uma correntinha prateada. Trazia um crânio com uma serpente saindo pela boca. A Marca Negra.


                -O seu castigo será diferente, Michael – disse ele, com prazer. – Eu lhe amaldiçoarei.


                -Não, milorde, não...


                -Você não disse que faria qualquer coisa por mim?


                -Sim, é verdade... Mas não seja ruim, milorde...


                -É noite de lua cheia – e Voldemort olhou para o céu. – Perfeito! Seu castigo, Michael, será ficar trancafiado dentro desse amuleto, até alguém encontrá-lo.


                “Se alguém encontrá-lo, a alma que ficará no amuleto será a da pessoa, e você tomará o corpo dela”.


                -E o meu corpo, milorde?


                -Seu corpo será largado em Hogwarts. Você está sendo procurado há quatro anos, segundo me informaram. Acham que você está desaparecido, como o outro aluno. Irão achá-lo sem sangue, pálido, sem alma. Pregarei um susto neles... Mas fique tranqüilo. Meu servo em Hogwarts vai pegar seu corpo e trazê-lo para esse jardim. Será conservado dentro do templo.


                -Ah, milorde, fico grato...


                -Mas não se anime muito – e a gargalhada fria, gélida, soou. – O amuleto ficará escondido. Até alguém encontrar. E, mesmo que você saia do amuleto, não vai conseguir seu corpo de volta.


                “Essa é uma antiga maldição... E vou usá-la em você. Para conseguir seu corpo novamente, você precisará do sangue de cada um dos integrantes desse grupinho patético, assim como parte dos inimigos... Menos eu, é claro”.


                -Cada um dos Jovens Anti-Trevas?


                -Exatamente. Você deverá jogar o sangue de cada um no seu corpo dentro do caixão, e a decomposição do corpo irá parando lentamente. Ele começará a se reconstituir. Pouco a pouco. Na última gota de sangue do último integrante, seu corpo estará perfeito, revitalizado, e aí sim você poderá retornar para ele.


                -Mas... E se demorar muito para encontrarem o amuleto? E se algum integrante do grupo morrer?


                -Você deverá ir atrás de algum parente... O sangue é o mesmo. Isso se eles tiverem algum parente vivo, do jeito que o meu império está caminhando... É perigoso não sobrar nenhum! – ele riu novamente. A tela tremeu. – Existem aliados meus nessa lista, assim como os filhos de alguns. Deles, você precisará de um pedaço do corpo de cada. Bom, esses, mesmo mortos, não farão muita diferença... Agora... Se não encontrar ninguém com o sangue, adeus esperança de ter seu corpo de volta.


                -Isso é um castigo muito duro, milorde...


                -Eu sei. E é para ser duro. Você contará com a sorte. Agora, vamos acabar logo com isso... Vai ser divertido, você vai ver. E, quando sair, espero que aprenda a matar. Você será obrigado a matar... É... Você ainda poderá ser muito útil, Michael.


                Voldemort ergueu o amuleto. O olhar de Michael acompanhou. O bronze iluminou-se com a luz do luar. Então, ele começou a dizer várias palavras estranhas, um ritual macabro, palavras que eles não compreendiam, mas que causavam arrepios a cada sílaba.


                Eles entenderam somente as palavras finais, os nomes do final:


                -... Tiago Potter, Sirius Black, Remo Lupin, Pedro Pettigrew, Ludmylla Patil, Coddy Sawyer, Jane Reynolds, Frank Baker, Merita Chang, Calvin Yumi, Severo Snape, Vinny Smith, Kleiton Parkinson, Rúbeo Hagrid, Jane Reynolds, – outra profusão de palavras esquisitas (separando o sangue do inimigo dos partidários de Voldemort, cujo sangue não precisaria ser extraído, explicou Michael) – Lúcio Malfoy, Brad Wallace, Dennis Sheppard, Crabbe,... – mais palavras estranhas... e ele terminou com dois nomes que Michael não esperava, pois a tela tremeu violentamente... – Patrick Thomas e Régulo Black.


                Ele tocou a varinha no amuleto. Os olhos do crânio tornaram-se vermelhos. Depois, apontou-a para Michael. Ele soltou um grito forte. Depois, a imagem na tela tornou-se escura. Michael entrara no amuleto.


                -E foi assim – suspirou Michael, olhando a escuridão da tela. – Por dezesseis anos. Escuridão... Depois disso, Rabicho me explicou, Dennis Sheppard, o papai de Charles, que apesar de estudar no sétimo ano em Hogwarts já era um servo, pegou o amuleto pela corrente, pois não podia encostar-se a ele, e o levou até a estátua de Salazar Slytherin, quebrando a corrente, para que a pessoa que apanhasse encostasse diretamente no amuleto. Fez tudo conforme as ordens de Voldemort.


                “Meu corpo foi largado nos jardins. A Marca Negra foi conjurada para chamar a atenção. E chamou mesmo. Me encontraram sem sangue algum e veio o boato da maldição, espalhado por Sheppard. Minha família foi protegida do escândalo pelo pseudônimo Michael Evans. Poucas pessoas sabiam que eu era, na verdade, um Black. Michael Evans se popularizou, não da maneira que eu esperava, mas se popularizou. Fiquei feliz em me ver, após tanto tempo amaldiçoado, nas páginas dos livros. Em ver que temiam meu nome, após os assassinatos se iniciarem”.


                “Então foi assim que tudo aconteceu. O princípio de tudo. Sirius sabia que eu tinha me acovardado, porque deve ter lido a carta que escrevi aos meus pais pouco antes de ser amaldiçoado, contando o temor que estava sentindo... Mesmo após minha morte, meus pais me adoravam... Sirius deve ter ido visitá-los, após ter fugido um ano antes de eu me juntar aos Comensais. Irmão traidor... Sirius nunca acreditou na maldição. Achou que eu fui largado morto lá na escola. Pena ter morrido para não presenciar tudo”.


                -Eu ouvi na sua lembrança daquela noite que, na hora de lançar a maldição e citar os nomes, Voldemort incluiu um tal de Patrick Thomas... E Ludmylla citou um tal de Tommy, provavelmente um apelido de “Thomas”... Ele não está em nenhum registro do grupo, mas suponho que seja o parente de Dino Thomas?


                -Sim. É ele. Ele foi o garoto que caiu pelo penhasco.


                -Mas não pode ser o pai de Dino – retorquiu Harry. – Dino vem de uma família de trouxas, nunca teve ligação com magia antes...


                -Não era o pai. Era um parente distante. Assim como ele, parece que era o único da família. Morreu cedo, nem teve tempo de mostrar seu talento... Mas, após algum tempo, o sangue bruxo retornou a família através desse Dino. Aliás, foi o que mais me preocupou ao sair do amuleto. Mas me tranqüilizei quando Úrsula me disse que havia um Thomas na Grifinória.


                -E as mortes na escola? Você montou todo um esquema?


                -Sim. Um esquema para matar. Coloquei uma ordem para matar. Mas acabou não dando muito certo. Aqueles enigmas... Foi um prazer criá-los. As duas primeiras vítimas, nem tive tempo em criar enigmas para elas... Vejamos... Pansy Parkinson foi a primeira, perambulando pelo castelo... Fiz questão de colocá-la bem na sala de Snape...


                “Severo... Ah, Snape... No vestiário de quadribol... Fiz questão de matá-lo com gosto. Ainda bem que ele não estava do lado de Voldemort na época da maldição, e foi incluído na lista das pessoas que eu tiraria o sangue. O problema foi conseguir matá-lo sem deixar suspeitas. Naquele dia, enviei um bilhete para o idiota, para ir até o vestiário. A minha turma estava em aula, com o paspalho do Hagrid. Eu não podia deixar a oportunidade de matar Snape escapar, então fingi que estava passando mal e ficaria no castelo. Tive que dar uma volta enorme para chegar ao local onde iria encontrar com o professor, tentando não ser visto pela minha turma. Felizmente deu tudo certo”.


                “Depois tentei matá-lo, Potter. Isso foi muito fácil, e meu álibi era enorme! Afinal, como conseguiria me infiltrar dentro da Grifinória e colocar uma flecha lá dentro? E sem ser notado em plena luz do dia? Claro que a resposta era... Úrsula! Bastou procurá-la. Se um dos meus amigos soubesse que eu estava falando com Úrsula, não haveria problema. Ninguém imaginava que Úrsula era má. Ao chegar na Mulher Gorda, pedi que uns alunos do primeiro ano a chamassem. Ela veio e eu contei tudo para ela. Que você precisava morrer logo! Expliquei tudo detalhadamente. Na minha lista, você era o próximo. Apanhei a flecha na minha artilharia de bolso e passei para ela. Ela seguiu como um cachorrinho obediente. Subiu no dormitório dos meninos e deixou um mecanismo com uma flecha dourada para acertá-lo”.


-Úrsula estava na sala comunal naquele dia – falou Harry para Hermione e Rony, e em seguida deu um tapa estalado na testa. – Como fomos estúpidos!


-Ninguém tem culpa, Harry – falou Mione. – Não dava para desconfiar dela. Uma garota tão boa quanto Úrsula... não dava para ser notada. E havia alguns outros alunos lá em cima... E nem lembramos disso, afinal, ela não estava na lista de suspeitos.


Michael continuou, olhando para Harry:


-Você não morreu, e eu pulei para a próxima vítima, e foi quando cometi o meu erro de matar num grupo limitado de pessoas... Um erro terrível, que só fui descobrir quando houve a primeira reunião na antiga sala dos Jovens Anti-Trevas... Decidi matar após o anúncio da minha lista negra. Lista esta que continha um detalhe muito interessante na morte destinada a James Smith: sem sangue te deixarei, sem dó te matarei. Deviam ter lembrado que a minha “morte” foi muito parecida com essa. Tolinhos... Agora, voltando...


                “Crabbe. Bom, eu fui buscar no templo, no arsenal deixado do tempo do Lord Voldemort, uma dose de cianureto. Afinal, não precisava do sangue de Crabbe, e sim um pedaço do corpo. Foi ótimo criar um enigma para ele, que realmente se concretizou. Qualquer um poderia pegar o copo envenenado. Só faltava ele na bandeja, e eu despejei o cianureto enquanto conversava com meus amigos. Eu estava perto da mesa. Bom, deu certo, a gula falou mais alto e Crabbe pegou o copo. Só depois percebi meu erro, e que não devia te-lo matado ali”.


                “Miss Reynolds... O primeiro furo no ciclo. Ela não devia ensinar aos alunos como se quebrava uma maldição. Tive que eliminá-la antes que ela ensinasse. Não queria que o Potter descobrisse. Sabia que você estava investigando, Christian nos contava tudo... Então, quebrei a ordem e deixei o círculo dos Jovens Anti-Trevas bem grande, com o X no meio”.


                “Tentei matar o trio Harry, Rony e Hermione depois. Me escondi dentro de uma armadura, aproveitando um chilique de Laurie. Ela saiu durante o jantar, e eu, Christian e Jennifer nos separamos para procurá-la. Ela me ajudou muito. Afinal, com o chilique, Christian e Jennifer desconfiaram dela, e eu fingi que também estava desconfiado. Mais uma vez, naturalmente, havia alguém que chamava mais atenção, afastando as suspeitas de mim... Quase consegui matar o trio. Harry e Rony ficaram feridos”.


                “Aí a morte de Dino Thomas... Joguei a culpa em Padma, como você descobriu brilhantemente Potter. Receio que muito tarde, mas descobriu”.


                “Depois... Cho Chang, logo após aquela palhaçada do interrogatório. Até que saí bem na minha encenação, não foi, Potter? Meu depoimento foi muito convincente... Bom, então... Usando mais um chilique de Laurie, que estava irritada com você, quando eu e meus amigos nos separamos para procurá-la, esperei todos saírem, acuei Chang e apanhei um objeto que tinha deixado escondido no corredor. A matei, e o corpo foi de encontro à porta da sala camuflada. Saí correndo, peguei um caminho mais curto e cheguei antes dos meus ‘amigos’ na sala comunal”.


                “Depois foi a vez de Laurie Sawyer. E nem era para ter sido. Foi a arte do destino... Quando ela subitamente desapareceu do nosso grupo para ter o encontro com Padma, disse aos outros que iria atrás dela, argumentando ser outro chilique, e saí em disparada, antes que um deles me seguisse. Decidi matá-la quando ouvi, no corredor, você pegando as duas no flagrante, numa conversa suspeita sobre a chantagem. Percebi que você estava quase certo na culpa de Padma Patil. Padma seria, novamente, um ouro em minhas mãos. Peguei outro caminho para o nosso salão comunal, mas quase fui pego por Laurie. Ainda bem que ela só viu minha sombra. Ao ver o susto dela, resolvi que iria assustá-la bastante até matá-la, dando uma sensação de perseguição”.


“No dia da recepção de boas vindas ao novo professor de Poções... Foi muito fácil. Puxei assunto com Harry, no saguão de entrada, sobre o desaparecimento de Laurie e a cisma de estar sendo perseguida. E estava mesmo. Por mim. Em alguns momentos da tarde... Eu fiquei sozinho por um tempo, fingindo que procurava ela. Ficava espionando-a. Então conversei sobre isso com Harry, e depois fingi que um zumbido de inseto passou por meu ouvido. Ah, como você foi inocente, Potter. Eu tinha lançado o dardo antes de conversar com você, tinha visto Padma no meio da multidão e o enfiei rapidamente no pescoço dela. Estava úmido de tanto veneno. Depois fui até você e encenei o zumbido, para você pensar que foi naquela hora que o dardo foi lançado. Como eu estava do seu lado, tinha um álibi a mais”.


                -Muito inteligente.


                -Obrigado Potter. Mas não esperava que Laurie durasse tanto. Levei um susto quando ela entrou no Salão Principal olhando para você. Felizmente a voz dela estava travada e ela apenas levantou a mão para cima. Para o teto. E você nem se tocou que ela queria dizer que as coisas às vezes não são o que parecem, como o teto do salão não é um céu, é só uma imagem. Quis lhe alertar que o zumbido foi falso. Mas, felizmente, sua mente foi tão lenta que não percebeu.


                “E, aproveitando suas suspeitas em Padma, eu joguei o diário com as anotações assustadas de Laurie sobre perseguição bem na porta do nosso salão comunal. Claro que um de nós achamos, e eu disse que devíamos mostra-lo a você. Sabia que você desconfiaria de Padma se o lesse”.


                -Mas o diário chegou a nos ajudar – disse Harry. – Achamos uma anotação sobre uma tal Tia Marie, e um círculo igual ao dos Jovens Anti-Trevas.


                -Realmente. Ela era tia de Laurie. Por isso, nem precisei do sangue da garota. Mas aquela anotação nem chegou a ajudá-los tanto...


                “Continuando... Teve a morte de Rogério Davies. Fiquei besta quando aconteceu. Não fui eu, pensei. Alguém se aproveitou dos meus crimes para cometer um. Até hoje não sei quem foi...”.


                -Foi Úrsula.


                -Ela, Potter? – perguntou ele, fitando a garota estuporada no chão. – Não acredito... Pensei que ela não fosse capaz de matar.


                -Foi um acidente. Perda de controle – explicou Harry. – Mas, pelo que vemos através de você, ela talvez adquira o hábito de matar com o tempo.


                -Sem piadas, Potter – retorquiu Michael. – Deixe ver... Depois de Laurie... Ah, Sheppard e a cobra... Banhei um lenço com sonífero e Madame Pince desmaiou. Charles estava só na biblioteca. Saí de lá e depois voltei pelo corredor. Fingi que estava do lado dele. Ele confiou no tonto James Smith... Depois confessei que era Michael Evans, e o deixei inconsciente com a Imperius. Conjurei a serpente, ele morreu após a picada, e depois enviei sua coruja branca ferida, Potter, para servir como isca, para vocês virem até mim. Vieram, mas escaparam outra vez. E quase que o espírito da Sra. Hubbard estragou tudo.


                “Depois Hermione foi presa acusada dos assassinatos... Mas, mesmo assim, eu não poderia parar para que pensassem que era ela mesma. Precisava do meu corpo. Preciso dele. Aí, por esses dias, meu jogo virou”.


“Perdi o gosto em acusar Padma. Tentei evitar o sentimento, mas apaixonei-me mesmo, talvez pela semelhança surpreendente com Ludmylla, tanto por fora quanto por dentro. Não era mais fingimento. Era paixão de verdade. Não queria que as suspeitas em relação a ela crescessem. O jogo virou completamente por causa dela, minhas intenções mudaram... Padma mostrou-me a foto de sua mãe comigo no jardim. Pensei em mostrar a foto para Christian, mas ele a levaria ao Potter e as suspeitas em torno de Padma cresceriam. Decidi que não. Meu objetivo de acusar Padma havia acabado”.


                “Após esses pensamentos, apaguei a vela para deixar o quarto na escuridão, saí do dormitório e cobri minha cama com vários travesseiros. Peguei os corpos, quase todos, primeiro os principais, os de Crabbe e Sheppard, pois precisava de um pedaço do corpo de cada um, e levei-os ao jardim. Nem deu tempo direito, pois Christian deve ter me visto pela janela e começou a me perseguir. Corri ao jardim, e me escondi no buraco de acesso. Christian não me encontrou e começou a gritar ofensas. Eu respondi ameaças de dentro do buraco. Nisso, Harry e Rony ouviram e apareceram. Aí eu puxei o pé do Potter. Quase o puxei para a morte. Mas aí Christian veio socorrê-lo, e não resisti à força de Rony e a dele. Convoquei os heliopatas para afastar vocês dali, os espíritos de fogo que aparecem na hora que eu quiser. Que não existem, mas podem afetá-los...”.


                “No outro dia, para meu desgosto, vocês descobriram que a nossa sala de reuniões era a mesma dos Jovens Anti-Trevas. Nem eu sabia, pombas! Foi muito azar... Por sorte, voces não encontraram nada... Quero dizer, a canção-tema dedava meu nome pagão, mas por sorte vocês ainda não tinham a Granger para ajudar...”.


                “Qual melhor solução do que queimar a sala e tudo o que havia dentro dela? Qualquer pista que pudesse estar escondida? Roubei a varinha de Harry durante a reunião, discretamente. Ele ficou sozinho quando a reunião acabou. Depois veio Gina Weasley, e, antes que ela entrasse, peguei a varinha com um Feitiço Convocatório. Puxei meu Círculo Hipnótico e adormeci Christian e Jennifer. Depois, fui agir. Padma e Parvati vinham pelo corredor na hora em que pus fogo por meio da minha varinha... Eu sabia que não conseguiria matá-los, nem queria. O que eu queria era queimar tudo o que havia naquela sala”.


                “Mas matei Parvati. Peguei seu sangue e deixei Padma ilesa. Nunca precisaria matar Padma, o sangue dela era o mesmo da irmã. Ela, coitada, foi pedir ajuda a vocês. Depois chamou a direção, como eu esperava. Deixei minha marca após matar Parvati e fui embora”.


                “Então, chegamos ao dia de hoje. A abertura do quadribol. Matei Jennifer Yumi, extraí o sangue. Depois deixei o corpo lá, coberto, para ser golpeado pelos balaços que eu havia enfeitiçado... Ah, foi um grande espetáculo”.


                “No fim da tarde, fui contar ao Potter tudo sobre a foto que Padma havia me mostrado. Queria criar um álibi perfeito para James Smith, para que quando ele fosse encontrado morto, ninguém pensasse que ele fora o assassino e que eu troquei de corpo. Tudo tinha que acabar hoje, porque o ataque de Voldemort estava previsto para meia noite. Então, mandei o traídor do Zacarias avisar a Draco e Kevin que Gina os esperava. Bom, a Gina do jardim, uma ilusão, atraiu-os pra cá. Depois, corri até junto de Christian e Padma e disse que vi dois vultos correndo. Eles foram espiar também e viram os dois correndo. Saímos atrás deles. A outra parte do plano estava nas mãos de Úrsula. Já estava tudo combinado. Eu pensei que ela falharia, e parece que quase falhou. Mas deu tudo certo. Brilhante essa menina, embora fez isso, creio eu, pensando em fazer mal a Granger, pensando nos interesses dela mesma, e não nos meus. Mas funcionou! Harry Potter, Rony Weasley e Gina Weasley vieram atrás da amiga”.


                “Do Hagrid eu tratarei depois, e Lupin, bem, os Comensais já sabem que não podem matá-lo, pois eu preciso do sangue dele”.


                “Bom, mas agora, já chega”, falou ele, erguendo a varinha, mas não na direção da tela da parede, e sim em direção aos garotos. “Vocês já viram tudo. O começo, o meio e agora participarão do fim, o fim da maldição de Michael. O fim do meu castigo”.


                “Mas é claro que um pouco de tortura não fará mal a ninguém... Crucio! Crucio! Crucio!...”.


                Ele lançou a Maldição Cruciatus em cada um deles. Todos caíram no chão, impotentes pela dor, que dilacerava cada pedaço do corpo de cada um com agulhadas terríveis. Hermione e Gina urraram de dor, assim como Draco; Rony se revirava no chão, assim como Harry. Padma Patil não deixou de ser alvejada.


                -Você vacilou, Padma querida – disse Michael, observando a garota se debater. – Por isso, um castigo você precisa tomar. Todos aprendem a lição após o sofrimento, Padma. Por mais que voce ache que não, mas aprendem, sim. Eu aprendi com o castigo de Lord Voldemort. E você vai aprender com o meu.


                Um sorriso medonho percorreu aqueles lábios. Ele observava cada um deles no chão, com um sadismo animal, um sadismo por sofrimento.


                -Aprendi a matar depois do meu castigo... Aprendi que o sofrimento ensina... Dezesseis anos trancafiado naquele amuleto me ensinaram a odiar... Vocês vão aprender a lição... Pena que irão morrer hoje mesmo.


Os olhos vidrados tornaram-se piores. Harry, com os olhos semicerrados pela dor, vislumbrou o toque de maldade daquelas pupilas crescer.


                Michael levou a mão para dentro das vestes e ele já se preparou para o pior.


                E o pior realmente veio


                Com um cabo de madeira, uma lâmina brilhante.


                Na forma de um enorme machado.


                Rápido, certeiro, letal.


                Para encerrar de vez com eles, e para a maldição de Michael tornar-se completa.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.