O mausoléu
CAPÍTULO 41 - O mausoléu
Rony e Padma tinham caído numa espécie de jardim subterrâneo, de igual beleza ao Jardim das Ilusões do lado de cima. Flores amarelas serpenteavam por entre moitas de um verde vivo e duas árvores finas ladeavam um poço.
Com curiosidade, Rony e Padma, ainda tremendo, aproximaram-se do poço, feito por diversas pedras. Olharam para o fundo, esperando ver alguma coisa, mas, como eles deviam esperar, só havia o fundo negro, que descia provavelmente por muitos e muitos metros.
-O que será que tem lá no fundo? – perguntou Rony, sentindo as mãos geladas de Padma sobre as suas, igualmente frias.
-Não quero nem imaginar – respondeu Padma. – Esse lugar me dá arrepios! Qualquer coisa pode sair daí. Enquanto estiver dentro dos limites do jardim, eu não duvido de mais nada.
-Alguma coisa deve acontecer – falou Rony, caminhando pelo mato, analisando cada local em que pisava. – Alguma coisa vai acontecer.
-Por que diz isso? – a voz de Padma saiu num tom agudo de medo.
-Porque deve haver algum motivo para tudo o que aconteceu! Olhe... É só você analisar: todos os últimos acontecimentos nos levam a acreditar que o assassino queria que estivéssemos aqui, todas as vítimas. Ele não faria com que viéssemos para dar um passeio pelo jardim e por esse templo. Uma hora, não sei qual, em qualquer momento, ele vai aparecer e nos matar, um por um. Algum momento, qualquer momento, isso vai acontecer.
Ele ficou olhando para Padma por um momento, e subitamente Rony lembrou-se que estava junto com uma das principais suspeitas dos crimes. E se fosse ela? Por que ele estava falando sobre as finalidades do assassino, sendo que ele poderia estar ali, na sua frente, olhando daquele modo estranho para seu rosto, com profundas olheiras sob os olhos, com uma feição de preocupação?
Rony devia ter demonstrado os seus pensamentos por algum gesto, pois Padma falou, em seguida:
-Está desconfiado de mim, não é?
Rony analisou rapidamente a pergunta. Se Michael Evans estivesse ali realmente, qual resposta ele iria querer ouvir?
“Sim. Acho que você matou todas as pessoas, e foi você quem fez todos nós pararmos nesse lugar”.
ou
“Não. Não acredito que você seja a assassina”.
“De qualquer jeito, acho que essa história não vai acabar bem. De que adiantaria eu responder...”.
-Não – disse ele, tentando manter a voz firme para passar convicção.
-Não precisa mentir – retorquiu Padma, dando novamente a impressão de que lia os pensamentos do garoto. – Sei que você acha que sou a assassina.
Sem que percebesse, Rony foi dando passos lentos para trás, afastando-se cada vez mais de Padma Patil. Algo na garota o estava incomodando. Os dois ficaram em silêncio, apenas encarando um ao outro. Rony esperava que Padma acabesse pegando a varinha em qualquer momento, matando-o ali mesmo. Ele continuava recuando lentamente. Padma, porém, continuou parada, fitando-o fixamente.
Rony chocou-se com alguma coisa, enquanto recuava. Sobressaltou-se e olhou para trás. Era uma das árvores que compunham o jardim subterrâneo.
Enquanto suspirava de alívio, Rony passou os olhos pelo tronco apodrecido da árvore. Sobre o tronco, encontrou inscrições feitas com algum objeto cortante – inscrições tão comuns para adolescentes. Havia um coração, cortado por uma flecha, e dentro dele as iniciais: R & L.
Rony continuou observando, até que um ruído de movimento das moitas as suas costas revelou que Padma estava avançando para o local onde ele se encontrava.
Rony já ia gritar e apanhar a varinha quando percebeu que os olhos de Padma não estavam voltados para ele, e sim para a árvore, para o tronco da árvore, para aquele simples desenho de coração.
O que haveria de tão fascinante ali? Por que Padma parecia surpresa em encontrar aquilo? Rony não compreendia porque ela estava daquele jeito.
-L... – suspirou Padma. – Ludmylla Patil...
-O que? – perguntou Rony. – Ludmylla Patil, sua mãe?
-É, minha mãe – respondeu Padma, passando os dedos pela letra L da inscrição.
-Mas o que a inicial de sua mãe estaria fazendo aqui, neste jardim escondido dentro desse templo, que também é escondido? L pode ser qualquer outra pessoa...
-Minha mãe conheceu Michael Evans – falou Padma, virando-se para Rony. – Esse local provavelmente é dele. Acho que ele trouxe minha mãe pra cá algumas vezes...
-Sua mãe... Conheceu ele? – perguntou Rony, pasmo.
-Sim. E tudo que descobri até agora indica que ele era apaixonado por ela.
-Ah – murmurou Rony, ainda perplexo. – Mas... Se fosse o nome de sua mãe com o de Michael, não estariam nesse coração as iniciais M & L?
Padma parecia ter acordado somente naquele instante, pois franziu a testa ante a observação de Rony, e observou a inscrição.
-Realmente – concordou ela. – O que isso quer dizer?
-Na minha opinião sua mãe deve ter trazido outra pessoa aqui em baixo... Provavelmente, não me leve a mal, mas... Ela traiu o Michael.
-Será? – perguntou Padma, incrédula, mas não irritada. Afinal, a hipótese que Rony levantara era bem convincente.
Rony olhou para a outra árvore, procurando encontrar mais alguma coisa. Havia algo cortado no outro tronco, algo ainda maior do que aquele coração. Ele apontou para Padma:
-Veja!
Os dois correram até a outra árvore (nessa altura, Rony nem se lembrava mais das suspeitas em relação a Padma) e nem precisaram se aproximar muito para começarem a ler:
L
É
MINHA
MATAR
R
As palavras foram cravadas com brutalidade no tronco. A pessoa que a escrevera devia estar com o ódio fulminando. O significado era óbvio: Michael Evans planejava matar o R.
-Quem seria o pobre R? – perguntou-se Rony em voz alta.
-Uma das vitimas do Michael – falou Padma. – Ele nunca deixaria vivo alguém que estivesse junto com sua amada.
-Provavelmente o R era biruta, uma pessoa sem noção do perigo – disse Rony. – Como ele pôde provocar o Michael Evans indicando claramente que esteve com a namorada dele?
-Michael ainda não devia ter colocado as garras de fora – sugeriu Padma. – Esse R devia ser um pobre coitado.
-Aquilo ali é uma caverna? – perguntou Rony, apontando para um buraco escuro que ficava nos limites do jardim.
-É o que parece – falou Padma. – Você... Quer espiar o que tem lá dentro?
-Não – discordou Rony. – Eu nunca entraria naquele lugar escuro. Vai saber o que tem lá dentro. Aqui, tudo é perigoso.
-Não custa nada – disse a garota. – Afinal, não temos nada pra fazer aqui. Só uma espiadinha, que tal?
Rony pensou por um momento, e acabou concordando. O risco estava ali no jardim subterrâneo, assim como naquela caverna. De qualquer jeito, ele estava correndo riscos. Balançou os ombros para o próprio pensamento e começou a caminhar, sendo seguido por Padma.
Espiaram para dentro da caverna. No fundo, uma claridade alaranjada podia ser enxergada – havia algo lá dentro.
-Talvez seja uma sala – opinou Padma. – Uma sala secreta dentro dessa caverna.
-Você não está pensando que eu...
-Você vai sim. Nós vamos – a garota pegou o braço de Rony e puxou-o para dentro. O caminho até a sala foi rápido, e eles logo viraram na entrada de onde saía àquela claridade.
Os dois boquiabriram-se.
Na pequena sala, objetos afiadíssimos, pontiagudos, ameaçadores, pendiam do teto. Prateleiras de madeira estavam ocupadas por frascos sinistros. Rony aproximou-se da prateleira mais próxima. Os potes de vidro eram etiquetados. Num deles, Rony leu Curare – veneno indígena, em outro Cianureto – Rony lembrou-se que fora o mesmo utilizado para envenenar Crabbe – , uma verdadeira infinidade de venenos.
Ele olhou para trás e viu Padma olhando, boquiaberta, os objetos pontiagudos.
-Esse cara é um... monstro – murmurou ela, e quando avistou um machado recostado num dos cantos e recordou-se da morte de Parvati, começou a chorar.
-Aqui está todo o arsenal dele... Foi daqui que ele tirou aquele objeto estranho que matou a Cho Chang.
Facas de diversos tamanhos estavam agrupadas em outra prateleira. Um facão com a lâmina do tamanho do braço de Rony mal cabia na prateleira. Até tesouras afiadas havia ali.
UM objeto de aparência inocente chamou a atenção de Rony. Parecia ser a coisa mais simples dali. Um círculo quadriculado, acompanhado de uma corrente de prata.
-O que é isso? – perguntou.
-Círculo Hipnótico – respondeu Padma. – Parece ser simples, mas não é. Ele adormece a pessoa, e ela não é nem capaz de perceber.
Padma apanhou uma das facas e observou-a. A mente de Rony evocou a morte de Dino Thomas – a afirmação da falecida Laurie de que a viu com uma faca ensangüentada, Padma pagando para ela se calar...
Ele concluiu o quanto fora tolo em ir até ali com Padma.
-Vamos – disfarçou ele, saindo da sala em disparada. Passou feito foguete pela caverna e saiu no jardim subterrâneo, tremulo. Padma saiu logo atrás, e para desespero de Rony, ainda com a faca na mão.
-Por que a pressa? – riu ela. – Está com medo?
E antes que ele esboçasse qualquer reação, algo pulou sobre ele, derrubando-o no chão. Garras prenderam suas vestes contra o solo. Um cheiro podre invadiu-lhe as narinas. Ele estava olhando para um monstro esverdeado e sua mente o achou parecido com uma gigantesca lagartixa provida de garras e presas, com olhos sinistros e fome por carne humana.
A criatura babava em seu rosto, e ia abrindo as presas lentamente. Pronta para devorá-lo.
Ele não podia render-se assim.Tinha que salvar a vida de Hermione ainda, sair daquele templo. Juntou todas as forças que podia e empurrou a criatura. Ela voou longe, chocando-se contra uma das árvores.
-CORRA, PADMA – gritou ele. Não sabia ainda se ela era uma assassina, por isso, queria ajudá-la. E realmente Padma começou a correr, seguindo-o.
A única saída possível ficava do lado de cima – eles precisavam escalar as paredes de pedra. Rony, apavorado, encontrou rapidamente saliências na pedra e começou a escalar. Padma vinha logo atrás, e começou a escalar em seguida, já sem a faca na mão.
A criatura se recuperava da queda. Rony arriscou uma olhadela para trás enquanto subia um pouco mais – as palmas das mãos começavam a arder – e viu o chifre pontiagudo que o monstro trazia no crânio. O monstro ajeitava-se, olhando ao redor à procura do jantar que fugia.
Rony continuou a escalar. De sua rapidez não dependia somente a sua vida, mas também a vida de Padma Patil.
Em alguns pontos as saliências eram muito separadas, e ele tinha que esticar o corpo o máximo que podia. Às vezes precisava deslocar-se um pouco para a esquerda ou para a direita.
Olhou para cima e viu que a saída aproximava-se. Suspirou de alívio, mas no momento do suspiro algo se chocou com força contra a parede. Ele forçou as mãos para não despencar. Olhou para baixo e viu que a criatura dera uma chifrada contra a parede e começava a se afastar, com o chifre ainda em posição de ataque, para uma nova investida. Padma estava bem, mas tão tensa quanto ele. Rony concluiu que a intenção da criatura era derrubá-los dali.
Ele continuou o percurso. Quanto mais rápido saíssem dali, melhor. Estava levando a mão para apioar-se na saída quando um novo baque estremeceu a parede. Suas mãos escorregaram perigosamente, e uma das pernas oscilou no ar por uns momentos.
Abaixo, Padma perdeu o equilíbrio de uma das mãos e quase caiu, mas logo conseguiu se restabelecer, assim como Rony.
Porém, no solo, a criatura era mais rápida em se restabelecer. O bicho pegou impulso. Rony esperou um novo baque, e não se arriscou a impulsionar o corpo para a saída – poderia perder o controle do corpo. Mas o novo baque não ocorreu.
O monstro simplesmente abriu as garras e prendeu-se contra a parede. Rony engoliu em seco, enquanto via que a criatura subia agilmente.
-VÁ LOGO – berrou Padma, e ele impulsionou o corpo para a saída. Conseguiu sair e espiou para baixo. Padma estava próxima, mas o monstro era muito mais rápido do que ela.
Ela estendeu a mão para Rony puxa-la.
-Ajude-me – pediu, e Rony ia tomando sua mão quando uma outra força, mais forte do que a dele, fez um impulso contrário, para o lado de baixo.
Uma das garras da criatura segurava a barra das vestes de Padma. Rony continuou puxando a garota, resistindo contra a força contrária, até que as vestes rasgaram e a criatura ficou apenas com um pedaço de pano nas garras.
Assim que Padma chegou na saída, os dois começaram a correr. Podiam ouvir a criatura seguindo-os com uma velocidade impressionante. Rony seguia mais à frente, apavorado, e nem percebeu quando a criatura alcançou Padma e a apanhou com as suas garras.
Rony continuou correndo, e só depois de muito tempo, quando chegou ao final daquele corredor, olhou para trás e viu que estava sozinho.
-Padma – suspirou. – Não... Mas... Mas não posso ficar aqui me lamentando... Tenho que achar os outros.
Estava num corredor escuro iluminado por archotes, o mesmo onde Harry e Christian haviam caído.
* * *
Úrsula gargalhou friamente da expressão de pânico que surgiu no rosto de Gina. Draco, ao contrário, estava satisfeto pelo flagrante – principalmente por Úrsula não ter sido a única testemunha do beijo apaixonado. Hermione viu o beijo dos dois com os próprios olhos, e se ela contasse para Harry a traição, ele acreditaria na amiga. Harry discutiria com Gina, os dois terminariam o namoro, e o caminho estaria livre para Malfoy. Gina seria sua, e ele não precisou mexer um dedo sequer para que isso acontecesse.
Gina estava pálida, quase transparente. Por seu corpo corria o medo e a vergonha. Vergonha pelo fato de ter fraquejado e beijado Malfoy, e medo pela reação que Harry teria ao saber, isso se...
-Úrsula, você... Por favor, não conte ao Harry...
-Ah você acha que eu não contaria? – zombou Úrsula, soltando mais uma gargalhada. – Queridinha, achei que você já me conhecia o suficiente. É lógico que eu vou contar.
-Mas... Droga, o que você vai ganhar com isso? – perguntou Gina, passando as mãos freneticamente pelos cabelos, num ato de desespero.
-É... – e Úrsula levou uma mão ao queixo e franziu as sobrancelhas, como se avaliasse a situação. – Não ganharia nada, mas... Você merece sofrer um pouquinho, querida amiga. Afinal... Há algum tempo atrás, naquela sala maldita, você me chamou de louca, disse que tinha nojo de mim... Enfim... Achou que o jogo não iria virar novamente pra mim, não é? – e passou os olhos vidrados por todo o rosto de Gina.
-Por favor, Úrsula...
-Não, não... Ninguém mandou me ofender. Achou que eu seria presa, que nunca mais me veria novamente... Mas veja como o destino é cruel! Você está nas minhas mãos agora! Afinal, essa boboca da Granger poderia esconder esse flagra... Mas eu não, Gina! Seu romance com o Potter vai por água abaixo e eu terei o maior prazer em provocar esse rompimento com essa revelação tão bombástica!
Gina olhou para Mione, que a fitava.
-Mione espero que acredite em mim... Eu amo o Harry, isso foi... Fraqueza de minha parte, e foi safadeza do Draco também – ela olhou feio para o garoto, e depois olhou novamente para Hermione. – Por favor, entenda...
-Foi fraqueza, mas você o beijou – vociferou Úrsula. – É um fato. Acha que o Potter vai acreditar nessa conversa?
Gina não insistiu mais. Apenas enxugou as lágrimas.
-Isso... Chore mais. Sofra! É isso o que eu mais desejo para você e para todos os outros. Aprenda uma lição com isso: prisão alguma poderia me segurar...
-Estou indo, pai, mãe... Estou indo...
Gina parou de enxugar as lágrimas e arregalou os olhos. Sobre a mordaça, os olhos de Hermione também saltaram das órbitas. Draco franziu a testa, e Úrsula sobressaltou-se.
Sem perder tempo, Gina saiu correndo na direção onde havia surgido a voz. Ela tinha quase certeza de que era da passagem a sua esquerda, e entrou por ela, correndo, sem dar atenção aos gritos histéricos de Úrsula.
Enquanto corria, pensou no que Harry queria dizer com Estou indo, pai, mãe... Estou indo...
Não encontrou a resposta, mas logo encontrou a saída da passagem. Ela desembocava numa sala ampla, com uma luz que ofuscou a vista de Gina por alguns momentos. Ela colocou os pés no piso, olhou para frente e percebeu que não podia avançar.
Um enorme poço cheio de lanças afiadas bloqueava a passagem. Havia bordas de chão ao redor, mas eram finas demais – para alguém sobreviver a uma travessia, precisaria de muito equilíbrio.
Os olhos de Gina encontraram Harry. Ela não compreendeu o que acontecia. Era Harry sem sombra de dúvida, mas aquele era um Harry diferente. Os olhos por baixo dos óculos redondos estavam vagos, e o corpo de Harry parecia tombar de um lado para o outro. Os passos eram lentos. Harry estava diferente.
E caminhava diretamente para o poço de espinhos – estava perigosamente próximo ao poço de espinhos. Mais alguns passos e ele cairia ali dentro, mais alguns passos e aquelas lanças afiadas perfurariam seu corpo em diversas partes, fazendo um “espetinho” de Harry Potter. E ele não parecia ter conta disso.
Apavorada, Gina fez a única coisa que estava a seu alcance: gritar.
-HARRY, CUIDADO!
O berro foi altíssimo, mas não adiantou; Harry continuou avançando, com o andar de lesma, os olhos abobalhados, fitando o vazio. Mais dois passos e ele estaria morto.
Gina não sabia mais o que fazer. Olhou ao redor. Um amontoado de pedrinhas estava jogado a um canto. Sem pensar duas vezes, Gina apanhou três pedras e jogou-as na direção de Harry.
Uma. Errada, passou direto pelo rapaz.
Duas. Errada, passou por cima da cabeça de Harry.
(Oh não, mais um passo e ele já era, eu tenho que acertar essa pedra, tenho sim...)
Três... Errada. A pedra ricocheteou na borda do poço de espinhos e caiu dentro dele. Enquanto isso, o pé de Harry começava o movimento para caminhar, para dar o passo final – o passo decisivo que o levaria para a morte.
Gina pegou outra pedrinha e arremessou-a sem pensar duas vezes. A pedra desviou o trajeto, indo bater na parede. Ela, perdendo as esperanças, ia começar a chorar em desespero, quando a pedra, ao ricochetear na parede, acertou com força total a testa de Harry.
-AI – fez Harry. No momento do choque com a pedra, seus olhos já voltaram a ser os mesmos, mas ele olhou confuso ao redor, sem entender onde estava. O pé estava levantado para dar o passo para o poço. – Cadê a casa? Cadê meus pais? E... Gina?
-HARRY, CUIDADO, VÁ PARA TRÁS PARA NÃO CAIR!
Ele olhou para o poço cheio de lanças e deu um pulo para trás, evitando que perdesse o equilíbrio. Caiu de bunda no chão. As costelas arderam novamente. Harry, no entanto, não se importou. Estava demasiado confuso com tudo o que viu para dar importância à dor nas costelas.
-O que houve aqui, Gina? – perguntou Harry, sem fôlego, para a namorada, que o observava preocupada do outro lado do poço.
-Não sei... Acho que você estava vendo alguma miragem... Mas era uma miragem nociva, Harry. Perigosa. Como todas as que esse lugar é capaz de produzir. Essa miragem o atraía para esse poço.
-Nossa – suspirou ele.
-Mas você está bem, e isso é o melhor de tudo...
-Por que está mentindo, Gina? – perguntou a voz arrogante de Úrsula. Hermione tentou esboçar um sorriso por baixo do tampão em sua boca ao ver que Harry estava bem. – Afinal, acho que você comemoraria muito a morte do seu namoradinho...
Harry olhou confuso para Gina:
-O que essa víbora está dizendo?
Gina ficou embaraçada, olhando de Harry para Úrsula, de Úrsula para Malfoy... Sem saber o que dizer...
-Vamos, Gina – encorajou Úrsula. – Quem sabe Harry compreenda... Ele tem tantas desgraças na vida, uma a mais não iria fazer muita diferença...
Gina continuou estática, olhando para todos.
-Ou será que a outra parte envolvida terá que falar? – perguntou Úrsula, virando-se para Malfoy. Draco tinha o rosto tenso. – Vamos, Draco, diga o que aconteceu...
Seguindo o exemplo de Gina, Draco ficou mudo. Harry, no entanto, sentia uma fúria crescendo dentro de si. Pela reação dos dois, algo tinha acontecido entre eles, envolvendo os dois, e não era mais um plano tirado da cartola dos horrores de Úrsula.
-Bom, pelo que estou vendo, ninguém quer dizer... – falou Úrsula, com um falso desapontamento.
-Por que não diz logo o que é? – desafiou-a Harry.
-Simplesmente porque é tão grave que você diria que é mentira... Mas tenho outra testemunha. Minha querida Hermione – e pressionou ainda mais a varinha. – Essa, se não quiser dizer o que viu, vai ter a cabeça estourada.
Com violência, ela tirou o tampão da boca de Hermione. A garota fez movimentos com a boca, para aliviar a dor que sentia nos lábios.
-Diga logo, Hermione... O que foi que você viu agora há pouco?
Hermione olhou apavorada para Gina.
-Lamento muito, amiga, mas... Estou sendo obrigada a fazer isso.
E virou os olhos para Harry, para um enfurecido Harry. Engoliu em seco, respirou fundo e começou a falar:
-Harry, dói muito dizer isso, mas... É que... – a varinha apertou com força a sua têmpora, e ela teve que começar a despejar tudo o que sabia. – Eu vi a Gina...
-FINALMENTE!
O grito sobressaltou a todos. Encontraram a origem dele vindo pelo mesmo buraco onde Harry entrara, durante a fuga do monstro, pela figura de um garoto sardento e de cabelos ruivos.
-Finalmente os encontrei – disse Rony, nitidamente cansado. Bateu no ombro de Harry e olhou para o outro lado do poço de lanças. – Úrsula... Ainda com essa idéia de seqüestro?
-CALE A BOCA – gritou Úrsula. – Isso não é uma brincadeira, isso aqui é sério, será que você ainda não percebeu?
-Gente, houve uma emergência... – falou Rony para os outros, ignorando Úrsula. – Eu e Padma... Quase morremos. Quer dizer, não sei se ela quase morreu ou se...
-Padma pode estar morta? – perguntou Gina.
-Sim – falou Rony. Olhou para Harry. – Temos que sair daqui, cara. Esse lugar... É perigoso demais. Temos que achar uma saída.
A risada de Úrsula, já conhecida deles, soou pela sala. E dessa vez estava mais aguda do que nunca, mais potente, mais irritante, e, claro, mais sinistra.
-O que tem de engraçado agora? – perguntou Gina.
-Acontece que vocês não sairão daqui – falou Úrsula, com uma expressão cínica. – Simplesmente porque o Mike não quer.
-Mike? – perguntou Harry. – Nossa, você tem muita intimidade com o Michael Evans, hein, Úrsula?
-Tenho sim. Somos íntimos. E eu sei que todos vocês morrerão aqui. Ouvi isso saindo da boca dele.
-E o que ele está esperando para aparecer? – desafiou Gina. – Se ele quer nos matar, porque não aparece?
Rony raciocinou calado durante esse tempo. Úrsula o amava, e faria qualquer coisa que ele pedisse... Talvez a fidelidade dela por Michael Evans fosse grande e ela não diria o que ele iria perguntar, mas valia a pena tentar.
Com uma expressão forçada de amor, ele chegou até a borda do poço de espinhos e olhou para o rosto da garota, do outro lado. Úrsula sorriu.
-Úrsula, querida... Por favor. Nos mostre como sair daqui.
-Não... – respondeu ela em voz baixa.
-Mas ele vai matar-me se você não me ajudar. Eu preciso sair daqui vivo, para poder ficar junto com você...
-Você quer sair vivo pra ficar com essa aqui!
-Não... Eu vou ficar com você. Você é muito linda e... Se eu sair vivo daqui... Eu te perdôo por tudo o que você fez para ficar comigo.
Úrsula, com os olhos úmidos, olhou indecisa para Rony. A tentativa de parecer convincente pareceu ter funcionado, porque Úrsula retribuiu o sorriso do garoto e disse logo em seguida:
-Está bem, querido.
Úrsula caminhou para uma das paredes da sala. Todos franziram as sobrancelhas, sem entenderem nada. A garota levou a mão até a parede, e abriu uma maçaneta – uma maçaneta invisível. Úrsula abriu a porta, revelando uma porta camuflada na parede – assim como a da sede dos Jovens Anti-Trevas.
-Boa, Rony – exclamou Harry.
-Mas como passaremos para o outro lado? – perguntou Rony. – Pelo que vejo, o único jeito é seguir pelas bordas do poço.
-Se é o único jeito, teremos que fazer assim – falou Harry, engolindo em seco logo em seguida. – Vamos ter que seguir colados na parede, ou cairemos...
-Rony, querido – chamou Úrsula. – Abra a porta que está aí perto. Camuflada na parede como esta. Você também sairá na Sala do Caixão.
-Sala do que? – perguntou Harry, mas Úrsula já entrava pela outra porta com Hermione junto. Draco e Gina, afastados um do outro, hesitaram por um momento, mas em seguida ambos entraram na sala.
-Sala do Caixão – repetiu Rony. – Harry... Deve ter alguma relação com a maldição de Michael Evans!
-Sim – concordou Harry. – Estou louco para conhecer esse lugar.
-Eu também... Mas, Harry – interrompeu-o Rony. – Tenho que falar sobre um certo objeto que encontrei.
Rony falou sobre o Círculo Hipnótico. Ao terminar, Harry apenas deu um sorriso maroto e enigmático.
Após isso, eles tatearam pela parede azulada e finalmente encontraram algo sólido – a maçaneta. Giraram a maçaneta redonda e, sem perda de tempo, passaram por ela, entrando na tal “Sala do Caixão”.
Harry boquiabriu-se ante a beleza da sala. O teto era alto e sustentado por grossas colunas. O formato da sala era oval, e ela era enorme. Pedras azuis brilhantes cobriam parte das paredes, que eram igualmente azuis. Os olhos de Harry logo se desviaram para o único objeto sólido que havia ali – mas ele estava demasiado distante para enxergá-lo.
Caminhou até ele, sem se importar com Úrsula, que estava próxima ao objeto com sua refém Hermione, sem se importar com a proximidade de Draco e Gina, parados junto à porta, sem se importar com os passos apressados de Rony atrás dele, correndo para acompanhá-lo.
Ele só tinha uma idéia fixa na mente: seja lá o que fosse aquilo, ali estaria uma grande pista. E ele tinha que chegar até lá o quanto antes.
Ele se aproximou, e lentamente o objeto foi sendo revelado.
Estava sobre uma pedra branca, e era feito de vidro. Seu formato era circular na parte de cima. Dois pés se revelavam sobre um lençol branco. Harry chegou rapidamente à conclusão do que era aquilo, antes de se aproximar e ver o que o vidro trazia dentro.
Era um caixão.
E aquele lugar era um mausoléu, um lugar destinado exclusivamente para o repouso daquele corpo.
Harry inclinou-se sobre o vidro. Dentro do caixão, sobre o forro branco, estava o corpo de um jovem. Ele podia concluir isso pela altura, pois a expressão do corpo era disforme. O rosto era metade carne apodrecida, enquanto a outra metade tinha alguns sinais de deterioração.
Um cadáver que devia estar repousando naquele mausoléu por um bom tempo.
Harry tirou os olhos do caixão quando novos passos vindos do exterior assustaram a todos. Eles haviam deixado as portas secretas abertas, e por uma delas – a que Harry e Rony usaram – entrou Padma Patil.
O estado da garota era deplorável. Os cabelos, geralmente lindos e escovados, estavam arrepiados – como se ela tivesse levado um choque. O rosto estava coberto de terra e os lábios tremiam.
-Padma! – exclamou Rony. – Você está viva!
-Sim – falou a garota, entrando lentamente no mausoléu. – Consegui sobreviver... Lutei muito, mas estou aqui! Aqui, viva! – ela estava eufórica.
-O que aconteceu com vocês dois? – perguntou Harry para Rony.
-É uma longa história... Mas quase que morremos. Então... – Rony olhou para o caixão envidraçado. – Quem é esse indivíduo dentro do caixão?
Harry pigarreou.
-Antes de começar qualquer coisa, eu devo avisar ao nosso caro Michael Evans que eu descobri a identidade dele.
-Tem certeza? – perguntou Draco.
-Sim... Quero dizer, eu não tinha tanto, até entrarmos no Jardim das Ilusões, e depois nesse templo. Descobri o que faltava por aqui. E esse mausoléu ajudou a colocar um ponto final em tudo o que aconteceu em Hogwarts nos últimos tempos.
“Eu sei quem é o atual Michael Evans. E ele está aqui. Agora. Neste mausoléu”.
Todos o encaravam. Úrsula e Hermione, Draco, Rony, Gina e Padma. Todos o observavam. Todos tensos.
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