Ameaçada
CAPÍTULO 26 - Ameaçada
Como para zombar de Úrsula, Rogério Davies levantou-se, ainda com o sorriso e saiu do Salão Principal. Úrsula, que estava desnorteada, sem ação, olhava para o garoto com os olhos arregalados. Não conseguia disfarçar o pânico. Não tinha escolha. Seus planos, tudo o que fizera até então, poderia ir por água abaixo... Tinha que ir atrás de Rogério... Ele sabia... E, se a verdade fosse revelada a Rony, ele nunca perdoaria Úrsula e voltaria a se aproximar de Hermione.
“Não posso deixar que isso aconteça”, pensou Úrsula, com furor.
Levantou-se rapidamente, quase derrubando o copo de suco. Aflita, saiu do Salão Principal e avistou Rogério Davies no Saguão deserto.
Aproximou-se do garoto. Vendo a aflição que dominava Úrsula, Rogério deu uma risadinha para ela.
-O que você quer? – perguntou Úrsula, com a pulsação rápida devido ao choque. – Por que me enviou aquele bilhete?
Rogério deu outra risada, desta vez mais carregada de desdém.
-Ah Úrsula... Faz-me rir! Você sabe muito bem do que eu sei, do que aquele bilhetinho quer dizer. Se não soubesse, não estaria tão pálida e com essa cara de assustada. Aliás, foi algo muito grave! – zombou ele. – Eu nunca imaginei que uma jovem tão meiga, disposta a ajudar a todos, fosse capaz disso.
Úrsula segurou o pulso do rapaz com força. Sua voz tornou-se ameaçadora.
-Escute aqui! Ninguém pode saber disso. Ouviu bem? Ninguém!
-Eu sei disso – resmungou Rogério. – Por isso que eu lhe mandei o bilhete. Úrsula, querida, você está nas minhas mãos agora. Eu sei que foi você quem deu aquela entrevista para o “Profeta”, dizendo que era Hermione. Eu vi você com o repórter dentro do beco. Para ligar sua entrevista a que saiu no jornal, foi muito fácil.
-Olha aqui...
-Espera aí! – interrompeu-a Rogério. – Aliás, dá pra soltar meu pulso. Isso... Então... Eu ainda não terminei. Sei que você fez tudo isso porque gosta do Weasley e quis separa-lo da Hermione.
-Como...?
-Eu não sou idiota. Depois que li a entrevista, e percebi que você colocou o nome de Hermione, saquei rapidinho. E sua demonstração de amizade para com o Rony também foi muita clara.
-O que você vai ganhar com isso? – perguntou Úrsula, trêmula. – O que vai te beneficiar você acabar com tudo o que planejei?
-Você ainda não me entendeu – disse Rogério, sarcástico. – Eu vou me beneficiar ficando de boca fechada, claro que se você aceitar minha proposta...
-Rogério, eu nunca vou aceitar proposta alguma! – respondeu Úrsula, furiosa.
-Não quer nem ouvir? – perguntou o garoto, olhando fundo nos olhos de Úrsula. – Tudo bem... Vou te dar um tempo. Qualquer coisa, você venha falar comigo. Mas tem prazo, ouviu bem? Se você não vier me procurar daqui a alguns dias, seus planos vão por água abaixo, e todo mundo saberá de sua armação.
Rogério colocou as mãos no bolso e virou-se novamente para o Salão.
-Cuidado Úrsula. Você não está acima do bem e do mal. Eu posso acabar com tudo.
Rogério entrou no Salão, deixando Úrsula Hubbard parada, junto ao corrimão da escadaria de mármore, com o rosto desprovido de cor, sentindo-se completamente ameaçada.
* * *
-Kevin, Gina, Christian, James, Charles Sheppard, Jennifer Yumi, Hagrid, Malfoy e as Patil – leu Harry, em voz alta, para Rony. Os dois estavam na sala comunal, após o banquete trágico, numa mesa próxima à janela, com o pergaminho dos suspeitos à mão.
-Nove suspeitos... – murmurou Rony.
-Dez – corrigiu-o Harry. – Dez suspeitos... As Patil são duas, esqueceu?
-Ah é – falou Rony, sem graça. Para disfarçar, continuou logo a conversa. – Aliás, Padma Patil continua sendo a principal, não é?
-Até agora sim – confirmou Harry, ainda olhando para o pergaminho. – Ela teve oportunidades na morte de hoje também. No momento em que o dardo foi lançado, praticamente todos os estudantes atolavam-se no Saguão. Qualquer um dos suspeitos poderia ter lançado o dardo.
-Então... Nada de novo...
-É – suspirou Harry. – Bom, pelo menos tivemos um breve depoimento de Christian sobre a Jennifer Yumi. Ela pode entrar no núcleo dos principais suspeitos... O que não me conformo é que estive perto de saber a verdade... Rony, Laurie ia me contar! Mas não teve força para tanto...
Os dois permaneceram em silêncio por alguns segundos. De repente, Neville Longbottom entrou pelo buraco do retrato, chamando por Harry:
-Harry! Tem um garoto aí fora querendo falar com você.
Harry e Rony se entreolharam, franzindo a testa.
-Um garoto? – indagou Harry, olhando para Neville. – Ele não disse o nome?
-É um tal de Cristóvão... Ou não... Acho que é... – Neville conservava na face um ar de dúvida.
-Christian! – exclamou Harry. – Só pode ser… Obrigado Neville – levantou-se e, rapidamente, passou pela passagem no buraco do retrato.
Christian estava muito aflito. Ao seu lado estava James Smith, com o mesmo ar de agonia. Nas mãos, Christian carregava um livro de anotações de capa lilás. O volume era bem grosso, devido a inúmera quantidade de papéis que o lotavam por dentro.
O dedo indicador de Christian marcava uma página.
-Harry – começou ele, com a voz num tom de perplexidade. – Encontramos esse livro onde a Laurie fazia suas anotações. Estava jogado no corredor que leva à nossa sala comunal...Esparramado... Como se tivesse sido jogado.
-E... Há alguma coisa de importante escrita nele? – perguntou Harry, interessado.
-Sim – respondeu Christian. – A Jennifer abriu quando o encontramos e, enquanto folheava, achou umas páginas escritas com uma letra trêmula... Parece com a letra de Laurie, mas... Como se ela estivesse bastante nervosa ao escrever.
-Intrigante... – murmurou Harry, pensativo.
-Lembra que eu lhe disse como ela andava nervosa, falando sozinha? – indagou James. – Ela parecia estar sendo ameaçada por algo, perseguida, não sei explicar... Leia pra ver!
Christian passou o volume para Harry. O garoto colocou o dedo na mesma página que Christian marcava e abriu, com o coração disparado.
A letra era um verdadeiro garrancho. Notava-se claramente que fora escrita por mãos trêmulas. Harry forçou a vista e concentrou-se para tentar ler.
Alguém está me vigiando... Tenho certeza. Não quero contar pra ninguém. Eu sei que, se contar para um dos meus amigos, eles pensarão que estou doida... Mas estou sendo vigiada mesmo. Olho para todos os lados nos corredores, quando estou sozinha, mas não vejo nada! Será que estou mesmo doida? Não pode ser... Sei que estou sendo vigiada. Tem alguém atrás de mim. Será Padma? Será que, para não me pagar, ela esteja querendo me matar? Ah, o que farei? Posso ser morta em qualquer momento por essa pessoa que está me perseguindo. Será que ele não está me espionando agora, neste exato momento? Como saber? Estou sendo vigiada... Estou com medo... Medo....
Harry olhou para Christian, como perguntando se havia mais coisa. Christian percebeu o que o garoto iria perguntar, e fez um sinal para que Harry virasse a página.
Mais uma vez, a caligrafia tremida e irregular. Harry forçou sua mente e conseguiu ler:
Agora há pouco Harry intrometeu-se e descobriu que eu fiz a chantagem com a Padma. Quer dizer, só confirmou, pois ele já estava desconfiado. Era só o que faltava. Padma poderá me matar agora. Ficará furiosa e virá me matar, mais cedo ou mais tarde. Tenho certeza de que ela é a assassina. Vinha me observando para certificar-se de que eu ficaria com a boca fechada. Passei por um apuro nos corredores... Despedi-me de Harry e me senti vigiada novamente. Quando dobrei um corredor, vi uma sombra... Horrível! Corri muito e consegui me safar. Estou aqui, debaixo das cobertas, torcendo para que Padma não venha até aqui. Não posso morrer... Não quero morrer....
-Tem mais – falou Christian, quando notou que Harry tinha terminado a esforçada leitura.
A outra folha estava amarrotada, e com uma letra muito pior.
Todos estão se divertindo. Estão com a tarde livre. Mas eu não posso me alegrar. Estou sendo perseguida. Talvez eu morra... Ele está me espionando... Agora mesmo. Estou com me....
O “e” que se formava no final terminava com um risco. Laurie não terminara a palavra. Provavelmente, seu perseguidor se revelara naquele instante.
Harry fechou o livro de anotações e pensou. Laurie conseguira escapar desse ataque, jogando o caderno longe, devido ao pânico. Ele caíra no lugar em que Jennifer o achara. Pelo que Laurie dizia, isso havia ocorrido durante à tarde. Foi o tempo que ela sumiu e os amigos a ficaram procurando. Quando ela finalmente apareceu, foi para entrar no meio da multidão que tumultuava o Saguão, sentindo-se segura. Não esperava que a morte viria voando pelo ar na forma de um dardo com a agulha cheia de veneno.
Olhou agradecido para Christian e James, embora isso não revelasse alguma pista para ele chegar ao assassino. A única informação era o aumento da probabilidade de culpa de Padma Patil, segundo as palavras da própria vítima.
-Obrigado, Christian, James... Não havia mais nada no local?
-Sim – respondeu Christian. – Claro que não viríamos com tanta urgência se não houvesse mais nada de intrigante. E é no próprio caderno de anotações... Abra na última folha.
Harry abriu. Com a mesma tinta que Laurie escrevera a última anotação, estavam as terríveis iniciais do assassino, acompanhadas do círculo rodeado com os desenhos.
-Não acredito que o criminoso...
-Não foi ele, Harry – interrompeu-o Christian. – Olhe novamente. Compare o M.E. com a letra de Laurie das outras páginas.
Harry comparou, intrigado. Para sua surpresa, era a mesma caligrafia. Harry olhou novamente para o círculo. Como Laurie saberia exatamente qual era o desenho do assassino?
Ao lado de um dos desenhos – que, apesar de ser um rascunho, Harry identificou como uma espécie de cristal – havia uma seta, acompanhada das palavras “Tia Marie”.
-Tia Marie? – perguntou Harry, mais para si mesmo do que para qualquer um dos outros.
-Também não entendi nada – falou Christian.
-Ela não tinha nenhuma tia Marie?
-Que eu me lembre, ela nunca falou sobre ela – respondeu Chris. – Aliás, é muito estranho ela nunca ter comentado...
-Será que eu não posso ficar com esse caderno, pelo menos por hoje à noite? – perguntou Harry, ansioso. – Para poder examinar melhor essa pista.
-Claro – concordou Christian. – Não vejo problema algum. Pode ficar com ele até mais tempo, se quiser.
-Valeu mesmo! – exclamou Harry. – Vocês não imaginam o valor que isso pode ter para solucionarmos o caso. Até amanhã, Christian. Até amanhã, James.
Os garotos se despediram e Harry entrou ansiosamente no salão comunal, segurando o caderno de Laurie nas mãos. Foi até a mesa onde Rony ainda o aguardava. Rony olhou do rosto de ansiedade de Harry para o caderno grosso que o amigo tinha nas mãos.
-O que é isso? – perguntou, intrigado.
-Uma boa pista. Afinal, não tínhamos absolutamente nenhuma. Isso já é, portanto, um enorme passo. O problema será decifrarmos o que ela quis dizer...
-Quem?
-Laurie Sawyer.
-A que morreu? – indagou Rony. – Esse caderno era dela e possui uma grande pista?
-Sim. Mas temos que ler bem para entendermos essa pista – Harry verificou a sala comunal. Além deles, havia uns alunos do segundo ano em um canto, fazendo deveres, e Gina, que estava calada, em frente à lareira, olhando para o fogo. Após a verificação, abriu o volume para o amigo, sentando-se ao lado dele. – Está aqui, nessas últimas páginas. Mas antes, deixe eu lhe contar como eles acharam esse caderno.
Harry relatou para Rony tudo o que Christian lhe disse, e sua conclusão ao rever em pensamento tudo o que teria acontecido.
-Coitada – suspirou Rony ao fim. – Achou que estava segura no meio da multidão. Nunca iria imaginar que aquele dardo infeliz seria lançado...
-Pois é – limitou-se Harry a dizer. Não via a hora de abrir o caderno. – Será que agora posso te mostrar o que está escrito?
Rony respondeu que sim e Harry abriu nas últimas anotações de Laurie. Rony fez um esforço para ler as letras tremidas. Quando terminou, Harry lhe mostrou a página que mais lhe interessava e intrigava.
-Veja só. Ela desenhou o círculo que o assassino sempre desenha, com os mesmos desenhos em volta. E, repare bem, ao lado desse, que se assemelha a um cristal, ela fez uma seta, que leva ao nome de “Tia Marie”. Estranho não? Como Laurie saberia o símbolo do assassino, exatamente como ele é desenhado? E o que significa essa seta vindo do cristal? Quem é Tia Marie?
Rony tinha o olhar intrigado.
-Sei lá... – murmurou. – É muito difícil de entender... E tem essa seta aqui saindo do cristal... Como assim? O que a tal de Tia Marie tem a ver com o cristal?
-Não sei. Temos que pensar muito – falou Harry. – Quem sabe, nas outras páginas, não encontramos algo sobre essa tal de Tia Marie? Não vai ser difícil – começou a folhear as páginas. – Ela fazia nesse caderno anotações escolares... Só são algumas as observações sobre sua vida. Se tiver algo sobre essa tia Marie, encontraremos facilmente.
Os minutos se passaram. Logo, só havia os dois na sala comunal, e Gina Weasley que ainda encarava o fogo, pensativa.
Harry e Rony examinaram cada folha, a partir do início. Liam somente as que Laurie relatava algum acontecimento importante. Perceberam que ela falava sobre essa Tia Marie, sempre a elogiando, mas nunca escrevendo algo que os ajudasse. O que teria a tia de Laurie a ver com o círculo do assassino?
Harry terminou de ler mais uma folha e desanimou.
-Que droga, Rony! – resmungou – Parece que, por mais que lemos, nada aparece! Pensei tanto que isso fosse nos ajudar de alguma forma...
-E acho que pode – falou Rony, que lia uma página. – Olhe só isso, Harry.
Harry adiantou-se e leu, embora não esperasse nada de interessante. Para sua surpresa, embora não respondesse às suas perguntas, era algo de grande interesse.
O dedo de Rony indicava um trecho, escrito com a caligrafia normal de Laurie:
Tia Marie tem um estilo próprio. Ela é incrível. É muito bom ter minha tia como professora. Pena não poder dizer aos meus amigos que ela é minha tia. Não sei porquê ela me pede para ficar quieta. Por que ela quer tanto esconder isso? Às vezes acho que tem algum motivo. Seria medo de alguém? Pode ser. Acho que tem algo aqui que a deixa apavorada. Muito estranho! Mas o importante é que ela é minha professora. O difícil será parar de chamá-la de Tia Marie.
-Está vendo... Até que pegar esse caderno de anotações não foi tão infrutífero assim – falou Rony, quando Harry levantou os olhos da folha.
-Então Tia Marie é uma das professoras – murmurou Harry. – Uma professora que não queria que ninguém soubesse que Laurie era sua sobrinha, que parecia ter medo de alguém... Uma professora que sabe que há uma ameaça aqui dentro... Ou seja, sabe da existência de Michael Evans.
-Mas que tem outro nome – falou Rony. – Se Laurie diz aqui que seria difícil parar de chamar a tia de Tia Marie, é porque ela usa outro nome e sobrenome...
-Quem será Rony?
-Temos muitas professoras aqui... Pode ser qualquer uma. O curioso é ver que, se ela não queria que Laurie dissesse ser sua sobrinha, ela também tinha medo de que a garota pudesse ser atingida.
-E realmente foi – suspirou Harry, dando um grande bocejo.
-Melhor irmos dormir – falou Rony, coçando os olhos. – Está muito tarde. E acho que não encontraremos mais nada nesse caderno de anotações...
-Depois irei ler melhor – disse Harry. – Vamos subir?
Rony confirmou com a cabeça. Somente quando se levantaram de suas cadeiras foi que os dois viram que havia mais alguém na sala comunal até esse momento. Gina Weasley parecia hipnotizada, olhando para o fogo, pensando. Harry suspirou. Era mais do que compreensível. Fora muito duro o golpe que a garota levara.
Devia se sentir responsável pela desgraça que vinha ocorrendo na família devido ao flagrante em Hogsmeade. Vira seu romance, que queria que permanecesse secreto, tornar-se público. E seu nome foi publicado por causa de sua antiga amiga Hermione Granger.
Harry e Rony se entreolharam. Harry colocou a mão sobre o ombro do amigo e pediu-lhe, em voz baixa:
-Por favor, Rony, suba. Preciso ter uma conversa com a sua irmã.
Rony, que confiava inteiramente no amigo, balançou a cabeça em sinal afirmativo e subiu as escadas que levavam aos dormitórios. Harry olhou para a garota e, calmamente, dirigiu-se até ela.
Harry fitou-a por alguns instantes. Pelo mesmo motivo que parecera desconhecido em alguns dias atrás, ele sentiu necessidade de confortar a garota. Sentiu que precisava consola-la.
Somente depois de alguns minutos, Gina levantou a cabeça, tirando os olhos do fogo e encarando os olhos verdes de Harry.
-Desculpe vir lhe incomodar Gina, mas... É que fiquei vendo você lá da mesa. Eu estava lá com seu irmão... E aí, vi você e senti que precisava de ajuda.
Gina, que tinha os olhos vermelhos de tantas lágrimas, respirou fundo e respondeu:
-Eu estraguei tudo, Harry... Por mais que me ofereçam ajuda, como a Úrsula já ofereceu emprego para meu pai e meus irmãos, eu sei que estraguei tudo. O emprego eles podem conseguir, mas e a minha reputação? Bruxos de vários países viram eu com o Draco...
Harry sentiu um acesso de fúria tomar-lhe o corpo. Concentrou-se, mantendo a calma. Por que ficara furioso dessa forma?
-Então por que se envolveu com ele? – perguntou, mantendo a voz amena.
-Será que não dá pra entender? – Gina voltou a chorar. – Draco me deu atenção, carinho... Eu estou gostando dele.
O acesso de fúria veio com tanta força que Harry não conseguiu se controlar. Levantou-se da poltrona em que estava sentado e começou a despejar tudo o que vinha em sua mente, descontrolado:
-Gostando dele? Ele é da Sonserina, filho de um Comensal foragido de Azkaban! Como pode gostar dele? Não pensou nas conseqüências que isso poderia trazer?
Gina pareceu chocada com a atitude de Harry. Também se enfureceu e começou a vociferar:
-O que você tem a ver com a minha vida, Harry? Eu não tenho culpa. Ninguém manda nos sentimentos. Não tenho culpa se comecei a gostar do Draco.
-Tem sim! – exclamou Harry, nervoso. As palavras saíam sem que ele nem pensasse no que ia dizer. – Tinha que ter se controlado. E, sinceramente, você acha que o Draco gosta mesmo de você? Ele só quer brincar com você, tirar sarro da sua cara.
-Por que acha isso? – perguntou Gina com a voz fraca. – Quer dizer que você acha que ninguém pode me amar de verdade? Eu sou feia é isso?
Harry, finalmente, suspirou. Após alguns instantes, falou:
-Não quis dizer isso.
-Quis sim! – berrou Gina. – Você sempre me achou uma garota horrível, mas isso não quer dizer que outra pessoa possa gostar de mim de verdade.
-Eu não disse que você é feia – falou Harry, calmamente. – Você é linda.
Engoliu em seco. De onde saíra aquelas palavras? Pareciam ter surgido do nada... O que estava acontecendo com ele?
-Eu... vou... subir – disse Harry, quase engasgando. – Já lhe avisei: abre o olho com o Malfoy e...
Gina o olhava, boquiaberta. Não podia acreditar. Ouvira mesmo Harry dizer que ela era linda?
-O que você tinha dito mesmo? – perguntou ela, incrédula.
-Eu disse? – disfarçou Harry, olhando para o chão. – Eu... O que? O que eu disse? Que o Malfoy não presta? Mas é a mais pura verdade...
-Não – interrompeu-o Gina. – Você disse que eu era...
-Era o que? Eu não disse nada! Ora, eu vou subir... Boa noite! – encerrou, rispidamente, subindo as escadas com passos fortes.
Gina olhou novamente para o fogo, que aos poucos ia tornando-se pequeninas chamas crepitantes. Sentia aquele fogo queimar-lhe o peito. Sim, ela tinha certeza que ouvira Harry dizer-lhe que a achava linda. Esperou tantos anos para ouvir isso... Queria ouvir mais...
De repente, a figura de Draco apareceu em sua mente. O único garoto que parecia gostar realmente dela. Realmente estava gostando dele, por isso não pensou nas conseqüências que ele poderia causar... Sentiu o mesmo calor no peito. Não podia entender... Os dois faziam seu coração disparar. Draco, Harry... Harry, Draco... Como ela não conseguia entender a si mesma?
* * *
-Devíamos ter acordado mais cedo – resmungava Rony, quando ele e Harry saíam do Salão Principal após o café. – Nem tive tempo de comer direito... Mas foi sua culpa, Harry! Não levantava de jeito nenhum. Ficou examinando o caderno de anotações da Laurie até tarde, não é? Por isso que não conseguiu acordar, não foi? Harry? Harry? Está me ouvindo?
Harry despertou do devaneio com o chamado de Rony:
-O que? Quem? – perguntou, desnorteado.
-Estava no mundo da lua? Pensando em que?
-Em nada, Rony... Nadinha – mentiu.
Estava pensando sim. Na conversa com Gina. Nos impulsos que o levaram a ir consola-la. Nos impulsos que o fizeram enfurecer quando a garota disse que estava gostando de Draco. Nos impulsos que o fizeram dizer que ela era linda.
-Estava perguntando por que você acordou tarde? Ficou examinando o caderno da Laurie, não?
-Claro – mentiu novamente. Na verdade, ficou muito tempo deitado, pensando em Gina. Só dormiu depois de muito tempo. – Mas não encontrei nada de novidade.
-E a sua conversa com a Gina? – indagou Rony, fazendo a pergunta que Harry menos desejava que ele fizesse naquele momento. – O que você queria falar com ela?
Harry pensou numa resposta rápida.
-Nada... Só disse para ela ficar tranqüila. A situação foi grave, não foi?
-É... Mas ninguém mandou ela ficar se esfregando com o Malfoy! – esbravejou Rony. – E também piorou muito por causa da Hermione...
Harry suspirou aliviado. Rony começou a falar um monte de coisas que achava de Hermione, desviando do assunto.
Rony só parou de falar um monte quando Úrsula Hubbard chegou até eles, com um sorriso radiante e os cabelos louros ainda mais brilhantes e encaracolados.
-E então, Rony, está melhor? – perguntou ela, nem ligando para Harry.
-Estou melhorando aos poucos...
-Que bom! – exclamou ela. – Qualquer coisa que precisar, você sabe que pode contar comigo!
-Eu sei – falou Rony. – Você quer falar alguma coisa comigo, Úrsula? Algum assunto em particular? Pode dizer o que for.
Úrsula fingiu um acanhamento.
-Não sei – suspirou. – É que...
-Pode falar! – pediu Rony. – Somos amigos, esqueceu?
-É que... Por favor, Rony, não confunda as coisas! – pediu falsamente. – Eu... Estou precisando que alguém me ajude numa pesquisa. Para Herbologia... A Professora Sprout espalhou uns bichos estranhos pelo gramado. Disse para apanharmos alguns e elaborarmos uma pesquisa. Será que...?
-Se eu posso ajuda-la? Mas é claro! Por que não? Não sou muito bom em Herbologia, mas claro que posso te dar uma forcinha. O Harry também podia te ajudar e...
-Não! – interrompeu Úrsula imediatamente. – É que... Ninguém pode saber que eu estou pedindo ajuda. A professora não iria gostar. É melhor que eu só vá com uma pessoa.
-Então, já que não dá pra ele ir, vou sozinho – disse Rony. – Você vai fazer a pesquisa quando, nessa tarde?
-Quando finalizar as aulas da tarde... Tudo bem pra você? – perguntou, ansiosa, embora essa ansiedade não transparecesse devido seu esforço.
-Tudo ótimo.
-Então, te espero depois da última sineta, no final da escadaria de mármore.
Rony sorriu e afastou-se com Harry. Úrsula irradiou-se de alegria. Seria o primeiro dia de sua conquista. Os dois sozinhos... Tinha que dar certo. Iria com calma. Com cautela.
“Não posso forçar a barra, senão ele percebe que eu já estava afim faz tempo”, pensou, parada no meio do corredor. “Tenho que manter a postura da ‘amiga que, do nada, se apaixonou’”.
Estava satisfeita com os seus pensamentos e a possibilidade de conquistar o seu amado.
-Eu sei o que você fez – sussurrou uma voz no seu ouvido.
Foi como um banho de água fria. Úrsula estremeceu ao ouvir aquela voz, de repente, sussurrando em seu ouvido. A voz que vinha da única pessoa que podia estragar o seu plano.
Úrsula, ainda trêmula, observou o garoto sorridente que se afastava, lançando-lhe olhares furtivos. Rogério Davies parecia ser só satisfação perante o pânico de Úrsula.
* * *
Após a última sineta soar, Rony despediu-se de Harry e foi ao encontro de Úrsula, que o esperava, conforme o combinado, aos pés da escadaria de mármore.
-Demorei? – perguntou Rony.
-Não. Está no horário certo – sorriu a garota. – Vamos?
Os dois passaram pelas portas de entrada e foram até os gramados. Alguns alunos da Professora Sprout também faziam a pesquisa naquele momento. Estavam apressados. O sol já ia se pondo e a permissão para permanecerem nos terrenos estava terminando.
Úrsula, com a varinha nas mãos, caminhava ao lado de Rony, falando sobre diversos assuntos, nem prestando atenção à pesquisa.
-Mal vejo a hora do campeonato de quadribol começar! – falou Úrsula. – Estamos indo muito bem nos últimos anos. Ano passado você deu um show como goleiro, Rony.
-Que nada, no começo era um desastre – comentou o garoto.
-Mas você foi melhorando com o tempo – elogiou Úrsula. – Agora é um ótimo goleiro. Suas defesas são impressionantes.
Rony baixou a cabeça, encabulado pelos elogios. Olhou para o gramado e lembrou-se de que Úrsula estava fazendo uma pesquisa – tinha até se esquecido. Afinal, até aquele momento ela não falara nada em respeito ao trabalho.
-E a sua pesquisa? – perguntou ele. – Logo vai anoitecer e você ainda não começou.
Úrsula sorriu, sem graça. Empolgara-se tanto que esquecera do que realmente viera fazer ali. O que poderia fazer? Rony a deixava assim, embasbacada, perdida no tempo...
-Enquanto conversamos estou atenta, procurando nos gramados – desconversou ela. – Mas até agora não vi nada. Acho que a Sprout espalhou muito bem esses bichos.
-Como eles são? Você não me disse ainda.
-Ah você já deve ter estudado. Os fripinks. São originários da África, e, em algumas épocas, despejam na terra seivas germinantes que originam ervas medicinais.
-Não, nunca os estudei – falou Rony.
-É porque nossa classe conseguiu pegar a estação fértil. Por isso, a matéria foi incluída nos estudos de Herbologia do quarto ano.
-Acho que achei um – apontou Rony, após ver o gramado sob os seus pés tremer.
Os dois abaixaram-se. Rony cutucou o gramado e puxou o bichinho asqueroso. Tinha a pele escamosa, olhos astutos e dentes afiados que tentavam compulsivamente alcançar as mãos de Rony para dar uma boa dentada.
-Que bicho folgado! – exclamou Rony.
-É – murmurou Úrsula, admirando o garoto. – Segure-o bem firme.
Apontou a varinha para o bicho que ainda se mexia, e lançou um feitiço imobilizador. O bicho parou quando o feitiço o atingiu. Úrsula pegou-o das mãos de Rony e jogou-o num pote de vidro. Fechou a tampa, guardou-a no bolso das vestes e levantou-se, olhando, sorridente, para Rony.
-Pronto. Conseguimos – falou, com um sorriso de ponta a ponta.
-Agora podemos ir – falou Rony. Já ia saindo quando sentiu a mão de Úrsula interrompendo-o, puxando a manga de suas vestes.
-Espere um pouco – pediu Úrsula.
-Por quê? – estranhou o garoto. – Nós já pegamos o que queríamos.
Úrsula pensou um pouco. Não podia ser direta. Tinha que ir calmamente... Inventou rapidamente uma boa desculpa:
-É que... Essa noite promete. O clima está frio, mas, se sentarmos um bem juntinho do outro, poderemos nos esquentar.
-É melhor entrarmos Úrsula – opinou Rony. – O castelo está um perigo. Esses assassinatos todos... Não podemos ficar dando bandeira aqui fora. E a última coisa que eu quero é que algo de ruim lhe aconteça.
Úrsula derreteu-se ao ouvir aquelas palavras. Ele se preocupava com ela. Já devia estar gostando dela... Não demoraria muito e os dois estariam namorando. Ela tinha certeza.
Contentou-se com o que ouviu e disse:
-Acho que tem razão. Mas seria muito bom podermos ficar conversando aqui, aproveitando a noite.
Rony sorriu e os dois se encaminharam para o castelo. No Saguão de Entrada, Úrsula separou-se de Rony, que ia jantar no Salão Principal.
-Descerei mais tarde – falou a garota. – Vou subir e guardar o bicho. Até logo, Rony.
Rony dirigiu-se até as portas do Salão Principal. Úrsula o observou, suspirando. Finalmente pôde exprimir seus sentimentos. Um calor delirante saía de cada poro do seu corpo. Sorriu. Felicidade... Vitória... Tudo se misturava dentro do seu peito.
-Eu vou acabar com a sua felicidade...
A mesma voz. A voz que vinha atormentá-la. O mesmo sussurro em seu ouvido. A mesma voz grave. Rogério Davies viera atormentá-la novamente.
O garoto já ia subindo a escadaria de mármore quando Úrsula o chamou. Ele atendeu ao chamado, indo em direção a garota com o mesmo sorriso desdenhoso.
-Por favor, esqueça tudo o que você sabe – implorou Úrsula, suplicante. – Esqueça. Não estrague tudo o que eu fiz para chegar até onde cheguei...
-Eu não quero estragar – respondeu Rogério. – Só quero que aceite a minha proposta. Mas você se recusa até em ouvi-la.
Rogério lhe lançou outro sorriso e começou a subir os degraus, murmurando:
-Eu sei de tudo... Tudo...
Úrsula o acompanhou com o olhar. Agora, a felicidade e a vitória que se misturavam em seu peito deram lugar ao medo de perder Rony para sempre.
A garota virou-se e começou a subir a escadaria. Hermione, que disfarçava em um canto, olhava-a agora com as sobrancelhas franzidas, e um olhar inteiramente intrigado.
Quando chegara, ela vira Rogério sussurrando alguma coisa para Úrsula. Ela parecia estremecer a cada nova palavra do garoto. Quando Rogério saiu, Hermione percebera claramente o desdém que fluía do sorriso do rapaz. Já do lado de Úrsula, o pânico também era facilmente percebido.
O que Rogério dissera para Úrsula que a deixara com tanto medo assim? Hermione subiu a escadaria de mármore. Iria dormir. Mas sabia que não pegaria no sono tão facilmente. Seu cérebro empenhava-se em pensar o que a conversa entre aqueles dois queria dizer.
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