Resgatando o Passado
Capitulo III
Resgatando o passado
Algumas horas depois, Angel foi chamada no quarto de John pelo enfermeiro da noite. Paciente rebelde.
- O que houve James?
- Ele não me permite fazer os procedimentos! –reclamou James, o enfermeiro - Gritou o tempo todo, e está bastante agitado!
Angel não disse nada, apenas aproximou-se de John e pegou sua mão.
– John, esse é o James. Você pode confiar nele, ele vai te ajudar enquanto estiver aqui. James, esse é o John, que não vai mais ter esse tipo de comportamento, não é?
O garoto não respondeu. Não querendo mais confusão, Angel se sentou na cama, ficando entre o paciente e James, que fazia curativos no abdômen do garoto e posicionava melhor a sonda. Angel colocou um termômetro debaixo do braço do garoto e auscultou seu coração enquanto esperava. Estava forte. Bom! Verificou também os cortes na cabeça, cujos pontos já haviam sido retirados e estavam bem cicatrizados. John acompanhava cada movimento da médica, sem nem se importar com o que James fazia.
- Pronto! O material das sondas está normal?
- Sim, doutora, mas ainda sem atividade intestinal. Acho que só amanhã.
- Assim espero! Quero retirar a urinária amanhã cedo, e também tirar ele da cama. Obrigada, James! – o enfermeiro não respondeu, apenas acenou com a cabeça antes de sair do quarto, deixando Angel sozinha com seu paciente. A médica sorriu. – Que tal chá e biscoitos?
Draco assentiu aceitaria qualquer coisa para que a médica não fosse embora.
Angel serviu chá em dois pequenos copos plásticos, para acompanhar a refeição de seu misterioso paciente. Com cuidado, alimentou John, que estava até sentindo gosto na comida. Ela sabia que ele não dormiria bem sem uma ajuda, então aplicou um calmante leve no soro depois do chá.
- Agora, você vai dormir. Amanhã cedo eu estarei aqui outra vez e, se tudo der certo, você vai se levantar e tomar café sentado!
Draco sorriu e deixou que ela o acomodasse, e logo deslizou em um sono sem sonhos.
Angel voltou aos seus afazeres. O hospital estava calmo, então ela aproveitou para colocar alguns relatórios em dia e arrumar seu armário. Quando terminou, já se passara mais de uma hora do fim do seu plantão. Resolveu ir para o quarto de John; não tinha a menor vontade de voltar para casa e, de mais a mais, teria que estar no hospital novamente às sete horas, já que queria acompanhar pessoalmente os procedimentos da manhã. Seriam apenas algumas horas de espera. Angel deitou-se na cama ao lado da de John, fechou os olhos e, estranhamente, dormiu.
Acordou pouco antes das sete, com a estranha sensação de que tinha dormido por mais de oito horas seguidas. Apressada, a Dra. Reed correu para o vestiário, tomou um banho e voltou para o quarto, onde John ainda dormia calmamente.
James e Sam chegaram juntos para tirar John da cama. Como no dia anterior, Angel sentou-se na cama e acordou o garoto. Ele abriu os olhos e esboçou um sorriso: a garota desconhecida cumprira sua promessa. Draco se esforçava para compreender o que era tudo aquilo, onde estava e quem era ela, a dona da voz que o resgatava do seu sono todos os dias, mas estava confuso, embora se sentisse seguro cada vez que via os olhos de Angel.
- Bom dia, John! Dormiu bem? – Draco assentiu. Angel viu certa desconfiança nos olhos do rapaz ao olhar para Sam, e isto a fez sorrir. – Este é Sam. Não se preocupe, ele só vai tirar sua sonda.
Draco ainda tinha um pouco de medo. Quando Sam começou a fazer seu trabalho, o loiro instintivamente procurou as mãos protetoras de Angel, apertando-as quando sentiu um leve ardor. Angel se sentiu satisfeita ao ver que tudo deu absolutamente certo, e tinha o maior sorriso do mundo no rosto.
– Agora vamos nos preparar para levantar!
Sam acionou o mecanismo da cama para que Draco ficasse mais sentado. O garoto sentiu-se meio mole; seu corpo inclinou-se para frente e teve que ser amparado por Angel. Draco sentiu seu perfume e ficou mais embriagado ainda.
- John, respira fundo. Essa sensação já vai passar.
Ele não queria que passasse, não queria que ela saísse de perto dele, tinha necessidade da sua presença. Angel pacientemente esperou que ele se recuperasse.
- Você não pode ainda se apoiar com os dois pés no chão, então vai ficar de pé um pouquinho e depois sentar nessa cadeira, ok?
Draco assentiu. Angel e Sam, um de cada lado, ampararam o rapaz, que mais uma vez se sentiu tonto, mas essa vertigem passou mais rápido.
- Agora, você vai para o banheiro tomar banho! Sam e James irão te ajudar, tudo bem?
Draco fez um muxoxo, mas assentiu. Para ele, os enfermeiros demoraram tempo demais, mas era fato que Draco saiu do banheiro com um pouco mais de disposição, barba feita, e mais confortável. Colocaram sua cadeira de rodas de frente a uma pequena mesa, onde Angel servia o café da manhã para ele.
- Obrigada, rapazes! Chamo vocês daqui a pouco para colocá-lo na cama novamente. – Os enfermeiros acenaram e saíram do quarto. Angel estendeu um copo para seu paciente. – Suco de laranja! Você consegue tomar sozinho?
Draco pegou o copo e tremeu ao tentar levá-lo a boca, quase o derrubando.
Angel se adiantou e segurou o copo.
- Não se preocupe isso é normal.
A própria Angel ia levando o copo aos lábios do garoto quando ele a interrompeu.
- Quem... É...? – a voz de Draco saiu rouca e com dificuldade.
- Nossa! Que falta a minha! Não me apresentei! – Angel se repreendeu, mas mesmo assim sorria. O garoto estava se recuperando rápido. - Sou a doutora
Angel Reed, sua médica aqui no Memorial.
- Eu... Sou grato... – Draco falava com certa dificuldade. Depois de seis anos calado, havia quase se esquecido de como falar. – O que a-aconteceu... Comigo?
Angel suspirou.
– Achamos que você foi espancado. Mas por que não come um pouco? Prometo a você que respondo todas as suas perguntas se você se alimentar!
Draco aceitou a ajuda de Angel e bebeu vários goles do suco de laranja, o que deixou a médica satisfeita.
- Você se lembra do seu nome? – perguntou Angel, depois de algum tempo em silêncio.
- Não.
- Posso continuar a te chamar de John, então?
- Sim. – Draco respirou fundo, e sentiu a garganta arder. – Minha... Minha garganta dói...
- Vou ver isso depois que comer. – Angel levou o copo novamente à boca do rapaz, e depois um pouco de mingau. – Sente mais alguma dor?
- Não... “Só quando você vai embora”, completou o loiro, em pensamento.
Quando o café da manhã terminou, Angel chamou os enfermeiros, que colocaram Draco de volta na cama, e então foi para seu plantão.
Os dias se arrastaram lentos. O braço de Draco se recuperou, seu cabelo começou a crescer novamente, e ele até ganhou algum peso, pois percebeu que deixava sua médica mais feliz quando comia bem e, estranhamente, gostava de vê-la feliz.
Os progressos de Draco eram acompanhados de perto pelos olhos atentos de Harry e Ginny, que aparecia de vez em quando no hospital. Num desses dias, a ruiva encontrou Angel enquanto a médica almoçava no quarto com Draco. A reação do garoto foi forte, uma dor de cabeça intensa, alguma coisa que parecia rasgar seu cérebro.
- John, olha pra mim! – Angel segurava o garoto pelos ombros e quase o chacoalhava. – John! Você precisa me ouvir! Relaxa! Tem que se acalmar!
Draco desmaiou.
– Ginny, por favor, aperta a campainha! – a ruiva obedeceu de pronto, então Angel se dedicou a acordar seu paciente – John! Acorda, vamos! Não é hora de dormir!
Angel segurava Draco, e agora sussurrava pra ele algo que Ginny não conseguia ouvir direito, mas que fez a ruiva perceber que a Dra. Reed cuidava de seu paciente com algo além de profissionalismo. Ginny chegou perto, pensando se poderia ajudar Angel, que tentava equilibrar o desfalecido Draco. O que será que acontecera? Ginny não era inimiga de Draco, nem nunca lhe fez qualquer mal. Então, o que havia acontecido? Ela já havia visitado Draco antes, no Saint Mungus, e ele nem notara sua presença! Por que aquilo agora?
Os enfermeiros chegaram e colocaram Malfoy de volta na cama. Angel fez alguns exames rápidos e constatou que tudo estava bem: foi só um susto. Ginny havia despertado algo na memória do rapaz, com certeza.
- Eu sinto muito, Angel! – desculpou-se a ruiva - Se soubesse, não teria entrado.
- Tudo bem, Ginny. Você não tinha como saber, nem eu saberia! – Angel deu um suspiro longo - Vou pedir ao psiquiatra que re-avalie o caso.
Alguns minutos de silêncio se passaram até Ginny dizer, hesitante:
- Angel... Você disse que estão para dar alta para John, e que ele não tem pra onde ir, então... Bem, vim te propor um passeio. Eu mandei limpar o Solar Reed, e ele está habitável. Por que não traz John? Mamãe, Harry e eu estaremos lá pra te ajudar! Nossa casa é perto, e...
Ginny parou, preocupada com a reação de Angel, que tinha uma expressão de pura surpresa.
- Nossa... Gin, querida, como você pode ser assim?
- Assim como? Atrevida?
- Não! Amiga! – Angel estava radiante com a idéia – Vou, sim, desde que você e sua família fiquem no solar comigo, é claro! Serão meus convidados! Ah! E pode contratar uma boa criada, eu não quero fazer nada por um bom tempo! E nem você!
- Nossa! – Ginny respirou mais aliviada - Por um momento pensei que você iria me estuporar... Digo me nocautear!
- Claro que não! E, já que vamos para o Solar, acho que vou tirar uns dias de folga, tenho férias vencidas... A Lils vai conosco também, não?
- Ela vai incomodar...
- Nem termine sua frase, Ginny! – Angel forçou uma indignação que se tornou quase súplica - Eu adoro aquela garota, e você sabe disso! Estou morta de saudades dela!
- Ok, ok! – Ginny assentiu - Depois não diga que não avisei!
As duas moças riram.
- Então, está combinado! – a Dra. Reed se espreguiçou, mas se endireitou rápido. - Por que não saímos juntas amanhã, lá pelas três horas da tarde? Podemos nos encontrar aqui mesmo, no hospital! Eu tenho assuntos a resolver aqui, e acho que consigo terminar a tempo!
- Será bom você respirar outros ares! Combinado!
Ginny saiu antes que Angel conseguisse reanimar Malfoy.
- Olá! – ela sorriu para o garoto quando este abriu os olhos cinzentos. – Você me deu um belo susto! O que foi? Lembrou-se de alguma coisa?
- Não sei... – respondeu Draco, ainda tonto - Vi uma cena na minha cabeça... Tinha uma ruiva, ela corria perigo e eu não tive escolha... Eu chamei a atenção dos perseguidores dela, e fui aprisionado... Dor... Muita dor... - Draco suava frio, e Angel carinhosamente o tomou nos braços. - Eu não podia deixar que ela fosse capturada...
- Shiiiiii! – Angel o abraçava com força, consolando-o - Tá tudo bem agora, John, vai ficar tudo bem... Acalme-se, ou terei que te dar um calmante, e você terá que ficar mais um dia aqui!
- Não... Entendo...
- Estou te dando alta.
Draco se soltou do abraço de Angel e encarou-a com certa agonia.
- Não tenho... Não sei pra onde ir...
- Mas eu sei! – Angel sorria com todos os dentes - Vamos pra Isle of Wigth, passar um final de semana com Ginny e sua família! Mas não vai ficar bem se você tiver outro ataque quando a vir novamente...
Draco não respondeu. Estava com lágrimas nos olhos; por um momento, pensou que ficaria sem seu anjo.
- O quê? – zombou Angel, brincalhona - Você pensou que ficaria livre de mim, é?
- Não... Claro que não, eu... Não consigo... Imaginar você longe de... De mim, eu... Eu...
O loiro se calou e abraçou Angel com força, como se pudesse prendê-la pelo resto da vida com aquele gesto. Angel percebeu que havia algo ali, mas sequer podia conceber que estava perdida por aqueles olhos cinzentos prestes a desabar em tempestade.
- Tudo bem, eu... Eu entendi. Estou confusa para tratar desse assunto agora, mas... Mas você poderia me dar a honra de sua presença amanhã cedo para a viagem, John?
Angel também tinha lágrimas nos olhos, que Draco limpou com os polegares e então, delicadamente, colou seus lábios aos dela. Ela aceitou o toque, e ele não aprofundou o beijo. Temia assustá-la. Quando se separaram novamente, um silêncio constrangido pesou entre o casal.
- Sim. – respondeu Draco, sem saber exatamente o que dizer. - Já que não tenho nada melhor pra fazer, mesmo, eu te acompanho. Prometo não surtar novamente com a visão da ruiva!
Angel estava corada e constrangida com o beijo, então se afastou e saiu do quarto, deixando um vazio frio entre os braços de Draco. Enquanto vagava pelos corredores do hospital, a médica percebeu que estava apaixonada pelo desconhecido, e que não queria lutar contra isso. Tudo era tão difícil naquele momento! Definitivamente precisava de folga. Decidida, Angel foi até a sala do diretor.
- Obrigada por me receber. – disse a médica, entrando na sala do Dr. Oliver. – Eu preciso de alguns dias de licença.
- Ah, é claro... Você deve estar cansada, com saudades do Solar... E não me faça essa cara de “como ele sabe disso”! – Oliver rolou os olhos, zombeteiro, ao imitar o tom de voz de Angel. A garota sorriu, sacudindo a cabeça. – Mas quem vai cuidar do “passarinho com a asa quebrada”? Ou será perna?
- Bem... Er...
- Desembucha Reed!
Angel soltou as palavras de uma só vez:
- Ele vai comigo!
- Pelos deuses! – Oliver caiu no encosto da cadeira – Você enlouqueceu garota?
- Não, Oliver... Ginny, aquela moça ruiva que veio me visitar, vai comigo, e toda a família dela também, e... Não se preocupe, estarei segura! Não se preocupe!
- Me preocupar? E por que eu deveria? – O velho se levantou e foi até a janela, encarando a neve que caía.
- Sim, por quê?
- Talvez por que eu a tenho como minha quarta neta, e te amo?
Angel corou. Ela não esperava aquilo. Sempre sentiu mesmo que Oliver a protegia, que tinha carinho por ela, mas não estava preparada para aquilo. Duas lágrimas fugiram dos olhos de Angel, e então, como uma criança, a médica dependurou no pescoço do velho diretor e enterrou o rosto em seu peito. Oliver a abraçou com carinho, depois ergueu seu rosto, e limpou suas lágrimas.
- Diga ao seu “paciente” que, se ele te fizer infeliz, o vovô aqui vai cuidar pra que ele volte pra rua!
- Está bem! – Angel limpou mais lágrimas do rosto - Eu vou dizer que arrumei um avô pra lá de ciumento!
- E tenho dito!
Ambos riram.
Angel saiu da sala do diretor e do hospital com o ânimo redobrado. Tinha a intenção de ir direto para seu apartamento, arrumar as malas para a viagem, quando se lembrou de um pequeno detalhe: John não tinha roupas. Assim, Angel saiu às pressas para pegar alguma loja masculina aberta. Compraria qualquer coisa pra que pudessem viajar e depois, com mais calma, levaria John para escolher suas próprias roupas.
Optou por calças jeans e camiseta, um suéter confortável e um, sobretudo, afinal, estavam no inverno. O clima da ilha era um pouco mais ameno, lá ainda não havia nevado, mas já deveria estar bem frio. Angel comprou tudo que ele pudesse precisar, já que não havia nada na casa, e aproveitou para passar no supermercado também.
Quando voltou para casa, Angel estava exausta, mas muito feliz, e acabou por dormir demais e quase perder a hora. Ainda tinha muitos assuntos a fechar no hospital naquela manhã, que já estava pela metade quando acordou. Levou para o carro os últimos itens que levaria para o solar e foi para o hospital.
Recebeu os Potter pessoalmente na recepção do hospital quando chegaram, e Lils correu para seus braços! A ligação entre Angel e a pequena Potter era flagrante, já se amavam desde a primeira vez. Harry percebeu e sentiu uma pontinha de ciúmes da filha; com certeza não seria o centro das atenções no final de semana. E ainda tinha Draco Malfoy. Mais um problema a se resolver!
- Desculpem! Estou muito atrasada, e ainda tenho que ajudar John a se vestir! – começou Angel, pondo Lily no chão – Ontem eu me dei conta de que ele não tinha nada pra usar, tive que sair correndo pra comprar alguma coisa!
- Não tem problema! – Ginny sorriu - Nós vamos esperar por vocês aqui na recepção.
- Eu já volto!
Angel correu para o quarto, ainda não havia encontrado com o garoto naquele dia. Encontrou John sentado na cadeira, de cara fechada, com Sam ao seu lado, tentando fazer com que o rapaz comesse o lanche da tarde. A médica queria rir da cena, mas se conteve.
- O que temos aqui? Alguém de mau humor, Sam?
- Eu desisto! – Sam ergueu-se da cadeira em clara desistência. - Ele é todo seu, doutora! Conseguimos fazer com que tomasse banho, e o forçamos a engolir a medicação da tarde, mas ele se recusa a comer!
- Espere Sam! – Angel segurou o enfermeiro antes que ele saísse para o
corredor - Eu trouxe roupas para ele, pode ajudar a vesti-lo? Espero ter acertado o tamanho.
- Se o mimadinho aí deixar...
Draco lançou um olhar homicida ao enfermeiro.
- Ele vai colaborar, sim, pois já estamos atrasados. Não é, John? Nossos amigos já estão lá fora!
Dito isso, Angel fez com que Draco se levantasse e fosse para o banheiro, seguido de Sam, de onde saiu já completamente vestido. Angel sorriu; ele estava lindo sem aquelas camisolas do hospital. Em um silêncio quase ofendido, o garoto sentou-se e engoliu o lanche da tarde sem reclamar.
- Terminei! – resmungou o loirinho, largando os talheres na mesa - Satisfeitos?
- Sim, sim, sim, agora, vamos!
Draco foi colocado em uma cadeira de rodas, que Angel empurrou para fora do hospital. Draco precisou de todo seu autocontrole para não surtar quando viu a cicatriz de Harry Potter. Angel percebeu. “Definitivamente existe algo de errado com vocês três. Ou comigo! Eu estou enlouquecendo, mesmo”, pensou Angel, sacudindo a cabeça. Ao olhar para cima, Angel viu doutor Oliver acenar para ela da janela de seu escritório, sorrindo, e sentiu-se aliviada e amada.
- Podemos ir? – chamou Harry, impaciente.
- Sim, vamos! Me ajude a colocar John no carro, Harry, por favor!
Angel percebeu que John rolou os olhos ao ser levado para o carro com ajuda de Harry. Quando finalmente ganharam a estrada, Angel quebrou o silêncio:
- Pensei que estivesse feliz por sair do hospital.
- É claro que estou! – Draco esboçou um sorriso.
- Não parece. – Angel fez cara de manha – Você está de cara fechada desde que cheguei...
- Ah! Meu Merlin! Eu... Me perdoe, sim? Você demorou tanto que cheguei a pensar que tinha desistido de mim. E aquele Potter...
- Você o conhece?
- Não, mas não fui com a cara dele!
Angel sacudiu a cabeça, risonha.
- Como assim? Você nem o conhece, John! E, aliás, o que tem Merlin a ver com isso?
- Merlin? Não sei... -Draco coçou o próprio queixo em dúvida – Olha, eu estou confuso e não quero que você fique magoada comigo. Eu até já gosto do testa-rachada, e...
Draco interrompeu sua fala imediatamente, pois mais um flash violento assaltou sua mente. Ele trincou os dentes, tentando conter o gemido de dor. Angel parou o carro de repente, já se arrependendo de ter tirado o rapaz do hospital, e viu o carro dos Potter parar vários metros à frente.
- John, acalme-se! Olha pra mim! John! Tente relaxar!
Angel sabia que era mais uma lembrança. Abraçou o rapaz com força, esperando que a lembrança o abandonasse, e sentiu John agarrar-se forte a ela. Depois de tensos segundos, ele relaxou e perdeu os sentidos, como da primeira vez. Angel respirou fundo, e assustou-se ao ouvir Harry se aproximar, batendo na janela do carro.
- Quer voltar? – inquiriu Potter, vendo o rapaz desacordado no banco do passageiro.
- Não. – respondeu Angel, endireitando John e voltando a sua posição atrás do volante. - Ele vai acordar logo, e ficará tudo bem. Vamos seguir.
Angel dirigia e tentava acordar John ao mesmo tempo. Ele demorou um pouco mais para abrir os olhos dessa vez, mas a voz de Angel foi trazendo sua mente de volta.
- Perdoe-me. – foi a primeira coisa que Draco disse ao acordar. - Eu prometi que iria me controlar...
Angel tinha lágrimas nos olhos.
– Não há como ter controle sobre esse tipo de lembranças, John. Não é culpa sua. Por mais que doa, é a única maneira de recobrar sua memória, e eu não posso fazer nada!
- A não ser estar aqui comigo. –Draco afastou uma mecha dos cabelos de Angel de seu rosto - Não sabe o quão importante é ver seus olhos quando abro os meus.
Angel concentrou-se na estrada para tentar controlar as batidas de seu coração.
- Sente dor? – perguntou a médica, quebrando o silêncio.
- Um pouco. Na cabeça.
Angel remexeu em uma pequena valise, e tirou de lá um vidro de aspirina. John não precisava de muito mais que aquilo. Passou a ele com uma garrafinha de água, que estava do seu lado direito no carro.
- Tome um. – ela disse quase que ordenando. Depois completou, em um tom mais suave: - E me conte o que viu. Ordens médicas!
Draco lhe enviou um olhar sofrido. A lembrança ainda doía, mas, como da primeira vez, fez o que Angel lhe pediu.
- Não sei onde estava. As pessoas corriam gritando coisas que eu não entendia, e o clima era de medo. Estava escuro, a noite era iluminada por flashes de luzes de todas as cores, e havia sabres também... E sangue, e pessoas mortas, e... Eu tinha uma espada na mão e uma varinha na outra, e eu matava pessoas encapuzadas...
Lágrimas começaram a correr pelos olhos do loiro, e Angel interrompeu essa narrativa de pronto. Com certeza não era realmente uma lembrança; se fosse uma guerra de verdade, as armas não seriam sabres e nem raios luminosos. E varinhas! Angel começava a se sentir perseguida por elas. Com carinho, Angel levou a mão esquerda ao rosto de John, e ele capturou a mão dela entre as suas.
- Quer que eu pare o carro?
- Não, meu anjo...
Por mais que quisesse um abraço de Angel, Draco não poderia demonstrar tanta fraqueza assim. Aquelas lágrimas fora de controle já foram estrago suficiente.
Angel levou a mão dele até o rosto e depositou ali um delicado beijo. Draco se sentiu reconfortado e sua dor de cabeça já não incomodava mais. Adormeceu rápido demais para seu gosto, o que provava que ele também não controlava seu sono.
Quando Draco acordou, estavam em uma balsa, fazendo a travessia. A voz de Angel inundava seus sonhos, chamando-o à consciência.
- Vamos, seu dorminhoco, acorde! Eu estou cansada de tanto silêncio!
- Onde estamos? – perguntou o loiro, desorientado. – Ah, Merlin! Eu dormi de novo?
- Sim, você dormiu! – Angel riu – Não se preocupe John! É mais que natural! Você esteve sobre estresse forte, e isto, aliado aos medicamentos que ainda toma, só poderia resultar em um sono pesado desses. Mas o que Merlin tem a ver com isso?
- Merlin?
- Sim, Merlin! Ele se instalou no seu vocabulário há algum tempo, principalmente quando fica preocupado ou nervoso com algo.
- Eu... Eu não sei...
- Não importa! – Angel percebeu que ele não tinha mesmo a resposta – Vamos descer um pouco e apreciar a travessia. Você não tem nenhum problema com barcos, tem?
Draco deu de ombros, e deu um sorriso cansado. Não sabia nada a seu respeito.
– Vamos descobrir agora!
Fora do carro, Angel se colocou ao lado de John, e passou o braço dele pelo seu ombro para apoiá-lo melhor. Draco sentiu o perfume de Angel e teve ímpetos de roubar-lhe um beijo, mas, com o testa-rachada vigiando, de jeito nenhum! Mas talvez aquele tal de Merlin estivesse ao seu lado, pois o casal Potter voltou logo para o carro, carregando uma adormecida Lily.
- Sentiu o que eu senti amor? – perguntou Ginny, em sussurros. Harry ajeitou Lils no banco de trás, e fez uma careta de dúvida.
- Do que estamos falando exatamente, bruxa?
- Do Malfoy e da Angel, seu trasgo!
Harry fechou a porta do carro com o máximo de silêncio possível.
- Vi o que? Que a doninha se deu bem?
- Bruxos! – Ginny sacudiu a cabeça - Eles se amam!
- Só que não avisaram isso pra eles então!
As poucas risadas de Harry morreram diante da expressão da esposa.
- Nossa Harry! Você tem a sensibilidade de um hipogrifo, mesmo!
- Tudo bem, tudo bem. – por experiência, Harry sabia que era melhor não continuar esta discussão. - Agora, falando sério. É coincidência demais Malfoy ser salvo justo pela Dra. Reed! Fora ele voltar a falar depois de seis anos, e não ter mais aquele olhar perdido... Ele realmente recuperou a sanidade, como você disse! E a memória dele voltará logo, não tenho dúvidas.
- É isso que me preocupa, Harry. – a voz de Ginny era pouco mais alta que um sussurro. - E se Malfoy voltar a ser um vegetal?
- Se isso acontecer, vamos ter sérios problemas! Olha aquilo...
Harry apontou para o outro lado do convés, onde estavam Malfoy e Angel, abraçados. Sem conseguir se segurar, Draco depositou um leve beijo nos lábios de Angel, que se derretia a cada toque seu. Como antes, ele se conteve para não assustá-la, mas não foi o bastante para impedir que eles quase perdessem o equilíbrio. Draco se segurou ainda mais forte a garota, que era, naquele momento, sua tábua de salvação, seu porto seguro.
As risadas que ecoaram morreram logo, e reinou um silêncio que não era constrangido, mas calmo e tranqüilo, morno. Malfoy acariciava os cabelos de Angel sem a menor pressa ou pensamentos futuros. Tudo o que existia era Angel, seus cabelos sedosos que esvoaçavam ao vento, seu cheiro de oceano, seu corpo colado ao dele, e um pôr-do-sol magnífico que John não viu, pois estava preso ao misterioso mundo castanho-esverdeado dos olhos de seu doce anjo.
O fim de semana foi bastante agitado, e passou rápido. A presença de Lily dava vida ao Solar, vida que ele nunca teve. A garotinha contagiou até o frio coração de Malfoy, que, para não magoar Angel, tentou ser amigável com aquele Potter testa-rachada. Mas o fim de semana chegou ao fim.
- Gin, querida, você fez um verdadeiro milagre nessa velha casa! - dizia Angel, quando a família Potter arrumava-se para partir da Isla of Wright. - Se John não se opor, vou passar a semana aqui. Por que não vem com Harry e Lils pra cá no próximo final de semana? Traga a senhora Weasley também! Quem sabe seu pai?
Ginny sacudiu a cabeça ruiva com força.
- Não me tente!
- Nós podemos fazer uma noite com queijos, vinhos, fondue...
- Acho que não dá pra resistir, não é mesmo?
- Não fiz o convite pra ser resistido! – Angel sorria largamente - Espero você na sexta-feira, então?
- Sim, combinado! – Ginny abraçou Angel com força em despedida - Me liga pra qualquer emergência, sim?
- Claro! Você é meu anjo-da-guarda!
Lils aprontou um berreiro na porta, pois não queria ir embora. Angel quase pediu para que ela ficasse, mas a garotinha tinha escola no dia seguinte, então não podia intervir. Mas bem que gostaria.
oOo
Agradeço a todos que passaram por aqui e por um motivo ou outro não deixaram seu comentário. eu não tenho bola de cristal (faltei na aula de adivinhações) para saber se estão gostando ou não!!!
Música do capítulo Memories da Within para conferir tem um clip no meu multiply
jinhos da Belle
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