Capitulo II



O pensamento sobre ela começou a tornar-se agradável, mas logo uma voz fria interrompeu os chamados do outro lado da linha, informando:

- Penmadoc Hall.

O forte sotaque galês que reconhecia afastou-o dos pensamentos.

- Oh, olá, aqui é Harry Potter falando. Minha mãe se encontra?

— Harry! — A voz pareceu-lhe mais familiar agora e Eleanor Tenby pareceu-lhe surpreendentemente amigável. – Sua mãe ficará muito satisfeita em falar-lhe. Aguarde um instante enquanto vou chamá-la, sim?

— Obrigado.

Ele não fez questão de detê-la ao telefone para trocarem mais do que aquelas palavras, embora não fosse comum para a tia de Gina, apelidada de Nell pela família, mostrar qualquer tipo de consideração em relação a ele ou a sua mãe. Não fosse pelo fato de ser irmã de Molly Weasley e de Penmadoc Hall ter sido sempre seu lar, Lilian já a teria expulsado de lá havia muito tempo. No entanto, embora Arthur sempre houvesse feito todas as vontades de sua mãe, no que se referia a Eleanor, ele sempre se mantivera firme como uma rocha.

Além do mais, nos últimos tempos, fora muito cômodo para Lilian ter uma governanta tão eficiente, Harry imaginou, irônico. Como a mãe de Laura tivesse ficado doente por vários anos antes de morrer, Eleanor acabara assumindo a direção da casa. Quando Molly falecera e Arthur se casara outra vez, Eleanor mantivera sua posição na mansão. Lilian tentou reagir a isso no início de seu casamento, mas, como jamais apreciara nada que se referisse ao trabalho doméstico, os afazeres acabaram confiados a Eleanor como já estava sendo feito havia muito tempo.

— Harry? - A voz de sua mãe soou triste do outro lado do fio e, embora estivesse acostumado às atitudes melodramáticas dela, desta vez Lilian pareceu-lhe de fato abalada. Sentia certo tom de histeria que jamais poderia esperar nela e preparou-se para confortá-la da melhor maneira possível.

— Olá, mamãe! — cumprimentou-a, com a costumeira irreverência. Depois acrescentou, mais gentil: — Sinto muito. Acabei de saber sobre Arthur. Você deve estar muito abalada.

— É... De fato, estou. – A resposta dela era trêmula. No entanto, mudou logo: - Mas... por onde andou, Harry? Estou tentando lhe falar há dias!

— Eu sei, Thomas me disse.

— Thomas! – ela repetiu com desdém. – Esse infeliz teve o desplante de me dizer que não sabia onde você estava! Como se te tivesse ido embora sem deixar o endereço de onde poderia ser encontrado!

Harry respirou fundo.

—E não mentia, mamãe. Saí de Singapura esta manhã, mas o avião sofreu um atraso por um problema de motor no Bahain, e logo com o do mau tempo...

—Podia ter chamado a casa.

— Ele não estava mentindo, mãe – explicou, tentando manter a calma. – Deixei Singapura ontem pela manhã, mas o avião teve um sério atraso com problemas em uma das turbinas, em Bahrain, e depois enfrentamos a tempestade de neve...

— Poderia, ao menos, ter telefonado para casa, não? – Ela continuava com o tom repreensivo, implacável. Onde estava a viúva chorosa que ele imaginara encontrar a princípio? Parecia que mais uma vez se enganara...

- E por que eu ligaria? – rebateu Harry, começando a se aborrecer. – Thomas enxerga bem e podia ver muito claramente o problema da nevasca bem diante de si, não acha?

- Está querendo dizer que isso serve para mim também? - A voz dela tornou a ficar trêmula, e Harry imaginou que talvez a morte de seu padrasto houvesse mexido mais com os nervos de Lilian do que poderia supor. Estava mais acostumado a ouvi-la reclamar sobre as desvantagens de estar casada com um homem mais velho, o qual parecia nunca compreender por que ela estava sempre sem dinheiro...

— Não estou querendo dizer nada além do que disse, mãe – explicou, procurando continuar com o tom gentil. – É claro que se eu tivesse sabido sobre Arthur...

— Eu sei, eu sei. – Para seu alívio, Lilian parecia estar sob controle outra vez. – Bem, não parecia haver nada de errado com ele quando você partiu, não é? Como poderíamos imaginar que, em três semanas, ele estaria morto? – A voz dela pareceu fraquejar mais uma vez, mas Lilian conseguiu controlá-la. Você vem para cá, com certeza, não?

— Com certeza. – Harry sabia que não poderia evitar tal transtorno. – Vou comer alguma coisa e logo partirei.

— Ah, graças a Deus! — Ela estava visivelmente aliviada, o que o fez imaginar que, para Lilian, seus sentimentos ou seu estado pouco contavam, desde que ela própria estivesse satisfeita. Mas, como não havia novidade alguma nisso... E ouviu-a acrescentar, em tom definitivo: - Estarei esperando.

Lilian teria desligado nesse ponto da conversa, mas Harry não pôde deixar de perguntar:

— E quanto a Arthur? Como foi que tudo aconteceu?

— Foi um ataque cardíaco – ela resumiu, certamente sem querer prolongar a conversa por telefone. – Dirija com cuidado.

Lilian desligou sem mais uma palavra, e Harry fez o mesmo, pensativo. Um ataque do coração. Pelo que sabia, Arthur jamais sofrera do coração. Mas, o que poderia saber? Nos vinte anos em que sua mãe estivera casada com aquele homem, mal tinham tido tempo para conversarem de fato e tornarem-se amigos. Sempre houvera um grande entendimento entra ambos, mas nada que pudesse ser chamado de amizade.

Queria sabe muitas coisas. Se Gina iria para os funerais do pai, por exemplo. Devia ir, com certeza. Mas ela não voltara para casa quando seu casamento com Dino Thomas fracassara... No entanto, isso fora bem diferente. Ela trabalhava em Nova York e criara sua vida lá... Por que voltaria ao País de Gales quando tinha um excelente trabalho nos Estados Unidos?

Harry franziu a testa, pensativo. Era obvio que Lilian apreciara o fato de Gina não ter voltado para casa naquela época. A última coisa que poderia desejar era que sua enteada retornasse e acabasse fazendo uma aliança com o pai contra ela, já que Gina jamais lhe perdoara por ter substituído sua mãe na vida dele menos de um ano após sua morte.

Harry sabia que sua mãe sempre sentira ciúme do relacionamento harmonioso entre Gina e Arthur.


- Separei algumas roupas limpas em seu quarto, senhor – Thomas explicou, ao reaparecer. Parecia compreender muito bem a expressão pensativa de seu patrão. – Imagino que vá tomar um banho antes de partir? – acrescentou. – Estarei com o café e uma refeição leve prontos assim que descer.

Harry levantou os olhos para vê-lo.

- Quero apenas um sanduíche, Thomas, obrigado – disse. – Comi no avião e não estou com fome. Quanto ao café... bem, você sabe o quanto ele é bem vindo. Sabe se há gasolina suficiente no carro?

- Vai usar o jipe, senhor? – Thomas ergueu as sobrancelhas, em uma expressão que Harry já conhecia muito bem, e à qual respondeu apenas confirmando com um movimento de cabeça. Possuía também um Mercedes, mas o jipe com tração nas quatro rodas era a melhor opção para aquela noite, os dois sabiam. O clima não estava propício para grandes velocidades e poderia piorar conforme chagasse a Severn Bridge. Harry tomou seu banho e, depois de se vestir, notou que a noite já caíra. A tarde curta de inverno cedera lugar a uma noite fria e Harry não estava muito feliz por ter de dirigir até Gales. No andar de baixo, o café prometido estava pronto, e havia um prato de sopa a alguns lanches sobre a mesa.


- Para aquecê-lo, senhor – explicou o mordomo, olhando para o prato com expressão de desculpas.

Os aposentos do criado ficavam na parte de baixo da casa, onde também ficava o quarto escuro de revelação fotográfica de Harry e, nas noites quentes de verão, Thomas muitas vezes servia o jantar no pequeno jardim que ficava nos fundos da casa. Naquela noite, porém, o pátio parecia apenas ser uma mancha mais clara, coberta de neve, em meio ao negrume geral. E, através das janelas da cozinha, a visão dele chegava a ser romântica.


O telefone tornou tocar enquanto Harry tomava a sopa e, desta vez, o mordomo não hesitou em atendê-lo.

—É a srta. Chang — informou, cobrindo o fone com a mão enluvada – Pretende falar com ela, senhor, ou devo dizer que já partiu?

— Dizer uma mentira assim?! – Harry protestou com sarcasmo. Depois, sorrindo, estendeu a mão para pegar o aparelho. – Eu falo com ela. – Imaginava que deveria dar uma satisfação à Cho sobre onde iria estar nos próximos dias. – Como está, querida? Que bom ouvir sua voz! Sentiu saudade? – Ele a ouviu falar e ergue as sobrancelhas, notando que também a namorada estava aborrecida com ele.

- Bem, esperei que me ligasse a tarde toda! Liguei para o aeroporto e de lá me informaram sobre o atraso do vôo, mas...

- Cheguei há apenas meia hora, querida! Eu ia ligar para você, mas, bem... algumas coisas aconteceram...

- Que coisas? – Ela estava furiosa.

Continua [...]

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.