XXIV
Em seu apartamento no Greenwich Village, Gina sentava-se junto à janela e observava o parque do outro lado da rua. Era quase noite e tudo estava praticamente deserto. Ela bebericou o café que tinha na caneca entre as mãos e prestou atenção às copas altas das árvores. Apesar da beleza da paisagem, aquela era a parte do dia de que menos gostava. Sempre preferira as manhãs.
Já fazia quatro meses que voltara de Gales, e seu chefe estava sendo muito gentil com ela nesse tempo. Gina suspeitava de que fosse devido ao seu excelente trabalho, nada mais, mas era sempre bom sentir-se necessária.
Lembrou-se do telefonema que dera havia três dias e sentiu-se um tanto culpada. Sabia que estava cometendo um erro estúpido ao ligar para Harry, mas assim mesmo o fizera. No entanto, como era de se esperar, ele não estava em casa, e Thomas explicara que ele estava na Espanha, fotografando touros para uma mostra da cultura espanhola que aconteceria em Londres em poucos meses. Gina não deixara recado algum, mas chorara muito assim que desligara o telefone, o que vinha provar que ainda sentia algo por Harry. Algo muito forte.
Estava ansiosa como se estivesse sempre à espera de notícias dele, mas elas nunca chegavam... Soubera, pelos jornais, que Cho estava noiva de um magnata grego e que se casaria em breve, mas nada sabia sobre Harry.
Sorriu, imaginando que ele devia estar livre... Ela também estava. Mas estava sozinha... Pensou em Lilian e na noite em que tudo se revelara em Penmadoc. Lembrar-se da madrasta ainda lhe era penoso. Pensava no caso que ela estava tendo com o marido da amiga Dilys. Jaz, e no segundo testamento que ela escondera de seu conhecimento por interesse próprio. Era estranho, mas, ali, em Nova York, isso tudo lhe parecia muito distante e irreal. Talvez por isso tivesse sido tão mais fácil voltar aos Estados Unidos e retomar sua vida e seu trabalho. Harry ficara ainda mais algum tempo em Gales e informara Venning sobre o segundo testamento. Lilian, por sua vez, saíra de lá na manhã seguinte, mudando-se para um apartamento em Rhosmawr, que Jaz providenciara. Agora ela seria apenas uma viúva que viveria da pensão do marido, sem a chance de tornar-se rica ao vender Penmadoc.
Gina sentiu um aperto no peito ao lembrar-se do pai e do que ele deveria ter sofrido pouco antes de sua morte. Seu ataque cardíaco poderia ter acontecido com ou sem a traição de Lilian, mas Gina preferia pensar que teria ocorrido em qualquer circunstancia, para não sofrer ainda mais.
Tia Nell permaneceria na casa e tomaria conta dela até que Gina conseguisse forças para tentar viver lá novamente. Por enquanto, ela ficaria em Nova York.
Quanto a Harry, nada mais ouvira falar. Sabia que ela voltara a Londres, mas nada além disso. Talvez, depois das revelações daquela fatídica noite em Penmadoc, ele achasse que não deveria procurá-la até por respeito a sua dor.
Olhou mais uma vez para o parque e sua atenção desviou-se para ao táxi que passava, muito lentamente, diante do prédio em que vivia. Era como se alguém em seu interior estivesse procurando por um endereço. Mas o automóvel logo seguiu rua abaixo, e Gina voltou a observar as árvores. Minutos depois, o carro reapareceu e estacionou diante do prédio. A porta traseira se abriu e, para sua surpresa, ela viu Harry.
Agitada, Gina levantou-se da baqueta em que estivera sentada com tanta pressa que o café quase caiu de suas mãos. Engoliu em seco, em um súbito desespero e tentou ocultar-se para fingir que não havia ninguém em casa. Harry estava olhando para cima, tentando verificar a presença de alguém através da janela...
De repente, achou-se ridícula por seu comportamento. Queria ou não vê-lo?, perguntou-se ansiosa. E, decidindo que queria muito vê-lo, esperou pelo toque da campainha para, em seguida, abrir a porta.
Harry pareceu-lhe familiar, embora tenso.
- Olá – ele saudou, um tanto sem graça.
- Olá. – Gina deu-lhe passagem e depois fechou a porta atrás de si.
Ele parou no meio da sala, olhando ao redor, notando os detalhes da decoração que ela mesma fizera.
- Bonito – comentou.
- Obrigada. – Ela sentia as pernas trêmulas o gostaria de enrodilhar-se no sofá, mas sabia que não poderia fazê-lo antes da saber o motivo da presença de Harry ali.
- Este lugar seria excelente para um estúdio – ouviu-o comentar.
Ela apenas assentiu, concordando. Depois ofereceu, para quebrar a tensão que sentia no ar:
- Quer beber alguma coisa?
- Bem... qualquer coisa com álcool, por favor. – Ele se aproximava da janela e exclamou: - Bela vista!
Gina pegou uma cerveja na geladeira e trouxe-a, comentando:
- Eu gosto.
Seus dedos se tocaram quando entregou a garrafa a ele e foi inevitável a troca de olhares.
- Por que ligou? – Harry perguntou antes de tomar o primeiro gole.
- Bem, eu... por que acha que foi?
- Perguntei primeiro. Algo de errado?
- Não...
- Bem, eu fiz uma pergunta simples, e você ainda não respondeu. Por que ligou? Preciso saber, Gina. Preciso saber principalmente se cometi outro grande erro vindo até aqui.
- Não... – Ela parecia ter perdido a capacidade de falar de modo sensato. – Eu estou feliz que tenha vindo.
- Está?
- Sim. Queria muito vê-lo e dizer-lhe que... fiquei... Bem, que sinto muito por você ter rompido com Cho. Eu li no jornal sobre o noivado dela...
Harry negou de leve com a cabeça e tornou a levar a garrafa aos lábios. Após alguns goles, tornou a encará-la, para perguntar, admirado:
- Ligou para mim para dizer que sentia pelo rompimento com Cho? Bem... obrigado. – Seu tom era casual.
- Ora, eu não sabia como estava se sentindo a respeito...
- Não? Pelo amor de Deus, Gina, sabia muito bem como eu estava me sentindo! Escute, por que acha que estou em Nova York?
- Eu não sei... Talvez algum trabalho...
- Seria conveniente, não? Encontrar um trabalho aqui apenas três dias depois de você ter ligado... Não, Gina. Eu estava em Sevilha e ainda deveria estar por lá. Mas, como pode ver, não estou.
- E veio até aqui só por minha causa?
- Exatamente. – Ele parecia se impacientar. – Gina, achei que estivesse precisando de mim!
- E preciso, Harry.
O tom suave com que ela disse tais palavras fez Harry deixar a garrafa de lado e aproximar-se mais.
- Está falando a sério? – indagou ansioso.
- Estou.
- Pelo amor de Deus, não me torture desse jeito! Não sabe o quanto já sofri por sua causa?
Gina não tinha palavras. Há muito aceitara que nada poderia haver entre ela e Harry e agora que havia uma chance de se entenderem, não queria estragar nada usando palavras erradas.
Mas Harry não lhe deu oportunidade para ficar pensando no que poderia dizer. Tomou-a nos braços com a mesma decisão de sempre e, com a paixão que ela já conhecia, apoderou-se de sua boca em um beijo faminto e saudoso, que levou a ambos ao total esquecimento da realidade.
Mesmo estando, havia pouco, diante do vazio em que se resumira sua vida, Gina sentia-se reviver agora, com o amor que sempre nutrira por Harry.
- Eu estava com tanto medo – sussurrou ele, ainda junto a seus lábios. – No avião, quando vinha para cá... Achei que poderia querer apenas conversar sobre alguma coisa fútil, sem importância, ou sobre algo que se referisse a Penmadoc... Eu queria tanto que estivesse precisando de mim deste modo, desejando-me como a quero! Porque desde que nos reencontramos, Gina, não há mais espaço em minha vida para outra mulher. Nem para Cho nem para nenhuma outra. Por favor, perdoe-me por tudo que houve no passado. Fui um tolo por acreditar em minha mãe e não fazer nada para salvar nosso amor. Mas agora sei que sempre a amei e ainda a amo, e que poderemos tentar novamente.
Gina fitou-o por longos momentos. Estava nos braços do homem que sempre amara e que o destino, com uma ajudazinha de Lilian, afastara por tantos anos. Escondendo o rosto em seu pescoço, murmurou, abraçando-o com força:
- Oh, Harry, eu o amo tanto! Sempre o amei. Sempre!
- Mal pude crer quando Thomas me ligou, dizendo que você telefonara. Lilian me disse, antes de sair de Penmadoc, que depois de tudo aquilo, você jamais iria querer falar comigo e, mais uma vez, acreditei nela. Você ficou tanto tempo sem entrar em contato...
- Como pôde pensar tal coisa? Eu pensei que você e Cho... Bem, só quando soube do noivado dela é que percebi que vocês estavam separados...
- Falei com ela assim que cheguei a Londres. Não havia mais como ficarmos juntos, meu amor. Eu só a queria, só pensava em você. Só esperava que me ligasse...
- Que bom que liguei, então...
Harry sorriu. A felicidade que sentia quase não cabia em seu peito.
- Quer me ajudar a reparar um erro antigo? – perguntou hesitante. – Quer se casar comigo?
- Casar... – Gina tinha lágrimas nos olhos.
- Poderemos viver em Londres ou aqui, em Nova York. – Ele se antecipava à resposta, procurando soluções, mas, na verdade, tentando deixar a resposta dela livre de qualquer empecilho a seu amor. – Minha profissão me permite trabalhar em qualquer lugar, você sabe...
Gina colocou dois dedos sobre os lábios dele, calando-o.
- É claro que quero me casar com você – sussurrou. – E não importa onde iremos morar, desde que estejamos juntos, meu amor.
Harry engoliu em seco.
- Desde que estejamos juntos... – repetiu, quase sem voz. – É. Tem razão. Porque não quero arriscar perdê-la mais uma vez. – E voltou a beijá-la daquele modo só seu, levando-a consigo para longe dali, para um mundo de felicidade que só os dois conheciam.
FIM
Espero que tenham gostado do último capitulo (:
Obrigado a todos que comentaram, votaram, ...
COMENTEEM ;**
Ana Eulina: Não se preocupe, não vou demorar a postar Vizinhos Intimos. Por esses dias eu devo estar postando. To dando prioridade primeiro as mais antigas ;)
Comentários (1)
Mt fofa a fic!;*
2012-09-06