CAPÍTULO I
Apreensiva, Ginny Weasley apertou mais uma vez o botão do sétimo andar, observando o painel luminoso. Já há minutos que estava subindo e descendo sem parar e começava a sentir-se uma prisioneira daquela ameaçadora caixa cinzenta. Finalmente o elevador parou e as portas se abriram. Antes, porém, de poder esboçar o menor movimento, um homem alto, de porte atlético, entrou correndo, sem olhar para onde ia. O impacto foi tão violento que as portas se fecharam novamente.
- Oh! Não! Veja o que você fez! - Exclamou a jovem, indignada, tentando soltar a saia, presa à porta do elevador.
- Eu? De que me culpa? - Perguntou o homem surpreso. - Oh! O seu vestido! Acalme-se, não precisa...
O som característico de tecido rasgado interrompeu-o, pois Ginny acabara de puxar a saia energicamente, deixando-a em tiras, desesperada com o medo de ficar presa.
- Ora, eu poderia tê-Ia ajudado. Não precisava...
- Como não? Fiquei apavorada... Ginny murmurou com um fio de voz.
Sem conseguir mais se controlar, ela caiu ajoelhada ao chão frio do elevador.
- Ai! Acho que vou desmaiar - gemeu.
- Nem pense nisso - disse o desconhecido, abaixando-se ao lado dela.
Ginny elevou a cabeça e deparou com profundos olhos verdes que a encaravam como se a situação fosse extremamente divertida. Era um rosto de traços marcantes e expressão decidida. E os cabelos negros, entremeados de fios prateados, contrastavam com a pele bronzeada.
- Em que andar estamos? Ginny conseguiu balbuciar.
- Talvez entre o terceiro e o quarto, pois o elevador parou entre dois andares. Deve haver alguma coisa errada!
- Ah! Como odeio elevadores! - Ela disse, desabafando seu medo com toda a energia que lhe restava. - Sempre odiei! Tinha certeza de que um dia ainda ficaria presa num deles.
- Não se preocupe tanto. Todas as estatísticas provam que o elevador é um meio de transporte muito seguro.
- Você pode ter razão, mas eu prefiro um cavalo; até mesmo, um avião. Como pode pensar em estatística nesta situação? Este elevador está com problemas. De repente, os cabos podem se arrebentar e nós despencaremos no poço...
- Hei! - Interrompeu ele; sentando-se também no chão, puxou-a para si, como se não passasse de uma criança. - Acredite, não vai acontecer nenhuma tragédia. Não fique tão apavorada.
- Não consigo evitar! Quando você entrou, eu já estava trancada aqui há bastante tempo.
- É desagradável essa sensação de estarmos presos, mas não vamos cair em nenhum poço. Já apertei o botão de alarme e os técnicos cuidarão desta falha. Trata-se de uma simples questão de eletrônica, não há razão para pânico - ele disse com firmeza e acrescentou: - Como é mesmo o seu nome?
- Ginny!
- Ginny! Repetiu pensativo. - Gosto deste nome; é muito sonoro.
Ela ia dizer alguma coisa, porém se deteve ao sentir à mão dele deslizar sobre seus cabelos, com o mesmo jeito carinhoso de seu pai.
- Desculpe-me, sei que estou fazendo um papel ridículo. Mas entrei em pânico.
- Compreendo. Você deve sofrer de claustrofobia. Se lhe servir de consolo, saiba que não é a única pessoa no mundo com este problema.
- Deve ser isto, sim. Só que é uma claustrofobia muito estranha, pois acontece apenas em elevadores.
De repente, Ginny sentiu-se maravilhosamente calma e protegida, recostada naquele homem desconhecido que a abraçava paternalmente. Gostaria de ficar ali para sempre! Então se deu conta do absurdo da situação e, com um impulso, quis se levantar, porém ele a segurou firme. Um sorriso formou-se na boca firme e sensual.
Ginny teve a nítida sensação de que ele lera seus pensa¬mentos como se estivessem escritos em seu rosto.
- Qual é sua idade, Ginny?
- Dezoito. Por quê? Não tem nada a ver com a situação!
- Sou bem mais velho do que você.
- E daí? Está se sentindo paternal em relação a mim?
- Não é bem isso... Com a idade, aprende-se a ter mais autocontrole. Portanto, se está com medo de que eu vá agarrá-la, não se preocupe!
Ginny ficou mais aliviada, mas o fato de ser tratada como uma garotinha a irritava desproporcionalmente. Olhou o vestido rasgado, passando os dedos nos fiapos soltos, e suspirou.
- Qual o problema, Ginny? Nós vamos sair daqui, eu lhe prometo...
- Oh! Não é isto - ela disse e agarrou-lhe a mão, assustada ao sentir o elevador movimentar-se. - Estava pensando no meu vestido. Gostava tanto dele...
Ginny falava sem parar, para não pensar no elevador.
- Coloquei este vestido hoje, para impressionar uma pessoa que ia ver pela primeira vez. Aí, este elevador infernal acabou com os meus planos. Agora, terei de voltar para casa, reunir toda a minha coragem de novo...
- Não quer me explicar melhor o que aconteceu? Talvez eu possa ajuda-Ia.
Ginny ficou uns segundos pensativa antes de explicar o seu problema.
- Esta pessoa vai pensar que sou desequilibrada. É um homem muito ocupado e eu sou tão atrapalhada! Sempre me acontecem coisas inacreditáveis.
- Então, era um encontro de negócios?
- Mais ou menos. Tenho ligado para este senhor todos os dias e a secretária sempre me diz que ele está em reunião. Sem dúvida ela nem anota meu nome! Por isto, resolvi vir pessoalmente para enfrentar a fera. E veja o que aconteceu! Ginny apontou desolada para sua roupa arruinada.
- Sei como você se sente. Há dias assim mesmo, quando seria melhor não sair da cama.
- Você também se sente assim? Ela perguntou surpresa.
Ele deu uma risada gostosa.
- Acontece com todo mundo. Mas e o seu vestido? Não tem conserto.
- Bem, acho que não. Mas, como meu pai costumava dizer, 'Deus proverá. Tenho de confiar...
Interrompeu-se, nervosa, ao ouvir ruídos estranhos.
- O que está acontecendo agora? - Novamente agarrou-se ao braço dele.
- Deve ser a turma de salvamento trabalhando para nos tirar daqui.
Levantando a cabeça, Ginny encontrou os olhos verdes e sedutores fitando-a com curiosidade.
E o atraente estranho parecia indeciso até que, num impulso, retirou do bolso duas notas de cinqüenta dólares.
- Olhe aceite isto como um adiantamento da providência divina - disse ele, forçando-a a pegar o dinheiro.
Surpresa, Ginny olhou para o homem e para as notas, sem entender. Quando conseguiu falar, estava rubra de vergonha.
- Oh! Eu não... O que você pensou? Oh! Céus! Não posso aceitar!
- Eu odiaria saber que você não tem um belo vestido para sentir-se mais segura quando for à entrevista.
Naquele instante a porta do elevador se abriu, mas o desconhecido aproximou-se mais de Ginny, com um brilho malicioso no olhar, e beijou-a delicadamente nos lábios.
- Duvido que algum homem no mundo possa se sentir paternal em relação a você. É atraente demais.
Embora bastante perturbada pelo beijo rápido ela viu, horrorizada, um pequeno grupo de pessoas a espiá-Ios com sorrisos divertidos, testemunhas maliciosas do que acabara de acontecer. Ginny ainda tentou devolver o dinheiro ao desconhecido, mas ele não aceitou; apenas ajudou-a a levantar-se, e deu-Ihe um tapinha amigável na cabeça antes de sumir no meio da multidão.
- Desculpe, preciso me apressar! Já estou muito atrasado.
- Mas... Não posso aceitar - gaguejou Ginny, segurando o dinheiro, diante dos curiosos que olhavam intrigados sua saia rasgada.
- Oh! Não é o que vocês estão pensando! Tentou jus¬tificar-se. Vendo, porém, a inutilidade de suas palavras, abriu caminho entre as pessoas e saiu correndo pelo corredor, dese¬jando apenas ver-se livre dali o mais depressa possível.
Uma hora mais tarde, Ginny chegou à casa da Sra. Clayton, a esposa do pastor de sua igreja, e, diante de seus olhos arregalados de espanto, contou o que lhe sucedera.
O reverendo Clayton havia sido um grande amigo do pai de Ginny, o reverendo Weasley, e por este motivo ela estava hospedada já há algum tempo na casa dos Claytons.
- Bem - disse a velha senhora - não vejo nada de errado em ficar com este dinheiro. Deus nos ajuda das mais variadas formas, Ginny.
- Eu sei. Mas...
- Então, qual é o problema? Use o dinheiro, compre um vestido novo e pague quando você tiver um emprego. Consi¬dere-o um empréstimo - a Sra. Clayton acrescentou, com seu senso prático.
- Mas eu nem sei o nome dele!
- E por que não perguntou? Olhou atentamente para a moça e prosseguiu: - Minha querida, pelo que você me contou, este homem agiu como um perfeito cavalheiro.
- Sim - Ginny falou, recordando os olhos verdes e acariciantes. - Mas foi muito estranho ele me dar o dinheiro, não acha?
Naquele instante, o reverendo Clayton entrou inesperadamente e, ouvindo as últimas palavras de Ginny, perguntou:
- O que aconteceu? Você já está de volta, Ginny? Falou com o homem?
- Não... Ela respondeu, desolada. - Fiquei presa no elevador, rasguei meu melhor vestido, um estranho me deu dinheiro para comprar uma roupa, e, se o senhor quer saber nunca me senti tão humilhada em toda a minha vida! Ele me beijou na frente de todo mundo e só imagino o que aquela gente deve ter pensado!
Ginny calou-se, ofegante e à beira das lágrimas.
A Sra. Clayton trocou um olhar significativo com seu marido.
- Ginny, minha querida, não fique tão arrasada. Foi um beijo sem maldade; seria diferente se vocês estivessem sozinhos, entende? Quanto ao dinheiro, se você não quiser mesmo usá-Io, faça uma doação para a igreja. E, se precisar de um vestido novo, eu e Ted podemos dar um jeito, não é, querido? Ela procurou o olhar do reverendo Ted Clayton, que balançou a cabeça, concordando.
Com o rosto vermelho e molhado de lágrimas, Ginny reagiu.
- Não! Eu agradeço muito. Mas se tenho o dinheiro e estou em necessidade, vou usá-Io. - Enxugando as lágrimas disse resoluta: - E hoje eu farei o jantar!
- Oh! Ginny, você é nossa hóspede...
- Deixe-a a vontade - interrompeu o reverendo Ted. - A atividade vai lhe fazer bem. E agora conte tudo o que aconteceu a Ginny esta tarde. Ainda não entendi.
- Oh! Meu Deus! Vou tentar, mas também estou muito confusa.
De pé, em frente ao espelho de uma loja sofisticada, Ginny contemplou-se com satisfação.
Virou-se de lado para observar-se sob outro ângulo e admirou a seda suave do vestido rosa-claro, que realçava seus cabelos ruivos e seus olhos castanhos.
"Mais bonito do que o outro e mais caro também", pensou ela, em dúvida.
Sorriu para a própria imagem e admitiu que seria uma boa maneira de aplicar os cem dólares, ganhos de maneira tão inusitada. Ficou subitamente séria, lembrando-se de que em toda a sua vida desejara ter belos vestidos, porém jamais pudera comprá-Ios. Precisava disciplinar-se, pois seus pais sempre lhe disseram que não se devia julgar as pessoas pelas roupas. No entanto, como era difícil resistir a um belo vestido!
De repente, seu pensamento tomou um rumo diferente, e diante de si viu os olhos verdes e profundos daquele homem. Gostaria de saber como eles veriam seu vestido novo. Espantada com aquela idéia, afastou-se rapidamente e dirigiu-se à vendedora.
- Vou ficar com este. É muito bonito.
- Achei que você gostaria. Faz bem o seu estilo. Tem classe! É para alguma ocasião especial?
- Espero que para muitas - Ginny sorriu.
Na semana seguinte, em frente ao elevador, Ginny teve um momento de pânico. Não agiria covardemente; enfrentaria aquela máquina infernal e rezaria para que ninguém a reconhecesse.
Finalmente a porta do elevador abriu e Ginny apertou o botão do sétimo andar com a mão trêmula, mas com a vontade firme. Enquanto subia, rezou baixinho e, para seu enorme alívio, chegou ao seu destino sem nenhum contratempo.
No corredor acarpetado, Ginny avistou imediatamente o que procurava: uma grande placa sobre uma porta de vidro blindex: HARRY POTTER- Imobiliária. Ela se deteve para reunir coragem, inspirou profundamente e abriu a porta.
- Que deseja? - Uma recepcionista atarefadíssima perguntou, quase sem olhá-Ia.
Ginny observou os detalhes da sala, agradavelmente surpreendida pelo bom gosto da decoração. Depois se voltou para a recepcionista, que era tão bonita quanto o ambiente, apesar do ar cansado.
- Gostaria de ver o Sr. Potter, por favor. Meu nome é...
- Desculpe - a recepcionista interrompeu - mas, se você não tiver hora marcada, será impossível vê-Io.
Falou rapidamente e voltou a se ocupar de uma pilha de papéis e documentos que pareciam em total desordem.
Ginny controlou uma onda de raiva, ergueu levemente o queixo e insistiu:
- Você sempre repete que o Sr. Potter não tem tempo e que devo procurá-Io noutra hora. Venho tentando há várias semanas e não é possível que ele seja tão ocupado. Além disso, tenho certeza de que, quando ele me vir, entenderá minha insistência...
A recepcionista ergueu os belos olhos azuis para o céu, num pedido de paciência.
- Mas o Sr. Potter é muito ocupado mesmo. Vai haver um grande negócio esta semana, uma venda muito importante, e aconteceu um imprevisto que transtornou nosso ritmo de trabalho, melhor você tentar num outro dia. - Ela se interrompeu subitamente curiosa. - Você foi enviada por alguma agência de emprego?
- Não, eu... Ginny se deteve ao ver uma porta se abrir e um homem muito alto aparecer. Ele segurava uma pilha de papéis e estava tão absorto em seus pensamentos que se dirigiu à recepcionista sem notar a presença dela.
- Sílvia, preciso disto com urgência. Você já acabou a outra parte? Que inferno! - Ele explodiu ao ver os papéis ainda espalhados desordenadamente, em frente da jovem secretária.
- Não pude acabar tudo, Sr. Potter. Ah! Esta moça insiste em falar com o senhor.
Ao ver quem era o Sr. Potter, Ginny perdera a voz. Sem conseguir desviar-se daqueles magníficos olhos verdes, balbuciou apenas:
- Você!
- Ora, Ginny! - Harry Potter exclamou, divertido e surpreso. - Então nos encontramos outra vez! Que coincidência!
Um intenso rubor subiu ao rosto de Ginny.
- Não entendo. Você não pode ser o Harry Potter que procuro. Talvez seja o seu pai. Quer dizer... deteve-se, indecisa.
- Já tive pai, mas ele morreu. Ah! Agora vejo que você tem um vestido novo. É muito bonito - ele observou aprovadoramente.
Nova onda de rubor embaraçou Ginny. Que vergonha! Ele sabia que ela usara aquele dinheiro. O vestido novo a traíra.
Enquanto isto, a recepcionista, sem compreender muito bem o que estava acontecendo, interferiu:
- Oh! Desculpe... Não sabia que o senhor a conhecia.
- Você queria me ver Ginny? É sobre o que aconteceu no elevador?
- Oh! Não! Meu pai disse que vocês eram grandes amigos e me mandou procurá-Io. Foi seu último conselho, antes de morrer. Ele disse para eu lhe falar dos cavalos que domaram em "Barcoo". E que você entenderia.
Harry Potter ficou subitamente imóvel, parecendo uma bela escultura masculina. Apenas seus olhos profundos davam sinal de vida e pareciam transpassar a mente de Ginny, adivinhar-lhe os pensamentos.
- Percebi que havia alguma coisa diferente a seu respeito, na primeira vez em que a vi, mas não sabia o que era. Você se parece com Weasley, não sei como não vi isto logo. Ginny... Weasley?
- Sim! - Ela murmurou timidamente, enxugando uma lágrima. - Desculpe! Às vezes, não consigo deixar de chorar. Meu pai sempre me falava a seu respeito e que eu iria conhecê-Io um dia. Eu devia estar no colégio na última vez que você esteve com meu pai.
- Sim. E eu estava no exterior, quando ele morreu. - Harry a interrompeu, com uma expressão de pesar. – Agora me arrependo de não ter tentado localizar a filha dele. Foi uma falta minha.
- Oh! Não! Você não tinha nenhuma obrigação. - Ela apertou as mãos nervosamente, palma contra palma, esfregando-as sem perceber. - Olhe, eu não quero ocupar ainda mais o seu tempo. Vejo que está ocupadíssimo.
- Espere Ginny! - ele chamou com firmeza, ao vê-Ia afastar-se. - Precisamos conversar.
Harry Potter colocou os papéis sobre a mesa de Sílvia, dando uma ordem firme.
- Não deixe ninguém entrar. Não quero ser interrompido. E não se afobe demais com o trabalho. Daremos um jeito.
E, dirigindo-se a Ginny:
- Agora vamos a um lugar tranqüilo. Quero lhe falar sobre os velhos tempos, quando conheci o velho Weasley. Seu pai foi o melhor amigo que já tive na vida.
Aquela confissão encheu o coração de Ginny de alegria e confiança e ela não hesitou nem um minuto em acompanhá-Io.
- A sua vida daria uma história e tanto, Ginny - disse Harry Potter, algumas horas mais tarde. - Você não acha que foi um pouco estranho para uma garota viver de paróquia em paróquia, acompanhando um pai reverendo?
- Oh! Não - Ginny respondeu com sinceridade. - Só lamento não ter podido acompanhá-lo mais. Quando criança, eu sofria por não ser menino, pois meu pai queria muito um filho. Talvez eu pudesse ser um pastor da nossa igreja e seguir sua vocação. - Os olhos de Ginny tornaram-se pensativos e longínquos, mas depois ela deu de ombros. - Bem, acho que mesmo que fosse homem não teria uma vocação verdadeira.
- Por que diz isto?
- Em primeiro lugar, sou muito ligada às coisas materiais. Não resisto às coisas bonitas. Veja, hoje dei noventa e nove dólares por um vestido. Oh!
Mal acabou de falar, lembrou-se do incidente no elevador e levou a mão aos lábios, com o rosto em chamas. Desejou ardentemente que a penumbra do bar ocultasse seu embaraço; um segundo depois não conteve um sorriso.
- Não devia ter usado aquele dinheiro. Se soubesse que a pessoa que eu procurava era você, não teria feito isso. Acredite, não sabia para quem devolver o dinheiro. Fiquei tão envergonhada naquele dia! - Ela acrescentou, com leve ressentimento.
- Peço desculpas. Foi um impulso! Não pude resistir. Mas, agora que nos conhecemos melhor, você me perdoa? - Olhou-a com aquele olhar intenso que parecia ler sua alma.
- Oh! Claro que sim! Como amigo de meu pai, está fora de qualquer suspeita.
Harry não fez nenhum comentário, porém sua expressão revelava que não era aquilo que esperava ouvir. As palavras de Ginny não elogiavam seu ego masculino.
- Como foi sua vida estudantil? Ele perguntou, para mudar de assunto.
Uma expressão de enfado apareceu no rosto suave de Ginny.
- Se dependesse de mim, jamais teria freqüentado um curso regular. Meu pai podia me ensinar tudo. Para que freqüentar escolas idiotas, onde só aprendia boas maneiras? As senhoras da nossa paróquia insistiram com meu pai, dizendo que uma moça sem mãe precisava ir à escola. E ele concordou.
- Pobre Ginny! Foi muito difícil aprender boas maneiras?
- Bem, se foi em parte à culpa é minha. - Ela baixou os olhos e sorriu: - Sou um pouco impulsiva e às vezes muito teimosa. Custo a dar o braço a torcer. Entende o que quero dizer?
Havia um brilho terno nos olhos de Harry, que disse apenas:
- Continue. Conte mais!
- Ah! Eu tinha a língua um pouco solta e um dia disse aos diretores da escola que meu pai se formara em Oxford e era melhor qualificado para me ensinar do que eles. Veja só a minha petulância! Ainda bem que ganhei o prêmio de melhor aluna de história, caso contrário minha situação ficaria preta.
Desta vez, Harry riu com gosto.
- E conseguiu fazer amigos na escola?
- Sim, uns poucos. Meu jeito muito franco não me ajudava a ser social, compreende? Eu era muito radical; se achava alguma coisa errada, dizia. Esta minha mania de querer corrigir os erros dos outros às vezes causa problemas.
- Você perdeu sua mãe muito cedo, não foi, Ginny? Eu a vi apenas uma vez, antes de você nascer. Você se recorda dela?
- Muito pouco. Tinha só cinco anos quando mamãe morreu. Meu pai nunca se recuperou da morte dela. Não se lamentava, mas às vezes ficava horas em silêncio, olhando o vazio, e eu sabia no que ele estava pensando! Papai preocupava-se muito com o meu futuro. Tinha medo de me deixar só no mundo. Tenho só dezoito anos e ainda não tenho formação completa para enfrentar uma vida de trabalho.
Ginny falava rapidamente, quase sem tomar fôlego, como se desejasse narrar toda a sua história enquanto havia alguém disposto a ouvi-Ia.
- Seu pai foi um grande homem. Ele lhe contou, por acaso, o que fez por mim?
- Não! Apenas disse que vocês eram grandes amigos.
- Quando conheci seu pai, eu era um adolescente problemático, seguindo uma trilha de autodestruição. Algumas vezes fui recolhido à Casa de Detenção de Menores. Numa das vezes em que estava lá, a direção enviou seu pai para conversar comigo. Você sabe a que me refiro essas tentativas de converter uma ovelha negra. Tive vontade de rir na cara dele. Harry deu de ombros. - Eu era um garoto duro, filho de pai alcoólatra, já vira muitas coisas na vida e não seria um pastor religioso que iria me modificar. Quando saí da reclusão, só para provocá-Io, fui à casa dele, quebrei algumas vidraças, arranquei algumas plantas e esperei sua reação. Que coisa incrível! Ele não fez nenhuma denúncia. Apenas um dia, quando não havia ninguém por perto, agarrou-me perto do estábulo e me deu uma bela surra. Depois me limpou, tratou de alguns machucados e se ofereceu para me ensinar a lidar com cavalos.
Ele sabia tudo sobre o assunto e eu fiquei apaixonado. Resumindo, trabalhei com seu pai por três anos e tudo que sei hoje aprendi com ele. Principalmente aprendi o valor do trabalho e cresci. Superei o mundo cruel e mesquinho onde nasci e agora alcancei o sucesso.
- Nunca teria imaginado que a amizade de vocês tivesse começado assim. É uma grande surpresa.
- Seu pai se orgulhava de ter me tirado do mau caminho. Apesar de não nos vermos muito, continuamos amigos. E você? Onde está vivendo agora? Sozinha?
- Não. Moro com um casal amigo. Até poder cuidar de mim mesma. - Ela falou hesitante, pois se sentia vagamente humilhada, por não ter nenhum parente.
- Pelo menos tem um bom emprego?
- Ainda não, mas estou procurando. Talvez trabalhe como governanta, ou cuide de crianças - ela mentiu.
Ginny baixou os olhos e contemplou as mãos em silêncio. Por que lhe parecia tão difícil dizer àquele homem que viera à sua procura para pedir emprego? Se ele fosse o senhor idoso, de cabelos brancos e ar imponente que imaginara, seria mais fácil. Mas Harry Potter era um belo homem, em pleno vigor, capaz de tirar o fôlego de qualquer mulher, e aquilo a intimidava. Levantou os olhos e deparou com os magnéticos olhos verdes a observá-Ia.
- Hum! - Tive uma idéia, Ginny - ele falou semicerrando os olhos. - Se você puxou a seu pai, deve entender bastante de cavalos. Estou certo?
- Oh! Sim! Entendo! Pode apostar. Desde criança lido com cavalos e aprendi a amá-Ios também. Por que perguntou?
Durante um breve momento Harry Potter ficou em silêncio. Depois, num tom meio cético, e com um sorriso que lhe enrugava o canto dos olhos, explicou-se.
- Acho que devo acreditar na providência divina, pois ela acabou de enviar a solução para os meus problemas. Você deve ter notado como meu escritório está desorganizado. Tudo atrasado e minha secretária está quase maluca com o acúmulo de serviço...
- Bem... realmente... ela me pareceu muito atarefada e nervosa.
- Eu explico... Há três semanas, uma pessoa que trabalhava há anos para mim e era praticamente o meu braço direito precisou se afastar. Era uma senhora que me ajudava nas exposições e nas vendas dos meus cavalos, entre outras coisas. Cuidava praticamente sozinha do meu haras. - Ele lançou-lhe um rápido olhar. - Talvez você...
- Eu... Ginny piscou, boquiaberta, não podendo acreditar na sugestão que lia nos olhos dele. - Você está me oferecendo o lugar desta senhora?
- Sim. Estou. As agências de emprego até agora não me conseguiram ninguém. Você tem boa escolaridade e tenho certeza de que entende de cavalos melhor do que ninguém. O que você diz?
- Eu... estou nas nuvens - exclamou, ao recuperar a voz. Mais uma vez ele lhe lançou um olhar perscrutador, que a mantinha quase hipnotizada.
- Está? Ginny, de repente lembrei uma coisa que você disse no outro dia, no elevador.
- Que eu disse? E o que foi? - Perguntou, num grande estado de excitação, tentando lembrar o que teria falado, porém sem sucesso.
Ele esticou as longas pernas, posicionando-se confortavelmente e, sem desviar o olhar do rosto corado de Ginny, prosseguiu:
- Você disse que estava usando seu melhor vestido para impressionar a pessoa com quem ia ter uma entrevista.
Ginny mordeu os lábios, tentando achar uma resposta pronta e inteligente. Contudo, sentiu-se totalmente bloqueada pelo nervosismo.
- Pois bem! Você me impressionou muito. Agora, fale a verdade! Você ia pedir um emprego, mas desistiu ao saber quem sou não foi?
- Sim - ela murmurou, controlando-se para não roer as unhas ou fazer qualquer outro gesto imaturo.
- Então está tudo resolvido! Sorria! Eu precisava de alguém e você apareceu na hora certa. Agora escute Ginny! O meu impulso no elevador não tem nada a ver com meu modo de conduzir negócios. Nem sonharia em tratar a filha do reverendo Weasley do jeito que tratei.
- Talvez você tenha razão. Ficar preso num elevador produz estranhos efeitos nas pessoas!
Diante das palavras afetuosas de Harry, do seu tom informal, Ginny finalmente relaxou e percebeu o lado cômico da situação.
- Tem certeza de que não está sendo apenas caridoso comigo... por causa de meu pai?
- Vá ao meu escritório, fale com Sílvia e ela lhe mostrará como precisamos de ajuda. Dou-lhe um tempo para pensar, até se familiarizar com nosso, tipo de trabalho.
N/A: bem vocês já sabem esses personagens não mi pertence... E aproveite a historia!
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