Lua de mel
Assim que os marotos em questão atravessam a passagem, a estante volta a se mover para seu lugar antigo e Rose dá um gritinho de medo. Antes que eles possam falar qualquer coisa, dezenas de tochas acendem-se iluminando o local, que se parecia com um enorme quarto. Aquela inusitada câmara estava mobiliada com uma grande cama de dossel, um guarda-roupa, um piano e calda, um sofá, uma escrivaninha com uma cadeira e uma penteadeira, todos móveis seculares e caríssimos. O chão era coberto por tapetes finos e as paredes estavam cheias de quadros, todos da mesma bela e sorridente mulher, com seu longo e encaracolado cabelo loiro-escuro e seus olhos cor de mel.
- Quem é essa? – pergunta Al impressionado com a beleza da pintura.
- Minha avó Catherine – responde Jay, intrigado. Estava começando a entender o que afinal de contas era aquele lugar.
- Que coisa maravilhosa – exclamou Rose, que abrira o guarda-roupa e olhava a mais linda coleção de vestidos antigos que já vira. – Tudo aqui é tão antigo, deve haver algum poderoso feitiço de conservação nessas coisas.
- Há quanto tempo sua avó morreu? – pergunta Jimmy, agora sentado na escrivaninha olhando uma pilha enorme de cartas de amor muito velhas e, apesar de conservadas, desgastadas o suficiente para terem sido lidas milhares de vezes. Todas estavam assinadas por Catherine.
- Quase duzentos anos – Jay responde olhando pasmado tudo em volta. Todas aquelas coisas pertenceram a sua avó!
Os quatro amigos se entreolharam e pareceram compreender tudo ao mesmo tempo. Rose suspirou baixinho em meio ao constrangimento que compartilhava com os amigos.
- Sem ofensas cara, mas seu avô é maluco! – brinca o ruivo, tentando desanuviar o ambiente e só conseguindo três risadinhas nervosas como resposta.
Neste momento eles se assustam porque todas as tochas se apagam e a estante volta a se mover mostrando, recortada sobre a luz da biblioteca, a figura altiva de um aborrecido Alexander Mallory.
- Gosto de pensar que sou apenas um pouco excêntrico, Sr. Potter – fala o anfitrião, com um certo tom de tristeza na voz enquanto os quatro saem da câmara de cabeça baixa. – O jantar será servido daqui a pouco e estão procurando por vocês no salão. Espero que não comentem com ninguém sobre meu... eh... pequeno hobbie. Acho que as pessoas pensariam que sou maluco, sabe?
- Me desculpe, senhor Mallory. Eu não tive a intenção – se justifica Jimmy, extremamente envergonhado.
- É vô, foi um acidente...
- Tenho certeza que sim – o velho interrompe. – Mas se vocês não contem a ninguém, não há do que se desculparem. Crianças não têm culpa por sentirem curiosidade. Agora vão jantar!
Os garotos saem da biblioteca ainda de cabeça baixa e o vampiro atravessa o portal, que se fecha novamente atrás dele. As luzes se acendem mais uma vez e ele caminha até o maior dos quadros, situado bem no meio da parede. Era possível escutar uma música tocando baixinho, vinda de fora.
I'm so tired of being here / Estou tão cansado de estar aqui
Suppressed by all of my childish fears / Reprimido por todos os meus medos infantis
And if you have to leave / E se você tiver que ir
I wish that you would just leave / Eu desejo que você vá logo
Your presence still lingers here / Porque sua presença ainda permanece aqui
And it won't leave me alone / E isso não vai me deixa em paz
- Lex, o garoto está certo: você é maluco – brinca a maior figura de Catherine as outras assentem, reproduzindo várias vezes o mesmo sorriso misterioso.
- Sim, eu sou maluco e você é uma egoísta. Uma egoísta linda.
Não importava o quanto ele o havia feito sofrer quando partira, Alex não conseguia deixar de amá-la. Ele tinha perfeita consciência da ridícula situação que vivia, mas não resistia a tentação de revê-la, ainda que através de uma pintura.
These wounds won't seem to heal / Essas feridas parecem não querer cicatrizar
This pain is just too real / Essa dor é muito real
There's just too much that time cannot erase / Isso é simplesmente muito mais do que o tempo não pode apagar
- As coisas devem estar bem entre você e sua namorada vampira, você nunca mais veio me ver – ela fala, disfarçando muito mal uma pontada de ciúme.
- Diana e eu terminamos há um mês. E ainda há pouco você admitiu que nossas conversas não eram muito saudáveis para mim.
Diana fora um de seus mais duradouros casos, que acabara pela insistência dela que conhecer sua família, coisa que estava fora de cogitação para Alex. Nunca ninguém ocuparia o lugar de Catherine em sua vida. Nunca.
When you cried I'd wipe away all of your tears / Quando você chorou eu enxuguei todas as suas lágrimas
When you'd scream i'd fight away all of your fears / Quando você gritou eu lutei contra todos os seus medos
And I've held your hand through all of these years / Eu segurei a sua mão por todos esses anos
But you still have all of me / Mas você ainda tem tudo de mim
- É uma pena, eu queria mesmo que as coisas dessem certo entre vocês dois – ele fala meigamente e recebe do vampiro um olhar incrédulo. – Eu queria que você continuasse sua vida.
- Eu estou tentando, mas não é a mesma coisa. Quando começa a ficar sério eu não consigo me comprometer, me ligar a ninguém. Eu me sinto, sei lá... infiel.
Ele corou violentamente e a bruxa sorriu, surpresa. Definitivamente ele era maluco. E masoquista, pois olhar para ela era incrivelmente torturante e ao mesmo tempo irresistível.
You used to captivate me / Você costumava me cativar
By your resonating light / Pela sua luz ressonante
But now i'm bound by the life you left behind / Agora eu estou limitado pela vida que você deixou para trás
Your face it haunts my once pleasant dreams / Seu rosto assombra todos os meus sonhos, que já foram agradáveis
Your voice it chased away all the sanity in me. / Sua voz expulsou toda a sanidade em mim
- Que adorável, mas como você sabe se a essa altura eu já não estou casada com um defunto bonitão?
- Que coisa horrível de se dizer – ele responde e começa a rir, seguido de dezenas de Catherines presas à parede. Sua expressão muda e seus olhos ficam tristes. – Hoje eu precisava te ver sorrindo pra mim... Eu precisava ouvir sua voz.
O humor do casal não se extinguira com o tempo, a despeito da tristeza que tomava conta de ambos os olhares e que parecia aumentar a cada palavra dita. O peito de Alex doía quando estava ali. Mas quando não estava doía também...
These wounds won't seem to heal / Essas feridas parecem não querer cicatrizar
This pain is just too real / Essa dor é muito real
There's just too much that time cannot erase / Isso é simplesmente muito mais do que o tempo não pode apagar
- Lex, você precisa seguir em frente – a voz melodiosa da pintura agora era vacilante.
- Eu... não posso. Queria que você estivesse aqui.
Os olhares de ambos se cruzaram por longos segundos em que eles não pronunciaram nenhuma palavra. O silêncio falava pelos dois.
- Eu também – uma lágrima discreta corre pelo rosto da bruxa, mas ela prossegue em tom mais alegre, ainda fitando-o intensamente. – Você bem que poderia me arranjar uma pintura sua pra me fazer companhia.
- Está pensando em me trair, e pior, comigo mesmo? – ele brincou, tentando também parecer mais feliz, mas a lágrima que acabara de ver lhe despedaçara o coração.
When you cried I'd wipe away all of your tears / Quando você chorou eu enxuguei todas as suas lágrimas
When you'd scream i'd fight away all of your fears / Quando você gritou eu lutei contra todos os seus medos
And I've held your hand through all of these years / Eu segurei a sua mão por todos esses anos
But you still have all of me / Mas você ainda tem tudo de mim
Toda aquela falsa felicidade em ver uma pálida sombra da mulher que amava desvanecera com uma força impressionante, esmagando-o. Ao mesmo tempo, não queria deixar aquele lugar.
- Então ao menos volte para a festa, não é sempre que o nosso James se casa – ela pediu, ainda sorrindo, mas um sorriso forçado que contrariava com a índole franca da bruxa.
- Logo mais eu vou, Cath. Deixe-me ficar só mais um pouco...
Sair dali parecia algo impossível, o mundo lá fora estava a anos-luz de distância. Mesmo com toda a tristeza que ele carregava dentro de si, seus olhos estavam pregados na mulher que tanto amava. Sentia uma dor incomensurável, mas que lhe causava um estranho prazer, porque essa mesma dor provava o amor que tinha por Ela.
I've tried so hard to tell myself that you're gone /Eu tentei com todas as forças dizer a mim mesmo que você se foi
But though you're still with me /Mas embora você ainda esteja comigo
I've been alone all along / Eu tenho estado sozinho todo esse tempo.
[...]
Os quatro pré-adolescentes entraram no salão e foram até onde Harry, Gina, Fred, Hagrid, Barker, McGonagall e o Sr. e Sra. Longbottom estavam sentados. A mesa se localizava ao lado do palco, próxima a parede, onde a altura do meio-gigante não atrapalhava a visão de ninguém da banda. Eles jantaram e foram novamente para o jardim, deixando os adultos conversando amenidades.
A festa corria normalmente, com a pista de dança sempre cheia de casais que dançavam coladinhos as músicas muito românticas, que abafavam um pouco as conversas que se desenvolviam isoladamente, inclusive o chaveco que estava rolando entre Victor e Marie, que recebia olhares raivosos de McGonagall o tempo todo.
- Ela superou rápido, né? – brinca Arthur, dando um cutucão em Hagrid e apontando discretamente para o novo casal que estava se formando.
- Do que vocês estão falando? – pergunta a diretora rispidamente, interpretando mal o gesto dele.
- Da Marie, o Jack terminou com ela e agora parece que ela vai ficar com o irmão dele – as pessoas que estavam em volta se viram para ele, que recebe um cutucão mais forte do amigo. – Eu não devia ter dito isso...
- Não mesmo – concorda Barker rindo da indiscrição do outro.
- Quer dizer que é com o Mallory que ela namorava? – a diretora pergunta baixinho e os dois assentem em resposta. Com isso o humor de Minerva melhora instantaneamente, mas infelizmente isso não vai durar muito.
Eis que chega a hora mais esperada da festa: a noiva jogar o buquê. Por isso formou-se uma multidão de vampiras e bruxas esperançosas (pra não dizer desesperadas) em frente ao palco, onde Cassie já estava devidamente posicionada de costas enquanto o baterista da banda fazia o característico “rufar de tambores”. Nesse instante Hagrid se levanta para ir ao banheiro coincidindo com a hora em que a noiva joga o buquê, que no meio do vôo esbarra na cabeça do professor de trato com as criaturas mágicas, dá um rodopio e cai no colo de McGonagall. Aônita, a diretora cora violentamente enquanto o noivo tinha uma forte crise de risos e o professor Barker cuspia metade do hidromel que tinha na boca.
- Parece uma conspiração do destino – cochicha Jack à esposa, que já vira a cena e também se pusera a rir com gosto, assim como o resto da mesa.
- Quem fizer um comentário sobre isso está demitido – McGonagall fala entre os dentes, fazendo com que toda a mesa segura o riso, exceto Barker que começara a tossir, engasgado com o pouco da bebida que não cuspira.
[...]
Horas depois a música já havia cessado e os convidados se dispersado, a maioria deixando o castelo por alguma das várias e luxuosíssimas lareiras, apesar de algumas pessoas permanecerem para pernoitar. Cassie, que havia entrado no quarto nos braços do marido, agora estava deitada na cama a espera da taça de conteúdo vermelho que ele havia ido buscar. a iluminação suave vinha das velhas que o vampiro tinha espalhado pelo local e pela lua, que entrava livremente pela janela aberta.
- Você tem certeza? Eu vou entender se... – ele perde a coragem de terminar a frase quando se depara com o sorriso confiante da esposa.
- Não há nada que eu queira mais nesse momento – ela sussurra, retirando da taça mão de Jack e levando-a aos lábios com um sorriso malicioso. – Bem, tem uma coisa, mas fica pra daqui a pouco.
Cassie então bebe o sangue do marido, surpreendendo-se com o gosto que não era nada desagradável. Aquele era o primeiro passo para a mais extraordinária mudança que já se fizera em sua vida. Ela não tinha a menor dúvida de que era aquilo que queria, apesar de ser algo tão definitivo.
Já ele estava apavorado. Tinha medo de que a qualquer momento ela se arrependesse ou que doesse quando ele finalmente a mordesse. Durante anos ele desejara ardentemente aquele pescoço, mas agora tinha de se controlar para ser o mais delicado possível. Céus, como aquela mulher tinha o poder de deixá-lo inseguro!
Ela puxou os cabelos por cima do ombro esquerdo, deixando a mostra o lado direito do pescoço, que agora ele devorava com os olhos. Sentindo um calor estranho tomar contar de seu corpo, constatou com prazer que a transformação já começara.
- Morda-me – ela sussurrou, pouco antes de Jack cravar suas presas alvíssimas em sua pele. Ela sentiu uma dor suave e depois um forte arrepio na nuca, que se estendia ao resto do corpo. Era uma sensação indescritível.
- E-eu disse que ia doer – ele fala vacilante, afastando-se alguns centímetros e contemplando-a extremamente pálida, porém mais bela do que nunca. Ela tinha os olhos fechados e a boca entreaberta e demorou alguns segundos para responder-lhe.
- Não, isso foi... bom – ela fala sorrindo e Jack a olha incrédulo. – Depois de dar a luz isso aqui foi moleza... Agora é minha vez!
É a vez dele de sorrir frente às recém-adquiridas presas da esposa.
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