DOIS
Enquanto atravessava o corredor a passos largos, procurando pela sala 212, que tinha sido transformada em um escritório para o acampamento Sunburst, eu me sentia totalmente confiante. O zíper da minha calça estava fechado, a camisa abotoada, o cabelo cuidadosamente preso em uma longa trança que caia pelas minhas costas; e, na loja do centro acadêmico, comprei um par de meias brancas na conta da minha mãe, diretora do departamento de inglês da faculdade. Estava pronta para enfrentar todo mundo, principalmente as crianças. Brincadeira: adoro trabalhar com crianças pequenas e cheias de energia.
- Você deve ser Hermione Granger.
Um rapaz alto e sardento, com o cabelo loiro e as mãos tão largas quanto uma luva de cozinha, estava em pe na entrada do escritório.
- Jim Klein?—perguntei.
- Isso - respondeu o chefe dos monitores—Entre e conheça a galera. Pessoal, esta é a nossa monitora de esportes.
Entrei na sala e parei. A garota de visual exótico que eu quase havia atropelado com minha bicicleta sorriu calmamente para mim.
- Eu sou a Anna - disse ela.
- Pamela - falou uma menina novinha com um cabelo cheio de mechas coloridas e uma maquiagem bastante pesada.
- Hau - um garoto magrelo com pequenos olhos pretos acenou para mim.
- A gente já se conhece - disse o monitor ao lado dele.
- Oi, Harry - falei, tentando esconder a minha surpresa.
Ele estava sorrindo, sempre sorrindo.
- Demais, gente! Excelente! - disse Jim, batendo palmas como se tivéssemos acabado de fazer algo muito extraordinário ao nos apresentarmos - Agora, vamos nos divertir um pouco.
Começamos a reunião conversando sobre as crianças. O Sunburst era um acampamento gratuito para alunos da primeira à terceira serie que eram trazidos dos bairros da periferia. Jim recém-formado na faculdade Kirbysmith, tinha gastado boa parte do semestre passado na vizinhança das crianças e nos falou sobre suas casas, escolas e ruas; era tudo bastante desolador.
Como todas as crianças, elas querem diversão - disse, com o olhar distante por um momento, como se estivesse de volta aos bairros da periferia. - Mas são desesperadas por atenção. E já presenciaram coisas nas ruas e em suas próprias casas que nenhum de nos gostaria de saber.
Discutimos quais eram os nossos objetivos para as quatro semanas de acampamento e alguns procedimentos gerais. Nosso dia seria dividido em dois períodos antes do almoço, e dois após o almoço. Anna, que estava no último ano da faculdade e era uma aluna da Educação como Harry, havia sido contratada como monitora de leitura e de matemática. Harry era o monitor de musica e artes. Descobri que ele tinha acabado de se mudar para Baltimore e que iria começar a faculdade, assim como eu.
Pamela, de 15 anos, era irmã mais nova de Jim e estava como voluntária. Iria monitorar as atividades livres. Eu fiquei responsável pelos esportes, é claro. E Hau, um calouro da faculdade, era o monitor de inglês; iria praticar inglês o dia inteiro com dez crianças vietnamitas que ficariam sob sua responsabilidade.
Assim que a reunião terminou, Jim, que andava balançando os braços ao lado do corpo como um chefe de escoteiros, nos acompanhou até o estacionamento onde as crianças seriam deixadas todos os dias. Alguns minutos depois, um grande ônibus amarelo, repleto de braços que acenavam para fora das janelas, chegou sacudindo ao som de diversas vozes e encostou próximo ao meio-fio.
Levou um certo tempo para agrupar as crianças no ginásio. Posso estar enganada, mas acho que alguns cães pastores teriam ajudado. Filas para o banheiro foram formadas. Depois disso, crachás com nomes foram entregues. Jim acalmou as crianças e falou sobre as regras. Então, os grupos foram levados para almoçar no refeitório.
- Ainda bem que tomamos café - observou Harry vinte minutos mais tarde.
Dos seis monitores, somente Jim ainda tinha apetite. Eu já havia trabalhado antes como baby-sitter e professora de educação física e estava acostumada a ficar rodeada por crianças. Mas ali eu descobri que algo acontece quando cinqüenta e oito delas se juntam. Elas descobrem inúmeras maneiras de destroçar os seus sanduíches.
Depois do almoço, dividimos as crianças em quatro grupos – primeira, segunda e terceira e os estudantes vietnamitas. Cada líder ficou com um grupo por um turno. Eu me dei bem com o grupo da primeira serie, que, ao se separar das outras crianças, ficara repentinamente tímido. Brincamos de “batatinha 1,2,3" de modo bem civilizado e, depois disso, a terceira serie chegou num alvoroço.
Muitas crianças já tinham perdido ou rasgado o crachá, e algumas decidiram que seria melhor não me falar quem eram.
- Tudo bem, moçada – disse - Darei um numero para cada um. Você é cem. Você é três. Você, dezoito. E você, setenta. Não esqueçam.
- Eu sei o nome deles - se ofereceu uma garota com o cabelo da mesma cor que o meu, preso no alto da cabeça com duas fitas espalhafatosas. Janet. O seu crachá estava em perfeito estado e provavelmente continuaria assim por mais quatro semanas.
- Aquele é o Eugene - denunciou, apontando para um menino com a pele morena e um cabelo preto quase todo raspado.
- Não sou.
- E sim.
- Não sou!
- Sim!
- Ele é o setenta - eu disse firmemente.
Mas Janet estava determinada a entregar todos:
- Aquela é a Maria, o Jackson e o Keith.
As crianças a encararam com raiva. Senti uma vontade enorme de chamá-la de dedo-duro, mas me lembrei que a adulta ali era eu.
Comecei a organizar as crianças para um jogo de "polícia e ladrão". Eu pensei que se começassem a perseguir uns aos outros em um grande campo iriam gastar aquela energia toda. Avistei Jim vindo do centro acadêmico com uma grande caixa. Uma senhora alta e magra o acompanhava segurando outra caixa. Meus dezesseis amorzinhos, reconhecendo Jim como o chefe do acampamento, repentinamente pararam de girar em círculos, arrancar grama com as mãos e amarrar os cabelos e cadarços dos coleguinhas. Sim, por um momento eles se tornaram anjos.
Jim me apresentou a senhora Mulhaney, membro da igreja que patrocinava o acampamento. Dirigiu-se às crianças, explicando que havia trazido algo para elas brincarem. Olhei para a caixa e depois para Harry, achando que ele estava maluco. Era um conjunto de arcos e flechas. Obviamente, as flechas possuíam uma proteção de borracha nas pontas, mas qualquer um que conhece uma turma de terceira serie sabe que basta um objeto diferente para surgirem diversas maneiras de usa-lo.
- É por pouco tempo - Jim cochichou em meu ouvido ao sair - Use uma vez e depois nós guardamos tudo no armário.
Bem, ninguém conseguiu acertar o centro do alvo naquele dia. Mas um menino - eu sei que isso é difícil de acreditar - pegou um esquilo, e eu levei duas flechadas na bunda. Querido setenta.
O arco e flecha deve ter impressionado bastante as crianças, Quando eu retornei para o escritório do acampamento no final da tarde, Hau, Pamela, Anna e Harry estavam sentados no chão olhando os desenhos feitos pela turma da terceira serie. Eles olharam para mim e sorriram ironicamente.
- Eu estava com medo de ver as mesmas coisas de sempre, aviões e flores - disse Harry.
Mas não. Ele tinha recebido vários desenhos repetidos de uma garota com uma trança vermelha e uma flecha fincada na testa.
- Obrigado por ser uma grande instrutora de esportes - elogiou Jim, colocando suas grandes mãos em meus ombros.
- Claro, claro - repliquei, sorrindo. Queria matar Harry.
Naquela tarde, fiz o longo caminho de volta para casa, pedalando lentamente pela faculdade, relaxando um pouco e aproveitando o frescor das árvores. A praça com prédios antigos de tijolos sempre me pareceu muito sossegada. Mais adiante, Kirbysmith se expandia de uma maneira meio desordenada. Prédios novos com uma arquitetura moderna foram sendo dispostos em ângulos esquisitos conforme a faculdade comprava novos terrenos. A maioria deles era feia. Mas, escondido num dos cantos da faculdade, havia um pequeno bosque de carvalhos cortado por um córrego com uma ponte. Foi ali que eu parei.
Queria pensar sobre Draco. Imaginar como ele olharia para mim com aqueles olhos cinzentos maravilhosos. Quando vi o seu corpo esticado sobre a ponte de madeira, não estava certa se havia imaginado aquilo também. Ele estava tão imóvel que parecia morto. Entrei em pânico.
- Socorro! Alguém me ajude!- larguei a bicicleta e corri em sua direção.
Draco levantou a cabeça e olhou rapidamente ao redor.
- Oh! Desculpe – disse - Eu me enganei - comecei a recuar.
Ele se virou e me fitou com olhos curiosos.
- Eu... eu pensei que você estava machucado - expliquei.
Um sorriso iluminou seu rosto e ele se levantou. Olhei fixamente para ele como se nunca tivesse visto um garoto antes.
- Eu não conheço você? - perguntou, inclinando levemente a cabeça - Você não estudou no colégio Eisenhower? Era chefe de torcida, não era?
Eu, que sempre havia dito que as garotas que organizam torcidas deviam ter espremido o cérebro para fora de suas cabeças quando crianças, estava completamente desarmada com aquele elogio.
- Não - respondi timidamente - Eu... ha... jogo basquete. E hóquei.
- Uau!
- Uau! - repeti.
- Eu acho que já vi você antes. Está trabalhando no campus neste verão? - perguntou ele.
- Sim. Quer dizer, não. Estou trabalhando temporariamente. Sou uma monitora.
- Uau!
Parecia que essa era a palavra "do momento".
- E você, Draco? - falei, antes de me lembrar que ele ainda não havia se apresentado. Mas, pelo jeito, ele não percebeu nada ou já esperava que eu soubesse seu nome.
- Estou treinando com o instrutor Inyart. Ele é excelente em ginástica olímpica.
- Ua... demais!
- Qual o seu nome? - perguntou.
- Hermione. E o seu?
Ele sorriu gentilmente.
- Fico feliz em encontrar você, Hermione. Não conheço ninguém no campus.
- Mesmo?
"Muito obrigado, muito obrigado, estrelas da sorte", pensei.
- Bem, o nosso escritório fica no centro acadêmico – falei alto - Acampamento Sunburst. Sala 212.
Ele sorriu e acenou com a cabeça.
- Espero encontrar você de novo.
- É... - disse, enquanto subia em minha bicicleta.
- Espero encontrar você bem em breve - ele acrescentou.
Meu coração disparou. Por um momento silenciei toda minha excitação, todas as frases bobas que atravessavam a minha mente. "Acorde, Hermione, seja interessante e divertida."
- Cuidado com o que você deseja - eu o preveni. - Hoje eu já encontrei e quase matei duas pessoas.
Ele riu e eu saí com minha bicicleta. Estava me sentindo O próprio garoto do E.T, pedalando no céu.
Ao chegar na garagem de casa, desci rapidamente da bicicleta. Joelle, na cozinha, amassava estranhos montes de carne moída semicongelada e colocava-os em um prato.
- Hummm - eu disse, entrando pela porta.
- Não precisa debochar - retrucou ela. O suor escorria pelo canto de sua testa. Nossos pais, que organizam caprichosamente a nossa vida como se fossem planos de aula, estavam nos fazendo suar ate exatamente o dia 21 de julho; só então, quando Joelle entraria no quarto mês de gravidez, poderíamos ligar o ar-condicionado na potencia máxima.
- Não estava debochando. Eu não almocei.
- Como foi o acampamento?
- Acampamento?
Minha irmã me olhou intrigada.
- Ah, o acampamento! Legal.
- Gina ligou - disse.
- E? - eu roubei um pedaço de carne crua.
- Você vai pegar verme - avisou.
- Aí você me leva pro veterinário. E...?
- Ela quer que você a encontre no shopping.
- E?
- Ela quer lhe dar uma roupa. Pra se desculpar pelo garoto que ela roubou de você ontem à noite.
- O que?
- Brincadeirinha - falou Joelle.
Não havia sido nada engraçado.
- Ela vai estar no Tanzini's. Às seis horas. Sabe o que eu tenho me perguntado? - Joelle disse enquanto cobria o hambúrguer com papel alumínio e o colocava no refrigerador.- Eu tenho me perguntado se a Gina escolhe os seus namorados.
- Sobre o que você esta falando, Joelle?
Ela pegou um punhado de alface e começou a lavá-las.
- Por acaso, a Gina fica sugerindo com quem você deve sair? Afinal, ela é sempre a próxima da fila.
Eu fitei minha irmã, esperando que ela levantasse os olhos novamente. Joelle fingiu um ar de inocência.
- Você nunca gostou da Gina.
- Não é esse o caso, Hermione. A questão é: por que você gosta dela? Ela usa você.
- Não usa! - gritei, me arrependendo agora por todas aquelas cartas cheias de sinceridade que havia escrito para Joelle quanto ela estava na faculdade, longe o suficiente para que ficasse próxima. - Gina é tímida e isso acaba se refletindo nessas situações.
- "Leve todos eles! Eles são todos seus, Gina!" - disse minha irmã - Isso deve ter sido de algum sonho da noite passada. Por que você é tão otária, Hermione?
Eu podia sentir um calor subindo dentro de mim.
- É uma sorte pra você e pro Camarada que eu seja assim - Camarada era o modo como eu chamava o bebe de Joelle - Maldita sorte sua e do Camarada que eu seja do tipo que divide!
Aquilo terminou com a conversa. Minha irmã sabia sobre o que eu estava falando. Além de roubar um espaço que havia se tornado meu depois que ela foi para a faculdade, ela e o Camarada estavam exigindo um dinheiro que havia sido poupado para a minha formação. Graças ao seu erro estúpido, eu e ela estávamos confinadas a permanecer em casa e cursar a faculdade Kirbysmith.
- Acho que você vai querer o seu hambúrguer mais cedo hoje à noite - disse com o rosto pálido. - O que mais vai querer comer?
- Nada, vou comer no shopping - saí da cozinha e subi a escada pisando duro nos degraus, desejando que nós não tivéssemos que brigar toda vez que conversássemos, e que, quando brigássemos, não disséssemos tantas verdades que machucam.
Como é bom estar de volta!
Nossa, põem tempo que eu não vinha aqui!
Vou direto ao assunto, sem mais delongas...
Peço desculpas para todos que acompanham esta fic e também as minhas outras. Minha vida mudou muito nos ultimos seis meses e devo confessar que eu não soube administrar tudo, para que eu pudesse ter um tempinho para vir aqui!
Acredito que em breve, vou estar de volta, como era antigamente! Na verdade, estou torcendo por isso...
Resolvi atualizar essa fic primeiro, porque acho que é fic mais "fácil" que tenho postada aqui, já que é uma adaptação. Mas nem por isso devo esquecer o trabalho que dá em scaner, digitar, corrigir e editar. Mas acho que vale a pena, né?
Agora um pouco sobre nossa história:
Eu adoro os comentário de nossa incrível Hermione, sempre que leio, começo a rir sozinha! E Joelle? O que acham dela? Em breve ela vai ter uma participação maior na história...
Vou me despedindo, espero que eu esteja desculpada pelo atraso!
Baccio
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!