Capítulo Dez
Ele sempre preferiu o inverno.
Verão, primavera e outono sempre lhe traziam más recordações, e a maior parte delas eram recordações mortais. Mortes de pessoas queridas, de pessoas que um dia ele conversou, que se preocuparam com ele, que ele eventualmente chegara a criar certo vínculo.
Isso porque na época ele nunca chegara a imaginar que perderia Dumbledore em junho.
Logo após um treino particularmente exaustivo de Quadribol, em que quase todos os jogadores – incluindo Ron – saíram reclamando de dores e sobre como Harry pegara pesado no treino, ele se dirigiu com a vassoura em cima de um dos ombros para o lago. A camada de gelo que se formava no Lago sempre quebrava graças a Lula Gigante.
Ele próprio admitia que havia pegado pesado demais no treino, mas fizera isso irracionalmente. Sua noite havia sido um inferno, ele passava por um estresse continuo graças a Dumbledore e seus descobrimentos sobre as Horcruxes, sem contar não conseguir deixar de pensar em Ginny, que resolvera se concentrar tanto no treino que acabou exagerando.
Se soubessem o que ele passava, quem poderia culpá-lo?
Encostando as costas em uma das arvores próxima ao lago, ficou se lembrando de um dia distante, a Segunda Tarefa do Torneio Tribruxo. Com uma fisgada de contrariedade, lembrou-se que naquele ano Cedric Diggory havia morrido. Por pura incompetência sua.
- Você vai pegar um resfriado.
Aparentemente surpreso com a dona da voz, Harry ergueu o rosto e encarou Ginny. Lembrou-se que fora a única a não reclamar do treino, e ele conseguiu pegar uma ou duas vezes um brilho de entendimento em seu olhar.
Ela já havia trocado as vestes de Quadribol por vestes do colégio. Usava o cachecol grifinório para proteger a boca e luvas para as mãos. As maçãs do rosto estavam levemente rosadas pelo frio.
Ah droga, ela era linda. Imediatamente, ele se xingou mentalmente.
- Se não morri cinco vezes com Voldemort, não é um resfriado que vai acabar comigo. – ele tentou parecer brincalhão, mas foi sem duvida a pior tentativa que fizera na vida.
Ginny franziu o cenho em sua direção, e sentou-se ao seu lado. Ele não pareceu surpreso com isso; há muito havia percebido qual era a facilidade daquela garota de entendê-lo. Hermione obviamente continuaria ralhando com ele sobre entrar no castelo e se aquecer, mas não Ginny.
- Bom, vamos esperar a neve então nos cobrir. – ela disse com desinteresse, abraçando as próprias pernas e encostando o queixo no joelho. Ele desviou o olhar dela e ficou encarando o lago.
O silêncio reinou sobre eles, mas em momento algum pareceu ser constrangedor. O entendimento mudo permanecia entre eles, de forma sobrenatural.
- Como estão as coisas entre você e Dean? – Harry perguntou depois de um bom momento de silêncio. Ginny ergueu o rosto e o encarou profundamente nos olhos.
- Não muito boas. – ela admitiu, desviando o olhar. – Ele tem cismado com algumas coisas ultimamente que são completamente idiotas.
Harry se esforçou para não parecer interessado com o que Dean havia cismando ultimamente.
- Você tentou conversar com ele?
- Sinceramente? É um tipo de relacionamento que está ficando desgastado, apenas. – ela admitiu encolhendo os ombros.
Mais uma vez, o silêncio. Mas Harry soube que havia algo que Ginny queria dizer, queria perguntar.
E não se enganou.
- Harry. – ela o chamou e o encarou mais uma vez. Harry ficou observando em silêncio o quanto ele a achava bonita, com os cabelos ruivos e vivos e as maçãs vermelhas por causa do frio. Ele sentiu uma vontade incontrolável de abaixar o cachecol dela e beijá-la.
- O que é?
- Você não precisa agüentar tudo isso sozinho.
Simples assim. Ela sabia o que ele estava pensando, o que ele vinha sentindo nos últimos dias, mesmo não sabendo com o que ele vinha passando ultimamente. Como uma gostosa surpresa, ele apenas sorriu. Não disse nada, apenas sorriu.
Aproximou-se de Ginny e passou a mão pelos seus cabelos, antes que desse um beijo em sua testa. Levantou-se e pegou a vassoura e simplesmente disse:
- É melhor voltarmos, antes que a neve fique amontoada o suficiente para que fiquemos entalados aqui.
Se ela pareceu chateada com sua atitude, não demonstrou. Apenas levantou-se e caminhou ao seu lado em direção ao castelo.
Quando chegaram ao retrato da Mulher Gorda, Harry colocou a mão no ombro de Ginny, impedindo-a de entrar. Curiosa, ela o encarou.
Ele soltou um suspiro cansado, antes de dizer:
- Obrigado, Ginny.
A explosão fora forte o suficiente para que o lugar tremesse sob os pés dos presentes. Imediatamente, a fumaça enegrecida e o cheiro forte invadiu as narinas de todos os presentes, que já haviam se levantado em pânico. Era possível ter uma pequena visão de uma das pessoas que estava na entrada pouco tempo antes, estirada no chão e com uma massa escura escorrendo da metade da cabeça.
- Não consigo aparatar! Eles impediram a saída! – uma mulher gritou desesperada, abraçando a um homem que parecia ter idade para ser seu pai.
Sarah já estava com a varinha em punhos, com Malfoy ao seu lado. Ela escutou barulhos de mais corpos caindo e gritou:
- Todo mundo para o chão! Já! – ela correu olhou ao redor do restaurante e olhou para Draco Malfoy. Ele parecia tão incrédulo quanto ela.
Cozinheiros saíram de seus respectivos lugares ao escutar a gritaria, e logo eles também começaram a se juntar ao coro de gritaria desesperada. Um deles não parava de apontar para os mortos na explosão e gesticular enlouquecido.
Sarah mordeu lábio inferior, enquanto olhava para os feridos. Quantos inocentes estariam ali? Uns trinta e poucos, julgou pelo número de pessoas. Ah, droga.
Ela gritou para os cozinheiros também se deitarem e com a varinha erguida, arrastou-se na direção de um deles, que parecia ser o chef.
- Há alguma saída nos fundos da cozinha? – ela perguntou aos sussurros apressadamente. Os autores da explosão não haviam ainda entrado no local. Por quê?
- Fomos trancados ali, e logo em seguida ouvimos gritos e viemos ver...
Droga. Eles foram eficientemente rápidos.
- Continuem deitados, tentem ir para a cozinha, tentem tirar algumas pessoas do caminho. Encoste-os nas paredes. – Ela se levantou no exato momento em que duas figuras entraram.
Comensais da Morte foi seu primeiro pensamento.
Mas que merda de roupa era aquela? Aquilo não era sequer vestes de bruxo...
Moviam-se como as sombras, até que ficassem de frente para ela e Malfoy. As varinhas em punho e todo o corpo coberto de negro, incluindo o rosto, ela era capaz apenas de ver os olhos de seus oponentes. Um arrepio horrível correu pelo seu corpo quando eles se encontraram. Frios e calculistas, eles não desistiriam do que quer que fosse que vieram fazer, até conseguirem.
Mas não deram um passo, esperando para que suas presas primeiro que se movessem.
Ah, maldição, ela tinha que pensar rápido. Havia reféns, eles haviam sido encurralados e ela não sabia quantos daqueles ainda existiam.
- Eu preciso alcançar meu espelho de duas faces, na bolsa. – ela murmurou para Draco quando se colocou ao seu lado, ambas as varinhas erguidas. Ele assentiu seriamente
- Eu dou cobertura.
Fora questão de segundos. Em um momento estava murmurando para Malfoy e, no instante seguinte, estava depositando sua vida nas mãos dele, enquanto dava as costas e corria como uma maluca em direção a mesa em que ambos tinham divido a tão pouco tempo, que estava tombada ao chão.
Sarah teve que se jogar no chão quando um dos homens pareceu surgir do teto e se jogou sobre ela. Ela rolou para o lado, deixando uma de suas sandálias em algum lugar no chão, enquanto suas mãos se ocupavam do necessário: uma alcançou uma faca que estava no chão e a outra sua pequena bolsa.
Ela deu as costas o suficiente para que conseguisse pegar a bolsa. O homem encapuzado jogou-se sobre ela com um olhar mortal, mas tivera tempo o suficiente apenas para bloquear o feitiço que Malfoy lhe lançava. Sarah levantou-se com agilidade e girou o corpo, até que suas mãos levassem a faca em direção a garganta do homem.
Ele não tivera tempo para se defender do ataque inesperado. Seus olhos calculistas arregalaram-se e ele chegara até mesmo tentar alcançar as mãos em direção a ela, mas Sarah apenas o empurrara para longe de si, fazendo com que o homem caísse. A faca estava até a metade em seu pescoço.
Ela se levantou e mais uma vez sacou a varinha, segurando o espelho com a mão esquerda. Suas costas trombaram com as de Malfoy, que respirava pesadamente.
- Mais problemas a caminho. – ele a avisou.
- O que quer dizer?
- Tirando o que você acabou de matar, temos mais cinco.
- Preciso de mais uns segundos. – ela pediu.
- Sem problemas.
Ela olhou para a o espelho. Deu dois toques com a ponta dos dedos.
- Por favor, faça isso dar certo. – murmurou enfurecida.
A face de uma mulher de cabelos brancos apareceu. Ela olhou para Sarah de cara feia.
- Departamento de Investigação Contra as -.
- Ah, me poupe. – Sarah a cortou furiosa. – Código B-2, Connor e Stuart. Quanto mais, melhor.
- Sua posição foi rastreada. – a mulher respondeu com a voz entediada.
Sarah não precisou escutar mais detalhes. Enquanto a mulher continuava a falar, Sarah girou seu corpo até que ficasse de frente para Malfoy e atirou o espelho na direção de um dos homens encapuzados, que afastou com um aceno de varinha. Mais um aceno, e facas e garfos flutuaram por breves segundos, antes de serem atirados em sua direção e na de Malfoy.
Foi como se tivessem ensaiado; um colocou a mão no pescoço do outro para caírem no chão, mas ambos sabiam o que tinham que fazer. Draco Malfoy prendeu a respiração quando um garfo passou raspando pelo seu nariz.
- Madison!
- ‘To sabendo! – ela gritou quando ambos se ergueram. Malfoy os distraiu mais uma vez enquanto Sarah fazia um aceno com a varinha. A porta de aço que separava a cozinha do restaurante derreteu e formou uma espécie de longa estaca. Mais um aceno, e a estaca voou até que atingisse dois dos homens mascarados. O suficiente para que entrasse e saísse de ambos.
Um feitiço convocatório e Malfoy retirou suas varinhas. Ficou com uma para si e entregou a outra a Sarah. Os dois homens atingidos caíram para o lado.
- Faltam três. – Malfoy murmurou com o cenho franzido.
Mais cinco homens entraram. Todos se confundindo com as sombras.
- Você não disse que eram mais três? – Sarah gritou para ele furiosa, jogando-se para o lado quando quase foram atingidos pela Maldição da Morte.
- Era o que parecia, merda! – ele gritou irado. Sangue escorria do seu ombro enquanto ele rolava pelo chão.
A gritaria dos reféns seria capaz de deixar Sarah enlouquecida. Ela se levantou e seus olhos encontraram com um dos assassinos.
Ela sentiu o sangue parar de correr em seu corpo. Íris vermelhas. Cenho cerrado em um puro ódio.
- Mamãe!
Uma garotinha de aproximadamente cinco anos corria desesperada para um corpo de uma mulher no chão. O olhar tanto dela quanto do assassino foram desviados para a pequena figura que corria até o corpo.
Uma fração de segundo, mas o suficiente para que ela percebesse o que ele iria fazer.
- Não.
Não pensara realmente na situação. Simplesmente se jogara na frente da criança, seu corpo protegendo o corpo pequeno dela. Sarah deu as costas para o assassino, fazendo o máximo para cobrir toda a menina com seu corpo.
O feitiço que ela esperava não veio. Ainda sobre a criança, com os cotovelos apoiados para não esmagar a menina e uma das mãos sobre sua cabeça de cabelos encaracolados, ela observou o homem cambalear quando Malfoy pulou sobre ele, depositando toda sua força em seu punho. Sarah escutou a cartilagem se quebrar.
Ela esperou apenas o suficiente para saber que não atingiria Malfoy e sussurrou:
- Avada Kedavra!
Uma morte rápida. O homem tombou para o lado, mas ela não tivera tempo para respirar, uma vez que estava novamente rolando com a criança para o lado para não ser atingida pela saraivada de feitiços que choveu sobre elas.
Algum dos homens pareceu ter gritado alguma coisa para seu companheiro, que assentiu. Alemão. Ela tinha certeza que aquilo era alemão.
- Madison!
Ela lançou um olhar rápido na direção de Malfoy, vendo-o correr em sua direção, bloqueando e fugindo dos feitiços. A menina nos braços de Sarah gritava, enquanto a Auror abraçava a criança com força com a mão livre.
Ela entendeu porque Malfoy correra em sua direção. Os homens mascarados haviam repentinamente de desinteressado por ele e por ela, uma vez que sete homens e três mulheres entraram. As capas na cor vinho confirmavam quem era. No meio da multidão, o olhar de David Connor cruzou o seu por um breve segundo, antes que eles atacassem.
O caminhar para sua casa foi igualmente torturante.
O vento gélido castigava seus corpos, enquanto as capas balançavam com forças as suas costas. Ela caminhava de cabeça baixa, mordiscando o lábio e vez ou outra subindo o cachecol para os lábios para se proteger do frio. Ele andava de queixo erguido, cenho franzido e com o corpo inteiro tenso.
Maldição, por que ela se sentia culpada pela reação dele? Eles nunca tiveram nada para que ela se sentisse daquela forma. Então por que diabos ele estava daquela forma também?
- Então – ele pigarreou e Ginny estremeceu. Seu tom saíra incrivelmente displicente, mas aquilo não condizia com a sua expressão corporal. – Quem era o felizardo?
Ela percebeu que ele havia feito uma pausa sutil para dizer felizardo. Imaginou se ele queria ter dito alguma coisa que não tinha nada a ver com um elogio.
- Você... Você não chegou a conhecer. – respondeu num tom de voz de quem se sentia completamente acuada. – E não importa mais.
- É mesmo? E quando você estava pensando em me deixar a par disso tudo?
Eles haviam virado a rua para a casa dela quando ele soltara aquela pergunta debochada. Ginny continuou olhando para os pés, completamente envergonhada.
- Bem, você ia ler o jornal de qualquer jeito.
Harry franziu o cenho.
- Você ia esperar que eu lesse o jornal então? – a pergunta foi feita de modo incrédulo, mas impossível não negar a irritação que saiu em sua voz. O antigo Harry bem na sua frente. Aquilo pareceu acender uma chama dentro de Ginny, dando forças para que ela parasse de andar e erguesse o olhar para ele de modo desafiador.
- E se eu deixasse? Escute, isso é a minha vida -.
- E você está compartilhando dela comigo, não está? - ele a interrompeu, parando de andar também. – Quer dizer, não estamos andando por aí como um casal?
Ela sabia como ele queria ter feito aquela pergunta: Não estamos por aí fingindo por todos os lados que estamos apaixonados? Fora bom saber que ele tivera tato o suficiente caso existisse algum jornalista ali.
De qualquer modo...
- Aqui não é um bom lugar para conversarmos sobre isso. – ela deu as costas a ele e continuou a conversar.
Ele pareceu entender, mas o olhar que ele lhe deu foi capaz de fazê-la perder um batimento cardíaco. Com passos firmes, passou por ela e começou a caminhar em direção a casa. O silêncio seguiu-se até que Ginny entrasse em sua casa e fechasse a porta com um aceno de varinha.
Quando se virou, Harry estava parado estupidamente próximo a ela, com os braços cruzados.
Ela sabia o que ele queria: explicações.
- Escute – ela começou, passando a mão pelos cabelos. – Eu não tive tempo para te contar, está bem? Logo que chegamos recebemos uma coruja de minha mãe dizendo para irmos até lá jantar em família... Eu não queria que você recebesse a noticia daquele jeito.
Ele não moveu um músculo do lugar onde estava.
- Fico imaginando quando você ia ter tempo para contar. – ele retrucou secamente.
- Qual é o maldito problema com você? – o humor de Ginny que estava péssimo atualmente a atacou. Ela franziu o cenho na direção dele e não se deixou intimidar. – Tudo bem, eu entendo que você esteve todo esse tempo desaparecido e não teve informações de ninguém, e que gostaria de ter todas as novidades, mas qual é o maldito problema que eu estive casada e não quis te contar imediatamente? Será que passou pela sua cabeça a simples idéia de que eu posso estar me acostumando com isso? Que pode ser assunto delicado para mim?
Por que ele estava tão zangado com ela? Eles nunca tiveram uma relação mais do que “a irmã mais nova de Ron”. Qual era o maldito problema se ela havia crescido e decidido ter uma vida própria, parando de se esconder à sombra de tudo?
Ele suspirou e fechou os olhos, tentando se acalmar. Ginny não demonstrou a surpresa que sentiu; finalmente, ele estava deixando mostrar emoção, não uma onda de falsas sensações, um teatro.
- A primeira regra em qualquer operação é contar o menor número de mentiras possível. – ele retrucou em um tom profissionalmente frio. – Ou mais cedo ou mais tarde elas podem voltar e acabar te dando o trança-pé.
Ginny sorriu debochadamente.
- É mesmo? Péssimas notícias, garotão, nós estamos vivendo uma mentira! – ela cruzou os braços e o encarou furiosa. – A noticia do jornal, sobre nossa historia, sobre o fato de você estar perfeitamente bem após a batalha.
Aquilo pareceu tê-lo abalado, de alguma maneira. Ginny percebeu pelo brilho rápido que passou por suas íris verdes.
Mas fora questão de um segundo. No instante seguinte, ela o viu fechar o punho e suspirar cansado.
- O que eu estou pedindo, Virginia, é honestidade. Podemos estar vivendo uma mentira, mas se não quisermos ser pegos nela, temos que pelo menos ser honestos um com o outro.
Ah! Aquilo só podia ser uma piada. Ginny sentiu o sangue esquentar ainda mais.
- Como você pode pedir honestidade quando você não consegue ser honesto nem com seus melhores amigos? Como você vai ser honesto comigo, quando vive mentindo para Ron e Hermione quando eles lhe perguntam sobre esse seu maldito desaparecimento de quase sete anos? – ela murmurou incredulamente furiosa.
Ele apenas a encarou por um breve instante, antes de olhar para a coruja que socava o vidro da sala com o bico, e lhe dar as costas, pronunciando-se com um ar gélido:
- Você tem os seus motivos Weasley, eu tenho os meus.
Weasley. A resposta que ela tinha pronta para chicotear morreu quando escutou seu sobrenome sendo dito. Harry, por mais que estivesse nervoso, nunca chamava alguém pelo sobrenome... À exceção de McLaggen e Malfoy...
Era óbvio que Harry também tinha as suas feridas. Fora apenas mencionar esse fato, lembrá-lo sobre o que ele havia passado, para que se fechasse em copas. E ela tinha que admitir, preferia quando ele despejava as frustrações em cima dela do que manter aquele silêncio.
Ela conhecia perfeitamente bem o garoto que se descontrolava, mas sua confiança ia para o ralo quando era em relação ao homem frio que fora abrir a janela para a coruja.
Eu não conheço você...
- Um restaurante no Beco Diagonal foi alvo de atentados de Comensais. - ele cortou os pensamentos de Ginny ao entregar a carta para ela. – Não foi nenhum Comensal original.
- Como pode ter certeza disso? – ela perguntou enquanto lia o conteúdo da carta. Não havia esse detalhe na mesma. Na carta Mike pedia para que ela e Harry fossem para lá imediatamente, e contou que onze Comensais da Morte invadiram o restaurante. Dois Comensais haviam sobrevivido, e houve sete vítimas fatais.
Harry nem sequer pareceu interessado quando respondeu:
- Dos três que foram presos pelo seu departamento, apenas um está vivo. Os outros estão mortos.
Aquilo a deixou com os olhos arregalados. O DICAT havia encontrado o corpo de Bellatrix Lestrange – horrivelmente deformado, como se alguém tivera o prazer de ter feito aquilo. – assim como o de Lucius Malfoy e Theodor Nott. Mas nunca haviam imaginado que todos os Comensais originais...
Harry... Quem é você?
Recobrando a suposta calma, ela balançou a cabeça e avançou para a sala.
- Vamos de Flu para o Departamento.
A enfermeira do Departamento de Investigação Contra as Artes das Trevas parecia estar encantada com Draco Malfoy. Ele silenciosamente esperava enquanto a jovem enfermeira limpava o ferimento em seu ombro, antes de aplicar a poção de cicatrização.
- Não foi um corte muito profundo, na verdade acho que o senhor não irá sentir muita dor -.
- Não importa o quanto doa, apenas termine logo com isso – ele percebeu o quanto havia sido grosseiro, e fez uma careta ao dizer: - Por favor.
Velhos hábitos nunca mudavam.
Numa cama ao lado, uma garotinha com um vestido azul claro dormia pesadamente. Suas roupas de frio estavam sobre uma cadeira, ao seu lado.
A enfermeira percebeu que o olhar de Malfoy estava sobre a criança, e disse com a voz suave:
- Tive que dar uma Poção do Sono para ela. Ela estava mais em estado de choque do que machucada, na verdade.
Ele conseguia compreender a dor da menina. Ela vira a mãe morrer bem diante de seus olhos assim como ele vira seu pai morrendo. Imaginou que a dor da menina deveria ser pior, uma vez que ele supunha que naquela idade toda criança acreditasse que seu pai e sua mãe são os maiores protetores, que nada é capaz de vencê-los e toda a fonte de segurança.
- O que vai acontecer com ela? – ele fechou o punho quando a mulher aplicou a poção sobre seu ombro graças à dor.
- O pai disse que estaria aqui em breve. Ele não tinha ido ao restaurante, pelo que pude escutar. Bem, está acabado. – Ela disse quando colocou uma gaze no ombro dele, apenas por precaução. – Procure não mexer muito este braço por hoje e um pouco amanhã.
Draco Malfoy se levantou e abotoou a camisa, para logo em seguida jogar a capa de inverno sobre os ombros.
- Tem alguma idéia onde a Auror Madison está?
- O Auror Connor havia aparecido por aqui enquanto a Auror Madison estava com a garota. Acredito que estejam juntos ainda.
Connor é um antigo caso de Sarah, as palavras de Ginny vieram à sua mente sabe-se lá por que. Ao mesmo tempo, não gostou de pensar nisso.
Com um resmungo, saiu da enfermaria e começou a caminhar perdido pelo Departamento. Droga, aquele lugar era enorme e ele não conhecia sequer um centímetro quadrado daquele lugar.
Duas mulheres passaram ao seu lado, conversando em uma língua que lhe pareceu português. Ou aquilo seria espanhol?Ah, quem se importava! Aquilo não o faria se situar naquele local dos infernos.
Por sorte, pura sorte, no momento em que havia dobrado um corredor, deu de cara com Ginny e Potter. Bem, alguém lá em cima gostava dele, presumiu por fim.
- Draco? – Ginny perguntou surpresa enquanto seguia em sua direção. Malfoy percebeu os olhares que Potter lançava discretamente sobre ela, com um ar (estaria ele enganado?) de irritação. – Acabamos de receber uma carta de Mike sobre o ataque ao restaurante.
Ele franziu o cenho ao se lembrar dos acontecimentos. A dor da batalha ainda estava lá em seu corpo.
- Comensais, certo? – Potter perguntou, tirando finalmente os olhos de Ginny e encarando Malfoy. Este assentiu.
- Sim, mas não eram os originais, o círculo íntimo de Voldemort. – ele passou a mão pelos cabelos e suspirou. – O que usavam eu até mesmo duvido que sejam consideradas vestes de bruxos aqui e na Rússia. E talvez no resto do mundo.
Ginny abriu a boca para falar alguma coisa, mas Harry foi mais rápido:
- Como eram as vestes?
Malfoy franziu o cenho, tentando se lembrar.
- A única semelhança é a cor: eram da cor preta. Calças largas, um capuz negro deixando apenas os olhos à vista... Tudo coberto. Mãos, pernas, pés, nenhum pedaço de pele.
Ginny fez uma careta, mas Harry franziu o cenho.
- Comensais Alemães.
Tanto Malfoy quanto Ginny pareceram surpresos, mas cada um a sua maneira. Malfoy parecia quase indignado.
- Alemanha? Pelo que eu saiba a era praticamente um país neutro. Não sabia que Voldemort havia ido para lá.
- Existiram manifestantes e pessoas que eram a favor da política de Voldemort. Na verdade, eles se denominavam Comensais, mas nunca foram reais partidários dele. No máximo, agiam e aterrorizavam as pessoas por conta própria.
Ginny parecia embabascada.
-Mas o que eles estariam fazendo aqui? – ela perguntou com um ar inconformado. Potter pareceu se esquecer que estava nervoso com ela, percebeu Malfoy, porque dirigira um olhar para ela realmente interessado no assunto.
- Isso é uma boa pergunta. Eles sempre pareceram mais preocupados com eles mesmos e seu país. Se acontecesse alguma atividade das trevas, seria um acontecimento isolado. Nunca pareceram ser do tipo que iriam vir até aqui realizar um motim porque Voldemort foi derrotado...
-Ginny! Potter!
Os três se viraram para o dono da voz; Mike caminhava apressadamente em direção aos Aurores, com Sarah e Connor em seus calcanhares.
- Meu Deus, parece que você foi arrastada pelo chão do inferno. – Ginny comentou estupefata para Sarah, que deu um sorriso sarcástico para a amiga.
- Você realmente sabe elogiar uma pessoa, Gin.
- Dois Comensais sobreviveram. – anunciou Mike. Connor parecia escrever apressadamente em um bloco de notas.
- Dois Comensais de onze? – Draco soltou um riso debochado. – Cacet-.
- Na verdade, apenas um sobreviveu. O outro acabou de se suicidar. – Sarah o interrompeu. - Ele se enforcou.
Todos ficaram terrivelmente quietos. Harry parecia perdido em seus próprios pensamentos, até que comentou lentamente:
- Isso não é muito comum entre os alemães.
- Você já encaminhou os corpos para analise? – Ginny perguntou e Connor assentiu.
- Neville já está examinando um deles.
- Longbottom? – Malfoy perguntou incrédulo. – Longbottom trabalha num departamento de Elite contra as Artes das Trevas?
- Qual é o problema com isso? – Sarah o olhou confusa.
- Neville não é o que costumava ser no colégio, Draco. – Ginny explicou calmamente. – Acredite em mim, ele é um gênio. É incrivelmente lerdo com outras coisas, mas ainda sim é um gênio.
- De qualquer modo. – Sarah os interrompeu. – Ginny, você quer tentar arrancar alguma informação do único sobrevivente? Eu não consegui arrancar nada dele... Além, é claro, de uma cuspida na cara.
- Sim, eu gostaria.
- Eu também gostaria. – Harry se colocou ao lado de Ginny, com o cenho franzido.
Tal atitude deixou os presentes, com a exceção de Connor que não sabia de nada, meio incertos do que dizer. Afinal, ele estava sem magia, como poderia ajudar? Ele pareceu perceber o que acontecera, porque isso o deixara com um ar ainda mais aborrecido ao dizer:
- Eu poderia dar alguma sugestão do que pode ter acontecido.
- Sim, eu acho isso fantástico. – interveio Connor. Sarah o fuzilou com um olhar.
Mike engoliu em seco, antes de lançar um olhar para Connor, antes de olhar para Harry e assentir.
- Claro... Seria excelente que você ajudasse Ginny, Harry. Connor, fique com Longbottom e traga noticias quando ele encontrar alguma coisa. Se puder ajudar, mande um aviso para Hermione Granger, ainda não tive a oportunidade de mandar um aviso para ela.
O Auror assentiu e imediatamente deu às costas ao grupo. Antes de dobrar o corredor, porém, olhou para Sarah e abriu um pequeno sorriso, antes de piscar. Malfoy percebeu aquele gesto imediatamente, e olhou para Sarah para ver como ela havia reagido. Ela não havia demonstrado reação alguma... Na verdade, Malfoy duvidava até mesmo que ela havia prestado atenção no que Connor fizera.
- Bem... – Mike pigarreou. – Vamos lá.
Vinte minutos mais tarde.
A Sala de Interrogatórios era minúscula. Não existiam janelas, e as paredes eram pintadas de um tom pobre e cinza. Havia uma mesa retangular de aço e duas cadeiras, cada uma colocada nas extremidades da mesma.
A única coisa em uma das paredes era um vidro extenso que separava a sala de outra que era tão menor quanto à dita. Enquanto Harry e Ginny entravam na Sala de Interrogatórios, Mike, Sarah e Malfoy entraram na sala ao lado, podendo ter visão do que acontecia durante o interrogatório.
- Vamos poder escutar o que eles perguntam para o Comensal, enquanto não poderemos ser vistos. – Mike explicou a Malfoy, que franziu o cenho e assentiu. Cruzou os braços e encarou Potter encostar-se à parede, ao lado da porta e Ginny dar a volta pelas costas do Comensal, que sequer fez menção de tê-la percebido.
Ginny parou absurdamente próxima ao homem, que continuava com o olhar fixo na tela de vidro. Ao outro lado, Sarah sentiu-se incomodada, como se aquele homem estivesse olhando fixamente em sua direção. O olhar frio, calculista... De quem mataria sem hesito.
Ginny jogou uma pasta amarelada sobre a mesa, finalmente atraindo a atenção do Comensal graças ao barulho.
- Otto Bohrer. – Ginny disse com a voz baixa e calma, enquanto apoiava uma das mãos sobre a mesa e encarava o homem a sua frente, que ergueu o olhar gélido em sua direção e sequer piscou. – Quarenta e quatro anos, conhecido até então por trabalhar no Gringots, na Alemanha. Viúvo, sem filhos.
O silêncio reinou na sala. Tanto Comensal quanto Auror travaram uma batalha silenciosa de olhares. Ao contrário de Sarah, Ginny não pareceu incomodada com o olhar frio e calculista que o homem lhe lançou, como se a avaliasse. Ao contrário, lançou um olhar como se também estivesse o estudando.
- Aparentemente sem envolvimento com as Artes das Trevas. – ela continuou com a voz suave e ergueu uma sobrancelha. – É claro que eu deveria enfatizar o aparentemente.
O homem continuou quieto, como um silencioso deboche de que não diria nada a ela. Ao outro lado da sala, Harry continuava em silêncio. Colocara as mãos no bolso da calça e mantinha o ar sério em direção ao homem.
- Considerado um bom vizinho, um bom cidadão. O que chega a ser muito intrigante nesse caráter perfeito – sua voz não passava de um sussurro quando ela se inclinou em direção ao homem amarrado à cadeira. – uma vez que o que você estava fazendo aqui não chega nem um pouco perto de ser considerado decente.
Mais uma vez, silêncio; mas dessa vez Bohrer abriu um pequeno sorriso. Um sorriso macabro.
- Conhece a brincadeira de se fingir de morto? – ele sussurrou de volta para Ginny, com o sorriso ainda em rosto, o que fez a pergunta ficar potencialmente mais macabra. – É um instinto natural do ser humano em questões de perigo, Auror.
Ginny franziu o cenho na direção dele, aparentemente despreocupada com o ar maníaco daquele homem. Era como se ela estivesse analisando o teor daquelas palavras.
- Então, Otto, porque esteve se fingindo de morto e só resolveu se revelar agora?
O homem soltou um riso baixo, algo que lembrava um silvo.
- Estava cansado da monotonia. Estava cansado da mesmice. Não era o melhor momento para se revelar? Para ser quem realmente sou?
- E o que você é? – ela ergueu uma sobrancelha. – Alguém se escondendo na máscara de Comensal da Morte? Por que isso você não é, não é mesmo?
Silêncio. O homem desviou pela primeira vez seu olhar do de Ginny. Ela parou de se inclinar sobre a mesa e se afastou dele, dando a volta pelas suas costas mais uma vez. Seus olhos encontraram os de Harry, e ele finalmente se desencostou da parede e andou até que ficasse meramente próximo à mesa. Seu olhar havia se voltado para o prisioneiro mais uma vez quando Ginny sentou-se na outra cadeira vaga e apoiou os braços sobre a mesa, cruzando um sobre o outro.
- O ataque de hoje me pareceu ser do tipo organizado. – ela disse tranquilamente, enquanto Harry se encostava à mesa e cruzava os braços. – Então vocês não estavam buscando realmente apenas se divertir, não é?
Ele continuou em silêncio. Ginny começou a se aborrecer.
- Por que vocês vieram até Londres? Quem vocês queriam matar?
Otto Bohrer começou a rir. Um riso enlouquecido. Ginny levantou-se e gritou:
- Responda!
Na sala ao lado, a porta se abriu revelando a imagem de Connor. Os três Aurores presentes o encararam, mas a pessoa a quem ele dirigiu total atenção foi Sarah. Carregava várias pastas em mãos.
- O Departamento de Identificação conseguiu achar a identidade de cada Comensal. – ele encarou Sarah por vários segundos, antes que Malfoy se estressasse com aquela atitude de pirralho apaixonado e se colocou entre ele e a Auror. Ter a imagem de uma bela mulher substituída por um homem que parecia mais um gigante obviamente o sobressaltou.
- E então? – Malfoy perguntou rispidamente para ele, que sustentou o olhar.
- Nenhum dos supostos Comensais pareciam se conhecer. Cada um morava em um lugar diferente da Alemanha, e nunca sequer se esbarraram. – Connor colocou as pastas sobre a pequena mesa e olhou para Mike, que continuava com o olhar atento sobre Harry, Ginny e Otto Bohrer.
Sarah voltou para o campo de visão de Connor com as sobrancelhas erguidas.
- Como se organizaram então?
Connor balançou a cabeça.
- O que intriga também é que todos eles jamais tiveram inclinação ou contato que tenha sido notificado com as Artes das Trevas. Um até parecia completamente contra a política de Voldemort.
Mike franziu o cenho.
- Isso só deixa mais uma lacuna nessa invasão. Quem eles queriam matar? Será que realmente não se conheciam?
Sarah voltou-se para ele.
- Quando fizemos o maluco que se enforcou engolir o Veritaserum ele não confessou nada. Simplesmente era como se não soubesse de nada.
Ao mesmo tempo, Ginny havia perdido o pouco de paciência que lhe restava, e dirigia-se furiosamente na direção do homem. Quando estava a meio metro dele, Harry segurou seu ombro, a impedindo de jogar o homem para fora da cadeira.
Ela se voltou para ele com o cenho franzido, enquanto Bohrer continuava às gargalhadas.
- Você não vai conseguir arrancar nada dele. – Ele sequer havia perdido seu tempo a encarando enquanto dizia tais palavras. Seu olhar estava cravado sobre o homem. Era como se tivesse chegado à conclusões importantes apenas de diagnosticar o homem à olho.
- Por que você diz isso? – ela perguntou com agressividade, livrando seu ombro do aperto de Harry. Ele finalmente desviou seu olhar para ela e disse com a voz suave.
- Porque nem ao menos ele sabe o que está fazendo aqui. Otto Bohrer foi confundido.
Continua...
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!