Capítulo Onze
- Eu desisto!
O tom de sua voz saíra completamente enlouquecido,enquanto observava o erro em sua poção pela enésima vez. Levantou-se, sacudindo a sujeira de suas vestes e olhou para o velho careca e gorducho sentado ao seu lado.
- Desistir? – o idoso perguntou com a voz mansa e paternal. Em seguida, levantou-se e balançou a cabeça. Era cego. – Pensei que quisesse vencer Voldemort, rapaz.
- Eu quero! – Harry replicou furioso, passando as duas mãos pelos cabelos, bagunçando-os ainda mais. – Mas para que uma poção vai me ajudar? E... E eu não nasci para essa porcaria de estudo de poções. – rebateu baixo, zangado e humilhado. – Não consigo fazer poção alguma com perfeição em um período de tempo relativamente curto.
- Hum. – o velho coçou o queixo e, mesmo que não enxergasse, dirigiu o rosto em sua direção. – Sempre escutei que o lendário Harry Potter era um rapaz forte e poderoso.
- Todo mundo inventa o que gostaria que fosse verdade. – ele rebateu zangado, sentando-se em um dos bancos do mosteiro.
- Hum. – ele suspirou mais uma vez, e pareceu não encontrar dificuldades para sentar-se ao lado de seu aprendiz. Ergueu as sobrancelhas. – E o que você gostaria que fosse verdade, rapaz?
Por muito tempo, Harry não respondeu. Aquele velho já havia feito aquela pergunta mais de uma vez, e Harry guardava as respostas para si. Com mais uma falha em sua lista extensa de tragédias em poções, ele não se agüentou e resmungou:
- Eu gostaria que outra pessoa fosse Harry Potter.
- É compreensível. – o homem disse amavelmente. – Mas não podemos esconder quem somos. E você, é Harry Potter... Mas não veja isso como um fardo. Você sabe quem você é.
- Não sou quem todo mundo pensa. – Harry deixou os ombros caírem e encurvou-se, apoiando os braços nas pernas.
- Quem é você, então?
- Alguém que teve o destino jogado em mãos, sem a oportunidade de escolha. – não conseguira evitar que sua voz não saísse um pouco rancorosa. – Alguém que as pessoas que gosto sempre morrem apenas porque estão perto de mim. Alguém que não consegue preparar uma poção sem destruir o caldeirão irreparavelmente e sem conseguir um sucesso. Alguém que não é nada e as pessoas esperam tudo e mais um pouco.
Ambos ficaram em silêncio após os comentários de Harry. Quando o mesmo ergueu os olhos para fitar o monge ,percebeu que o velho sorria. Havia um sorriso amoroso em seu rosto,enquanto ele parecia apreciar o som dos pássaros e o sol matinal.
Harry abaixou o rosto e resmungou:
- Queria ser como o senhor. Sempre foi extraordinário, pude perceber isso assim que cheguei aqui.
O velho pareceu sentir a borboleta que flutuava próximo a eles, porque abriu um sorriso caloroso e gentil.
- Sou um cego.
Harry entendeu o impacto daquelas palavras ao serem ditas. O velho continuava sorrindo, mesmo após sua condição triste. Já fazia dois meses que ele havia fugido da casa dos Weasley e estava vivendo ali naquela comunidade escondida, no Nepal. Os mais brilhantes preparadores de poções estavam ali, e quando Harry pedira a opinião daqueles gentis senhores, ambos haviam se recolhido e dito que ele tinha o talento para ser um preparador de poções nato.
Mas desde que chegara ali, sempre falhara.
Antes, no inicio, ele não entenderia onde o velho queria chegar dizendo sobre sua situação, mas dessa vez ele compreendera. O fato de ter problemas não o impedia de realizar as coisas, por mais que fossem complicadas.
- E mesmo assim o senhor não deixou de se esforçar para ajudar as pessoas. – Harry pareceu envergonhado com suas palavras anteriores.
O velho sorriu.
- Nós somos o que somos. Depende de nós, Harry, e exclusivamente de nós a forma como vamos encarar os acontecimentos que o destino nos presenteia. Podemos simplesmente cruzar nossos braços e dizermos que não somos capazes de fazer apenas pelo grau de nossas dificuldades, mas podemos tentar realizar nosso máximo, não pensando no que pode dar errado.
Eles ficaram novamente em silêncio. A borboleta havia pousado no topo da careca do senhor, e ele a recolheu carinhosamente, antes de abrir a palma da mão e permitir que ela voltasse a voarao redor das flores.
- O conselho disse que eu tinha talento para preparador de poções. – Harry murmurou depois de um tempo, olhando para as próprias mãos.
- O que você acha, Harry?
O rapaz engoliu em seco e olhou para o que restava do caldeirão. Seu peito se encheu de determinação e ele assentiu ao dizer:
- Quero tentar de novo, senhor.
Ginny olhou para os olhos de Harry, ignorando o maníaco que ria logo atrás deles. Podia até jurar que o clima na sala ao lado havia ficado mais tenso com a declaração dele.
- Confundido? – ela perguntou, balançando a cabeça. Em seguida, olhou para Otto Bohrer e não viu nenhum sinal que tivesse aprendido na Academia que mostrava sinais de uma pessoa que tivesse sido confundida. – Seria possível ver se a pessoa foi confundida, não?
Harry franziu o cenho em direção ao homem e soltou o ombro de Ginny.
- Se a pessoa que o enfeitiçou for boa, não.
Ele se aproximou de Otto, que ria loucamente, e colocou a mão em seu pescoço. Ergueu uma sobrancelha e molhou os lábios com a língua, antes de continuar:
- O corpo humano reage de diversas maneiras a diversos tipos de feitiços lançados. Um feitiço de confusão geralmente faz os olhos ficarem vidrados vez ou outra -.
- Essa é a maneira padrão para se perceber. – Ginny o cortou, com a sobrancelha erguida. Ele assentiu.
- Pode acontecer que o bruxo que os enfeitiçou não queria que as pessoas descobrissem imediatamente que as atitudes desses homens sejam percebidas como as de Homens Confundidos. – o homem parou de rir e estudou Harry, que o ignorou e soltou sua mão do pescoço dele. – Há uma mudança na respiração e na pressão dos batimentos cardíacos. Eles aceleram loucamente, como se o enfeitiçado estivesse posto sob uma adrenalina constante.
Ginny o encarou por um tempo em silêncio, com o olhar embasbacado. Em seguida, recuperou o seu controle.
- Mike? Você escutou isso? – ela perguntou olhando para o vidro. A porta se abriu e revelou a imagem de Draco Malfoy e Sarah.
- Cada palavra. – A voz de Mike ecoou na pequena Sala de Interrogatórios, enquanto Sarah aproximava-se do homem e fazia o mesmo gesto de Harry, checando seus batimentos cardíacos. Ela não ficou surpresa quando percebeu que o coração do homem estava realmente acelerado.
Malfoy estendeu uma folha para Ginny, observando Sarah e o maníaco.
- Potter está certo. O feitiço está perdendo o efeito, também. – ele franziu o cenho. – Nosso velho Otto está começando a ficar com os olhos vidrados vez ou outra.
Ginny leu a folha e olhou para Malfoy.
- Ele era contra Voldemort. – ela sussurrou e ele assentiu.
- Isso se intensificou quando a esposa foi morta por Comensais da Morte em uma convenção de paz em Londres, dois anos atrás.
Sarah se afastou de Bohrer e se aproximou de Harry.
- Sem contar que os supostos Comensais de hoje não tinham envolvimento algum uns com os outros, como se nunca tivessem se conhecido.
Ginny encarou Harry.
- Isso explica porque um dos sobreviventes se suicidou. – ele assentiu enquanto ela falava. – Um feitiço de confusão poderia causar isso, não poderia?
- Com toda a certeza. As duas perguntas importantes agora a serem feitas são: quem e por quê?
Sarah fez um gesto para Mike, para que chamasse outros Aurores para tirar o Comensal falso dali. Não demorou muito para que dois Aurores do Departamento entrassem e tirassem o homem, que voltara a ri, dali.
- Inicialmente pensei que fosse alguma rebelião de simpatizantes de Comensais, como no Caldeirão furado. – Sarah comentou com os braços cruzados, voltando-se para os três. – Mas não era como se fosse um motim.
- Eles estavam organizados. – Draco Malfoy completou por ela. – Mas não saberia dizer se eles haviam ido lá para atacar especificamente alguém, ou se para atacar todos os presentes.
- Pode existir a possibilidade de que eles tenham ido atacar vocês? – Harry perguntou a Draco, que balançou a cabeça.
- Muito remota. Não havíamos combinado de ir jantar fora até meia hora antes de irmos até lá. Pode ser apenas que estivéssemos na hora errada, no local errado.
- Eles haviam atacados todos que estavam a sua frente. – Sarah interpôs. – Um deles tentou assassinar uma criança aleatoriamente, como contei a Mike. Era como se apenas quisessem invadir e causar um estrago dos grandes.
Os quatro ficaram em silêncio, e saíram da sala da mesma forma. Ginny parecia atenta as expressões de Harry, como se tentasse desvendá-lo.
“Mas perder os poderes não significa que ele tenha perdido todo o aprendizado que teve ao longo dos anos, de quando esteve no colégio. Ele preserva suas atividades mentais normalmente.”
Harry... Onde você aprendeu tanto? Isso são noções da Academia de Aurores... Se não mais.
Malfoy não parecia impressionado com os comentários de Harry sobre feitiços de Confusão, e Ginny se pegou pensando sobre isso também. Era como se eles tivessem se encontrado mais de uma vez durante esses anos, como se tivessem até trabalhado juntos vez ou outra, e aquilo fazia tanto sentido quanto Harry estar misteriosamente mais conhecedor do mundo Bruxo e mais forte.
- Isso poderia estar ligado à Rostova? – Sarah perguntou de repente, interrompendo os pensamentos dos quatro, especialmente de Ginny.
Malfoy fez um barulho debochado com a boca.
- Rostova é um assassino em série, Madison. Um assassino em série organizado. O que aconteceu hoje não foi organizado nem obra de um assassino em série.
Aquilo pareceu atrair a atenção de Harry.
- Rostova está aqui? – perguntou a Malfoy com as sobrancelhas erguidas. O Auror deu de ombros.
- Nikolaievich acredita que sim, mas não me pergunte por quê. Não conheço indícios que possam provar sobre a estadia dele aqui.
Ginny não se agüentou sobre o conhecimento de Harry sobre aquilo, também.
- Como você sabe sobre Rostova?
Ele a encarou brevemente, enquanto os quatro caminhavam pelo corredor, antes de responder com sinceridade:
- Ajudei o Ministério Russo algumas vezes, recebendo ajuda em troca.
Sarah não pareceu surpresa com a informação. Enquanto Ginny muitas vezes era obrigada a ficar passeando de um país para o outro a cada dia, Sarah fora obrigada a passar um ano na Rússia, onde criara paixão pelo país e pela forma como o DICAT resolvia os crimes por lá. Ginny ficou se perguntando se Sarah também já havia se encontrado com Harry durante esse tempo, e não tivesse dito nada a ela.
- Rostova não seria bom o suficiente para Confundir esse número de bruxos apenas para nos confundir? – Sarah insistiu, fazendo Malfoy girar os olhos.
- Madison, entenda de uma vez por todas, Rostova trabalha sozinho. – ele olhou para Harry e fez uma cara entediada. – Ela tem estado com o caso de Rostova na cabeça o dia inteiro hoje, sabe-se Deus por quê.
- É a mesma coisa que você disse sobre assassinos em série. – ela retrucou aborrecida. – Que sempre se conhece a identidade dos assassinos... Bom, nem sempre. Sabemos o padrão, lemos suas mentes e os loucos da área psiquiátrica lhe dão apelidos. Você sabe, Jack Estripador, o Dominador, o Cirurgião, o Fantasma (4) ou qualquer coisa do tipo.
Malfoy parou de andar e Sarah quase trombou nele. Harry e Ginny também pararam, ambos com caretas em suas faces pela atitude frustrada dos dois Aurores.
- É por isso que eu estou falando que Rostova não está envolvido. – ele respondeu pela milésima vez, como se Sarah fosse incapaz de compreender. – O padrão de Rostova é trabalhar sozinho.
- Certo. – Sarah respondeu como se tivesse sido insultada. – Então temos dois casos em nossas mãos. Encontrar Rostova e prendê-lo e uma chacina sem motivo aparente num restaurante.
- Existe um motivo aparente. São Comensais, ou pelo menos é isso que eles acham que são.
- Claro. Qual parte de que eles estão Confundidos você não escutou? - ela deu um passo ameaçador em sua direção e franziu o cenho. Malfoy não recuou, e sim imitou seu gesto, pronto para uma briga.
Malfoy abriu a boca para responder, mas Harry pigarreou alto, fazendo os dois o encararem. Ele ergueu uma sobrancelha e disse sarcástico:
- Se o casal de velhos não se importa, temos que ir até Neville.
Sarah ficou instantaneamente vermelha, e Ginny sabia que era de raiva. Malfoy, por sua vez, encarou Harry como se fosse capaz de socá-lo até a morte.
Ginny segurou um sorriso. Harry poderia estar sem poderes, mas usufruía de uma posição natural de liderança, e estava agindo como se fosse o líder da operação.
- Você precisa saber onde fica a sala de Neville. – ela murmurou para ele, cutucando seu braço, aparentemente esquecida que ambos estavam se estranhando. Harry encolheu os ombros e piscou para ela.
- Essa é hora que você me dá instruções e salva o dia.
Neville Longbottom saudou os quatro visitantes com um aceno de mãos e um sorriso caloroso e receptivo. Teria sido algo muito bom de sua parte, se isso não fosse contrastado com o fato de que estava dentro de um local cheio de mortos refrigerados em geladeiras, o que tornava a saudação medonhamente macabra.
Draco Malfoy fez uma careta quando olhou bem para Longbottom. Como aquele paspalho que não conseguia sequer se livrar de um feitiço das Pernas Presas trabalhava nessa área? Ele pensou a respeito, e imaginou que os mortos deveriam se sentir aliviados que pelo menos não correriam risco de vida, já que alguém potencialmente perigoso para a saúde de todos estava a cargo de verificar toxinas e tudo o mais em seus corpos.
O que era um pensamento completamente estúpido e maldoso para ser criado naquele momento.
- Acho que não tive tempo ainda de lhe dar boas vindas decentemente, Harry. – Neville disse alegremente para o antigo colega de quarto, e Harry apenas abriu um pequeno sorriso de conformação, algo que Ginny percebeu não ser inteiramente natural.
- Isso não é problema. Vejo que andou muito ocupado ultimamente.
Neville sorriu e acenou.
- Ah, é verdade. Ossos do oficio, acho.
Atrás do homem vestido de branco com luvas cirúrgicas e uma touca para os cabelos, haviam quatro mesas com três homens e uma mulher. A máscara de morte já havia se instalado permanentemente em seus corpos.
Ginny, Harry, Malfoy e Sarah colocaram um avental cirúrgico parecido com o de Neville, touca para os cabelos e luvas cirúrgicas. Tanto Harry como Ginny pareciam tranqüilos àquela situação, caminhando com Neville para que se dispusessem ao lado da mesa de um dos três homens. Ginny viu que não havia um pingo de emoção na fisionomia de Harry, nem um brilho de raiva ou de indignação.
Malfoy por sua vez estava ligeiramente verde, e Sarah tentava manter sua postura de indiferença, mas Ginny a percebeu fechando o punho com força quando se colocou ao lado da amiga. Assim funcionava Sarah Madison, Ginny pensou. Casa caso, cada missão motivados pela raiva.
Neville inspirou profundamente e estalou os dedos das mãos, antes de perguntar:
- Posso começar o show?
Todos assentiram, com exceção de Malfoy, que o olhou como se Neville fosse um lunático pela escolha de palavras.
- Como vocês já ficaram sabendo, todos os agressores dessa noite na verdade são vitimas, tanto quanto os atacados no restaurante. – Neville explicou calmamente enquanto abaixava o lençol que cobria o corpo do homem até a cintura. – Todos, sem exceção, estavam Confundidos.
- Foi um feitiço? – Harry perguntou com a voz neutra.
- Na verdade, foi o que eu pensei de inicio. – Neville afirmou, não desgrudando os olhos do corte profundo que existia na garganta do homem. – Mas não posso determinar com certeza absoluta porque ainda faltam sair os resultados
- Isso causa alguma dificuldade na dedução? – Malfoy perguntou.
- Se fosse para determinar qualquer coisa como: causa de morte, ou o que seriam os cortes através do corpo ou doenças ou qualquer coisa do tipo, diria que não tem tanto problema, uma vez que há casos que acabo estudando com o rigor mortis sem problema algum. Agora num caso desses, acaba complicando um pouco justamente pelo nome. Pela atrofia dos músculos, do corpo em geral, não dá para colher muita informação a respeito da magia deixada no corpo.
Ginny o estudou por um momento.
- Mas você conseguiu chegar a conclusões, não é mesmo, Nev?
O homem abriu um largo sorriso.
- Bem, sim. Há a possibilidade de pelo menos setenta e cinco por cento de que o estado Confundido deles possa ter sido por meio de ingestão.
Malfoy e Ginny o encararam com o ar confuso, de quem não acreditava no que estava ouvindo. Sarah e Harry, por sua vez, desviaram a atenção do corpo e encaram Neville.
- Como um gás?
- Pouco improvável. – Harry respondeu. – Uma poção, talvez.
Neville assentiu animadamente para Harry, como se ele tivesse acertado a uma pergunta numa sala de DCAT em Hogwarts.
- Correto. Quem os confundiu sabia exatamente o estrago que queria causar. Uma poção controlaria mais do que um feitiço, ou a formação de gás.
- Existe poção para Confundir? – Malfoy perguntou.
- Não é como se existisse uma receita, veja bem. O bruxo ou bruxa no mínimo teria que ser um exímio preparador de poções para saber quais ingredientes juntar para conseguir a mistura que realmente quer. Mas se a pessoa consegue tal proeza, o resultado é melhor do que um gás produzido por varinha ou um feitiço. – Neville encarou o corpo por um tempo e disse baixinho. – Esse coitado sequer sabia o que estava acontecendo ao seu redor quando foi morto.
Sarah olhou imediatamente para os lados, parecendo envergonhada com alguma coisa.
- Não era como se ele estivesse confundido, na hora. O olhar que cada um nos lançava era como se tivessem calculado cada passo do plano.
- Mas isso ficou estranho quando eles começaram a entrar um por um, não foi? – Ginny perguntou para ele, que assentiu.
- Precisamente é um sinal do efeito da poção. Vocês têm alguma idéia de quem possa ter feito isso?
Sarah foi à única que nem negou nem afirmou. Os três negaram.
- Hum. – Neville disse suavemente. – Não podemos subestimar nosso desconhecido. Ele tomou todas as precauções para que sua identidade real não fosse revelada por meio de exames nos corpos.
-Você quer dizer que ele conseguiu desaparecer com sua marca. – o olhar de Harry cruzou com o de Neville e assentiu. Aquilo não havia sido uma pergunta.
- Correto. Não há como determinar o autor disso tudo. Mas ele não fez apenas isso.
- O que quer dizer? – Ginny perguntou com as sobrancelhas erguidas.
- Olhe, eu estudo corpos e a reação de feitiços e poções sobre eles, como a mente de nosso desconhecido funciona é provavelmente assunto para discutirem com o departamento da Mione. – ele riu. – De qualquer modo, por tudo o que ele fez eu presumo que é uma pessoa cuidadosa.
Harry pareceu entender as palavras de Neville.
- Ele considerou a hipótese de que quebrássemos o efeito da poção.
- Mais uma vez correto, Harry. E ele tomou precauções para isso.
Neville se afastou do corpo e dos presentes, caminhando até um espelho pregado à parede.
- Helena? Pode me trazer o resultado do exame realizado trinta minutos atrás? É o único que está sobre a minha escrivaninha.
Uma mulher de cabelos cortado Chanel e absolutamente negro, assim como seus olhos astutos, assentiu e abriu um pequeno sorriso para Neville, antes de desaparecer. Um segundo depois, retornou, mas dessa vez pessoalmente com papéis em mãos. Seu olhar caiu sobre todos os presentes na sala e ela abriu um sorriso para cada um, mas Sarah fisgou o olhar que ela lançou sobre Malfoy,e depois para Harry. Típico, ela pensou com desprezo. É só ver um homem bonito, no caso dois, e ela já fica com sorrisinhos e olhares maliciosos.
Sem dizer mais nada, ela voltou para sua sala em outro andar.
Neville entregou o papel a Harry, porque Ginny julgou que Neville o tivesse encarado como a pessoa mais digna de lê-lo. Neville adorava jogos de perguntas, e Harry chegara a maior parte das conclusões corretas. Aquilo era seu prêmio.
Harry leu o resultado e franziu o cenho, antes de dizer para os três Aurores:
- Nosso desconhecido envenenou os onze supostos Comensais.
- Correto. – Neville assentiu. – Para o caso de conseguirmos driblar sua poção perfeita, ele adicionou veneno ao sistema de cada um, com o pensamento de que não conseguiríamos obter informação alguma sobre quem está por trás disso tudo.
Sarah estava batendo os dentes quando finalmente chegou a seu apartamento, por volta das três e cinqüenta da manhã. Ela abraçava a si mesma e tinha pequenas olheiras sob seus olhos, sinal de que estava realmente cansada da noite estressante que tivera.
Ainda suficientemente zangada com Malfoy e cansada demais para pensar em lhe dirigir uma palavra educada, arrastou-se para o seu dormitório e trancou a porta em seguida.
Como se Malfoy se importasse com palavras como ‘boa noite’.
Ele não estava tão incomodado com o frio, uma vez que vivia na Rússia há tempo o suficiente para saber o que realmente era um clima frio. Entrando em seu quarto e deixando o casaco de inverno sobre a cadeira, olhou satisfeito para a coruja que estava no parapeito da janela, esperando ser admitida no aposento.
Ela desapareceu no céu escuro no instante seguinte que ele lhe tirou o envelope comprido. Sentou-se na cama e o abriu, revelando uma pasta grossa e amarela.
Fazendo o menor ruído possível, ele olhou para aquele tesouro à sua frente; eram fotografias, relatos e o dossiê completo de Sarah Madison.
Ele pegou a primeira folha, que lhe parecia o resumo de tudo que estaria por vir dentro daquela pasta.
Sarah Elisabeth Madison
Nascida no dia dezesseis de dezembro de mil novecentos e oitenta e três.
Filha do meio de Roger Madison, americano,serviço secreto americano, dispensa de honra
E Elisabeth Madison, britânica, professora de Transfiguração.
Nascida britânica, naturalizada americana. Estudante formada do Instituto das Bruxas de Salem.
Formação Acadêmica na Academia de Aurores do Canadá, com nota máxima em Disfarces, Feitiços Defensivos e Ofensivos, especialização em Desaparecimentos e Homicídios.
Atualmente no Departamento de Investigação Contra as Artes das Trevas, situado em Londres, sob direção de Michael Samuel Stuart, na Área de Missões Internacionais, sob direção e parceria de Ginevra Molly Weasley, na divisão de Homicídios.
Já deu suporte ao serviço secreto americano na área de Desaparecimento de Agentes Especiais.
Draco franziu o cenho e colocou a folha de lado, pegando uma das fotografias que tinha dentro da pasta. Nela tinha um homem alto e de ombros largos, olhos exatamente azuis como os de Sarah e os mesmos cabelos negros; postura rígida e o olhar sério. Ao seu lado, uma mulher duas cabeça mais baixa, com cabelos e olhos castanhos. Diferentemente do marido, tinha o olhar amoroso e gentil. Segurava um bebê em seus braços que não devia passar dos meses, com um tufo de cabelos castanhos.
À frente dos pais, duas crianças. Um garoto, aparentemente sendo o mais velho, por volta dos seus sete, oito anos, com cabelos castanhos curtos e olhos acinzentados, com a mesma pose rígida do pai e uma garota ao seu lado, por volta de seis anos.
Malfoy reconheceu imediatamente os cabelos negros e o olhar matreiro de Sarah Madison, por mais que estivesse com os cabelos curtos, um pouco abaixo do queixo e com aquele ar infantil, que obviamente ela havia perdido.
Passou mais uma foto e viu Madison perdida no meio de vários garotos, todos acenando para ele. Quase gargalhou ao se perguntar quando Sarah começou a criar curvas, porque ali estava óbvio que ela parecia exatamente como um. Todos usavam as mesmas cores, saia ou calça xadrez azul marinho e a gravata com alguns detalhes em um azul mais claro, o que ele julgou ser o uniforme do colégio que ela havia estudado.
A próxima foto era outra de sua família, mas poderia existir a possibilidade de Sarah nunca ter tido noção da existência da mesma, por ter sido tirada aparentemente por fora da casa; seu pai estava com a aparência cansada, e segurava um presente em mãos enquanto beijava o filho mais velho. A mãe depositava um bolo sobre a mesa e Sarah estava observando a mãe, o cabelo negro preso em um rabo de cavalo. Como todos os presentes,ela também não sorria. Era óbvio o ar melancólico na casa.
Draco estranhou aquela foto. Não havia sinal do filho mais novo do casal Madison.
Ele mal sabia do inferno que aquela família já havia passado.
A resposta veio em uma declaração feita em letra caprichosa, que ele julgou ser de Elisabeth Madison.
Por morarmos em um bairro tranqüilo, uma comunidade bruxa segura e isolada, nunca sentimos problema em criar nossos filhos com mais liberdade. Como estávamos entrando na semana de véspera de Natal, Roger e eu saímos em busca de uma árvore que atendesse nossas exigências e de nossa única filha, Sarah. Como Nathan, meu filho mais velho, já tinha a idade de quatorze anos, não vimos problemas em deixar as três crianças em casa enquanto íamos atrás de nossa busca.
Os Comensais da Morte invadiram nossa casa meia hora após a nossa partida,tomando nossos três filho, Nathan, quatorze anos, Sarah, doze anos e Alec, seis anos como reféns. Não tenho a absoluta certeza de que o termo ‘reféns’ seja algo completamente certo nesse caso, uma vez que os Comensais invadiram nossa casa com o intuito de vingar a morte de um Comensal que fora assassinado pelo grupo a qual Roger trabalhou, pela proteção de nosso país.
Obviamente Roger nunca deixou de ensinar aos seus três filhos técnicas simples de sobrevivência, como lugares apropriados na casa para se esconderem enquanto estávamos ausentes, lugares que o próprio Roger havia enfeitiçado para que não fossem encontrados sobre o Homenum Revellium, mas os três foram pegos antes que conseguissem se esconder.
Comensais da Morte sentem prazer em matar. Excitam-se com o cheiro de sangue e com os gritos de agonia. Especialmente o de crianças.
De acordo com o depoimento de meus filhos, na terceira página desse relatório, os três foram amarrados em cadeiras e vez ou outra eram soltos apenas para satisfazer a diversão dos Comensais.
Nathan foi torturado e queimado vivo, e Deus sabe que os Comensais apenas o ignoraram porque ele fingiu estar completamente inconsciente. Alec sofreu inúmeras maldições que lhe renderam cortes por todo o corpo, e não conseguiu sobreviver a perca de sangue considerável e o numero incontável de Maldições Cruciatus, onde ficou estendido ao pé da escada quando os Comensais haviam se cansado dele e ele estava desacordado, possivelmente morto.
Dos meus três filhos, Sarah foi a única que pareceu ter alguma reação. Escondeu um canivete para abrir portas em mãos enquanto era amarrada magicamente pelos Comensais e de fato chegou a possivelmente cegar um quando este tentou abusar sexualmente dela, enfiando-o com toda sua possível força para a idade no olho de seu agressor Obviamente não foi bem sucedida em seu plano, que era alcançar a própria varinha, próxima a lareira.
Ao acreditarem que as três crianças estavam desacordadas e possivelmente mortas, os Comensais saíram e incendiaram o local.
Quando Nathan conseguiu finalmente nos enviar um pedido de socorro, encontramos nosso filho na região pantanosa do vilarejo com Sarah desacordada e gravemente ferida nos braços, escondido. O corpo ensangüentado de Alec estava à sua frente
Malfoy não terminou de ler o resto daquele depoimento, que estava borrado em alguns pontos. Afastou o papel de si e o colocou ao lado das fotos, virado do lado que nada tinha escrito. Balançou a cabeça, enquanto imagens perfeitas daquele dia vinham em sua mente como flashs, por mais que não estivesse presente. Elisabeth Madison fora coesa o bastante para se poder imaginar os acontecimentos com perfeição.
Imaginou um garotinho de cabelos negros estendido no chão, sangrando até a morte. Imaginou o filho mais velho do casal Madison paralisado pelo medo e pelos acontecimentos, seu corpo não obedecendo aos seus comandos, ficando apenas num fingimento de inconsciência.
E Sarah.
Fechou um punho e o levou até os lábios, onde apoiou a cabeça por um momento, fechando os olhos e soltando um suspiro. Ele queria saber as habilidades de Madison e o que a tornava tão especial para Nikolaievich querê-la em seu grupo secreto, mas nunca que ele queria ter lido as palavras daquela mulher.
Já bastava seu próprio pesadelo.
Ele se lembrava de ter encontrado vários arquivos falando sobre as habilidades de Sarah, que incluíam manuseio com armas brancas trouxas, lutas trouxas e ‘habilidade excepcional em duelos’, mas sua mente não conseguia processar mais nada.
A única coisa que via eram flashs da cabeça loura de seu pai sobre seu colo, a respiração cada vez mais difícil, o olhar suplicante, que ele inutilmente sabia que não poderia fazer nada para ajudá-lo, os gritos de sua mãe, o olhar calculista do executor de seu pai.
E agora flashs de outra família destruída por Comensais da Morte. Um filho queimado. Um filho morto. E uma garotinha encolhida a um canto, os olhos azuis arregalados de medo, subjugada após sua tentativa frustrada de se salvar.
Ah, droga. Ele não conseguiria ler aquele dossiê tão cedo agora.
Mais uma noite em que ela não conseguia dormir.
Aquilo já estava virando rotina. Ginny enrolou-se em seus cobertores e se arrastou até o andar de baixo, pronta para ficar sentada, admirando a neve cair.
Não era por causa dos pesadelos. Simplesmente, por mais cansada que estivesse, ficava apenas virando de um lado para o outro na cama, incapaz de se render a delicia que era dormir.
Completamente mal humorada por que tinha plena ciência de que estaria um caco no dia seguinte, ela desceu as escadas vagarosamente e se dirigiu para a sala.
O que não esperava era que encontrasse Harry, também acordado, sentado em seu pequeno sofá com vista para a bay window.
Ela percebeu que ele a havia notado antes que ela percebesse que não estava sozinha. Por mais que não tivesse feito um movimento brusco, Ginny viu o vislumbre de sua silhueta através do vidro e a dele, os olhos verdes movendo-se em direção ao som, pronto para descobrir se estavam sendo invadidos ou se Ginny era tão atormentada com a insônia quanto ele.
- Problemas para dormir?
Sua voz saíra calma e controlada, sem nenhum vestígio de emoção aparente.
- Parece que você também. – ela rebateu com indiferença, sentando-se ao seu lado. Deu-se conta de como eram desconhecidos um para o outro; Ginny não sabia nada sobre Harry. O que ela sabia apenas, e de uma forma muito pobre, era que ele havia vencido Voldemort em uma batalha poderosa. Fim.
Harry assentiu e voltou a encarar a neve que tingia toda a paisagem de branco. O pequeno rio que era possível se ver através da janela da casa de Ginny estava congelado.
- Lembranças de Guerra é o tipo de coisa que não se tem como esquecer. – ele retrucou suavemente. Seu olhar parecia perdido, e Ginny se pegou pensando que ele poderia esconder a maior parte de suas emoções, mas ela conseguia compreender que ele era um homem marcado. Conseguia compreender o quanto as cicatrizes internas, em sua alma, o machucavam como se estivessem abertas as feridas ainda.
O silêncio reinou entre os dois, e Ginny se sentiu constrangida com o mesmo. Harry não parecia incomodado.
Ela ficou se debatendo por inúmeros minutos internamente, antes que dissesse com a voz controlada, mas não conseguindo esconder a culpa:
- Harry, desculpe, eu não ter te contado sobre meu casamento antes. Aquilo foi uma maneira horrível de se descobrir.
Ele desviou o olhar da paisagem pela primeira vez, e seus olhos perscrutaram os dela. Ela sentiu um arrepio percorrer pelo seu corpo, sentindo como se ele fosse capaz de ler seu interior. Por fim, apenas deu de ombros e desviou seu olhar do dela, voltando a encarar a neve.
- Tudo bem. Acho que eu não deveria ter ficado nervoso com você. Afinal, eu nunca deveria ter achado que as coisas não estariam diferentes.
Ginny percebeu que havia alguma coisa a mais por trás daquelas palavras.
- O que quer dizer com isso?
Ele se aconchegou no sofá e fechou os olhos.
- Só estou um pouco confuso com tantas mudanças.
Ela franziu o cenho, enquanto estudava suas feições, sentindo liberdade em fazer isso abertamente uma vez que ele não poderia vê-la fazendo isso. Por fim, disse baixinho e lentamente:
- Por que você se esconde atrás dessa máscara de controle e indiferença?
Ele deixou que um vestígio de sorriso aparecesse em suas feições.
- Muito perspicaz, Ginny.
Muito perspicaz o que? Ginny gostaria de poder ler sua mente, mas duvidava que ele ainda fosse um péssimo Oclumente.
- Isso não responde a pergunta. – ela pontuou, com os olhos fixos em todas as suas reações.
- A Guerra me ensinou a ser assim. – Harry respondeu e abriu os olhos, encontrando os dela. – Vi, presenciei e fiz coisas horríveis, que me obrigavam a tomar certa postura. Não permito mais que as pessoas vejam quem sou ou o que sinto, realmente. Simplesmente paro e analiso.
Mas sua muralha teve uma falha hoje, Ginny pensou consigo mesma, Quando descobriu que eu havia me casado.
- Eu não sou sua inimiga para ter tanta cautela.
- Eu nunca a vi assim.
- Então por que a mesma postura que teria com inimigos ou supostos? Até com Ron e Hermione você tem sido assim.
Harry suspirou.
- Talvez seja um hábito. Talvez esse seja realmente eu atualmente... Afinal, não foi apenas você quem mudou, Ginny.
- Ainda sou a mesma pessoa.
- Mas as circunstâncias são completamente diferentes. E não me diga que não é, não me refiro apenas ao seu divórcio. Antes você era apenas uma garota de dezesseis anos, hoje é uma mulher conhecida como uma das melhores Aurores da atualidade onde lidou com casos e missões perigosas e pode até analisar situações que antes via de uma forma de outra completamente diferente.
Ginny se afundou em seu cobertor e imitou Harry, observando a paisagem.
- Mas se isso serve de algum consolo, você parece ser a única pessoa que consegue me decifrar melhor. Que sabe que tudo que é falado tranquilamente é simplesmente frases calculadas.
- Se eu consigo te decifrar, sinto dó das outras pessoas.
Ele apenas sorriu, mas ela percebeu que fora um sorriso divertido e verdadeiro. Ficaram em silêncio por mais alguns minutos, antes de Ginny dizer em voz baixa:
- É como se fossemos dois estranhos.
- Eu nunca me esforcei para que passasse disso.
Ela conseguiu pegar o pequeno rastro de rancor que passou por aquela resposta. Desviou o olhar do lago congelado e o fitou.
- Acho que eu concordo com você sobre o que disse anteriormente.
Ele também a encarou dessa vez. Estava com um olhar de educada curiosidade, como se não tivesse entendido o real significado daquelas palavras. Ginny apressou-se ao dizer:
- Quero dizer, sobre sermos honestos um com o outro.
- Ah. – foi impressão dela ou ele ficara tenso com o que ela havia dito antes? – Bem, é a melhor maneira para não sermos pegos nessa mentira toda que se transformou as nossas vidas.
- Não apenas por isso. – ela desviou o olhar para os móveis dentro de sua casa quando estava prestes a revelar o que realmente pensava: - Eu... Simplesmente não consigo suportar o fato de que não sei nada sobre você, não consigo te decifrar. É como se o garoto que conheci fosse simplesmente outro. Finjo viver um romance com um homem que, quando olho nos olhos, não consigo ver nada a não ser a figura que desejam ver. Harry Potter, O Eleito.
Harry franziu o cenho em sua direção.
- O que você quer?
- Que você seja o homem Harry, e não a figura do Eleito que todos querem ver. – Ginny respondeu com suavidade. – Infelizmente ou felizmente, eu sou sua guarda-costas – ela encolheu os ombros – isso quer dizer que eu preciso da sua confiança em mim para que o meu trabalho seja o melhor possível.
Ele ficou em silêncio e Ginny se perguntou se ele havia se ofendido pelo uso de suas palavras.
- Não apenas isso. – ela balançou a cabeça. – Não apenas por ser minha obrigação, meu trabalho, mas porque eu me preocupo com você, por mais que sejamos completamente desconhecidos.
Harry continuou em silêncio e Ginny terminou:
- Não ser tão difícil ser apenas Harry.
Aquilo fez que ele soltasse uma risada,mas nem de longe ela fora divertida.
- Você não imagina como pode ser.
- Então me deixe saber. – ela pediu, não desviando seu olhar do dele.
Ele pareceu considerar suas palavras, e Ginny entendeu que ele estava avaliando a situação. Por fim, disse:
- Você já consegue me interpretar bem mais que qualquer um, Ginny. No momento, o que você está olhando não é O Eleito, e sim apenas Harry. – ele apontou para si mesmo, como se enfatizasse o que dizia. – Mas há coisas sobre mim que você não precisa saber, não agora, pelo menos. – disse baixinho. – Da mesma forma que provavelmente há coisas sobre você que ainda não quer que eu saiba. Mas sim, há honestidade entre nós, se é isso que quer. – Harry encolheu os ombros. – Sem motivos obscuros.
Fora a vez dela de considerar suas palavras. Era verdade, existiam coisas sobre sua vida que ela não se sentia bem o suficiente para que contasse a Harry, da mesma forma que acreditava que aquilo não fizesse diferença ele saber ou não. Isso se enquadrava seu casamento que caíra em desgraça e sua gravidez, ambas histórias que ardiam em seu intimo como feridas abertas.
Harry se levantou, enrolado em seu cobertor.
- Quer um chá ou chocolate quente?
Ótima forma de encerrar o assunto. Ginny ergueu o rosto e o encarou com as sobrancelhas erguidas.
- Você não sabe onde eu guardo as coisas na cozinha. – o provocou.
- Ótimo momento para ser honesta comigo. – ele brincou. – Eu não estou em condições de fazer um feitiço convocatório para encontrar saches de chá ou o pote de chocolate em pó.
Ela se levantou com um sorriso de quem achara graça e caminhou até a cozinha, com Harry em seus calcanhares.
- Fala sobre seu problema como se estivesse despreocupado.
- E estou. – ele encolheu os ombros enquanto ela o instruía a se sentar numa das cadeiras na cozinha, que ela iria fazer o chocolate quente para ambos.
- Você sabe o que pode ter acontecido? – bem, afinal, ele sabia de tudo, Ginny pensou com certo sarcasmo, mas quando se virou viu genuinamente que ele não sabia.
- Não faço idéia. – Era verdade. Ela conseguia interpretar isso. – Mas não adianta ficar se desesperando por causa desse contratempo. Escutei as versões dos curandeiros e a única coisa que posso fazer é esperar até sair um diagnóstico.
Ela acendeu o fogo e colocou o leite num tipo de caneca de aço.
- Pensei que ficaria nervoso com sua situação.
- Nervoso eu estou. – Ele admitiu. – Mas com relação a minha proteção, não estou preocupado. Tenho você.
Continua...
--------------------------------------------------------------------------------
(4) “o Cirurgião” e “o Dominador” são ambas as personagens fictícios de Tess Gerritsen, ambos assassinos em série, e eu usei como se fossem assassinos reais. Como não se sabia a identidade deles no inicio, o Dr. Zucker (do livro também) dava apelidos de acordo com a maneira de pensar do assassino, daí o comentário de Sarah a respeito da identidade de Rostova. “o Fantasma” já se refere à Monk, matador profissional do livro de Julie Garwood (cujas aparições se retratam em ‘O Testamento’ e ‘Prazer de Matar’), cujo apelido foi dado porque sempre sumia no instante que estava para ser preso. Conforme se lê livros de suspense médico e/ou romance policial, é fácil encontrar personagens que são definidos assim, assim como Assassinos em Série ao longo da vida real que são definidos de acordo com o seu comportamento padrão na hora de cometer um assassinato.
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!