Cap 4 - Contando a verdade

Cap 4 - Contando a verdade



Hope começou a despertar como sempre fazia, tomando consciência de tudo aos poucos, prestando atenção e absorvendo, antes de mover um único músculo. Sentiu o suave ronronar de Guinevere na nuca, pôs-se a pensar e abriu os olhos.

Ao girar a cabeça, encostou a face no pêlo da gata, viu a irmã dormindo ao seu lado e, de repente, tornou-se real o que acontecera na noite anterior. Movendo-se o mínimo possível no colchão, sentou-se e pôs a gata nos braços. Em silêncio, enfiou os pés nas botas de caubói e saiu do quarto na ponta dos pés.

A visão do pai deitado no sofá proporcionou-lhe alívio imediato. Desejara tanto a sua presença. Samantha dissera que lê não vinha – que há séculos não aparecia quando precisavam dele. Mas Hope pressentira que o pai ia chegar. Ás vezes, acontecia isso... Ela pressentia coisas. Como pressentira a preocupação da mãe ao sair para o grupo de leitura. Achara então que era por causa de Guinevere. O veterinário advertira que o fim da gata seria silencioso e rápido, e Hope se preparara. Fora ela mesma quem insistira para que a gata morresse em casa, a seu lado. Mas queria que a mãe também estivesse com ali quando o fim acontecesse.

Acomodando-se no tapete, não muito longe do pai, cruzou as pernas e conchegou-se delicadamente Guinevere no colo. O pai dormia. Talvez fosse um bom sinal. Se sua mãe tivesse morrido, ele as teria acordado não?

Travava uma batalha consigo mesma, sem saber se o acordava ou se o deixava dormir, quando Harry despertou com um sobressalto da cabeça aos pés.

- Você devia ter me acordado. – ele disse.

- Imaginei que, se você conseguiu dormir assim, mamãe está bem.

- Ela está bem. Só precisa de muitos cuidados.

- Você falou com ela?

- Não, ela estava dormindo. Mas acho que sabia que eu estava lá.

- Ela não está morta?

- Não.

- Tem certeza? – Hope tinha 13 anos. Se a mãe estivesse morta, queria saber. Agüentaria a verdade.

- Não, Hope. Ela não está morta. Eu nunca mentiria a você sobre isso.

Ela fez que sim com a cabeça, recuperando o ritmo da respiração.

- Quando vamos lá?

- Mais tarde. – Olhou para a gata. – Então é este o bichinho que apareceu um dia na porta da frente todo mordido e machucado?

Hope acariciou a orelha da gata malhada.

- As mordidas sararam.

- Gwendolyn, não é?

- Guinevere. – Curvou a cabeça e começou a alisar os pêlos espetados em volta do pescoço do animal, quando a voz de Samantha surgiu na porta.

- Quando você chegou? – perguntou, encarando o pai.

Ele ergueu os olhos e, por um instante, confuso pelo cansaço e tensão, pareceu-lhe ver Hermione. Em parte, por causa do cabelo, castanho, tão ondulados e cheios quanto os da mulher, quando a conhecera. Em parte por causa do feitio do corpo, ainda mais definido do que na última vez em que há vira um mês e meio atrás. Mas a voz era idêntica, o mesmo tom de quem tem sempre a última palavra. Reconhecia naquela entonação à mesma cautela, até mesmo o ressentimento que ouvira em Hermione na última noite em que passaram juntos, ainda casados... E, de repente, ele se via de volta àquela noite, no quarto do casal, escolhendo as gravatas para levar em sua viagem a trabalho, enquanto Hermione falava, recostada á porta.

Harry lembrava de cada detalhe da cena e era capaz de materializar a figura da mulher com nitidez absoluta.

Flashback

Hermione acabara de sair do estúdio que os dois dividiam no último andar da casa rosa, estilo mediterrâneo, na marina. Usava calça jeans folgada e uma das camisetas dele. Tinha o rosto pálido e transmitia aquela decepção que, num instante, o colocava na defensiva.

- Achei que você não iria mais. – ela declarou encostada na porta.

- Eu também, mas tive de mudar os planos. – Afastava as gravatas no armário para escolher as que combinavam com os ternos que separara.

- Eu esperava que ficasse aqui por algum tempo.

Ele não se voltou, não queria ver a palidez em seu rosto.

- Eu também.

- Não pode simplesmente recusar? – perguntou, aproximando-se.

- Não é assim que funcionam as coisas. – comentou ríspido. – Fui contratado para projetar um centro de convenções. Dos grandes. O projeto básico é a parte mais fácil. O difícil é dar-lhe consistência e adaptá-lo para atender à sua função e, para fazer isso, tenho de sentir mais a cidade. – Lançou uma gravata na cama e virou-se para ela suplicante: - Pense em seu próprio trabalho, Mione. Seu talento a destaca dos outros pintores. Não só o talento, mas também as opções quanto faz a profundidade, tema, intenção, e você não poderia fazer escolhas desse tipo sem passar algum tempo no campo. Nem eu poderia.

Embora mantivesse a voz baixa, ela não cedia.

- Limito meu trabalho ao campo há apenas uma semana, duas vezes por ano. Você já viajou duas vezes este mês... Três, se for amanhã.

- É o meu trabalho Mione.

Ela parecia á beira das lágrimas.

- Que sempre me deixa sozinha aqui.

Era somente uma força de expressão, Harry sabia disso.

- Você tem as meninas. Poderia fazer amizades se quisesse, além de pintar. E também sair todas as noites.

- Mas não quero! Detesto me embonecar, detesto conversa-fiada, detesto ficar circulando de salto alto e mastigando canapés com caviar.

- Nem mesmo por uma boa causa?

As reuniões para levantar fundos beneficentes eram parte integrada da vida social da cidade e essenciais, sobretudo para alguém como Harry. Ele precisava comparecer e ser visto.

- Não posso mais pintar aqui. – disse Hermione entristecida.

E a pintura era seu mundo.

- Todo pintor ás vezes se sente bloqueado.

- É mais que isso. – ela cruzou os braços na cintura. – Sequei até a borda, acabou minha criatividade. Não vejo cores aqui. Não consigo mais sentir inspiração como antes. Você e eu vivemos agora mais separados que juntos.

Ele lançou as gravatas na cama.

- Olhe bem para isso. – ela gritou. – Olhe bem, são todas caretas. Nós íamos fazer alguma coisa só nossa, criativa, diferente, não ficar preso nesta luta renhida para vencer na vida. – Quando você voltar, não vai mais me encontrar aqui.

Ele suspirou.

- Por favor, Mione, tente compreender.

- Tente você compreender. – ela gritou. - Se é para eu ficar sozinha, prefiro que seja em outros lugares. Vou me mudar para West Sussex. – Acrescentou então, com delicadeza. – Venha comigo.

Ela sabia que ele não podia se mudar para West Sussex. Ficava a três horas de Londres.

- Fala sério?

- Muito sério. Morei dez anos aqui por você. Agora é a sua vez de morar em outro lugar por mim. – disse saindo do quarto.

Fim flashback.


- Pai! – gritou Samantha, trazendo-o de volta ao presente. – Como ela está?

Harry correu a mão pelo rosto e respirou fundo antes de contar à filha sobre a perna e as costelas da mãe. Estendeu o braço e tocou os cabelos de Hope, querendo desesperadamente aliviar o choque.

- O problema é que ela levou uma pancada muito forte na cabeça e continua inconsciente.

Hope fixou os olhos no pai.

- Ela está dormindo? – perguntou.

- É, pode-se dizer que sim. Só que nada a acorda. O nome disso é coma.

- Coma?! – gritou Samantha.

- Calma filha. – Harry apressou-se em dizer. – Não é tão ruim quanto parece. Coma é o que o cérebro faz quando precisa concentrar toda sua energia na cura. Assim que a pessoa se recupera o suficiente, acorda.

- Nem sempre. – contestou Samantha. – Ás vezes as pessoas ficam em coma durante anos.

- Sua mãe vai acordar. – insistiu Harry.

- Como é que você sabe?

Ele não sabia, mas a alternativa era impensável.

- O médico não viu motivo algum para achar que ela não vai acordar. Escute – começou, baixando o olhar para incluir Hope, curvada sobre a gata. – temos de ser otimistas. Precisamos ir até lá e dizer á mamãe que ela vai melhorar. Se dissermos coisas assim muitas vezes, ela vai ficar boa.

Samantha deixou escapar um gemido. Ele deu-lhe uma olhada a tempo de vê-la revirar os olhos, mas quando se encontraram com os dele, estavam marejados de lágrimas.

- Você tem alguma sugestão melhor?

A garota não respondeu. Limitou-se a fazer que não com a cabeça.

- Muito bem, acho então que devemos fazer o seguinte: tomar o café da manhã e ir pra o hospital.

Abraçando a gata junto ao peito, Hope disse:

- Talvez seja melhor eu ficar por aqui.

- Não quer ver a sua mãe?

Lágrimas escorriam-lhe pelo rosto quando ela o ergueu:

- E se Guinevere morrer quando eu não estiver aqui?

- Não vai morrer. – retrucou Samantha. – O veterinário disse que ale ainda tinha algum tempo de vida.

- Não muito.

- Hope, ela não vai morrer hoje.

- De que é que estão falando? – Harry perguntou.

- Guinevere tem um tumor. – explicou Samantha. – O veterinário quis dar uma injeção para fazê-la dormir, mas Hope não deixou.

Então a gata tem uma doença terminal. Harry se perguntava o que mais haveria de errado ali, quando Hope encarou-o com os olhos rasos de lágrimas e disse:

- Ela não sente dor. Se sentisse, eu deixaria o veterinário dar a injeção. Mas amo Guinevere e ela sabe disso. Quero que continue, a saber, por mais algum tempo. Que há de errado nisso?

- Nada. – disse Harry.

Samantha discordou.

- Prioridades. – disse à irmã. – Mamãe vive falando delas. Guinevere não vai morrer hoje. Se não houvesse acontecido o acidente, você ia deixá-la em casa quando fosse para a escola. Por isso, se sair agora, ela não vai saber se você vai para a escola ou visitar a mamãe. Mas a mamãe vai.

Harry começava a achar que ela argumentava com muita sensatez e que talvez houvesse esperança para a filha mais velha, quando Samantha se virou e disse:

- Você vai se barbear e tudo mais antes de sairmos, não pai? Parece um mendigo.

- Obrigado.

Deu um tapinha no ombro de Hope e levantou-se com esforço do sofá. Precisando de energia depois de apenas – quanto? – uma hora de sono, foi preparar o café.


Se conhecesse outro caminho para o hospital, Harry o teria tomado. Mas só havia aquele. Sentada no banco do carona, os cabelos molhados do banho no chuveiro, Samantha tinha os olhos cravados na estrada. Hope se encaixara no banco traseiro do BMW, as botas de caubói plantadas em cada lado da protuberância no meio do carro. Harry reduziu a velocidade para fazer a primeira curva de muitas.

- Veja! – apontou Samantha. – Foi ali que aconteceu. Ali... Onde está faltando um pedaço de grade de proteção da estrada. Pare, quero ver.

Harry continuou dirigindo.

- Não há nada para ver, o carro foi rebocado.

As duas meninas viraram-se para olhar o local do acidente pela janela traseira.

- Gina disse que alguém bateu no carro da mamãe. O que aconteceu com o outro motorista?

- Não sei! – mentiu Harry.

Samantha tornou a desabar para frente.

- Sabe sim, mas não quer dizer.

- Nesse momento, sua mãe ia querer que você dissesse apenas coisas agradáveis, ou se calasse.

- Isso é o que você diria não a mamãe. Ela ia querer que disséssemos o que pensamos, e eu acho que esse acidente foi mais sério do que você afirma, o que significa que estamos numa enrascada. E se mamãe não acordar? Eu não vou morar em Londres.

- Papai? – do banco traseiro, brotou um grito assustador.

Harry encontrou o rosto de Hope pelo espelho retrovisor.

- Ela não vai morrer, Hope. Vai ficar boa. O acidente aconteceu há menos de 12 horas. Pelo que sabemos, quando chegarmos ao hospital, sua mãe pode estar acordada e pedindo o café da manhã.

Pelo menos era isso que ele esperava.


N/A: dpois d naum sie qnto tempo... aki estou eu!!! Nossa... sou eu msmo?? uhauauahuahuha
Quero agrqdecer a tds q esperaram ansiosos por esse cap.. especialmente a Sarinha, q mandava msgm cobrando esse cap o tempo td.. Minina, esse cap eh especial p/vc!!!
Dpois eu escrevo + aki..
Bjoks e ate+

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