Via-crúcis do corpo
Amanheci meio doente. O mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão com vidas mentirosas. E o amor, em vez de dar, exige. E quem gosta de nós quer que sejamos alguma coisa de que eles precisam. Mentir dá remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece...Você deve se perguntar onde foi que eu menti. Menti quando disse que não queria a ver nunca mais.
Hoje era o dia em que voltaríamos para as nossas casas para passar o Natal. Passou-se uma semana e não vi mais Hermione. E a dor do que havia dito a ela doía mais que os tapas que recebi. Perdi ela porque não sabia se estava cansado ou estava querendo desistir. Perdi ela porque não medi minhas palavras. Quer um conselho? Ás, vezes, é bom saber a hora de calar-se porque senão pode-se morrer sufocado na sua ânsia de acertar as palavras. Então, quando ver que vai começar a falar asneiras, cale a boca. Se você sentir que precisa dizer urgentemente aquilo áquela pessoa, apenas não fale. Finja que nada aconteceu e tudo irá voltar naturalmente para você. Não seja sonserino como eu. Não estrague a sua vida como estraguei a minha.
Fui para o salão tomar café. Todos estavam ali. Menos Hermione e Potter. Weasley estava falando com Longbottom e a Weasley estava olhando para a porta de entrada a cada cinco minutos. Termino de comer e levanto-me da mesa. Parkinson diz algo que não entendo e então, eles apareceram. Potter e Hermione. A minha Hermione. Ela estava feliz. Pelo menos aparentava. Os dois andavam juntos até a mesa da Grifinória. Havia a leve embriaguez de estarem juntos. Embriaguez que era minha até pouco tempo. Saí do salão porque não agüentaria ver aqueles dois juntos. Não depois de ter conhecido Hermione como eu conheci. Fui para o meu quarto arrumar o meu malão. O trem saía ás nove horas. Eram oito e vinte.
Oito e cinqüenta.
Subo no trem e vou para a primeira cabine do último vagão. Coloco meu malão no compartimento, sento no banco estofado perto da janela e espero. Encosto a cabeça na janela de vidro, e pelo frio que sai da minha boca, a janela fica embaçada. Começo a desenhar. Um cavalo-marinho. Adoro cavalos-marinhos.
-Oi, Draco. – Falou Parkinson quando entrou na cabine. – Então, vai passar o natal com o seu pai mesmo ?
-Aham.
-Vou passar o Natal com o Bruce. -Falou sentando ao meu lado. Soltou um muxoxo.
-Voltou com ele foi? – Perguntei parando de desenhar e olhando para ela. Não me interessa muito a vida particular da Parkinson com o Bruce, mas tento me fazer de educado.
-Foi. Ele quis voltar comigo, e como ele tem muito status na comunidade bruxa, aceitei.
Entende agora o que digo sobre garotas interesseiras serem ridículas? Pois é, são ridículas. Vi que meu desenho já havia desaparecido, embacei o vidro, e comecei a desenhar novamente.
-Blaise volta dia 29 tá sabendo?
-Tô. Mas não to nem aí, se você quer saber. – Eu nunca esqueceria o que ele falou de Hermione.
-Sempre sonserino, não é?
-Sempre.
Vi a porta da cabine abrir e entrar Crabbe e Goyle. Sentaram no banco da frente e falaram algo que pra mim era mais pra um grunhido. Ouvi o pino do trem e olhei no relógio. Oito e cinqüenta e sete. A porta da cabine abriu mais uma vez e entrou á cabine Steve Bruce, o namorado da Parkinson. Cumprimentei-o com a cabeça.
Encostei a cabeça na janela do trem e fiquei a esperar a viagem acabar. Nunca uma viagem de cinco horas pareceram dias para mim.
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Ouvi a companhia da porta soar. Olhei o relógio no meu pulso: dez para ás seis da manhã. Quem diabos visitava alguém em plena seis da madrugada? Ouvi outra vez o som irritante e levantei da cama, jogando as cartas e as fotos em cima da cama. Desci ás escadas e abri a porta. Minhas sobrancelhas se encontraram.
-Oi, desculpa invadir sua casa a essa hora, Malfoy. – Falou, já entrando em casa. – Mas é que é urgente!
-Não pode me dizer, Weasley?
Não estranhe o Weasley invadir assim a minha casa. Faz dois anos que trabalhamos na mesma equipe de aurores. Não considero Weasley meu amigo nem ele a mim, mas falamos profissionalmente. Potter trabalha no Conselho Nacional de Aurores, um órgão normativo do Ministério. Já Weasley e eu trabalhamos no Departamento de Aurores, embora eu quisesse trabalhar na Junta Administrativa de Relações Internacionais. Eu não sou tão bom auror assim, admito. Ás vezes, aurores têm que sacrificar a vida pela dos outros, isso não é muito comigo.
-Não, há certos assuntos que precisam ser estudados e visto. Esse é o caso.
-Não pode estudá-lo sozinho?
-Não, porque isso lhe interessa.
-Ah, é? – Respondi sentando no sofá ao lado dele. –Faz tempo que não tenho algo que me interessa.
-Pois é. É urgente, encontre-me hoje no Caldeirão Furado, ás três horas da tarde.
-Pra quê?
-Você vai saber, não seja curioso. – Reclamou levantando do sofá. – Não se atrase. Feliz Natal.
Depois aparatou. Feliz Natal? Aquilo ali era uma piada, esse Natal consegue ser pior do que o do ano passado que passei a noite comendo sopa porque o avô da Parkinson tinha morrido no dia 23. Tudo bem que nunca tive um feliz Natal, mas antes de Hermione, eu pensava que tinha, e isso já bastava. Agora, nem felicidade eu sei o que representa mais. Dei de ombros e subi ás escadas para meu quarto, precisava dormir. Era sábado, então passaria a manhã todinha dormindo para encontrar o Weasley á tarde. Espero que não seja perca de tempo.
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Passei pelo portal da estação King’s Cross. Estava voltando do Natal. Como foi? Um tédio. Meu pai e eu jantando á mesa sozinhos sem comentar uma palavra para o outro. Tive a impresão que ele queria falar algo comigo, mas não sabia como, então deixou por isso mesmo. Parei de lembrar do Natal quando vi Thanatos remexer as asas na gaiola e soltar um pio. Fechei os olhos com raiva quando senti uma mão pesada bater nas minhas costas.
-Oi, Malfoy. Como é que foi de Natal? – Perguntou Goyle.
-Péssimo, Goyle. Agora, nunca mais bata em mim.
-Sim, desculpe. Olha, o Crabbe está vindo aí. – Disse apontando para Crabbe. Fiz uma careta involuntária.
-Vamos juntos para a cabine? – Convidou Crabbe. Mas o que raios havia acontecido com aqueles dois? Haviam se amado por acaso?
-Ah, vão vocês, preciso comprar uma coisa. – Menti. Eles deram de ombros e embarcaram no trem. Cocei a cabeça e girei o pescoço para a direita. Ouvi um trec.
Empurrei o carrinho e subi no trem. Não estava a fim de ficar na mesma cabine que Crabbe e Goyle, então fui para as cabines dos monitores. Preferia ficar sozinho naquela viagem a ficar escutando as baboseiras do que fizeram no Natal. Escutei o pino do trem avisando que já ia sair. Não deu meia-hora e a porta da cabine foi aberta por Parkinson.
-Oi, Draco. – Ela comprimentou sentando ao meu lado. – Eu não vou perguntar como foi suas semanas de feriado, porque sei que foi uma porcaria pra você.
-Que bom que você sabe.
-Te conheço. Eu só queria saber o que você tem com a Granger.
-Nada. – Falei assustado. Será que a Parkinson tinha descoberto meu segredo? Mas como? Crabbe e Goyle? – Por quê?
-Porque a Weasley disse pro Profeta Diário que vocês tão tendo um “affair”. É verdade?
Meu coração disparou mais assustado que já estava. Tinha que ser aquela Weasley. –Claro que não, Parkinson. Granger é uma sangue-ruim. Nunca me sujaria com ela, sabe disso. Sou honrado, e honra se lava com sangue!
-Sei. – Ela disse. – Mas o que disse ao seu pai? Porque você sabe que ele não gosta que se misture com esse povo.
Talvez fosse isso que o meu pai queria falar comigo. Só que eu não estava nem aí. Cansei de todos que estavam á minha volta. Havia cansado até de mim mesmo. Por culpa de Hermione, o que eu era, eu não sou mais e não tenha nada para me lembrar. Não que eu queira.
-Já falei sim. – Menti não sei porquê.
-Tá triste. – Ela comentou vendo o meu rosto.
-E como foi lá com o Bruce?
-Normal. Em falar nele, vou procurá-lo. – Ela disse levantando-se. –Ah, o Flinch-Fletchey disse que queria reformular as rondas esses semestres.
-E o que eu tenho a ver com isso?
-Você é o Monitor-Chefe, Draco. Você e Granger são os responsáveis pelas rondas no castelo. Vocês têm que se organizarem e dividir as rondas para cada um de nós, esqueceu?
-Não. Mas será que temos que fazer tudo? Não estou a fim de reformular rondas de ninguém, muito menos do Flinch-Fletchey. Que ele fale com a Granger.
-E você acha que ele não falou? Só que ela disse que você também tem que dar a autorização pra mudar o horário dele, já que trocando o horário de um, poderia alterar os horários dos outros. Sabe como é a Granger, cheia de frescura.
-Bem, ela segue as regras. – Respondi olhando o chão.
–Daí ele pediu pra eu pedir a você que aceite a mudança de horário dele, já que ele não gosta de você. O que diz?
-Pra mim tanto faz.
Ela acenou com a cabeça e saiu da cabine. Hermione era realmente profissional no que fazia. Ás vezes, um defeito, outras vezes, uma qualidade. A porta abriu novamente e entrou Flinch-Fletchey junto com Emily alguma coisa, monitores da Lufa-Lufa. Vi o rosto de raiva do Fletchey e um sorriso amarelo de Emily. Eles sentaram no canto do banco oposto ao que eu estava.
-O que estão fazendo aqui? – Perguntei visivelmente incomodado com aqueles dois.
-Parkinson nos chamou aqui para ajeitar as rondas. – Respondeu Emily. – O Justin tá querendo fazer rondas em duplas porque acha que estão muito cansativas.
Não era má idéia. Até porque podia ter um dia em dupla com Hermione. E mesmo sem dizer uma palavra, me faria feliz por uma noite. A porta abriu de novo e entraram Lovegood, Maloney. Lovegood sentou ao lado de Emily enquanto Maloney sentou no canto do banco onde eu estava sentado. Mal deu tempo de eu olhar a paisagem lá fora e Parkinson entrou de novo sentando ao meu lado. Depois dela, Weasley e Hermione. Não olhei para ela por isso não posso dizer o rosto que ela fez ao me ver. Como sabia que era ela? Conhecia o perfume dela a quilômetros. Ouvi-a bufar zangada quando viu que o lugar exatamente á minha frente era o único disponível.
Ela sentou e fiquei a mirar seus sapatos.
-Justin está querendo fazer as rondas em duplas e não acho má idéia, mas teremos que dividir uma dupla por noite, além de ter que pedir aos professores que também nos ajudem com as rondas, pois haverá lugares que não serão vistos. - Hermione falou de uma vez.
-Sou a favor também de folgas. – Sugeriu Weasley. - E quero as minhas nas segundas-feiras. Odeio segundas-feiras.
-Certo. Também sou a favor de folgas. – Respondeu Hermione. – Então, para não haver reclamações, primeiro, decidimos os dias de folgas de cada um para depois decidirmos os pares e os locais para cada dupla. Rony ás segundas-feiras. E vocês?
-As minhas têm que ser nos sábados, porque a maioria dos jogos no domingo acontece de manhã. – Falou Lovegood esbugalhando os olhos azuis. – Mas se não puder, não tem problema.
-Pode sim, Luna. E você, Miguel?
-Quero aos domingos. – Respondeu sorrindo mostrando os dentes de castor.
-Minhas folgas serão nas quartas-feiras. – Parkinson falou com convicção. Ai de Hermione se ela não colocasse Parkinson de folga ás quartas.
-Certo. Justin?
-Ás quintas. E a Emily quer ás terças.
-Então, eu fico com a sexta-feira livre. – Falou. Tinha certeza que ela havia gostado. Hermione adorava sextas-feiras e odiava fazer rondas nesse dia. Para ela, era perda de tempo passar a sexta-feira fazendo ronda.
-Só falta você Draco. – Disse Parkinson. – Vai ter que repetir o dia de folga com alguém. Quer ás quartas, também?
-Não, ás sextas. – Respondi calmo. Senão a veria na ronda sexta-feira era melhor não ter também. Ouvi ela soltar um muxoxo baixinho.
-Bom, então, Malfoy e eu vamos ajustar as duplas e os locais, depois passaremos a vocês.
Os outros levantaram e saíram da cabine deixando somente Hermione e eu. Profissionalismo. Pensei. Só pensei porque dizer não disse nada, Hermione também não. Acho que ela tava esperando eu dizer algo, mas eu disse que não falaria mais com ela. Ela que puxe assunto, não eu. Não me venha dizer que estou sendo idiota, eu sou assim mesmo. Posso morrer de amor por aquela garota, mas não puxarei assunto se falei que não ia mais perder meu tempo com ela. Acho que ela cansou de ficar esperando uma palavra minha e decidiu falar.
-Qual dia você prefere pra fazer rondas com a Parkinson, Malfoy? Exceto ás quartas, lógico.
Dei de ombros dando a entender que tanto faz o dia. Não muda nada mesmo só o nome. –Pode ser ás terças? – Ela perguntou.
-Uhum.
Levantei o rosto e vi que ela havia transformado um pedaço de sapo de chocolate em um papel amarelo. Hermione era realmente boa naquilo.
-Bom, já que tudo tanto faz para você, vou decidir as duplas sozinha. – Ela começou a escrever no papelzinho. Consegui ler “Segunda-feira: Justin-Parkinson, torre de astrologia.” A letra não estava caprichada como costumava ver, parecia tremida. Ela escrevia as duplas e eu continuava a ignorá-la olhando para os sapatos. Fiz uma careta quando senti algo queimar dentro de mim. Fechei os olhos quando comecei a suar. Abri-os novamente, respirava ofegante. Estranhamente, recordei momentos da minha vida, quando criança, quando entrei em Hogwarts, quando recebi o tapa de Hermione no terceiro ano, quando a vi chorar perto da estátua de um olho só, quando estávamos em Hogsmeade tirando aquela foto...minhas mãos se fecharam e percebi que o que queimava era meu braço esquerdo. Diabos, a marca negra! Soltei um gemido de dor pela ardência e Hermione pareceu escutar. Olhei para ela e ela parecia estar sabendo o que acontecia. Senti ela pegar na minha mão e abri os botões da manga da minha camisa branca. Ela ia ver a marca negra. Ia ver e ia ficar com ódio de mim, nunca mais falaria comigo! A última coisa que me lembro é que olhei pro olhos castanhos de Hermione. Fixamente. Tais momentos são meus segredos. E não pense que sabe todos os meus segredos, porque tem segredos que não conto nem a mim mesmo. Mas esse segundo terminou e vi minha vista ficar embaçada, depois, um peso enorme pareceu sair de cima de mim.
Abri os olhos.
Meu corpo mexia ao movimento da locomotiva. Meu pé direito estava fora do banco e sentia que estava todo molhado. Vi umas bolinhas brancas flutuando no ar. Ainda sentia uma ardência no braço esquerdo. Aproveitei para olhá-lo. A manga da camisa estava dobrada até o cotovelo e a marca estava mais escura e mais verde. Passei a mão em minha testa e senti o suor impregnado.
-Você tá bem? – Olhei de onde vinha a voz e vi Hermione sentada no banco da frente. Ela levantou e sentou no chão próximo aonde eu estava deitado. Passou a mão em minha testa. –Você me deu um baita susto, Malfoy. Parecia que estava tendo uma convulsão, nunca mais faça isso.
Desviei o olhar mirando o teto da cabine. Não conseguia olhar para ela. Nunca em toda minha vida tinha vontade de chorar tanto quanto tive naquele momento.
-Tá ardendo ainda? – Ela perguntou curiosa. Não respondi. –Quando você desmaiou, a marca ficava cada vez mais verde...
-Como sabe que arde?
-Porque é o lógico. Como sabe que Voldemort está chamando senão acontecer algo com você?
-Faz sentido. – Ela ficou de joelhos e tocou na marca no meu braço. – Como passou o Natal? – Perguntei puxando assunto. Desisti de me fazer de otário.
-Bem. Só to preocupada porque tio Géremy ficou doente e não sei como ajudá-lo. A gente teve que ir para Paris quase que de repente. Mamãe ta desesperada.
-São os tios que você visitou no terceiro ano?
-São.
-E não sabe o que ele pode ter?
-Os médicos suspeitam de síndrome da imunodeficiência adquirida. Os trouxas costumam chamar de AIDS. Ele ta horrível, Malfoy, cheio de feridas.
-Isso aí é pereba! – Falei e ouvi-a rir.
-Quem dera. Seria tão mais fácil. Ah, em falar em Paris, comprei uma coisa pra você que vai adorar.
-Comprou algo pra mim? – Perguntei assustado. Ela tinha comprado algo pra mim mesmo quando havíamos discutido, e eu não comprei nada pra ela. Caralho, eu era muito boçal mesmo. Senti meu coração bater acelerado. –O que é?
-Ah, é trouxa, espero que não se importe. Ta lá nas cabines dos meninos, quando a gente chegar em Hogwarts, eu te entrego.
-Certo, não tem problema. –Ora, quem não estava esperando ganhar nada qualquer coisa é lucro, mesmo que demore a receber.
-E como você passou o Natal?
-Morgando. – Falei sem titubear. – Um tédio total.
-Ah, olha, aqui está os horários das rondas, vê se você concorda.
Ela me deu o papelzinho amarelo e comecei a ler. Abri um sorriso quando vi “Quarta-feira: Rony-Justin, Torre de Astrologia; Luna-Emily, Torre Sul; Miguel, Jardim; Malfoy-Hermione, Masmorras”. Teria um dia em dupla com ela, e no meu território! Concordei com a cabeça. Ela pegou a varinha e multiplicou os papéis, depois, guardou-os no bolso da calça. Levantei as costas do banco e fiquei sentado, dobrei as pernas e coloquei pra fora do banco. Hermione levantou-se do chão e sentou no banco de couro ao meu lado. Percebi que ela ainda olhava para a marca como se esperasse que desaparecesse. Levantei meu braço esquerdo e ela seguia os movimentos do braço com os olhos; coloquei o braço no apoio do banco atrás dela.
-Tá tudo bem, já parou de arder.
-Hm, que bom.
Virei o rosto para olhá-la de perfil. O rosto corou-se rapidamente. Ela virou o rosto e olhou-me nos olhos. Nada precisou ser dito. Até porque não tinha como. Eu não sabia o que dizer e descobri que o que não consigo dizer é mais importante do que digo. Descobri que a hora da palavra é quando não se diz nada; é quando tudo que deseja falar, a outra pessoa lê pelos olhos. E aquele silêncio que ficou entre mim e Hermione não precisou de tradução. Hermione engoliu em seco enquanto meu rosto aproximar-se-ia do dela. Os lábios dela despregaram-se e senti o ar quente no meu rosto; a mão esquerda deitou-se sobre meu peito e depois foi passando para trás da minha nuca; fechou os olhos como se rezasse por algo; abriu-os novamente. Meus lábios tocaram os de Hermione e pela primeira vez ela aceitou e devolveu o beijo. Foi intensificando-se. Sentia a mão esquerda perder-se nos meus cabelos vagarosamente; minha boca desgrudou da dela e desceu para o pescoço; minha mão esquerda saiu do encosto do banco e juntou-se a direita levantando o casaco preto de Hermione. Por baixo, uma blusa de mangas compridas de cor também preta ainda a protegia do frio. O contraste da cor castanha do cabelo com o preto da blusa era formidável. Hermione calou meus pensamentos com um beijo; a mão esquerda ajudou a direita a desabotoar minha camisa, demorou um pouco porque os botões na camisa masculina ficam ao contrário das blusas femininas e Hermione não tinha experiência com isso. Senti a respiração ofegante de Hermione no meu ouvido enquanto a mão direita subia dedo por dedo pelo meu abdômen até o meu tórax. Meus dedos desabotoaram a calça marrom de Hermione; senti que as mãos dela começavam a suar deixando um rastro pelo meu corpo por onde os dedos dela percorriam; minha mão esquerda guardou-se na direita dela, enquanto a minha mão direita ia deitando-a no banco pela cintura, ao mesmo tempo, meu corpo ia inclinando-se para frente. Hermione começou a brincar com os meus cabelos, ela sabia o que aquilo fazia comigo. Com meus próprios pés tirei meus sapatos; Hermione tirou a mão esquerda dos meus cabelos e foi descendo pelo meu rosto, pelo meu tórax, pelo meu abdômen. Os dedos dela abriram meu botão da calça preta e o zíper, depois subiram de novo até a nuca me puxando para mais perto de si. O beijo, assim como no começo, ia se aprofundando; minha mão direita continuava guardada na esquerda dela. A cada segundo, as mãos suavam mais, tanto as minhas quanto as de Hermione. Senti minha mão direita ser apertada fortemente pela dela como se tivesse medo de ficar sozinha. Parei o beijo e a olhei nos olhos. Os olhos cor de mel que mais amava naquele mundo. Que eu nunca amaria outros iguais.
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Naquele momento adoraria que aquele fotógrafo de Hogsmeade eternizasse aquele minuto. Estava deitado no banco de couro, sem camisa, com a cabeça apoiada nas pernas de Hermione enquanto os dedos dela brincavam comigo. Meus pés dançavam sozinhos encostados na parede da cabine num ritmo que não existia. Meus olhos estavam cerrados e um sorriso maroto tímido aparecia no meu rosto. Escutava Hermione falar baixinho, mas depois notei que ela estava cantando. Consegui escutar “That sugarcane that tasted good, that’s who you are, that's what you could, c’mon, c’mon, no one can see you cry”.¹
Abri os olhos e encontrei os dourados dela. Aposto toda minha fortuna que Potter nunca os fez brilharem assim. Hermione sorriu e depois encostou a cabeça na borda da janela do trem. Hermione se desencostou da parede quando ouviu alguém bater na porta.
-Hermione?! – Chamou Potter. Hermione abaixou o rosto e olhou para mim apreensiva. – O que está fazendo aí?
Respirei fundo e me ajeitei no banco. Hermione levantou-se e pegou minha camisa que estava no chão e entregou-me. Levantei-me e coloquei a camisa, Hermione chegou perto de mim e me ajudou a abotoar.
-Hermione! Abra a porta! – Gritou Potter batendo mais forte na porta da cabine. Hermione tirou a varinha e desfez o feitiço e abriu a porta. Potter entrou bufando. – O que aconteceu? Por que demorou tanto? E por que estava trancada com Malfoy?
-Estávamos fazendo a nova ronda dos monitores, Potter! – Respondi um pouco rouco.
-Ah sim? Acredito! – Falou irônico. –Não pense que sou idiota, Malfoy.
-Eu não penso, Potter, eu tenho certeza!
-Parem! – Interferiu Hermione.
-Não sou idiota, Malfoy. Você não me engana, vai, mostra a marca, vai! – Potter voou pra cima de mim e puxava a manga da minha camisa para cima. Hermione tentou segurar, mas não conseguiu. Potter deu um soco no meu estômago. –Vai, desgraçado! Mostra a marca, mostra!
Potter puxou mais forte e a manga da camisa acabou rasgando um pouco. Tentei me soltar, mas ele me prendia na parede e puxava a camisa.
-Sai fora, Potter!!
-Harry, solta ele!
-Não se mete, Hermione! –Ele respondeu. A mão esquerda dele segurou meu pescoço na parede, manchas vermelhas começavam a aparecer. Potter soltou meu pescoço e com as duas mãos puxou a manga esquerda da camisa rasgando-a mais do que já estava. Potter conseguiu rasgar mais a manga e viu a marca negra. Cerrei os punhos quando ele me deu um soco agora no rosto. –Seu filho da puta, acha que eu não sei que você é um deles?
-Harry, pára! Deixa ele!
-Hermione, ele é um comensal! Não ta vendo a marca? - Ele falou apontando o dedo para a marca no meu braço. – Não vai me dizer que você ainda vai ficar falando com ele ainda depois de ter visto a marca?
-E se eu ficar? Ele é meu amigo, não é?
-Não seja ridícula, Hermione. Está expondo a todos nós. Rony tem razão, você vive confraternizando com o inimigo.
-Não é verdade, não fale do que não entende. – Potter não deixou que Hermione terminasse e foi embora. Hermione olhou pra mim e depois saiu atrás do cicatriz. Eu já sabia que ela ia atrás dele mesmo. Fechei a porta com brutalidade e soltei o ar nervoso. Tirei a camisa branca, peguei o malão que estava no compartimento e aproveitei para trocar logo de roupa, já estávamos chegando a Hogwarts.
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Meus pés andavam sobre a grama um pouco alta. Senti pisar em pequenos cristais de gelo na grama verde. Respirava um pouco ofegante pela raiva de ter que seguir Weasley para algum lugar que não fazia idéia do que fosse. Havia cansado de perguntar e Weasley não querer dizer. Tento mais uma vez.
-O que estamos fazendo aqui, Weasley? Aliás, onde estamos?
Vejo Weasley limpar a garganta e do bolso tirar uma fotografia. Entregou-me. Era uma fotografia trouxa, não se mexia. A fotografia era de um menino pequeno. No máximo seis anos. Tinha os cabelos e os olhos castanhos. Um sorriso divertido estampado no rosto mostrava que parecia ser um garoto alegre. Sortudo.
-O que aconteceu com ele? – Pergunto ainda mirando a fotografia.
-Morreu.
-Morreu? Como?
-Assassinado.
-Por que diabos alguém iria matar um menino de seis anos? – Perguntei guardando a fotografia no bolso da calça.
-Na verdade ele tinha quatro. –Como se aquilo fizesse muita diferença. – Foi morto por Comensais enquanto brincava no jardim da casa onde morava.
-O garoto era trouxa?
-Faz diferença pra você, Malfoy? – Ele perguntou aumentando a voz.
Não respondi. Ele também não repetiu a pergunta. Então ficou por isso mesmo. Percebi que estávamos num cemitério. Vi algumas lápides e coroas de flores. Parece que iríamos até a lápide do garoto.
-Como é o nome dele?
-William. – Nome bonito. Weasley parou de andar e fiquei a espera dele fazer algo. Comecei a bater o pé. Ele percebeu. – Acalme-se, Malfoy, já estamos chegando.
Começamos a andar por mais alguns metros. Weasley parou em frente á uma lápide de mármore branco. Estava cheia de flores, de todo o tipo, mostrando que havia morrido não fazia muitos dias. Senti uma angústia que não sei explicar, não sei se era revolta por terem matado uma simples criança ou outra coisa, mas me incomodava ficar olhando. Abaixo e fico sob um joelho. Afasto uma flor que estava em pé prejudicando a leitura do nome. A angústia que já sentia, aumentou quando li o que estava escrito.
“Nunca esquecido”
“William Draco Malfoy”
*03-Out-1998
† 20-Dez-2002
-Ele era seu filho.
Continua...
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“That sugarcane that tasted good, that’s who you are, that's what you could, c’mon, c’mon, no one can see you cry”.¹
Trecho da música Imitation of Life do R.E.M. Fica aí a dica para quem quiser escutar, fantástica banda, acho que é uma das únicas no mundo que consegue me passar um sentimento diferente a cada música que escuto deles. Talvez seja porque sou meio alucinada por música.
N/A: A cena entre Draco e Hermione fica pela imaginação de vocês. Vamos lá, sejam criativas.
Respondendo comentários.
Teresa: Desculpe pela demora. Semana atoladíssima. Aula de Legislação de Trânsito. Não sei se já teve, mas aguarde as piores horas da sua vida. Enfim, aí está o capítulo e espero que tenha gostado. Hermione nem precisou correr muito para ter o perdão do Draco não é? Mas vou te dizer, ô loirinho que dá pena, esse! Hehehe, coitado, sofre muito. Você pegou raiva da Mione? Que isso, não faça isso não! Harry trair Hermione com Gina? Hm, vamos ver o que acontece nos próximos. Keep reviewing please =*.
Isabella Rodrigues: Guarde sua ansiedade, moça! Se não perde a graça, não se preocupe, a fic não terá mais que 13 capítulos. Por isso se eu passar dos 13 podem me apredejar, eu aguento! Brincadeiras á parte, está quase tudo planejado para terminar a fic no capítulo 12. Só falta colocar de forma correta no papel.
Ariane: O único capítulo referenciado com música é o capítulo sete, cujo nome é carinhoso, penso que conheça a música, não? Embora este capítulo- "via-crúcis do corpo"- também é uma música, é do grande Cazuza. São os únicos capítulos que estão refernciados com música. Mas eu tava vendo, se você juntar o capítulo 5 e o capítulo 6 fica uma alusão á "O bêbado e a equilibrista". Acho que minha paixão pro música acaba falando mais alto até inconscientemente. Quer um final feliz? Hmm, vou pensar no seu caso. (Mentira, a história já tá toda pronta, e não posso dizer o que acontece, sinto muito, =P).
Maris: Você ficou com vergonha deles terem discutindo na frente de todos? Você é tímida? Não me leve a mal, mas a maioria das pessoas tímdas não gostam de ver pessoas discutindo na frente dos outros. A discussão foi mais pra deixar aquela coisa de "nossa, e agora? todos vão saber disso" eu sei que é tosco, mas eu descobri que dá certo. xD.
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