Dia do Encanto



Como a professora Hannah não voltara mais depois de ter visto os dragões e não voltara para a aula com sua turma da noite, Vicky sugeriu que Nissenson fizesse uma demonstração de suas habilidades para os alunos. Mesmo não tendo gostado nada da idéia, Nissenson foi convencido por MacGilleain, já que ele já havia feito amizade com as alunas, que estavam sentadas todas ao seu redor, e não tinha a intenção de ir embora tão cedo.
Contrariado, ele listou todo o material que precisaria e pediu para que Vicky providenciasse. Assim que ela voltou com um caldeirão repleto de ingredientes e o colocou em cima da mesa principal da sala, o dragão já havia começado os preparativos com o que eu tinha ao seu alcance. Porém, quando ele viu a garota colocando todos os ingredientes em ordem, ele parou.
- Esses frascos...
- Ah, bonitos, não? É a professora Hannah mesma quem faz! Todos os finais de semana ela... O que foi?
- Hannah? Por acaso não seria Hannah McPherson?
- Sim. Conhece ela?
- Na-não é isso. – ele se atrapalhou em devolver os frascos que estava olhando para a mesa – Eu tenho que ir. Boa sorte com a aula, Vicky.
- Mas você vai dar a aula!
- Ei? Já vai? – perguntou MacGilleain confuso, por não ter prestado atenção no amigo até ele sair apressado da sala, e então se levantou e foi atrás dele – Ei, Simon! Você vai embora?
Diante da fuga dos dois, os alunos olharam perplexos para Vicky. Mas ela, mantinha o olhar fixo nos frascos e parecia ter feito a ligação de alguma coisa muito importante.


***


- A Mary pediu para encontrar com ela no final do dia na ponte. – informou Doumajyd para Hainault pela esfera.
O outro dragão limitou-se a mostrar interesse em algo além da visão do amigo.
- Ela falou com você? – perguntou o líder preocupado.
- Não. – disse simplesmente Hainault, mas não conseguindo esconder o tom de estar incomodado com a pergunta direta.
- Eu não vou perder, Ryan. – ainda disse Doumajyd antes de terminar o contato.


***


Quando Vicky chegou na frente da principal loja de poções da família Nissenson, no centro de Hogsmeade, ainda nem havia amanhecido direito. Porém uma pequena multidão de garotas já fazia o maior alvoroço na porta. Dois empregados da loja tentavam contê-las, cada uma exigindo ser recebida pelo Dragão Simon para poderem lhe entregar seus doces do Dia do Encanto. Nissenson sempre passava pela loja antes de ir para a Academia em Londres, por isso haviam tantas garotas lá. Elas sabiam que aquela era a melhor oportunidade de se aproximar dele.
Respirando fundo, Vicky escondeu o seu embrulho com seus chocolates (que não terminaram muito bem depois de ela ter perdido a orientação da professora Hannah) na sua mochila e abriu caminho até a porta. Os empregados, ao verem que era ela, uma conhecida e cliente da loja, logo a deixaram passar. Assim que entrou, ela foi recebida pelo velho gerente com um grande sorriso:
- Ah, bom dia, senhorita Victory! Eu sabia que viria hoje! Mas o senhor Simon ainda não chegou.
Porém, assim que ele terminou de falar, um ronco de moto foi ouvido no lado de fora e o alvoroço das garotas aumentou. Logo a porta abriu e Nissenson entrou rapidamente, ainda com o seu capacete na cabeça, como proteção.
- Todo o ano a mesma coisa... – ele atravessou a loja reclamando – Ah, Vicky! Quem bom que veio!
Desde que o vira entrar pela porta, Vicky teve a sensação de que não conseguiria se manter em pé por não controlar o nervosismo que sentia. Mas aquelas palavras dele ao vê-la lhe deram coragem. Ela deu um grande sorriso e começou a dizer, se atrapalhando em abrir a mochila:
- Si-simon, eu-
- Posso falar com você? – pediu ele sério.
- Ah... – ela desistiu de tentar abrir a mochila, tendo um pressentimento de que o assunto não tinha nenhuma relação com o Dia do Encanto e que não era mais o melhor momento de se entregar doces – Claro.


***


No final do dia, Doumajyd esperava impacientemente na ponte que separava as propriedades da sua família de um pequeno vilarejo bruxo. Ele já observava há algum tempo o rio raso, mas de águas rápidas, tentando imaginar se Mary lhe traria novamente os biscoitos em forma de dragões, e sorria sozinho.
Um movimento na entrada do vilarejo chamou a sua atenção, mas ao verificar se era Mary, ele apenas viu duas crianças. A menina estava entregando timidamente um embrulho para o menino, e esse aceitou mais sem graça ainda.
A cena fez o sorriso de Doumajyd se alargar ainda mais, afinal, esse seria o seu primeiro presente do Dia do Encanto em toda a sua vida, e seria dado por Mary. Somente ele havia sido chamado por ela. E isso significava que ela havia tomado uma decisão.


***


Vicky não fora ajudar a professora Karoline nas estufas e Mary acabara ficando até o final do dia a ajudando a terminar as encomendas das alunas para o Dia do Encanto. Por isso, o sol já estava quase se pondo quando ela aparatou no vilarejo próximo as propriedades Doumajyd e correu mais rápido que pôde até a ponte.
- Desculpa, eu me atrasei! – ela chegou ofegante na ponte e se preparou para receber um rugido do dragão.
- Eu acabei de chegar. – disse Doumajyd contente.
Mary o encarou duvidando muito daquilo, mas se ele não havia ficado bravo ela não daria motivos para irritá-lo. Tudo o que menos precisava naquele momento, em que planejara tudo o que iria falar, era de um dragão cuspindo fogo e gritando com ela.
- Você tem algo para mim, não tem? – perguntou ele procurando pelas mãos delas.
A pergunta paralisou Mary por alguns instantes. Ela sabia o que ele estava esperando, mas...
- Eu fiquei muito confusa. – ela começou a dizer abrindo a sua mochila.
- Tudo bem. – disse ele ansioso e tentando espiar o que ela iria pegar.
Então Mary retirou uma caixinha de veludo roxo e a entregou para o dragão.
Confuso, Doumajyd pegou a caixinha e se surpreender ao ver dentro dela o colar com o pingente de saturno que ele havia dado para ela antes de ir para Nova York. Todo contentamento que ele demonstrava até momentos antes desaparecera, e então perguntou escolhendo as palavras:
- ...O que significa isso?
- Eu... eu estou devolvendo. – respondeu Mary – Significa que devemos acabar com isso definitivamente. – e ela respirou aliviada como se, até aquele momento, não acreditava que conseguiria falar aquilo.
- É brincadeira, não é? – perguntou o dragão.
- Eu realmente estava indecisa e precisei pensar muito. Mas, de todos os ângulos que eu tentava ver a nossa situação, a melhor alternativa sempre era desistir.
Ele permaneceu em silêncio, ainda encarando o colar com o planeta, refletindo o brilho dourado do sol que se escondia. Isso fez com que Mary percebesse que deveria dizer algo mais, mas não conseguia pensar em nada olhando para o dragão, então voltou a sua atenção para as águas do rio abaixo deles e tentou dizer sorrindo:
- Realmente você demorou muito, Doumajyd, e muitas pessoas estão sendo machucadas agora por causa disso... Não vamos conseguir ser felizes se continuarmos assim. Não somente pela Summer, que é a mais prejudicada, mas...
Doumajyd olhou para ela falando tudo aquilo como, se ela estivesse inventando uma desculpa e a aumentando cada vez mais para parecer verdade.
- Como fica o D4? – continuou Mary – Como fica você e o Ryan? Eu não posso... O quê?!
Doumajyd fechara a caixinha com raiva e a jogara no rio sem aviso.
- O que você fez?! – Mary se debruçou no muro de proteção e viu a caixinha deslizar e passar por debaixo deles. Então ela correu para o outro lado da ponte e tentou desesperadamente localizar a caixinha boiando, até que a encontrou presa em um monte de pedras da margem.
- NÃO BRINQUE COMIGO! – berrou Doumajyd chutando várias vezes o muro da ponte com raiva.
Mary se assustou e se voltou para ele, esquecendo da caixinha.
- É SÓ ISSO QUE EU SOU PARA VOCÊ?! – perguntou ele bufando – ACHA QUE ME DEVOLVENDO ESTARÁ TUDO RESOLVIDO?! SE VOCÊ NÃO QUER ELE NÃO TEM VALOR ALGUM PARA MIM! Eu... – ele vacilou nas palavras – Eu... SE NÃO FOR VOCÊ, MARY, NÃO TEM SIGNIFICADO NENHUM!... – sem conseguir falar mais nada, ele chutou mais uma vez a ponte com toda a sua força e saiu furioso em direção a sua mansão.
Mesmo quando ele havia desaparecido de vista, Mary ainda ficou paralisada no mesmo lugar em que estava, segurando a sua mochila, chocada com aquilo. Ela já havia ouvido o dragão gritar várias vezes, mas nunca como agora. E tudo o que ele falara a atingira como se fosse um feitiço estuporante.
Muito de vagar, ela voltou a olhar para o rio, onde a caixinha estava. Aquele colar só significava alguma coisa para Doumajyd se ele significasse alguma para ela. E para Mary, ele significava uma promessa:
Eu vou retornar quando me tornar um bruxo ainda melhor! Portanto me espere, Weed! E mesmo que você me peça e diga que não consegue viver sem mim, eu não vou voltar antes disso! O mesmo vale para mim!... Mesmo que eu não consiga viver sem você eu vou me esforçar e dar o melhor! Acredito que isso me fará forte! Tão forte que ninguém poderá nos atrapalhar novamente! Mesmo agora, no futuro, e ainda mais adiante... você é a única que eu sempre aprovarei! Eu ficarei com você, Mary, não importa o que aconteça!
Era o que Doumajyd havia dito para ela naquele dia quando foi para Nova York. O colar representava essa promessa. Promessa que ele tentou, mas não conseguiu esquecer. Porém ela, muito facilmente, era capaz de jogar toda a sua determinação fora e perder para as dúvidas.
- Eu não sou assim... – ela sussurrou para si mesma – O que foi que eu fiz?...
Então a correnteza conseguiu soltar a caixinha das pedras e começou a levá-la rio abaixo. Sem pensar duas vezes, Mary largou a sua mochila e correu. Saiu da ponte e atravessou a estrada, pulou acerca dos arredores da cidade, entrou na vegetação que havia na margem e pulou nas águas geladas do rio. Ele não era fundo e lhe batia somente nas canelas, mas era repleto de pedras escorregadias e a correnteza não facilitava o equilíbrio. Mesmo assim, caindo, resvalando, agüentando o frio que parecia queimar a pele como agulhas, ela continuou avançando até conseguir alcançar a caixinha. Por duas vezes ela escapou dos seus dedos e foi para mais longe, mas na terceira vez Mary se jogou para frente e conseguiu alcançá-la, não se importando por ter batido todo o seu corpo nas pedras. Segurando a caixinha com todas as suas forças para que ela não caísse novamente no rio, Mary se levantou e finalmente sentiu o frio e a dor das pancadas que levara, e não agüentou ficar em pé. Caiu de joelhos no rio e começou a chorar.
E, mesmo depois de o sol já haver se posto, Mary continuou ali, chorando como há muito tempo não chorava.
Na outra margem do rio, entre as árvores, dois grandes olhos lilases observavam atentamente toda a cena.


***


Doumajyd atravessou toda a mansão furioso e bateu a porta do seu quarto com toda a força que conseguiu. Tirou o seu casaco jogando-o de qualquer jeito no chão e se largou na cama, ainda respirando de forma descompassada.
Foi só depois disso que percebeu algo estranho e brilhante ao seu lado. Era uma caixa embrulhada com papel vermelho e um grande laço dourado. Entre o laço e a caixa, estava preso um pequeno bilhete rosa, onde estava escrito:


Para o meu Chris! Não coma todos de uma vez! E vamos ficar juntos para sempre!
Summer.


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