Destino
Christopher Doumajyd estava andando apressado pelas ruas de Londres, com seus pensamentos correndo ao mesmo ritmo que seus pés. Pensava em como tinha pouco tempo para resolver o problema com a vinda dos pais de Summer Vanderbilt e para desfazer o compromisso imposto por sua mãe, quando uma cena o fez parar bruscamente. Do outro lado da rua, viu um mendigo em um beco revirando um amontoado de lixo a procura de algo que lhe fosse útil. Isso o fez lembrar instantaneamente de uma situação idêntica a essa, em que ele estava nas ruas de Nova York e viu Ken procurando algo para comer em um monte de lixo. Apesar de parecer uma lembrança antiguíssima em meio a tanta coisa que havia ocorrido desde então, ela acontecera há apenas alguns meses atrás, um tempo antes dele encontrar Mary em um cruzamento indo comprar cachorro-quente.
Balançando a cabeça para tentar dissipar aquela lembrança, ele deu meia volta para fazer outro caminho quando outra visão quase o fez cair para trás. Summer Vanderbilt vinha em sua direção, acenando e praticamente pulando a cada passo, sem pedir desculpas para as pessoas em que esbarrava ao abrir caminho.
- Onde você vai, Chris?! – perguntou ela alegre e ofegante ao chegar até ele – Posso ir junto?!
Mal humorado, ele voltou ao seu antigo caminho, ignorando o mendigo e as recordações que ele trazia.
- Espera! – a metamorfomaga foi atrás dele – Por que está zangado?
- Só o fato de você existir me deixa zangado! – resmungou ele em resposta quando ela o alcançou novamente.
- Isso é coisa que se diga para a sua noiva?!
- Só você aceitou esse noivado!
- É o nosso destino! Você tem que aceitar!
- Destino? – ele parou a encarando incrédulo.
- Sim! – respondeu ela contente.
- Você realmente sabe o que há por trás desse casamento? – perguntou ele, pela primeira vez pensando que talvez Summer Vanderbilt não conhecesse as verdadeiras intenções da sua mãe.
- Bom, sei que tem algo a ver com unir as fortunas e o poder das famílias e ajudar os negócios dos Doumajyds... é isso?
Doumajyd a encarou por mais um tempo e então voltou ao seu caminho falando:
- Eu vou pensar em uma maneira de salvar o nome da minha família sem precisar me casar com você!
Ela demorou um pouco pra segui-lo, mas quando fez isso foi de uma forma decidida, e disse para as costas dele com uma certeza absoluta:
- Garanto que forma melhor do que essa você não vai encontrar!
- Mesmo assim, – ele virou-se para ela e respondeu irritado – o destino do Ilustríssimo Eu não é você, macaca!
***
- Uma advogada? – admirou-se Hainault.
- Foi o que eu escolhi. – Mary sorriu em resposta, enquanto procurava organizar os seus livros e as suas anotações para continuar seus estudos.
Os dois estavam na biblioteca de Hogwarts, ele ainda com o seu livro, enquanto esperava Mary se decidir por onde começaria.
- A professora Karoline me ajudou e me orientou sobre como eu posso conseguir uma bolsa na Academia Bruxa. Eu posso optar por fazer os NIEMs aqui em Hogwarts ou na Academia. Se eu optar pela primeira alternativa, preciso surpreender os avaliadores para eles considerarem colocar o meu nome na lista dos possíveis bolsistas que a Academia vai escolher. Agora se optar pela segunda, eu preciso fazer os testes direto na Academia, em Londres, e assim eu terei mais chances. Mas, para Hogwarts ceder uma liberação do último mês de aulas, eu preciso fazer testes simulados em todas as matérias na semana que vem. Se as minhas notas forem satisfatórias, eu posso ir para Londres e me dedicar exclusivamente a conseguir a minha bolsa!
- ...E como estão as suas notas atuais?
- Na verdade... não muito boas. Eu tenho me esforçado com os trabalhos, mas ultimamente não consigo estudar direito. Por isso tenho que me empenhar essa semana!
Ele olhou em volta quando ela retornou animada aos livros, feliz por ter contado a sua saga de aluna esforçada para alguém mais além de Vicky.
- Mary?
- O quê? – perguntou ela sem tirar os olhos das suas anotações.
- Querer ser advogada... é por causa da Sharon?
- É sim. – disse ela sem esconder o tom de orgulho – Quero ser alguém como a Sharon e conseguir defender bruxos sangue-ruins como eu!... Sabe, eu tive sorte por que a família da Vicky sempre me ajudou, mas eu não sou a única nascida trouxa no mundo...
- A Sharon vai vir para Inglaterra daqui algumas semanas. – contou ele – Ela disse que está com saudades de todos.
- Sério? Que bom! Eu gostaria de vê-la novamente.
Hainault apoiou a cabeça em uma das mãos e permaneceu calado, deixando que Mary mergulhasse cada vez mais nos livros, pela primeira vez em muitos dias conseguindo se concentrar.
***
- Destino? – perguntou Vicky surpresa, enquanto regava as plantas da estufa, depois de ouvir o relato de Summer Vanderbilt sobre o seu encontro com Doumajyd em Londres.
- Isso. – confirmou a metamorfomaga, comendo mais uma colherada do doce do estoque da estufa que comprara – O que acha? Nós não fomos feitos um para o outro? Nunca entendi direito o porquê de justo eu ser a bruxa mais rica da América... Mas agora vejo que, se não fosse por isso, eu não teria como ajudar o Chris e talvez nunca o teria conhecido... Isso não é destino?!
Mary desgrudou o nariz do livro em que estava se escondendo desde que a visita inesperada irrompera pelas portas da estufa e olhou disfarçadamente para ela.
- Hum, não sei... – respondeu Vicky não querendo acabar com a alegria de Summer, mas também não querendo de alguma forma magoar Mary.
- O destino é uma das forças mais poderosas que regem esse mundo! – anunciou a professora Karoline, aparecendo de repente dos fundos da estufa.
Summer se surpreendeu com a entrada elaborada da professora, ao contrário de Mary e Vicky, que já estavam se acostumando com essas intromissões.
- A propósito, quem é você? – perguntou a professora ao reparar que a visitante não usava o uniforme de Hogwarts – É amiga dessas duas?
- Sim! – Summer se apressou em ficar de pé para responder de uma forma educada, mas com a mesma energia de sempre – Sou Summer Vanderbilt, melhor amiga delas! Prazer em conhecê-la!
- Muito prazer, sou a professora de Herbologia e também sou eu quem faz os doces. – acrescentou ela indicando, com um imenso sorriso orgulhoso, o armário onde eles estavam, e então voltou a passar pela estufa, sem parecer prestar atenção em nada – Como eu estava falando, o destino é uma força muito poderosa! Ele age das formas mais inesperadas, mas nem sempre é bem aceito. Por isso, temos que lutar e insistir. Mesmo se você for desprezada, se continuar se esforçando, um dia o destino será mais forte e acabará conseguindo o que quer!
Apesar de já estar acostumada com a forma delirante como a professora falava quando se empolgava com algum assunto, aquelas palavras sobre destino ecoaram nos pensamentos de Mary, porque ela mesma vivera um grande exemplo disso. Quantas vezes ela tentara se livrar de Doumajyd e ele continuava insistindo? Quantos encontros e desencontros aconteceram? Quantas coisas inesperadas? Mas mesmo assim ele insistira até o final e conseguiu conquistá-la... Aquilo também não fora destino?
- O destino é algo que se expande! – continuou a professora – Muda conforme cada um!... Mas para que ele se realize você precisa ir atrás dele, não pode desistir!
- Então, – Summer pensava seriamente no que a professora dizia, como se fosse a coisa mais sábia que ouvira em toda a sua vida – se eu desistir da pessoa do meu destino, ela pode desaparecer, não?
- Isso! – concordou a professora – O fundamental do destino é você acreditar em seus sonhos, e um sonho só está destinado a acontecer quando acreditamos nele. Se você negá-lo, desistir, tentar esquecer, ele passará a não existir mais!
Mary engoliu em seco. Desistir, tentar esquecer, negar... era exatamente isso que havia acontecido entre ela e Doumajyd.
Um silêncio se instaurou na estufa depois das ultimas palavras da professora, com cada uma pensando em sua própria situação. Então a voz de Vicky soou baixinha:
- O Simon...
- O quê? – a professora a encorajou a continuar, se aproximando disposta a ouvir.
Vicky tirou uma esfera de vidro do bolso e a encarou tristemente. Mary ficara sabendo a pouco tempo que a amiga conseguira uma esfera para poder se comunicar com o dragão, mas raramente ela conseguia a usar.
- Ele... ele encantou a sua esfera para que eu não consiga mais chamá-lo...
- E se você for em busca do seu destino?! – sugeriu Summer – Vá direto falar com ele ao invés de ficar segurando essa bolinha!
- Mas eu...
Vicky não conseguiu terminar a frase, porque no mesmo instante a professora pegou a esfera da mão dela e a saiu andando pela estufa chamando por alguém. Então a fumaça azulada tomou forma e elas ouviram uma voz espantada perguntando:
- Professora Karoline?!
- Olá, Adam! Há quanto tempo! – cumprimentou ela indo para o fundo da estufa para que as outras não pudessem ouvir.
Vicky olhou espantada para Mary, visivelmente perguntando o que a professora estaria planejando com aquilo, mas a amiga apenas sacudiu os ombros e voltou ao seu livro.
Logo a professora voltou com um sorriso de orelha em orelha dizendo:
- Pronto! Nesse domingo Adam virá passar o dia na casa da sua família em Hogsmeade e Nissenson estará lá também! Eu disse que você irá visitá-los!
- Sério?! Ah, obrigada, professora!
Mary ergueu novamente os olhos do livro e suspirou. Com certeza perderia mais um dia de estudo, porque Vicky definitivamente iria arrastá-la consigo.
- E você, Mary? – perguntou Summer Vanderbilt bem perto dela, assustando-a.
- E-eu o quê? – ela engasgou, se atrapalhando com o livro.
- Não tem ‘a pessoa do seu destino’?
- Eu? É, eu-
- Sabe, eu sempre reparei que o Ryan Hainault está com você... Não acha que ele gosta de você, Mary?
Centenas de formas de responder negativamente aquilo passaram pela cabeça de Mary. Mas sobre todas elas veio a lembrança de algo que havia acontecido recentemente, quando ele a encontrara na Ala dos Dragões para perguntar sobre o encontro, e que havia feito o seu coração disparar.
- Mary! Vai comigo para Hogsmeade amanhã? – pediu Vicky em tom de suplica, felizmente a salvando de ter que dar uma resposta para a pergunta da metamorfomaga.
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