O retorno do passado



O Natal chegou e com ele o remorso foi esquecido. Gina parou de tentar persuadir o irmão, tinha muito no que pensar. Havia arrumado um emprego temporário numa loja do Beco Diagonal e estava preocupada com o que dar de presente para o namorado. Hermione também estivera ocupada com as compras de Natal. Sua família passaria o feriado com os parentes e ela os acompanharia apenas durante a ceia, depois partiria para A Toca. Harry e Rony estavam ocupadíssimos com os treinos de seus times. Harry mais, já que jogava na liga profissional, o que Rony tinha certeza, embora nunca comentasse, que Harry conseguira devido ao seu “prestígio” perante a comunidade bruxa.
Foi exatamente no dia 25, depois de ter passado mais uma noite maravilhosa ao lado dos Weasley, que o pesadelo de Hermione pareceu se concretizar. Naquele dia ela tivera certeza de que o pesadelo que tivera dias atrás era um aviso. Um presente em especial, deixado em baixo da árvore de Natal da família, a surpreendeu realmente. Junto com ele veio uma carta, e junto com a carta a lembrança, e a tristeza. Mas ela não ia se abalar facilmente. Daria um jeito naquela situação. Sempre dava. Ela tinha certeza de que ele entenderia, ele precisava entender.
O feriado do Ano Novo passou rápido, para desespero de Hermione, mas ela decidira aproveitar ao máximo os últimos dias, antes que sua vida virasse de cabeça para baixo. Ainda teria um tempo e, até lá, ela poderia explicar tudo.
Harry, Gina, Rony e Hermione saíram para comemorar o fato de que Gina fora efetivada em seu emprego de fim de ano. Agora ela e Hermione começariam a procurar uma casa para dividirem. Finalmente sairiam em busca de sua independência. Estavam cheias de planos para o futuro, Hermione já analisava um possível estágio em Hogwarts, junto ao professor de Feitiços. Foi justamente quando ela ia contar sobre a carta que recebera do antigo professor dizendo que a aceitava para a vaga, que eles foram interrompidos:
_Mione! – uma voz chamou alegremente por ela.
Seu sangue gelou, a cor sumiu de seu rosto e seu coração perdeu o compasso. Ela sentiu mãos carinhosas pousarem em seu ombros e um beijo saudoso pousar em seu rosto. Em seguida ele cumprimentou os demais.
_Harry, Rony, Gina! Que bom ver vocês! Eu estava com tanta saudade! Nem acredito que estou de volta.
_Nem nós... – Rony deixou escapar. A cor também deixara sua face. Gina e Harry não se pronunciavam.
_Eu fui até sua casa, Mi. Seus pais me disseram que você estava aqui. – ele a fez se levantar e a abraçou com vontade. – Tenho tanta coisa para te contar! Uma porção de fotos! Ah... – ele pousou as mãos em seu rosto e ela teve certeza de que ele iria beijá-la. – Eu senti tanto sua falta! Você ia adorar tudo aquilo! Precisa ver o tamanho da biblioteca que eles têm lá! Confesso que fiquei meio perdido sem você, sabe? – ele sorria, os olhos brilhantes. – Vocês não se importam se eu roubar a Mione de vocês por hoje, não é? – Neville se dirigiu aos outros. – Eu mal passei em casa, só deixei minhas coisas e vim te procurar! A gente se fala mais depois, ok?! – com um aceno rápido ele puxou Hermione pela mão. Ela só teve tempo de puxar a bolsa pela alça e seguir com ele. Não teve coragem de olhar para trás.
Harry e Gina não ousaram abrir a boca. Na verdade não sabiam o que dizer já que não tinham entendido direito tudo que acontecera. Rony estava igualmente quieto, mas parecia estar entendendo um pouco mais do que os outros dois. Ele mantinha a cabeça baixa, os punhos cerrados e o rosto agora vermelho. Incomodada com aquele silêncio Gina falou:
_Ele não ia voltar só no final da semana?
_Parece que ele resolveu fazer uma surpresa... – Harry respondeu sem jeito.
_E agora? – Gina perguntou sem ânimo de dizer ‘Eu avisei!’ – Rony?
Ele apenas suspirou. Um suspiro entrecortado. Ele esfregou os olhos bruscamente, estavam vermelhos. – Eu vou para casa...
_Espera ai! – Gina protestou. – Nós deveríamos ir atrás deles! Explicar para Neville a situação de Hermione! Ela não vai entender nada!
_É VOCÊ QUE NÃO ESTÁ ENTENDENDO NADA, GINA! – ele gritou.
Ela se assustou com o tom dele, mas não se abalou: - Não venha descontar em mim! Você sabia que isso ia acontecer! Eu falei para você esclarecer tudo de uma vez!
_Será que você não percebeu?! – ele falou um pouco mais controlado. – Ela já sabia! Hermione se lembrou de tudo! Ela se lembrava de Neville!
_Do que você está falando? – Gina não entendia.
_Acho que Rony está certo! – Harry concordou. – Por que outro motivo ela aceitaria ir com ele? Ela me pareceu tão assustada quanto nós quando Neville a chamou. Se ela não se lembrava dele não tinha por que ficar tão abismada...
_Eu não acredito! – Gina exclamou. – Então ela estava fingindo? Mas por quê?!
_Não é óbvio? Para tirar com a minha cara! – Rony desabafou. – Eu não acredito que ela teve coragem! Ela me fez de idiota!
_Calma, Rony! Tem que ter uma explicação para isso! Hermione não namoraria você e o Neville ao mesmo tempo de caso pensado! – Harry defendeu.
_Não vem com essa, Harry! Quando eu era o mentiroso vocês me criticavam. Agora vão defendê-la?! Não mesmo! Não tem explicação para o que ela fez! Eu nunca vou perdoar a Hermione por isso! Nunca! – enfurecido ele desaparatou deixando Harry e Gina completamente atordoados para trás.



_Qual o problema, Mi? – Neville perguntou preocupado com a apatia da namorada.
_Nada, não! – ela sorriu sem vontade. – Então quer dizer que você ganhou algumas mudas para começar uma estufa própria?
_O quê?!
_Não era o que você estava falando?
_Sim... Há meia hora! – falou deixando de lado os livros e a encarando. – O que está havendo, Mione? Você está tão distante... Parece que não ficou feliz por me ver...
_É claro que eu estou feliz por você estar aqui! – tentou. – É só que... Eu estou com um pouco de dor de cabeça, sabe...
_Ah ta... Você quer que eu vá embora?
_Hum... – ela hesitou.
_Vou te deixar descansar... Deve ser por causa do acidente, não é? – ele se levantou e juntou suas coisas.
_Você soube do acidente? – ela o ajudava a guardar o material.
_Claro que soube! Vovó me contou. Você acha que eu ficaria esse tempo todo longe sem nenhuma notícia sua? – ele sorriu carinhoso, envolvendo-a nos braços. – Achei estranha sua falta de notícias, escrevi para minha avó e ela me contou que você tinha perdido a memória. Como eu estava muito ocupado e não queria te pressionar achei melhor esperar um pouco até te escrever. Algumas semanas depois vovó me disse que encontrou sua mãe e ela falou que você já tinha se lembrado de tudo. Aí eu escrevi!
_Mamãe falou com sua avó? – ela sentou-se novamente, desanimada.
_Falou... – ele se sentou também. – Ela me contou que foi coisa do Rony. Vocês sempre se metendo em confusão! Achei que isso ia passar depois de sairmos de Hogwarts!
_Não foi de propósito! – ela o defendeu. – E o que você queria? Que eu o deixasse ir sozinho?
_Com certeza Harry iria com ele!
_Eles não são tão bons sozinhos! – falou orgulhosa. – Sempre acabam precisando da minha ajuda!
_É... Eu sei! O ‘trio maravilha’, como dizia o Malfoy. – falou levantando-se meio abatido. – Eu queria ter feito parte desse grupo...
_Mas você fazia... – ela tentou.
_Não fazia, não... Eram sempre vocês três... Você, Harry e Rony! Mesmo quando ele fazia alguma besteira, ou dizia alguma coisa ofensiva... Você nunca desistia dele, não é?
_Eu não estou entendendo... – ela se preocupou.
Ele riu. – Eu sei o quanto a amizade deles é importante para você... De certo modo ninguém mais vai conseguir entrar para o grupo, mesmo que todos vocês encontrem alguém, se casem, tenham filhos. Sempre serão vocês três: você, o Harry e... o Rony... – ele suspirou. – Eu vou embora... Descanse, mas me avise quando melhorar, ok? – ele a beijou com carinho e ela o acompanhou até a porta.
_É Neville... A amizade dele é muito importante... – ela se encostou a porta, arrependida. – Você nem sabe o quanto...
A próxima semana passou voando. O feriado acabou, as atividades voltaram ao normal, e Hermione continuava sem notícia dos Weasley e de Harry. Na verdade ela estava até aliviada com isso. Ainda não tinha encontrado uma boa explicação para dar a Rony e imaginou que Gina estaria decepcionada a ponto de não querer mais dividir uma casa com ela, mas ela estranhou o fato de Harry também não procurá-la. Ela tinha esperanças de que, pelo menos, ele não a julgasse. A falta de notícias acabou numa quinta feira fria, próximo do fim do expediente.
_Oh! Que bom que deu tempo!
Hermione interrompeu sua atividade para dar de cara com uma Gina eufórica, meio sem fôlego e com as bochechas vermelhas por causa do frio.
_Como vai, Mione? Você já está saindo?
_Em... Em cinco minutos... – respondeu abobada.
_Eu espero! Por acaso não tem uma máquina de café por aqui, tem? Eu preciso de algo quente.
_Ali no canto... – Hermione apontou. Gina foi se servir enquanto Hermione terminava de recolocar os últimos livros de volta na estante. Em alguns minutos ela saiu da biblioteca já com seu casaco e um gorro. Tremendo de frio as duas seguiram pelas ruas até um café próximo.
_Eu acho que encontrei o lugar perfeito! – Gina dizia empolgada. – Uma casa de dois quartos, sala e cozinha conjugadas, ta certo que é um pouco longe, mas o aluguel é bom. Ah! – Hermione se assustou: - E tem lareira! Papai vai poder interligá-la a rede de flu. Quer dizer, se nós realmente formos morar lá.
_Você parece bem empolgada! – ela sorriu. – O lugar deve ser bom.
_Eu adorei! Você não quer ver? Eu ainda estou com a chave!
_Vamos... – e para lá elas partiram.
A casa era realmente aconchegante. Os cômodos eram meio apertados e precisavam de pintura nova, mas o banheiro era perfeito. Limpo, claro e com louça de boa qualidade. A maioria das casas antigas tinha encanamento de péssima qualidade. O que parecia um sonho virava um pesadelo.
_O que você achou?
_Gostei... – Hermione falou seguindo até a janela. Gina a acompanhou.
_Então ficamos com ela?
_Você não prefere esperar um pouco?
_Se demorarmos muito podemos perder a chance... – ela a observava. – Para isso também...
_Isso o quê? – ela perguntou confusa.
_Isso mesmo que você está pensando...
_Sei... – ela sorriu desanimada. – Eu realmente achei que vocês não iam mais querer falar comigo.
_Ah, qual é... Uma amizade de tantos anos não se joga fora assim por causa de uma mentirinha... Nem um amor de verdade!
_Ele está muito bravo, não está?
_Você sabe como ele é! Adora apontar os erros dos outros, mas tem dificuldade em admitir os próprios... – ela entrou para fugir do vento gelado. – Aliás... Eu e o Harry deveríamos ter sido mais firmes com ele... Não tê-lo deixado ir tão longe... Desde quando você sabia?
_Desde o dia em que vocês nos encontraram no 3 Vassouras... – falou encabulada.
_Mas então? Aquele papo de não se lembrar...
_Eu não sei por que fiz aquilo... – ela fechou a janela e sentou-se no meio da sala, Gina a copiou. – Acho que queria entender por que ele nunca me disse antes, sabe?
_Vocês precisam conversar...
_É... Eu sei... Mas não só com ele...


_Eu preciso te falar uma coisa! – Hermione interrompeu a narração inflamada de Neville sobre as incríveis propriedades do suco de carambola azul.
_Fale... – ele parou preocupado.
_Ai... Eu nem sei por onde começar... – falou envergonhada.
_Que tal pelo começo? – Neville brincou.
_Esse é que é o problema... Eu não sei quando começou... – ela o olhou, penalizada.
_Hum... – ele se encostou na cadeira desanimado, mexendo no molho de seu macarrão.
_Eu não queria que fosse assim, sabe? Só que aconteceu... – ela começou. – Foi depois do acidente...
_Não foi, não! – ele a interrompeu. – Faz tempo que aconteceu, mas eu achei que tivesse passado.
_Nós estamos falando do mesmo assunto? – ela perguntou completamente confusa.
_Eu encontrei o Rony outro dia, com um grupo de jogadores de quadribol... Ele mal falou comigo. Eu queria convidá-lo para tomar alguma coisa, afinal fazia tempo que não conversávamos, mas ele inventou uma desculpa esfarrapada e se mandou. E tem você... Tão distante, fria... – ele sorriu conformado. – É óbvio que aconteceu alguma coisa entre vocês enquanto eu estava fora, não aconteceu?
Foi como um balde de água fria, embora ela se sentisse mais aliviada por não ter precisado falar ela mesma. – Eu nunca quis magoar você, Neville... Aconteceu... sem querer...
_Sem querer é que não foi, Mione! – ele enfatizou. – Aconteceu porque vocês dois quiseram. Aconteceu porque vocês dois queriam há muito tempo. Mas eu não estou bravo com você!
_Não?!
_Não... Eu sempre achei que vocês combinavam, mas como todo mundo parecia pensar o mesmo, menos vocês, eu achei que nós poderíamos dar certo. Eu realmente queria que tivesse dado certo, mas não deu.
_Mas Neville? Eu não acredito que você está tão calmo! Você realmente entendeu o que aconteceu?
_Claro que entendi! – ele respondeu. – Você ficou com o Rony enquanto eu estava estudando fora! – Hermione não sabia onde enfiar a cara. – Mas eu também não fui muito honesto com você, sabe?
_O quê?!
_Não me olhe com essa cara! – ele é que não sabia onde se esconder agora. – Eu conheci um monte de gente nova, sabe? Gente que não me achava um panaca! Lá eu era o melhor da sala e tinha muita gente reparando em mim.
_Eu não acredito! – Hermione quase gritou. – Quer dizer que enquanto eu permanecia duas semanas e meia inconsciente você me traía com uma italianinha qualquer?
_Espanhola! – ele corrigiu. – E ela não é uma qualquer! Ela nem sabia que eu tinha namorada!
_Ah!
_Mas foi uma vez só... Depois eu me arrependi, por isso não escrevia. Tinha certeza que você ia notar que tinha alguma coisa errada só pelo meu jeito de escrever. – antes que ela decidisse azará-lo ele falou: - Estamos quites!
_Quites?!
_Quites!
Ela cruzou os braços, enfurecida. Neville enfiou o rosto atrás do cardápio de sobremesas, embora não se sentisse mais tão culpado. Hermione respirou fundo, colocando as idéias no lugar.
_Ok... – falou mais calma. – Quer dizer que nós dois erramos, mas já admitimos nosso erro, certo?
Ele baixou o cardápio, inseguro: - Parece que sim...
_Quer dizer que tudo bem, para os dois, se nós terminarmos?
_Não era o que eu tinha em mente, mas... Acho que você não vai querer perdoar meu deslize, eu perdôo o seu e nós continuamos de onde paramos, né?
_Não Neville... – falou sincera. – Você sabe que eu gosto de você apenas como um amigo, não sabe?
_É... Eu sei...
_Então podemos esquecer nossas escorregadelas e continuarmos amigos?
_Claro que sim... – sorriu aliviado.
_Então... Se você me dá licença? – ela se levantou. – Eu preciso resolver um outro probleminha!
_Boa sorte!
_Obrigada!
_Lembre-se que vocês só não deram certo antes porque nenhum dos dois quis dar o braço a torcer...
_Vou tentar me lembrar! – ela aparatou esperançosa.


Apreensão. Era exatamente o que estava sentindo. Ela deve ter ficado uns cinco minutos dando voltas em frente a porta do centro de treinamento. Sabia que aquele seria o início de uma longa, e conhecida, discussão entre os dois. Não que ela não estivesse acostumada a discutir com Rony pelas mais variadas razões. O problema é que ela estava gostando tanto daquela nova fase Rony/Hermione, que agora lhe parecia muito difícil retornar a “realidade”.
Tomada de repentina coragem, ela entrou no campo. Caminhou entre as arquibancadas até chegar bem perto de onde os jogadores estavam conversando com algumas bruxas adolescentes. Uma delas, pendurada ao braço de Rony e, aparentemente, muito interessada em aprender mais sobre vassouras, fez Hermione contar até dez para se controlar. Ele estava tão absorto na “explicação” que não notou sua presença. Apenas quando um companheiro de equipe lhe deu uma cutucada e indicou Hermione com a cabeça, foi que ele a olhou.
Melhor se não tivesse olhado. Hermione jamais o vira tão irritado. Nem mesmo quando Bichento, supostamente, comera Perebas. Rony fechou a cara para ela e continuou a dar atenção à mocinha com quem conversava. Sem perder a pose, Hermione sentou-se, pacientemente, cruzou as pernas, e ficou olhando-o, como se tivesse todo tempo do mundo.
Alguns comentários indiscretos o fizeram olhar para ela novamente. Com a conhecida cara de “não-vou-sair-daqui-enquanto-não-discutirmos-exaustivamente”, Hermione o observava. Ele virou-se novamente para sua admiradora, mas apenas para lançar-lhe um sorriso e se despedir, com um irritante e exagerado beijo no rosto, o que deixou o ânimo de Hermione para brigar maior ainda. Batendo os pés ele veio até ela.
_O que você quer?
O tom dele a perturbou um pouco. Fazia muito tempo que ela não o ouvia, mas ela sabia como rebatê-lo, sabia muito bem: - Precisamos conversar! – falou no mesmo tom.
_Não temos nada para conversar!
_Temos sim, Ronald! E eu não vou sair daqui até termos esclarecido esta história!
Ele estava pronto para começar a gritar com ela ali mesmo, mas achou melhor não fazê-lo no seu local de trabalho. – Eu vou tomar um banho e aí conversamos.
_Ok! – ela se sentou novamente e ele foi em direção aos vestiários. – E nem pense em aparatar do vestiário, Ronald! Eu vou atrás de você até A Toca.
Ele olhou para trás e bufou, mas continuou seu caminho. Ele demorou tanto para voltar que Hermione tivera certeza de que ele havia fugido. Estava disposta a invadir o vestiário para averiguar se ele ainda estava lá, quando ele saiu, ainda com a cara amarrada. Ela ia falar qualquer coisa, mas ele foi mais rápido:
_Onde?
_Não sei...
_No Cabeça de Javali, então!
_Por que lá?! – ela se espantou.
_Por que ninguém vai achar estranho duas pessoas discutindo lá dentro! – falou grosso.
_E quem disse que eu vim aqui para discutir com você?! – ela cruzou os braços.
_Não é o que estamos fazendo?
_Humpf! Vamos logo, então! – e os dois aparataram.
Rony teve que usar todo seu alto controle para se concentrar nos 3D’s e chegar ao lugar certo, mas enfim chegaram. O bar mal iluminado parecia pior ainda durante o entardecer. Um garçom esquisito veio atendê-los. Pediram apenas uma água.
Longos minutos de silêncio antecederam o início daquela conversa. Quem quebrou o silêncio foi Rony.
_E então? O que você queria me falar?
_O que você acha?!
_Não faço idéia do que poderia ser dito depois do que você fez!
_Depois do que eu fiz?! – ela ralhou. – Quem foi que começou essa história?!
Rony ficou vermelho, de raiva e de vergonha. Perdeu as palavras. Hermione, por sua vez, lembrou-se das palavras de Neville: “ ... porque nenhum dos dois quis dar o braço a torcer...” Tomando fôlego ela começou:
_Me desculpe...
_Você acha que há desculpa para o que você fez?
_E para o que você fez, há?
_Eu estava pronto para levar uma bronca incrível quando você recuperasse sua memória. Ao invés disso você me fez de idiota!
_Como é? Quem foi que passou dias achando que era sua namorada e sem entender as caras desconfiadas de alguns? Você começou tudo isso! Você mentiu para mim primeiro!
_E você mentiu depois! E a sua mentira foi muito pior, Hermione! Você sabia que tinha namorado e mesmo assim continuou a sair comigo!
_Você sabia que eu tinha namorado, muito antes que eu me lembrasse desse fato, e mesmo assim fingiu que era ele! Por que você fez aquilo, Ronald?
_Por que eu sou um idiota, Hermione! Por que era isso que eu queria! Ser seu namorado! – ele corou. – E você? Por que fingiu não se lembrar de nada, quando se lembrou de tudo?
Ela corou também. Não teve coragem de encará-lo. – Porque... Porque eu também queria que você fosse meu namorado! Eu queria que tudo aquilo que aconteceu fosse para sempre! Queria que tudo que você falou para mim fosse verdade!
_Era verdade... Uma verdade um pouco melhorada, mas uma verdade...
_Tudo? – ela o encarou.
_Tudo... – ele a fitou também.
_Inclusive a parte em que você disse que gostava de mim desde o quinto ano?
_Inclusive... – ele desviou o olhar, encabulado.
_Por que você não me disse tudo aquilo antes? – ela perguntou com uma sensação incrível de tempo perdido.
_Eu ia dizer... – ele suspirou. – Eu realmente fui atrás de você na biblioteca no nosso último dia em Hogwarts! – ele se encheu de coragem. – Eu fui até lá decidido a me declarar para você e aceitar qualquer resposta sua, mas você estava conversando com o Neville! – ele ficou com o semblante carregado. – Ele estava te ajudando a por os livros nas estantes de novo. Eu esperei um pouco para ver se ele ia embora, mas ele não foi... Aí eu perdi a coragem, voltei para o dormitório para terminar de arrumar minhas coisas. Meses depois vocês começaram a namorar e eu comecei a achar que não era para ser mesmo...
Ela digeriu toda a história antes de falar também: - Eu aceitei o pedido do Neville por que estava cansada de esperar por você... – ela suspirou. – Ás vezes você era tão grosso comigo que eu cheguei a achar que você realmente não me suportava. Você dizia isso a todo momento! Como eu ia adivinhar que era correspondida se de cada dez palavras que você dirigia a mim, oito eram de reclamações?
Silêncio...
_Eu e o Neville terminamos tudo hoje...
Ao contrário da reação que Hermione esperava, Rony fechou mais ainda a cara e não fez nenhum comentário.
_Você ouviu o que eu disse? – ela insistiu.
_Ouvi!
Ela continuou observando-o, esperando qualquer coisa, menos o que veio a seguir.
_Se você acha que agora vai ficar tudo bem, que eu vou esquecer tudo, você está muito enganada!
_Eu achei que estivesse tudo explicado! Você acabou de admitir que queria que fôssemos namorados! Eu não entendi!
_Eu não confio mais em você Hermione! Você foi capaz de trair o Neville de caso pensado!
_Não foi de caso pensado! – ela se defendeu.
_Ah, não?! Então como foi? Onde entrava o Neville quando nós ficávamos juntos, hein?
_Eu... Eu... Eu esqueci do Neville! – admitiu sentindo-se a pior pessoa do mundo.
_Esqueceu?! – Rony estava estupefato.
_Esqueci! – ela gritou. – Assim como eu achei que tivesse esquecido que namorava você, eu esqueci que namorava o Neville! Ele ficou meses longe, sem dar notícias! Eu nem me lembrei dele!
_Como você pode ter esquecido dele?!
_Porque eu estava com você! – ela gritou. – Porque era com você que eu queria estar, e não com ele! – ela se descontrolou e começou a chorar. Um misto de culpa por ter se esquecido de Neville e raiva pela reação de Rony. – Eu é que deveria estar mais zangada nessa história! – falou conseguindo controlar o choro. – Você me induziu a trair o Neville!
_Mas não te obriguei a continuar traindo! – respondeu. – Eu esperava que você fosse acabar comigo quando descobrisse que eu menti para você, esperava que você, até mesmo, nunca mais falasse comigo, mas nunca que você trairia a confiança dele de caso pensado.
_Você percebe o absurdo que está falando?!
_Eu percebo que não vou poder confiar em você, Hermione! Quem me garante que você não seria capaz de me “esquecer” também? – cansado de discutir ele se levantou da mesa. – Eu não confio mais em você, Hermione... – deixando alguns trocados para pagar as águas, que permaneciam intocadas, ele deixou o Cabeça de Javali, sem olhar para trás, para não mostrar que também estava chorando.
Os dias se passaram melancólicos. Ninguém conseguia entender o que havia dado errado. Todos, que já estavam sabendo de toda história, tinham certeza que bastava que eles conversassem para se acertarem, mas isso não aconteceu.
Rony passava a maior parte do dia treinando. Quando chegava em casa ia direto para o quarto e, quando permanecia na companhia da família, deixava bem claro que não queria saber de conversa, muito menos queria saber de Hermione. O que era difícil já que os preparativos para mudança de Gina estavam a todo vapor e não se falava em outra coisa.
Hermione seguia sua vida como se nada tivesse acontecido, pelo menos por fora. Ela não gostava de transparecer seus sentimentos. No trabalho, com os amigos e com a família ela parecia ótima, mas quando ficava sozinha se fechava em seu mundo de arrependimento. Ela tentava não pensar em Rony, mas a tarefa era difícil já que os Weasley não paravam de trazer cacarecos até sua casa e dar conselhos sobre a vida fora da casa dos pais. A sra Weasley estava, inclusive, combinando um jantar em família para estrear a casa nova. O estômago de Hermione revirava mais a cada dia, com a perspectiva de rever Rony nesse jantar.
No fatídico dia todos apareceram, até Neville, mas Rony não. Inventara que teria um treino de última hora já que o campeonato da segunda divisão começaria no dia seguinte, e não foi à comemoração.
Neville, que era o único que não sabia que os dois não estavam juntos, decidiu interferir na história. Conversou com Hermione, a contragosto desta, e descobriu o que podia. Depois foi ter com Rony, a fim de resolver toda aquela confusão.
_Eu já sei por que você me chamou aqui e vou avisando que não vai adiantar nada, Neville! – falou de uma vez só, antes mesmo de se sentar.
_Eu imagino, mas não custa tentar... – falou tranqüilo, saboreando uma taça de um licor muito colorido. – Pra começo de conversa, você foi muito injusto com a Hermione. E eu nem sei por que é que eu estou conversando cordialmente com você, já que a culpa por eu não estar mais com ela é sua!
Rony o olhava abobado. Neville nunca falara com ele daquele jeito. Na verdade ele nunca falara com ninguém daquele jeito.
_Se você não tivesse tido a infeliz idéia de falar para ela que eram namorados, sendo que não eram, eu teria voltado da Itália, ela não teria se sentido culpada e eu não teria confessado que fiquei com outra garota por lá. Então ainda estaríamos namorando, você ainda estaria lamentando o fato de não ter se declarado antes de mim, e ainda estaria pensando que a Hermione sempre te viu apenas como um bom amigo. – ele deu outro gole na bebida. – Mas não! Você mentiu para ela, descobriu que ela sempre gostou de você, fez meu namoro acabar, e aí brigou com ela por um erro que qualquer um cometeria, inclusive eu! O que você tem a dizer sobre isso?
_Eu não entendi exatamente o que você tem a ver com isso, já que vocês não namoram mais, mas acho que vale a pena ressaltar que ela continuou namorando comigo mesmo sabendo de toda verdade! Como eu vou saber que ela não seria capaz de fazer a mesma coisa comigo?
_Eu tenho que ressaltar que você é de tão pouca confiança quanto ela, já que você a namorou mesmo sabendo que ela tinha namorado! – ele o olhou perigosamente. Rony recuou um pouco. – E você sabe que ela não seria capaz de fazer isso com você porque ela te ama! – ele se levantou calmamente do balcão do bar, deixando algumas moedas para pagar sua bebida. - E você sabe que está sendo um completo idiota por se fazer de vítima da armadilha que você mesmo armou! – falou sério. – E você sabe que eu deveria quebrar o seu nariz por você ter me corneado, não sabe?
Rony ficou rígido de repente. Sabia que Neville estaria no seu direito se resolvesse bater nele, embora com alguns dias de atraso, mas duvidava que ele fosse capaz. Neville nunca ameaçara nem uma mosca, e Rony sabia que levaria vantagem numa briga com ele.
_É claro que você sabe... – Neville mesmo respondeu. Satisfeito por ter posto para fora tudo que sentia, ou quase tudo, Neville se virou para deixar o bar. Meio confuso Rony se levantou também, ainda observando o mudado Neville, que de repente parou. Esperando a última parte do sermão Rony ficou parado, mas o sermão não veio. Ao invés dele, um bom gancho de esquerda que o fez ver estrelas e ouvir com dificuldade as últimas palavras de Neville: - Vai pedir desculpas para Hermione, Rony. Antes que seja tarde demais. De novo!
A campainha fez Hermione perder completamente a linha de raciocínio da redação que fazia sobre os sete usos do feitiço da lua nova. Irritada com o fato de que, definitivamente, não conseguiria terminar o trabalho tão cedo, ela foi atender a porta.
_Rony? Nossa! O que aconteceu com você?! – ela se afastou para que ele pudesse entrar. Na claridade da casa ela teve uma noção melhor do quão roxo estava o olho dele. – Não me diga que você foi assaltado de novo?
_Não! – ele falou se jogando no sofá. – Seu ex-namorado me bateu!
_O Neville? – ela perguntou incrédula.
_Você tem algum outro ex-namorado?
_Tirando você, não! – ela cruzou os braços. – Por que ele fez isso?
_Se eu não me engano porque eu seduzi você sabendo que você tinha namorado. Ele, por sinal!
_Ah... Bem feito!
_Olha, Hermione...
_Rony! – Gina saiu do quarto, acompanhada de Harry. – Eu não sabia que você sabia o nosso endereço. Meu Deus, o que houve com você?!
_Neville bateu nele! – Hermione respondeu parecendo satisfeita.
_Neville? – Harry se pronunciou. – Como?
_Hei! O que você está fazendo aqui? – Rony se levantou indignado com a presença de Harry. – Desde quando você freqüenta o quarto da minha irmã? Eu sabia que esse negócio de sair de casa não ia dar certo.
_Ah, cala boca, Rony! – ele falou fazendo Rony achar que todos resolveram enfrentá-lo de uma vez só. Gina sorriu satisfeita com a atitude do namorado. – Segura aí! Eu peguei para você! – Harry arremessou um embrulho pequeno nas mãos de Rony.
Percebendo que não era seu dia de comprar briga, Rony desistiu de dar lição de moral na irmã e abriu o pacote. – O anel! – sorriu. – Deu certo, então?
_Deu! – Harry respondeu sorridente.
_Deu certo o quê? – Hermione e Gina perguntaram ao mesmo tempo.
Rony corou um pouco, depois explicou: - Eu empenhei o anel para poder comprar uma parte da loja Artigos de Qualidade para Quadribol. Foi uma parte muito pequena, mas eu vou ficar com uma percentagem dos lucros da loja todo mês!
_Por causa do Natal a loja teve lucro e logo deu para pegar o anel de volta! – Harry completou.
_Eu acho que essa coisa de ser jogador não vai dar muito certo. Eu precisava pensar em alguma coisa, não é? – ele falou.
_Rony! Estou abismada! – Gina brincou. – Você pensando no futuro? Será que está pensando em se casar?
_Ah, cala a boca, Gina! – ele corou mais ainda. – Eu só não queria mais continuar dando gastos para nossos pais. Todos vocês têm um meio para sobreviver. Você até paga seu próprio aluguel. E eu ainda moro na casa da mamãe! É patético!
_Não é patético! – Hermione interveio, mas depois se calou.
_Bom... – Harry falou. – Eu acho que já vou indo... Você me leva até lá fora, Gi?
_Claro! – ela segurou a mão dele e os dois saíram depois dele acenar rapidamente para se despedir.
Hermione e Rony ficaram sozinhos novamente, mudos e desconfortáveis. Hermione tomou a iniciativa dessa vez:
_Você veio até aqui só para mostrar que apanhou do Neville?
_Claro que não! – ele falou se lembrando da dor no olho. – Eu vim te pedir desculpas...
_Oh...
_Neville foi falar comigo e me abriu os olhos...
_Eu diria que ele fechou! – ela não agüentou.
_Ha-ha! Muito engraçado! – ele tentou não rir também. – É sério! – ele se levantou e foi até onde ela estava. – Me desculpe... Eu fui um estúpido! Tive tanta ou mais culpa nessa história do que você! – ele se abaixou na frente dela, para poderem ficar na mesma altura. – Fui eu que te coloquei nessa história. Fiquei tão assustado com a possibilidade de te perder sem nunca ter confessado meus sentimentos que escolhi o momento errado para fazê-lo. Perdoe-me, Hermione... – ele suspirou. - Será que não poderíamos tentar de novo? – falou com um olhar pidão que fez o coração de Hermione se derreter, mesmo sem ela querer.
_Como disse o próprio Neville: nós só não demos certo antes porque não dávamos o braço a torcer. Eu bem que deveria te deixar de molho, pensando em tudo que você me falou e pagando por tudo que me fez sentir esses dias! – suspiro. - Mas é claro que podemos tentar de novo, Rony! – ela falou carinhosamente, tocando a face dele com a ponta dos dedos. – Se eu continuo te amando depois de todo esse tempo, como é que vou bancar a orgulhosa justo agora? - lentamente aproximou-se do rosto dele e o beijou, dessa vez livre de farsas, exatamente como devia ser. Separaram-se apenas o necessário para que pudessem se levantar e se abraçar como gostariam, para depois voltarem a se beijar calorosamente.
Agora eles tinham certeza de que daria tudo certo. Estavam finalmente completos, felizes. Hermione tinha, finalmente, certeza quanto aos sentimentos de Rony. Este, por sua vez, tinha tanta certeza do que sentia e de ser correspondido, que não teve dúvidas de que o anel de sua avó continuaria na família no dedo de Hermione, do jeito que ele planejara.
Quando o ar começou a fazer mais falta que o contato entre seus lábios, e a certeza de que nada mais poderia separá-los se fez presente, Rony perguntou:
_Será que você não tem um pouco de gelo? Meu olho está me matando...

N/A: Não percam! Em breve, atualização de TUDO SE TRANSFORMA, E SE O PRÍNCIPE VIRAR UM SAPO E AS PEÇAS QUE O CORAÇÃO PREGA.

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