Capítulo 10



 

Capítulo 10 Nas Pirâmides


- Ginny Weasley sua traidora!- gritou Izzie a plenos pulmões dentro do quarto que as duas dividiam no trem. Ginny já havia jogado metade do seu guarda-roupa no chão a procura da roupa adequada para um encontro da meia noite na pirâmide mais alta. Já provara a blusa vermelha com a calça preta, a saia de pregas com a blusa azul, a saia curta com a blusa preta, e até um suéter com a alça jeans azul escuro. Sem mencionar, é claro, os quatro vestidos.


- Iz, foco, foco, eu preciso de uma roupa.


- Como você não me contou sobre o encontro de hoje a noite?!- disse a outra ignorando o apelo da ruiva.


Izzie estava realmente frustrada.


- Izzie esquece isso por favor, você estava ocupada com o seu deus grego particular.


- Ginny você sabe que as amigas jamais estão ocupadas para ouvir novidades sobre os bofes alheios! Especialmente quando este em questão é tão misterioso!- ela ralhou com a ruiva


- Ok Izzie. Eu sou uma má pessoa, mas...


- Ainda bem que você reconhece, eu jamais teria escondido algo assim de você.- ela disse pondo a mão no peito ofendida.


- Certo, eu sou uma amiga ingrata, cruel, egoísta, e desatenciosa...


- Isso mesmo, tirou as palavras da minha boca.


- Mas você como amiga generosa e piedosa que é, irá me perdoar e me ajudar a achar um roupa descente. - disse Ginny usando seu melhor olhar de cachorro molhado.


Izzie ficou pensativa por alguns segundos.


- Não sei não Ginny, ainda estou muito ofendida...


- Ah Iz qualquer coisa, eu faço qualquer coisa!- a ruiva disse caindo em desespero a medida que vasculhava a mala e não encontrava nada que fosse apropriado aos seus olhos.


- Qualquer coisa?


- Qualquer coisa.


- Lembrarei disto.


- Certo.


- Diga-me o que tem em mente Gin.


A ruiva parou para pensar por alguns segundos. Ela mordia o lábio inferior com força enquanto imaginava a roupa que seria perfeita para a ocasião. Com um sorriso começou a descrever.


- Preciso de algo que seja relativamente prático, que seja bonito de uma forma encantadora, que diga “OI estou feliz em estar aqui”. Algo alegre como o vento do local. Algo que me caia bem, e não pareça de forma alguma vulgar... AH você entendeu. Eu vou estar a meia noite no topo de uma pirâmide. O que qualquer pessoa deveria usar em uma situação destas. Nada muito a rigor eu acho. Mais para casual que para rigor. Mas de qualquer forma encantador...


Esta era a vez de Izzie pensar.


Izzie pensou.


Fez algumas caretas e considerações.


- Vou precisar de reforços. - Concluiu.


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Draco estava começando suspeitar que Morgana havia lhe enfeitiçado. Ou lhe lançado qualquer maldição que o fazia dizer coisas sem ponderá-las primeiro enquanto estava com ela. De onde tirara essa idéia de pirâmide mais alta a meia noite do primeiro dia? Certamente ele em sã consciência jamais sugeriria um local tão esdrúxulo quanto aquele para um encontro.


No alto da pirâmide mais alta era no mínimo estranho ou diferente, mas afinal tudo com ela era diferente. Ele nem sequer estava atento para o fato que não sabia o nome dela. O nome verdadeiro. Não que ele jamais houvesse passado a noite com uma desconhecida, isso já havia acontecido algumas vezes.


Um sorriso torto surgiu nos seus lábios.


Claro, ele sabia que este não era o caso.


Sabia?


Claro que sabia. Morgana não era uma desconhecida. Ele a conhecia. Conhecia a risada dela, conhecia o perfume, conhecia a voz dela... Sabia que ela tinha medo de escuro, que se irritava com facilidade. Sabia que era muitíssimo impulsiva, exatamente o contrário dele neste aspecto. Sabia que ele a fazia rir com comentários que lhe pareciam normalmente sem graça. Sabia que ele sentia vontade de rir quando a deixava que odiava quando ela o chamava com a voz trêmula de medo do escuro quando ele se afastava...


Ele sabia muitas coisas dela. E ainda pretendia perguntar outras mais.


- Ainda aí?- Perguntou Blás entrando nos seus aposentos sem bater.- achei que tinha um encontro esta noite, estava enganado?


- Não.


Blás o olhou com uma das sobrancelhas erguidas.


- Você quis dizer que tinha um encontro, certo?


- Não.- respondeu o loiro.


- Está querendo me dizer que já foi e já voltou?- o outro disse incrédulo


- Não.- respondeu Draco novamente continuando com o olhar fixo em algum ponto no teto acima de sua cama onde ele jazia esparramado de braços abertos.


- Você não foi? Deixou a tal da sua amiga imaginária esperando? Um belo toco se me permite comentar.


- Não, não,não.


Blás o olhou confuso para o amigo.


- Draco você está se sentindo bem?


O outro bufou em resposta.


- Serio, acho que você precisa pegar essa sua amiga imaginária urgentemente ou vai ficar mais desequilibrado do que já está aparentando ser agora.- falou Blás preocupado com o Malfoy.


- Não.- disse Draco.


Como assim “Não”? Ele se perguntou. Seus olhos se arregalaram de imediato com a sua resposta. O que ele havia dito?! Como assim não ia pegar a Morgana de vez?


Claro que não! Respondeu sua consciência para ele.


Que consciência?! Desde quando ele tinha uma consciência?! Ele definitivamente não tinha uma consciência. Ele era Draco Malfoy. Claro que não possuía rastro de qualquer tipo de consciência em sua cabeça loira! Que absurdo estava pensando.


O problema é que de alguma forma o “absurdo” parecia fazer qualquer sentido para ele mesmo que fosse um tênue sentido.


- Draco você não esta bem. - disse Blás e aquilo não era um pergunta, era uma constatação.


- Não.- Ele teve que concordar com Zabini desta vez. O moreno o encarava com os olhos tão arregalados quanto os seus.


- Você quer me olhar enquanto eu falo?! Ou ao menos me responder com qualquer palavra que não seja monossilábica?


- O que você quer Zabini?- Draco perguntou levemente irritado com a sua confusão mental, mas com o tom de voz ainda aéreo.


- Você só pode ter tomado leite!


- Leite?- Agora Draco prestava atenção no que ele dizia embora não visse nenhuma conexão imediata com leite e toda a história.


- Você sabe que não pode tomar leite, ou comer chocolate Draco. Sabe do seu problema sério com Lactose. Sabe como passa horas no banheiro pagando o preço pelos seus pecados quando teima.


- Você enlouqueceu de vez Zabini? - Não que não fosse verdade a história da Lactose. Draco tinha intolerância a lactose, da última vez que provou um doce de chocolate com conhaque, passou o dia no banheiro xingando Merlin até a última geração. No fim de todo o suplício ele emagreceu dois quilos. O que lhe rendeu um semana na casa da sua mãe que tentava de todas as formas possíveis repor os dois quilos perdidos.


O que ele não entendia era o que aquilo tinha a ver com o momento.


- Eu é quem deveria estar perguntando isso para você. Eu estou falando aqui com você e você me responde coisas sem sentido com uma cara de quem colocou a alma para fora de uma forma totalmente desconfortável. A última vez que o vi desta forma foi quando você comeu chocolate e quase morreu de diarréia depois.


- O que?! Não! Não estou com...! Não comi chocolate!


- Então o que você tem? Não deveria estar voltando ou indo para o seu encontro?


- Só meia noite.


- Nossa vocês já chegaram a terceira base? Quando os encontros já são premeditados apenas para... Você sabe...- ele falou com um sorriso malicioso nos lábios.


- Do que você está falando?! Claro que não chegamos a terceira base, seu pervertido! Não chegamos nem na segunda ainda!- Draco falou irritado como amigo.


Blás o olhou de uma forma estranha. E depois arregalou os olhos espantado com as palavras do amigo.


- Você tem certeza que não ingeriu lactose?- perguntou por fim.


O problema é que o próprio Draco estava assustado com suas próprias palavras, e sabia que havia despertado dúvidas na cabeça de Zabini com elas. Blás jamais havia ouvido ele chamando qualquer outra pessoa de pervertido, especialmente porque as pessoas costumavam chamá-lo com um freqüência considerável por este adjetivo. Era surreal. Principalmente porque Blás não via o problema em dizer o que havia dito, afinal ela era só uma garota a mais que ele não sabia sequer o nome e havia conhecido numa viagem por capricho do acaso.


Havia algo de muito errado com Draco.


- Absoluta.


- Então nada de sexo com a tal Morgana ainda?


O loiro teria corado se isso fosse uma possibilidade real. E isso o transtornou. Definitivamente ele não se sentia a vontade pra responder esta pergunta. E este fato o deixou mais irritantemente transtornado.


- Não creio que isso seja da sua conta, Blás.


Foi o suficiente para o queixo de Zabini despencar.


- Como é que é? Absolutamente nada? - ele estava abismado com o que as palavras de Draco deixavam implícito.


- Ah, nem vem Blás eu sei que você ainda não conseguiu nada com a tal Izzie amiga da ruiva. E nem adianta fingir, logo se vê que aquela ali vale alguma coisa. - revidou o loiro totalmente na defensiva.


- Não posso de fato contradizê-lo, e devo entender que com a sua tal Morgana não é diferente.


- Exato. Não está na hora, até parece que você não sabe lidar com mulher...


Blás fez uma careta, para a última frase.


-Tudo bem, assunto encerrado. Agora pelo amor de Merlin vai logo para esse tal encontro que você já está falando como uma virgem... “Não está na hora...” Por Merlin, não havia uma frase melhor?


- Ahh, cala a boca Zabini. Que horas são?


- Meia noite em ponto.


- O que?!- disse Draco sobressaltado. O tempo simplesmente voara!


- Exatamente, você chegará atrasado.- disse o outro olhando o relógio para ter certeza.


Se havia algo que um Malfoy realmente odiava era falta de pontualidade.


- Creio que deveria correr.- completou Blás.


E levando ao pé da letra ele saiu correndo pela porta do seus aposentos deixando Blás totalmente confuso, olhando do relógio para a porta aberta que balançava nas dobradiças.


- Ai tem lactose, com certeza. O cara saí correndo com a calça do pijama e regata no meio do trem lotado. Draco está alterado, quem sabe tenha sido todo aquele sol, ou os calmantes.- disse para si mesmo sacudindo a cabeça.


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Depois de muitas horas com Izzie ao pé do seu ouvido fazendo-a se sentir culpado por ter omitido o encontro de sua conversa. Com a ajuda de Lucy e Julia, elas haviam conseguido achar um vestido branco de Júlia que simplesmente caía perfeitamente com a ocasião. Era Branco com uma fita verde de cetim verde escuro amarrada em um laço na linha abaixo dos seios e combinava com a capa de botões que Lucy possuía verde em um tom muito parecido com a da fita. A capa de Lucy ficara um pouco curta deixando a barra esvoaçante do vestido aparecer, pois Lucy era bem mais baixa que a ruiva, mas ainda assim estava bonito.


Depois de aprovada pelas amigas ela se dirigia para fora do trem, para que pudesse aparatar no topo da pirâmide. Era exatamente meia noite em ponto, ela chegaria dois minutos atrasada, mas isso não seria um problema. Merlin poderia esperar alguns minutos, eles teriam a noite inteira. Ela sorriu feliz, diante deste pensamento. Pensou então que deveria parecer uma maluca sorrindo para o vento.


Então antes que ela pudesse se dar conta do que estava acontecendo alguém a empurrou para o lado de tal forma que ela girou e caiu sentada no chão. Ginny sequer viu o vulto que passou como um relâmpago dobrando a esquina que levava às portas do trem. Ela se levantou aos tropeços, ainda confusa. Observou o corredor ao seu redor, agora tão vazio como quando ela havia colocado os pés para fora do quarto. Checou a roupa e a varinha para ver se estava tudo em ordem e nada danificado. Sua bunda latejava de dor, e ela sentiu vontade de amaldiçoar o infeliz até a última geração por ter sido tão rude. Nem sequer um pedido de desculpas!


Realmente, sua mãe tinha razão quando dizia que não se faziam mais homens como antigamente.


E ainda irritada saiu pelas portas do trem.


O ar lá fora não era gélido, era fresco e causava leves arrepios na sua pele. Uma temperatura agradável, o contrário daquele calor infernal da tarde e manhã. Seu vestido ondulou ao vento e ela sentiu a irritação ser levada aos poucos como os leves grãos de areia que cobriam o calçamento e batiam em suas pernas. Então com um sorriso de expectativas após o dia tão agitado que tivera, ela aparatou para o topo da pirâmide mais alta à meia noite do primeiro dia.


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Assim que o “POP” da sua aparição chegou aos seus ouvidos ela ouviu outro “POP” absolutamente igual. Ela arregalou os olhos para enxergar o dono do outro “POP” mas tudo que ela viu foi um o contornos do corpo de um homem na mais perfeita penumbra.


Ele estava a dois passos dela. Era ele, ela sabia que era ele.


Toda a irritação se foi. Ela olhou para baixo para ver sobre o que estava pisando e qual a superfície disponível para andar. Não era uma área considerável, mas dava alguns passos. Com um sorriso ela venceu a distancia que os separava e o abraçou. Um abraço mudo que tirou os pensamentos correntes de sua mente.


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Ele percebeu que havia aparatado no mesmo local um imediatamente após o outro. Isso foi suficiente para arrancar-lhe um sorriso. As coincidências com ela eram uma constante. Talvez não devessem se chamar coincidências, se não fosse pela falta de substantivos em sua mente para denominá-las.


Ela estava a dois passos de distância dele. Ele sabia pela silhueta e pelos cabelos esvoaçantes que contribuía para que o vulto que era a pessoa a sua frente parecer flutuar no vento forte. Antes que ele pudesse ver qualquer coisa ela foi em sua direção e para a sua surpresa ela o abraçou.


Segundos se passaram e um sorriso interno se espalhou pelo seu corpo com a sensação dos braços dela ao redor do seu pescoço. Ele demorou alguns segundos para abraçá-la de volta passando os braços ao redor da cintura dela, e confirmar que ela estava de fato com os pés no chão e não flutuando. Então o som do seu riso o trouxe de volta e o fez lembrar do objetivo que definira antes de Blás entrar nos seus aposentos. Afastou-a delicadamente dele ainda segurando-a pelos ombros.


Perguntou antes que sua mente fosse tirada de foco com outras das intermináveis risadas delas:


- Qual a sua cor preferida?


Ela sorriu, e se ele pudesse ver seu rosto veria sua sobrancelha arqueada.


- Ahm? Desculpe?- ela perguntou achando ter ouvido errado.


- Qual a sua cor preferida?- ele perguntou se sentindo bastante idiota.


- Essa é a primeira coisa que você vai falar para mim?- ela perguntou incrédula esperando qualquer coisa mais calorosa.


- É.- ele disse simplesmente não percebendo as expectativas na voz dela.


- Nossa, me sinto...- ela ia começar a frase irônica, mas simplesmente suspirou e respondeu.- Eu gosto de amarelo.


- Amarelo... - ele murmurou, imaginando como alguém poderia gostar de amarelo, e como seria esse alguém. Ele detestava amarelo.- Por que?


-Porque sim. Porque alguém gosta de cerveja amanteigada?


- Porque é bom?


- É.


- Mas amarelo não é bom, ou bonito.


- Eu acho.


Ele ficou calado, aquilo deveria ser um dos assuntos que sua mãe vivia dizendo para ele desde que era pequeno que não adiantava discutir.


- Ok, agora podemos voltar a normalidade de duas pessoas que se encontram. - ela falou não conseguindo evitar o sorriso de se formar em seus lábios - Oi, Merlin. Como você está?


Ele arqueou a sobrancelha, logo a seguir gargalhou. Então era isso que ela havia tentado dizer com “Essa é a primeira coisa que você vai falar para mim?”. Ela de fato era uma figura.


- Agora você soa como um dos meus sócios começando uma reunião de negócios.- ele falou divertido.


Ela sentiu uma leve irritação borbulhar em seu estômago.


- Ok, Merlin. Se você não faz questão de ser educado em um encontro, por favor me mostre como devo me comportar, pois está é a única maneira que eu conheço.- ela falou sentida.


Draco rolou os olhos com impaciência e antes que ela pudesse dizer outra palavra desceu as mãos até sua cintura e a trouxe mais perto para um beijo. Nem passou pela cabeça o fato de que esqueceria as perguntas que tinha que fazer. Ele ainda tentou manter o foco enquanto as mãos dela passeavam pelo seu cabelo, mas foi inútil. As muitas perguntas foram varridas em um turbilhão de sensações.


Seria exagero dizer que ele sentia frio na barriga, Malfoys não sentem frio na barriga. E esta não era como se fosse sua primeira vez... Definitivamente não, mas poderia dizer que havia algo de aconchegante nela. Talvez o cheiro de alfazema tivesse efeito. Ou talvez fosse o sorriso, ele gostava muito do sorriso dela. Ou ainda quem sabe ele gostasse mais do seu riso por quase sempre fazê-lo rir.


De qualquer forma ele não estava pensando direito.


O vento varreu os dois brincando com o vestido e capa dela e bagunçando seus cabelos, e causando arrepios nele.


- Nossa você está arrepiado.- ela falou soando divertida tirando as mãos do pescoço dele e segurando as vestes.


- Bom, não se pode dizer que eu estou nos trajes adequados...- ele disse refletindo sobre comovia deixado o trem, e ao mesmo tempo se xingando mentalmente por tê-lo feito. O lado bom era que assim como ele não poderia ver mais que sombras ela certamente não veria mais que isso, e o fato de estar de pijama não seria descoberto. A não ser é claro que ele dissesse, e ele definitivamente não tinha a menor intenção de fazê-lo.


- Bom, eu achei que estes trajes seriam adequados, mas na verdade foi tudo um grande desperdício de tempo.- ela falou com um tom de frustração.- Eu digo já que você não pode ter sequer o vislumbre do que eu estou usando.


- Então creio que deveria descrever para mim, para amenizar o desperdício de tempo.


- Creio que tem razão, Sr Merlin.- ela disse divertida.


- Sou todo ouvidos.- ele falou sentando-se no chão duro e areento segurando sua mão para que ela fizesse o mesmo ao seu lado.


- Estou usando um vestido branco e leve com uma capa verde escuro.- ela disse sucintamente.


- Só?


- Só. Ou você queria que eu estivesse vestida como um esquimó?


- Eu quis dizer, nem mais um detalhe?


- Bem, o vestido tem um laço verde escuro.


- Do mesmo tom da capa?


- Não exatamente.


- Está descalça?


- Não, eu uso saltos prateados,


- Logo notei.


- Quer eram prateados? Como...?


- Não, que eram saltos.- ela sorriu e lhe beliscou de leve.


- Estraga prazeres.- ele achou graça na tentativa de beliscão que ele mal sentira.


- Não tenho culpa se você tem a altura de um elfo Morgana.


- Não tenho não!- defendeu-se.


- Talvez dois dedos maior.


- Nossa, tudo bem Sr. Merlin Gigante.


Ele sorriu e não respondeu por um minuto inteiro eles ficaram em silêncio.


- Você está bonita.- ele disse por fim.


- Obrigada.


- Se incomoda se eu fizer algumas perguntas?- ele falou tentando lembrar das perguntas.


- Vá em frente.


- Com o que você trabalha?


-Sou curandeira. - falou sem hesitar.


Então ele lembrou-se de algumas horas mais cedo quando jurou ter ouvido a voz da mesma enquanto estava semi consciente na enfermaria do trem. O desejo de perguntá-la o invadiu, mas o receio de soar estúpido caso ela não tivesse passado sequer perto do local batalhava contra este. No fim das contas provavelmente não era ela, pois o perfume era diferente, e ele não conseguiu ver ninguém além da curandeira que o dopou.


A voz, mas aquela voz era muitíssimo parecida com a dela.


- Você esteve na enfermaria do trem mais cedo?- ele perguntou antes que pudesse se conter, sentiu-se um idiota.


Claro que não havia sido ela! Era coincidência demais.


- De fato estive. Como sabe ?


- Tive a impressão de ter ouvido sua voz...- ele sentia um calor no estômago e uma euforia desconhecidas, eles estiveram no mesmo local e sequer haviam se visto. Ela estivera tão próxima que ele poderia simplesmente ter aberto os olhos e...


- Você esteve lá também?


- Sim, digamos que minha pele não se adaptaria ao sol do Egito.


- Você não foi o único.- ela disse lembrando-se da tarde maluca.


- Você também foi medicada lá?


- Não, quis dizer que passei lá para ver o que estava acontecendo com os pacientes o trem parecia o cruzeiro das loucas! Aproveitei e dei uma olhada em alguns pacientes.


- Bom eu devo ter sido um deles.- ele falou.


O estômago dela se contorcia com uma euforia gelada só de pensar que de fato estivera no mesmo aposento que ele. Tão perto, e por uma simples coincidência não havia se reconhecido, pois ela tinha total certeza de que se ele houvesse falado perto dela ela teria reconhecido a sua voz. Isso chegava a ser frustrante. Não sabia se gostaria de que o tivesse reconhecido, ou mesmo que ele tivesse visto-a. Ela sequer havia parado para pensar como seria se o visse de verdade por inteiro como ele realmente era. E se ela não gostasse do que visse, ou pior ele não gostasse do que visse? Se fosse completos opostos? Se ele fosse qualquer coisa muito diferente do que ele parecia ser como Merlin?


Milhares de perguntas inundaram a cabeça dos dois durante o tempo em que ficaram em silêncio. Eles estiveram tão envolvidos com as identidades parciais de Merlin e Morgana que havia aderido por algum tempo que não haviam parada para pensar se chegariam a se conhecer. Era uma perspectiva que causava várias sensações, algumas desconfortáveis por isso resolveram deixar de lado.


- Você está bem agora?- ela perguntou.


- Estou. Mas passei por maus bocados esta tarde.


- Nem me diga.- ela falou rindo, embora na hora tivesse se sentido bastante irritada.


- Duvido que tenha sido tão crítico quanto uma mulher desconhecida tocando lugares indevidos.- ele falou- achando graça também.


Ela gargalhou gostosamente


- É, talvez você tenha razão. Quem era ela?


- Alguma obcecada por um tal de Daniel. Rosto oval e cabelos ondulados e soltos é tudo que me lembro. Depois do remédio que a curandeiro me deu, tudo se apagou e antes disso são borrões.


- Entendo... Aquela medicação que estavam receitando era realmente inadequada.- ela comentou.


- Por que quer saber?


Ela corou com a perspectiva de responder. Prendeu a voz para não gaguejar e agradeceu mentalmente a escuridão por esconder seu rosto vermelho.


- Bom, se alguém ficasse passando a mão na pessoa com quem está saindo você não ficaria curioso para saber quem é? - ela respondeu sem graça.


Ele sorriu. Ela sentia ciúme. Ele provavelmente estrangularia alguém que tivesse feito o mesmo com ela. Riu.


- Do que você está rindo?- ela perguntou querendo enfiar a cabeça em um buraco qualquer. Desviou o rosto e encarou as luzes pequenas e brilhantes da cidade.


- Morgana, você é ciumenta.- ele falou divertido.


Ela ficou mais sem graça ainda se possível, mas não negou. A ruiva sabia que era verdade.


- Não vai negar?- ele perguntou incrédulo.


- Por que? Você não sente ciúme?- ela disparou na defensiva voltando a “encará-lo” .


Foi a vez dele desviar o rosto do olhar pesado dela que ele jamais conseguiu ver.


- Há quem diga que sou possessivo.- foi tudo que ele disse, e achou muitíssimo estranho dizer isso em voz alta, ele jamais admitira isso para qualquer outro. Não que ele houvesse alguma vez se encontrado em uma situação semelhante. Soava estranho aos seus ouvidos.


Ela percebeu o seu desconforto e se deu por satisfeita.


- Bom, minha vez de perguntar. Você, Merlin, vive de que?


- Bom em sua maioria de investimentos.- não era como se ele precisasse ir todos os dias a um trabalho no escritório, fazia visitas ocasionais ao ministério e era encarregado de algumas questões do alto escalão.


- Temos aqui um bruxo de negócios...!- ela falou fingindo pompa. Ele achou a entonação da voz dela muito graciosa.


- Pode-se dizer que sim.- ele riu.


- E agora a sua cor preferida?


Ele nunca havia parado para pensar a respeito. Não era algo com o qual ele perdesse tempo.


- Bom, eu fico muito bem vestido de preto.


- E modéstia nota Zero para Merlin da Silva!- ela falou.


- Hey, esse não é meu sobrenome.


- Ótimo. Menos um na lista , apenas alguns milhões a mais para checar.- ela falou irônica.


- Certo, você já fez suas perguntas. Agora eu quero fazer as minhas.


- Achei que você havia se dado satisfeito com as perguntas.


- Nem perto Morgana, nem perto.


- Certo. Pergunte.


- O que você mais gosta de fazer?


- Não sei...


- Não aceito “Não sei...” como resposta. Seja criativa.


- Nossa que exigente.


- Sou mesmo.


- Certo... Deixe-me pensar...- ela falou vasculhando sua memória.


- Você tem dez segundos: 10...9...8...


- Ninguém falou nada sobre cronometragem


- Bem , está sabendo agora. 7...6...5...


-Bom, acho que o que mais gosto de fazer, é viajar.


- Nossa, então deve estar se divertindo muito nesta viagem.


- Pode-se dizer que sim. Fiquei realmente muito entusiasmada em poder vir. Tirar um tempo para relaxar, férias.


- Estranho.


- Você não está se divertindo?


- Pode-se dizer que não vim nesta viagem por livre e espontânea vontade.


- Foi forçado?- ela perguntou incrédula.


- De certa forma... Mas voltando às perguntas. O seu lugar preferido?


- Exatamente aqui.- ela respondeu de imediato.


- Aqui?


- É.


- Você inventou isto agora?


- Não.


- Por que justo aqui? Me sinto lisongeado por contribuir para tornar este lugar o seu preferido, mas se eu não estivesse aqui com você neste instante, este continuaria a ser seu lugar preferido? O topo da pirâmide mais alta?


- O que faz você se achar tão importante Merlin?- ela perguntou sorrindo da sua pretensão?


Ele sorriu de volta, ela era a primeira mulher que lhe dizia aquilo.


- Apenas responda a pergunta.


- Sim. Este é meu lugar preferido desde que subi aqui pela primeira vez quando tinha doze anos.


- então você não é novata em escalar pirâmides?


- Não, sou veterana no negócio.- ela disse achando graça. Ele deliciou-se internamente com a risada dela.


- Qual a sua comida preferida?


- Ahhh, não existe uma resposta para isso, sempre gostei muito de comer.


- isso me leva a pensar que você é gorda.- ele disse.


- Não sou gorda!


- Não?!


- Não! Sou perfeitamente satisfeita com o meu peso.- ela falou indignada.


- Tudo bem. Não fuja do assunto, responda a pergunta.


- Não estava fugindo. Só não sei responder.


- Viu? Está fugindo!


- Não estou. Eu não fujo das coisas.


- Então responda. É bastante simples.- ele disse.


- Tudo bem! Tudo bem!- ela falou irritadiça. Impressionante como ele era especialista em atingi-la nos pontos que mais a irritavam.- Creio que seja sorvete.


- Algum sabor em especial?


- Não, eu gosto da maioria.


- Qual a sua flor preferida?


- Flor?- ela perguntou surpresa.


- É. Não diga que nunca pensou nisto. Toda mulher tem seu tipo preferido.


- O que quer dizer com isso?


- Todas vocês adoram flores.


- Bom, flores são um gesto muito bonito de mostrar carinho por outra pessoa.


- Flores são a chave para as mulheres. Vocês se derretem.- ele disse em tom conclusivo.


- Não diria a chave.


- Diria o que?


- Não sei, você transforma o ato de dar flores em algo tão interesseiro.


- Mas é exatamente isso. Um homem não dá flores a uma mulher a não ser que esteja interessado em algo, funciona como um facilitador, um ampliador de possibilidades.


- Certo, então lembre-me de não aceitar flores da próxima vez que eu as receber.


- Provavelmente eu não vou estar por perto então não poderei lembrá-la.- ele disse. E ela ficou em silêncio diante da sinceridade da última frase dele. Ele não estaria por perto. O problema é que ela queria que ele estivesse por perto. E saber disso lhe causava um frio/aflição terrivelmente desconfortável no estômago.


Fez -se silêncio desde então, a aflição no estômago engolia suas palavras. Então ele desviou a mente dela para pensamentos mais aconchegantes.


- E a resposta?


- Bom, gosto de miosótis.


- Uma pequenina flor azul?


- É. Costumava crescer ao redor da propriedade da minha família quando eu era pequena.


- Uma flor delicada.- foi o comentário dele.


- Sem mais perguntas?- ela perguntou.


- Na verdade ainda tenho muitas curiosidades, mas creio que devo pedir que faça uma lista com coisas sobre você.


- Uma lista? Por que?


- Porque existem coisas que quero saber sobre você.


- Então pergunte-as. Prometo fazer meu melhor para respondê-lo agora.


- Não quero perguntar agora.


- Por que não?


- Por que agora eu quero beijá-la.


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