Capítulo 1




Betwen Angels and Demons

By Anny Black Fowl

Capítulo 1

As luzes são tão brilhantes que ele simplesmente não conseguia olha-las, era muito difícil elas tinham um tom verde, e bastante ofuscante, o que seria aquilo? Na verdade não havia luz alguma, estava tudo escuro, que lugar era aquele? Não havia paredes, não havia teto, na verdade não havia nada! Onde ele estava afinal? Piscou, para tentar clarear a visão, mas não adiantou nada, estava escuro. Estava deitado em algo macio, bastante macio, mas ele não entendia devia estar sentindo frio, mas por quê? Por que ele deveria estar sentindo frio mesmo? Flashes pularam na sua memória, gritos, luzes, a neve, o vento frio cortante, então um grito cortou o silêncio de suas lembranças, um grito dela, e então o barulho cessou, ele correu, pulou em cima da Sombra, então uma dor alucinante atingiu seus olhos, e vazio novamente.

Agora ele estava ali naquele lugar escuro deitado em algo que ele não sabia o que era, parecia algum tipo de tecido, teriam sido pegos? Sentou-se, sentiu algo pregado ao seu peito que o segurava aí, livrou-se do que descobriu serem fios, e então ouviu vozes.

- /Ele acordou!/

- /Malfoy acordou?!/

- /Oh meu Deus! Chame o Antony!/

- /Quem está ai?/- ele perguntou inseguro, sua mão tateando a superfície a sua volta, e tentando saber de que direção tinha vindo a voz.

- /Jack, sou eu./

- /Eu quem...? Onde estou? Onde está a Raposa?/- ele perguntou nervoso, não conseguia entender porque estava tudo tão escuro, quando sentiu uma mão em seu peito o pressionando, para que voltasse a se deitar, sobre o que ele achava que eram panos.

- /Sou eu, Seleena, lembra-se de mim?/

- /Seleena! Graças a Deus, claro que lembro, onde está Ginny Weasley, a ruiva...?/

- /Eu sei quem é a Ginny, Jack, não precisa se preocupar ela está sob meus cuidados./- ele respondeu com calma, ainda com a mão sobre seu peito.

- /Você quer dizer que estamos no hospital?/- ele perguntou lentamente com a voz fraca.

- /Sim, não reconhece?/

- /Reconheceria se houvesse alguma iluminação no lugar. Mas não vem ao caso preciso ver a Ginny./- ele falou tentando se levantar devagar e sentindo o corpo dolorido com uma especial pontada de dor sobre sua tempora, mas sendo novamente impedido.

- /Mas Jack, há iluminação, são seis da manhã, e temos velas acesas por todos os lados, não consegue ver? Consegue me ver?/- ela perguntou hesitante e com um tom que não o agradou nem um pouco na voz

- /Não, eu não consigo ver nada... Não há luz alguma!/- ele falou sentindo um desespero crescente em seu peito tampando suas vias respiratórias, diante do silencio que a curandeira fez em resposta, não sabia o que estava acontecendo, e sentia como se o lugar no qual estivesse deitado girasse um pouco mesmo que ele não pudesse ver. Uma sensação de mal estar começava a envenenar-lhe a mente assim como o escuro irrefutável que havia se estabelecido, algo lhe dizia que as coisas não estavam bem.

- /Oh, não, não acredito, Jack você tem certeza de que não consegue ver nada?/

- /Não, não há nada...! Qual é o problema Seleena por que eu não consigo ver?/- ele falou agitando os braços a procura de algo a sua frente, algo que ele pudesse tocar, que pudesse sentir, para provar que ela estava errada que não havia nada ali, que não havia luzes ali.

- /Jack, acalme-se, isso poderia acontecer, você está cego.../

- /Como assim cego?/- ele a imterrompeu - /Eu não posso estar cego, claro que não estou cego! Há algumas horas atrás eu estava lá, estava no gelo com a Raposa, não estou cego!/

- /Acalme-se, ouça! Escute, isso pode ser permanente, mas também há boas chances de ser passageiro, poderia acontecer, o feitiço o atingiu nos olhos. Mas não se preocupe temos tratamentos eficientes.../

- /Tigre! Graças a Merlin!/- ele ouviu uma voz a mais soando no recinto, e então o barulho de passos apressados no escuro.

- /Antony?! Pirralho, onde você está?/- ele perguntou virando-se para o outro lado de onde a voz do irmão parecia vir.

- /Como assim onde eu estou? Estou bem aqui ao seu lado./- ele ouviu a voz agora mais próxima e alguém segurou uma de suas mãos.

-/Seleena, não posso vê-lo! Não posso ver Antony!/- a sensação que agora se revelara ser um pânico impiedoso estava disposta em cada fibra do seu corpo, ele não poderia estar cego!

- /Como assim não pode me ver?! Eu estou bem aqui, estou na sua frente, estou segurando a sua mão, meu irmão, olhe para mim!/- disse Antony com um tom incrédulo na voz e o sorriso se desvanecendo no rosto.

- /Não posso vê-lo, está tudo escuro, não posso ver nada!/- disse segurando a mão que segurava a sua com força.

- /Acalmem-se os dois!/- ela falou com a voz firme.- /Jack, como eu já disse você está cego, mas ainda não se pode dizer se é uma situação permanente ou reversível, temos tratamentos que poderemos testar, não se preocupem faremos o que for possível, para cura-lo, Jack. Você não é o primeiro caso deste tipo que temos que enfrentar./

- /Não posso estar cego! Antony, diga a ela não posso estar cego, como eu vou dizer isto a Ivanovitch?! Ele vai ter um ataque, como eu vou poder trabalhar? Devem estar enganados, não posso estar cego. Alguém acenda a droga das velas!/- ele esbravejou, com um nó extremamente incômodo em sua garganta, por que Seleena insistia naquela história maluca?!

- /Jack, as velas estão acesas./- disse Antony com a voz fraca.

Um gosto amargo subiu a sua garganta, tomando-lhe a língua e afogando seu paladar, se as velas estavam acesas... Não poderia estar cego, como isso pudera acontecer? Não poderia enfrentar uma missão cego, como iria sair, chegar em casa, como iria se levantar dali, se não podia enxergar o que vinha na sua frente. Teria que andar tateando todos os objetos ao redor para ter certeza de estar seguro, como saberia onde estava ou para onde estava indo? Como seria a sua vida...?

Ele não conseguia entender por mais que tentasse, porque estava aprisionado naquela escuridão, mas talvez, não houvesse muito que entender, afinal, não havia nada no escuro o que entender, apenas talvez aceitar. Ele deitou-se de volta na cama, sentindo-se fadigado, como se tivesse corrido quilômetros, fechou os olhos, afinal para que abri-los novamente, não havia nada para ver, nada que pudesse ver.

-/Vou deixá-los a sós./-disse Seleena.- /Mas não desistam, vamos achar uma cura Jack./- falou passando a mão pelos cabelos escuros.

-/Tigre, você ouviu o que ela disse, eles vão conseguir fazer você voltar ao normal./

- /Antony como eu vim parar aqui? Estávamos perdidos, eu a Raposa.../

- /Eu os encontrei. Todos os aurores que haviam sido enviados nas suas missões já haviam voltado e cumprido coma sua parte no plano, então nós esperamos vocês voltarem, mas na segunda, como era previsto para voltarem de acordo com Ivanovitch, vocês não apareceram, então achamos que haviam acontecido apenas complicações de última hora, que deveria ter causado o atraso, afinal aquela tinha sido a missão mais difícil até o momento para todos. Até que mais um dia se passou, e ainda assim não havia nenhum sinal dos dois, nada, ficamos preocupados, e já à noite quando tivemos certeza que algo de muito sério havia acontecido, pois aquele não era um atraso tolerado. Ivanovitch mandou três equipes de busca, cada uma com quatro integrantes, para tentar rastreá-los, eu e Leo junto com Andrei e Bea formamos uma equipe. Ivanovitch achava muito arriscado que fossemos até a fortaleza das Sombras, poderia ser uma armadilha, poderiam estar esperando por nós, mas tivemos que tentar, e desobedecemos as ordens do nosso superior, quando chegamos a alguns metros de distância do locar, vimos muitos corpos, parcialmente cobertos pela neve outros totalmente congelados, mas felizmente o de vocês não estava lá. A fortaleza havia explodido e tudo indicava que havia sido uma granada mágica das nossas, o fato de não termos encontrado vocês lá aliviou um pouco a tensão e aumentou o pânico. Onde estariam vocês? Chegamos a conclusão que só poderiam estar perdidos no gelos. Avisamos aos outros que ainda estava na fortaleza e partimos em busca dos dois, não demorou muito e encontramos alguns rastros quase totalmente apagados pela neve. Os seguimos até certo ponto quando desapareceram, totalmente encobertos. Mais equipes foram enviadas, Ivanovitch não conseguia aceitar o fato de perder dois dos seus melhores aurores, então no fim do quarto dia eu pensei ter visto fogo em algum lugar, ou sei lá, o reflexo, segui naquela direção, não estava muito distante, achei os cabelos ruivos que se sobressaíam sobre a neve. A Raposa estava desacordada, e quase congelando, alertei os outros, e não demorou muito o encontrei também desacordado coberto de neve, mas com uma febre altíssima. Então o trouxemos imediatamente para o hospital onde Seleena vem cuidado de vocês há quatro dias. /- disse Antony terminando de narrar o acontecido para o irmão que ouvia atento.

- /No fim das contas não adiantou tanto esforço da parte de Ivanovitch, ele acabou tendo um do seus melhores aurores fora de circulação./- ele falou com uma risada sarcástica, referindo-se a si mesmo com a voz pesada de cólera.

- /Não, você não está fora de circulação./- falou Antony seco.

- /Pirralho você sempre foi bom em algumas coisas admito, mas mentir nunca foi uma delas, como vocês espera que eu volte a trabalhar nestas condições?/- continuou ele mantendo o mesmo tom.

-/E você, Jack Pólux Malfoy, não se finja de surdo, você ouviu muito bem o que Seleena disse a você. Eles irão tentar de tudo para curar você, pode ser reversível./

- /Você ouviu bastante bem Pirralho, pode ser reversível./- ele falou irônico ao irmão, que vacilou na voz por alguns instantes de forma quase imperceptível, mas que foram percebidas pelo Tigre.

- /Você sempre teve uma sorte impressionante desde que te conheço./

- /Veja onde ela me trouxe. De qualquer forma a Raposa está bem, não está? Quero vê-la, Antony, me leve até ela./- ele disse, se virando para onde a voz do irmão vinha.

- /Não é tão simples assim./- ele falou hesitante.

- /O que quer dizer com, “não é tão simples assim”? É simples, estou cego não paralítico, se não quiser me levar diga-me onde é e eu tento achar sozinho./- ele falou um pouco rude.

- /Não estou falando disse Tigre, Tudo bem você ir até lá./- ele falou com o tom de quem ainda tenta formular uma maneira de contar algo.

- /Então qual é o problema?/- O moreno perguntou com impaciência.

- /Você pode ir lá, mas não pode exatamente conversar com ela.../- falou Antony medindo as palavras, e Tigre pôde notar um tom de tristeza na voz do irmão, a sensação desagradável de outrora que ainda se encontrava alojada em seu corpo não totalmente dissolvida, retornou lentamente.

- /Ela não está... Não, não pode estar morta... Seleena falou que ela estava sobre seus cuidados./- ele falou coma voz falha, sentindo novamente algo sufoca-lo, terrivelmente.

- /Não, não é isso, graças a Merlin ela está viva./- disse Antony como se afastasse um mal agouro.

- /Então, o que me impede de falar com ela?/

- /Ela não está acordada./- falou o loiro com a respiração suspensa.

- /Tudo bem, podemos ir daqui a um tempo, quando ela acordar./- falou Jack, sem compreender o que Antony estava querendo dizer, mas não estava conseguindo. Será que o irmão estava lhe escondendo algo que acontecera coma ruiva? Como ela reagiria, sabendo que agora, depois que ele finalmente tinha conseguido o que mais almejara durante alguns anos, agora que estava juntos, ele estava cego? Ele não era tolo, não se enganaria por um segundo em pensar que ela o deixaria por este motivo, Virginia, jamais faria aquilo, não condizia com seu perfil. Mas ela certamente iria continuar a trabalhar logo que se re-estabelecesse, iria ter novas missões, teria que se afastar, e o Tigre se preocupava com isto, não estaria ali com ela. Teriam apenas momentos esporádicos nos quais poderiam se encontrar se pressa, ou desespero. Afinal tinham que conversar.

- / Tigre, não é que ela esteja dormindo, é que ela ainda não acordou./

- /Como assim?/- ele falou sentindo a sensação se agravar em seu peito o comprimindo como um visgo do diabo.

- /Ela ainda está desacordada desde que foi encontrada, seleena diz que ela está em uma espécie de coma./- o pirralho disse num tom de voz tenso, e hesitante, como se esperasse a reação do irmão.

- /A Raposa, esta em coma?/- ele repetiu com a impressão de que não ouvira direito e que tinha engolido várias pedras de gelo.

- /Sim./

- /Mas ela vai sair disso não vai? Seleena pode tirá-la do coma não pode?/- falou vendo o nervosismo aflorar.

- /Não sabemos, Seleena já tentou de tudo até chamou outros curandeiros, mas eles repetem a mesma coisa, não podem fazer anda para acordá-la, e que são infinitas as especulações sobre as seqüelas que ela pode ter, ou ela simplesmente pode não ter nenhuma./- ele falou apressado, observando o irmão que não parecia aceitar a notícia do melhor modo.

- /Antony ela tem que acordar! Tenho que vê-la!/

- /Se quiser eu o levo lá, mas como disse, ela está desacordada./- ele falou triste.

Parece que aquela noite no gelo, havia deixado marcas profundas em ambos, marcas das quais eles poderiam jamais conseguir se livrar. A idéia de que Ginny talvez não viesse a acordar lhe soava absurda, claro que ela iria acordar, ela tinha que acordar... Ele repetia para si mesmo, e tentava acreditar que ela estava bem e que não ficaria com nenhuma seqüela, qualquer que fosse, afinal ela sempre fora uma mulher forte, em todos os aspectos. Isso fazia com que ele a amasse. Ela não podia ficar para sempre ali naquela cama imóvel, sem vida, não agora... Seu peito doía, ele estava cego e ela poderia estar condenada a viver presa dentro do próprio corpo. Tinha vontade de gritar, de ódio e tristeza, não poderia agüentar ficar sem ela, ela era a mulher que ele escolhera para passar os anos.

Era perfeita para ele, não poderia permitir, mas via-se frustrado diante da sua incapacidade de reverter os fatos, uma habilidade que estava alem dos seus poderes Se viu desejando que jamais tivesse partido para esta missão, que jamais tivesse deixado-a sozinha naquela noite no gelo, talvez assim, poderia evitar que tudo isso acontecesse. Sua garganta estava em brasa e sua respiração falha, não conseguiu conter a lágrima que rolou de seus olhos azul-prateados. Deveria ser alguma maldição.

Antony, sentia uma agonia enorme do peito, observava o irmão em silêncio, nunca imaginara que um dia se encontraria em uma situação ao menos parecida, ele era o Tigre. Ele era o irmão mais velho, ele era quem sempre acobertava Antony, desde pequeno. Quando ele fazia alguma besteira e o pai descobria, para depois ralhar com ele, mas Antony preferia assim ao menos nunca ficava de castigo. Levava alguns petelecos era verdade, mas ainda assim ele preferia. Sempre fora o Tigre quem agüentava Antony e o chamava de Pirralho, e agora era o contrário, o Pirralho estava tomando conta do irmão mais velho.

Desejou com toda a sua força que o irmão voltasse a ser o que era, precisava dele sempre ali, e não agüentava ver aquela lágrima escorrendo pelo rosto tão parecido com o seu. Sabia o quanto Tigre gostava da Raposa, conhecia o irmão desde sempre. Logo

que Jack nasceu, sua mãe Vega Malfoy se separou do pai deles, e então Leônidas Tíndaro Malfoy casara-se com a mãe de Antony, permaneceram casados durantes dois anos, mas esta morreu, de uma doença grave, e então Leônidas casou-se novamente com Vega, até falecer alguns anos depois. Sabia que o irmão realmente gostava da Raposa, podia ver isso nos olhos dele, o Tigre sempre conquistador, era dependente dela mesmo que no início não admitisse, ele estava apaixonado pela ruiva desde quando se conheceram.

Tudo que conseguiu dizer foi:

- /Não se preocupe Tigre, ela vai acordar./

- /Pirralho, eu não te contei uma coisa, não é? A gente tinha se entendido, sabe, quando estávamos perdidos no gelo, ela finalmente estava comigo, era minha./- ele falou com a voz falha.

-/Que bom, Tigre nunca imaginei que viveria para ver esse dia... /- ele falou surpreso, acho que os dois passariam a vida toda brigando, sem admitir nada.

- /Definitivamente foram os melhores dias da minha vida, mas de que adianta agora, olhe para nós./- ele falou com angustia.

- /Ela vai acordar, meu irmão, temos que acreditar que ela vai acordar.../- falou Antony não podendo conter o tom sombrio.

- /Sr. Malfoy, hora da sua medicação./- falou a enfermeira que vinha trazendo as inúmeras poções que ele tomava por dia, e o colírio de chifre de unicórnio.

- /Alguém já disse para vocês que essa poção é horrível?/- ele perguntou desgostoso, arrancando leves risadas da enfermeira ao lado da sua cama, ele conhecia aquela risada.

- /A maioria dos pacientes dizem a mesma coisa./- ela falou com resquícios de diversão na voz.

- /Eu conheço você./- ele afirmou pensativo.

- /Certamente./- ela falou supresa, por ele ter reconhecido sua voz, mas deixando revelar um traço de felicidade que não escapou aos seus ouvidos.

- /Nay?/- ele perguntou, indeciso.

- /Eu mesma./- ela respondeu prontamente.- /Como anda o paciente mais rebelde que temos?/- ela perguntou, a sua tentativa de deixar o hospital no meio da noite, que quase conseguira se não encontrasse Andrei e Beatrice entrando no prédio. Ele sorriu.

- /Pediram para você tentar me conter?/- perguntou sarcástico.

- /Não, eu escolhi, mas não nego que o objetivo era este./- falou sincera colocando a bandeja de metal na mesa de cabeceira, e dosando o remédio para ele tomar.

- /Não é necessário cordas, OK? Eu já estou mais calmo./- ele falou.

- /Bom perceber isto./

- /Bom ouvir sua voz novamente./- ele tomou o remédio e não conseguiu conter a careta.- /Que coisa horrível!/

- /Acredito que já tenha tomado poções piores, polisuco por exemplo./

- /Acredite, nunca encostei nada tão ruim em minha boca./- ela sorriu novamente, colocando o colírio prateado, que escorreu pelo canto dos olhos dele, o líquido se confundia com o azul-prateado de seus olhos, mas isso só ela poderia reparar.

- /Você deve ter aprontado uma das grandes Tigre. Para Seleena ter te prendido aqui, e com razão./- ela falou recolocando as coisas na bandeja.

- /Desta vez a culpa não foi inteiramente minha, ossos do ofício, querida./- mas ele se calou, desde então fazia o possível para que as lembranças daquela noite, os gritos, não invadissem sua cabeça, e seu coração apertasse como sempre acontecia, não queria pensar também no trabalho, era doloroso, pensar ele não poderia mais...

- /Não se preocupe, você está melhorando, se continuar neste ritmo, poderá sair daqui sem demora./

- /Eu posso ver como estou progredindo./- ele falou com a mesma angústia na voz, e a vontade de gritar sufocada no peito. Ele não era idiota, detestava que todos o tratassem como um bebê, e tentassem lhe enganar dizendo que estava fazendo grandes progressos quando não estava!

- /Nunca imaginei que detestasse tanto minha companhia a ponto de querer deixar o hospital ainda impossibilitado de tal ato./- ela falou sorrindo.

- /Não é a sua companhia e sim, o local em si, nunca gostei de hospitais./- ele falou cético.

- /Percebe-se, Antony me disse./

- /Alguma notícia sobra a Raposa?/-ele perguntou hesitante.

- /Não, ela continua desacordada, mas seus sinais vitais ainda fortes./- ela falou seca, para ele. -/De qualquer forma, foi bom conversar com você Tigre, estava com saudades./

- /Posso dizer o mesmo./

- /Até outra hora./- ele falou e ela segurou a sua mão.

- /Até a hora do próximo remédio, você quer dizer./-ela falou fazendo-a sorrindo antes de se virar de costas e continuar sue caminho para outros pacientes.

Já fazia exatamente um mês que ele estava ali, naquele lugar, preso naquela escuridão infinita, naquela agonia silenciosa, odiava, quando falavam com ele e ele procurava de onde vinha o som, esperando encontrar ao menos um borrão de cores, odiava quando o silencio abria caminho para pensamentos dolorosos, e para a sensação de vulnerabilidade.

Sentia-se cansado e imprestável ao ter que passar todos aqueles dias em nostalgia, sentia-se ávido por sua antiga vida, mesmo sabendo que talvez jamais a tivesse volta. Toda aquela tristeza encerrada em seu peito fazia sua cabeça latejar, mas acima de tudo o que mais lhe incomodava era a falta dela, ela nunca estivera tão ausente, sentia falta dela, do cheiro, do beijo que tão poucas vezes provara, da pele macia, do olhar, dos cabelos flamejantes, tudo da ruiva lhe fazia falta.

Durante a noite era uma tortura quando não conseguia dormir, o que acontecia freqüentemente, viajava pelas lembranças tortuosas de tempo mais felizes, e ela estava acordada. Em seus eventuais e escassos sonhos ele podia vê-la tocá-la e observar como era graciosa ao sorrir, como os cabelos escorregando para os olhos, os magníficos fios cor de fogo, e como os olhos castanhos pareciam tão profundo quando se encolhia no sorriso... Se ela não acordasse tudo estava perdido. Todos os sorrisos, todos os olhares, todos os sonhos... Restariam apenas lembranças do que parecia ser outra vida para ele, uma vida distante...

Não poderia voltar no tempo. Infelizmente não podia.

Era de tarde, e ele podia sentir o sol morno entrando pelas janelas e batendo em sua pele pálida. Estava mais uma vez de olhos fechados, imóvel, deitado na cama.

- /Oi./- ele ouviu uma voz.

- /Bea?/- ele perguntou incerto.

- /Eu mesma./- ela falou em tom doce e alegre.

- /Adivinhei./- ele falou no tom que agora se tornara usual, retribuindo com um sorriso triste.

- /Minha voz é inconfundível, eu sei, mas como você tem passado?/

- /Terrivelmente mal, odeio hospitais./- ele disse se virando para onde ele ouviu o som da voz da mulher vir.

- /Não muda em nada mesmo./- ela falou sorrindo terna para ele e encarando aqueles olhos azuis, já tão conhecidos de todos, mas que ela sabia serem mortos.

- /Algumas coisas são para sempre./- ele argumentou - /Como vai você, e como é a vida lá fora? Será que conseguirei me lembrar de como era fora destas paredes depois de todos estes dias odiosos?/

Aquilo arrancou algumas risadas dela, mas ele continuava com a mesma expressão.

- /Dramático./

- /Realista./

- /Os outros estão vindo para cá, mas eu cheguei mais cedo porque queria falar com você./

- /Sou todo ouvidos, literalmente, já que não posso vê-la./- ele falou angustiado embora ostentasse um sorriso sem alegria no rosto bonito. - /Mas devo lhe dizer que Antony já está aqui, ele veio falar comigo ainda há pouco./

- /Pedi para que ele esperasse lá fora./- ela falou segura. - /Quero falar com você sozinha./

- /Você tem consciência que na hora que todos saírem ele vai tentar extorquir de mim cada palavra que você disse, não sabe?/- ele falou incrédulo.

- /E você decidirá se vai contar ou não./- ela falou ainda parecendo séria.

- /Certo, o que quer que tenham lhe dito, não fui eu ta legal? Eu estive deitado aqui todo o mês, com exceção as poucas vezes que alguém me acompanha em um emocionante tour pelos corredores deste lugar. E se o problema for com relação à mulher, bom, por incrível que pareça não foi eu também, o quer que ela diga, não fui eu. Estou em abstinência querida./- ele disse antes que ela pudesse dizer qualquer coisa.

- /Não, não é nada que você tenha feito de errado, ou que tenha a ver com qualquer outra mulher que não seja a Raposa, embora essa sua postura defensiva lhe denuncie./- ela falou com os traços de um sorriso se formando nos lábios.

- /Tem a ver com a Raposa é?/- ele perguntou sério, com a expressão indecifrável no rosto.

- /De certa forma./

- /Que tem ela? Algum problema?/- ele disse em tom preocupado.

- /Não, nada que você não saiba./

- /Se me deixar curioso era o objetivo, bom, receio que esteja conseguindo./

- /Tigre, eu vim aqui porque eu preciso lhe abrir os olhos. /- ela disse séria segurando uma de suas mãos, ele soltou um riso sarcástico e sem alegria.

- /Não adianta esqueceu? Já estou com eles aberto, e ainda assim não consigo ver nada./

- /Estou falando sério. Todos tem estado preocupados com você./

- /Não deveriam, eu estou bem./

- /Pare de mentir, você não está. Você não era assim, não tinha sempre este tom angustiado e melancólico na voz, tudo bem você sempre foi sarcástico e irônico, mas nunca desta maneira que está agora./

- /Esperavam que eu estivesse feliz?/- ele perguntou incrédulo.

- /Claro que não, sabemos perfeitamente que não é fácil passar pelo que você está passando, mas.../- ela não teve oportunidade de terminar a frase, ele a interrompeu.

- /Estou cego, caso alguém não tenha percebido, ou simplesmente prefira ignorar. Não enxergo um palmo a frente do nariz, e estou a um mês trancado num quarto escuro na minha mente. Vocês esperavam que eu estivesse feliz com isso?/- ele continuou incrédulo.

- /Nós esperávamos que você lutasse!/- ela disse firmemente. - /Esperávamos que como o Tigre antigo, aquele que sempre fora o rei de tudo, egocêntrico, alegre, safado, o irmão do Pirralho, você lutasse para sair disso, para se recuperar, para retomar o que é seu, sua vida. Tigre você se perdeu no meio do caminho?/- ela perguntou triste.

- /Talvez eu tenha me perdido Bea./- ele falou com a voz baixa.

- /Então nós o ajudaremos, meu amigo, você não pode se entregar e viver nesta angústia, você não pode viver no escuro. Nós não iremos deixar, eu não vou deixar./- ela falou apertando sua mão com mais intensidade, como que para lhe assegurar que estava ali mesmo ele não podendo ver ela.

- /Bea, sempre gostei do seu jeito, generoso, amigo, fiel, você sem dúvida é uma pessoa especial, Andrei é um homem de sorte, mas o que vocês podem fazer? Ninguém pode fazer nada./- ele falou apertando a mão dela de volta.

- /Não podemos fazer nada se você não deixar./

- /Você não entende não é?/- ele falou desgostosos com a constatação desviando o rosto para o lado oposto de onde ela estava.

- /Eu entendo Tigre, eu entendo só que.../

- /Não, você não entende, como poderia? Não estava lá naqueles dias na neve.../

- /Então me faça presente em tais dias, não sei o que aconteceu, mas ainda assim eu quero te ajudar Tigre, todos nós queremos./

Ele se calou em um frio iminente no estômago, e uma dor aguda no peito que parecia cortar seu tórax em dois. Nunca havia mencionado aquilo para ninguém depois que acordara, nunca haviam tocado no assunto, talvez achassem que tinha ficado traumatizado ou que talvez fosse doloroso para ele reviver tudo de novo. Eles tinham razão se fosse assim. Era doloroso saber que tudo jamais seria a mesma coisa.

Mas alguém precisava saber, ou ele simplesmente acabaria achando que fora tudo um misto de sonho e pesadelo que lhe assomara uma vez durante uma noite de sono.

- /Enquanto estivemos perdidos, aconteceram algumas coisas Bea... /

- /Que coisas...?/

- /Vou te contar desde o início... Quando eu e a Raposa finalmente conseguimos sair da Fortaleza, o plano trouxe complicações, não saiu exatamente como esperávamos, e acabamos nos machucando. Fomos apanhados por uma tempestade de neve, com ventos furiosos. Estávamos exaustos, e precisávamos de um lugar para nos aquecer e dormir, caso contrário morreríamos pela hipotermia, ou pelo cansaço. No primeiro dia simplesmente desabamos, e quando acordamos tentamos sair da barreira do feitiço anti-aparatação. Andamos por um bom tempo, e ainda assim não conseguimos, o frio era quase insuportável e tínhamos que dividir uma varinha roubada de uma Sombra morta. Não tenho certeza de quantos dias se passaram, agora que tento lembrar tudo parece um pouco embaçado. Uma noite quando estávamos em um dos buracos no gelo nos quais dormíamos, eu fiquei com medo, Bea, temia por nós dois, sozinhos naquele deserto de gelo, e se não encontrássemos a saída? E se não conseguíssemos sair da barreira antes que fossemos dominados pelo frio ou pela exaustão? Temia por ela, por morrer, e nunca mais poder ver a Raposa, sem jamais ter tentado de verdade, por jamais ter admitido uma coisa da qual eu já havia me tornado ciente há algum tempo. Então fiz a coisa que me parecia mais plausível na hora, perguntei a pergunta que eu havia me feito intimamente durante alguns anos: “Porque ela era tão difícil? Porque ela não me dava uma chance, de mostrar...?” Mas a resposta foi inesperada, ela respondeu que eu já estava tendo a minha chance há tempos. Durante aquele tempo estivemos juntos. Vocês não iriam acreditar se vissem, até eu estava achando alguma dificuldade em acreditar, ela era minha... Você entende agora?/- ele perguntou ainda ostentando aquele sorriso triste.

Beatrice ficou em silêncio durante alguns segundos olhando para ele, enquanto lágrimas desciam pelo seu rosto, então era isso que estava afetando tanto o seu amigo. Como ela não imaginara antes? O Tigre sempre fora visivelmente apaixonado pela Raposa, e ela se esquivava dele o máximo possível, ela sabia que os dois terminariam juntos, mas nunca imaginou...

- /Jack, sinto muito.../- ela falou sendo sincera, não fazia idéia. - /Todos nós sabemos o quanto ela é importante para você, para cada um de nós./

- /Não tem importância, agora não faz mais diferença. Em um momento eu a tinha, mas receio que agora a perdi./

- /Não./- ela disse.

- /Mas talvez o Potter esteja certo no fim das contas, talvez simplesmente eu não seja o cara certo./- falou amargo.

- /Pare com isso, ela é quem deve saber disso. Quando ela acordar você vai ver.../

- /Nada voltará a ser como era Bea, não sabemos se ela vai acordar, não sabemos se algum dia eu poderei ver o rosto dela ou o seu, ou até mesmo o meu, outra vez na vida. Perdi meu trabalho, não posso trabalhar assim, não posso nem chegar até em casa assim, quanto mais enfrentar outra missão. E se ela acordar, viveremos em dois mundos diferente./

- /Não fale assim. Claro que vai voltar a ser como antes, você vai voltar a enxergar, Seleena disse que você vem fazendo progressos.../

- /Ela pediu para você me dizer isto/

- /Não./

- /Bea, esqueça não há nada a se fazer, não há como reaver minha antiga vida, resta apenas me conformar com as velhas cicatrizes.../- ele falou não contendo a ardência nos olhos que deixaram escapar uma teimosa lágrima quente que rolava pelo seu rosto em busca do lençol branco linho que cobria seu peito.

Beatrice sentiu-se mortificada em olhar o Tigre sempre tão impenetrável chorando, nunca havia visto ele chorar, os olhos azuis, se tornarem mais cortantes, mas sendo lentamente recobertos por uma camada cintilante de lágrimas que desciam impassíveis pelo seu rosto bonito, e sem expressão, fitado o nada a sua frente.

- /Tigre, agora posso entender como deve ser difícil para você, todos nós sabíamos que um dia vocês iriam acabar juntos, mas não dessa forma. Ainda assim, você tem que lutar, tem que lutar para conseguir o que quer de volta, para quando ela acordar você estar lá ao lado dela, como sempre foi./

Ele continuou em silêncio olhando para o nada.

- /Tigre você sempre foi tão persistente, e de certa forma paciente, tudo que você tem que fazer é esperar, ela vai acordar. Tem que esperar como nós esperamos para que você acordasse, todos nós fomos pacientes, Antony mais que todos teve que manter a calma e a sanidade./- ela falou tocando o rosto dele delicadamente. - /Ou você acha que foi fácil para nós, não, não foi. Nós também tínhamos medo que você não acordasse, que os dois morressem, ou que acontecessem qualquer outra coisa como um coma mágico com vocês e não pudéssemos fazer anda. Mas todos tinham esperança, todos insistiam em acreditar e assim nós esperamos os quatro dias até você finalmente acordar. É isso que você tem que fazer, esperar. Mas por favor, não desista de você Tigre, se você não tentar, ninguém pode tentar. E devo acrescentar que assim você deixa todos nós preocupados, seu irmão tenha piedade dele coitado, não come direito. Ele está se perdendo junto com você, e logo todos assim como ele. Por isso Tigre reaja, tente melhorar, seus amigos estão todos aqui, sempre perto de você para que tudo se estabeleça, mesmo que não fique idêntico como era antes, mas nós vamos encontrar uma maneira, a gente sempre encontra, afinal eu achava que conhecia Jack Malfoy, que era o Tigre até do avesso./

Ele se sentia um pouco mais leve, e até conseguiu esboçar um leve sorriso enquanto se sentava na cama. Depois de algum tempo em silêncio chafurdando na própria mente, tentando se lembrar como o Tigre de sempre enfrentaria essa situação. O sorriso se alargou um pouco mais em seu rosto, talvez Bea não fosse totalmente leiga no que dissera, talvez ela tivesse um fundo de razão.

- /Talvez vocês esteja certa... Mas de qualquer forma, tenho que me compor se não me engano os outros já devem estar ai fora não?/

- /Tenho certeza./- ela confirmou com um sorriso radiante e limpou as lágrimas remanescentes e seu astro deixado ao longo das bochechas rosadas dela.

O Tigre se pôs de pé, e então parou durante um segundo como que para prestar atenção em algo, então ele falou com um meio sorriso:

- /Antony, eu como irmão mais velho tenho o direito de lhe avisar que escutar a conversa dos adultos é uma coisa feia./- ele falou com um riso maroto no rosto.

- /Como você me descobriu?/- perguntou Antony tirando o feitiço desilusório de si, e adquirindo suas cores normais. Enquanto Beatrice sorria satisfeita.

- /Nunca encontrei ninguém que respire tão pesado como você em toda a minha vida, a sua renite piorou?/

- /Não vale, você não tem renite, por isso você sempre me acha./- reclamou Antony.

- /Azar o seu pirralho./- falou ele dando um tapinha no ombro do irmão, e bagunçando os cabelos loiros cuidadosamente arrumados para trás, com gel. - /De qualquer forma, agora você não precisa me bombardear com perguntas curiosas sobre a conversa./

- /Droga, Tigre, só porque o seu cabelo não tem jeito, você estraga o meu./- falou Antony enquanto o irmão andava cuidadosamente na direção de onde ele sabia ser o banheiro.

Quando ele saiu de lá, todos estavam no recinto e ele pôde ouvir o crescente som de risos.

Não conteve um também.

- /Então todos finalmente encontraram tempo para me visitar juntos?/- ele se fez presente.

- /É o que parece não é?/- falou Leo.

- /Tivemos que esperar um pouco, mas de qualquer forma valeu a pena./- falou Andrei.

- /Inclusive estava me perguntando, foi uma conversa longa a sal com a Bea não? Longa demais pro seu gosto não foi Andrei?/- insinuou o colega e ele quase pôde ver Bea corar enquanto ela murmurava um “Cala boca Leo” bem baixinho.

- /Andrei você é o cara de sorte, meu amigo, mas não precisa se preocupar, eu me contive, com esforço, mas o fiz./

A conversa e as brincadeiras correram soltas até Seleena expulsá-los do quarto dizendo que seu paciente agora precisava descansar. Mas ainda assim tinha valido a pena, mesmo não vendo seus rostos, Jack ainda conservava as agora tão inconstantes risadas nos ouvidos.

Jack estava mais uma vez sendo forçado a engolir o seu arsenal de remédios para o tratamento, seu rosto se contorcia em caretas devido ao gosto muito ruim dos remédios que a enfermeira loira lhe dava.

- /Boa tarde Nay, boa tarde Tigre/- falou a voz animada de Leo que acabara de chegar.

- /Veio apreciar minha tortura?/- perguntou o moreno ainda com o gosto excepcionalmente amargo do remédio em sua boca.

- /Na verdade, não./- falou o outro com resquícios de risos na voz. O Tigre invejou a alegria constante do amigo, depois da conversa que tivera com Beatrice ele considerava que ela tivesse um pouco de razão, talvez até estivesse certa. Mas as coisas não era assim um passe de mágica como ele costumava achar que era há alguns meses atrás. Não dedicava muito tempo ao assunto, pois sempre que cogitava a idéia seu peito latejava lenta e dolorosamente.

- /Você me surpreende Leo./

- /Andrei está lá fora, e Antony e Beatrice já estão nos esperando/- disse o outro após soltar um riso audível do amigo. Mais uma vez o Tigre o invejou, não lembrava da última vez que sorrira de verdade.

- /Nos esperando? Esqueceu que não posso sair até segunda ordem, Leo? Agora eu sou um homem com coleira./- falou tentando fazer aquela sensação constante no seu peito permitir ao menos uma vez que ele sorrisse livre como o amigo, mas não obteve sucesso. - /Pena que a coleira não me prende a quem eu quero e sim a um hospital./- acrescentou em um tom baixo depois que Nay se afastou saindo do lugar.

- /Eu sei, mas nós não iremos sair do hospital, não se preocupe./

- /Onde vocês querem me levar?/

- /Vamos visitar a Raposa, Tigre./

Instantaneamente uma sensação não identificada invadiu o seu corpo e estabeleceu-se um silêncio pesado. Jack nunca havia visitado Ginny desde que acordara, e tinha receio de fazê-lo, não sabia como iria reagir não podendo ver o rosto alegre dela, ou os cabelos flamejantes ou sequer a pele clara. Sentia falta, como dissera, do som do sorriso dela, tinha medo de encontrá-la naquele estado e ter certeza de que jamais a veria sorrir.

Ao mesmo tempo uma ansiedade monstruosa dividia espaço com a sensação desconhecida, ansiava por poder tocá-la e saber que ela estava ali de verdade, sentir sua respiração... Era um contraste enorme dentro de si.

- /Vamos?/- Leo quebrou o silêncio abandonando o tom alegre por um tom hesitante.

O Tigre tentou sem muito sucesso afastar as sensações da sua cabeça e concordou com um aceno da cabeça, levantando-se automaticamente da cadeira. - /aonde você vai deste jeito?/

Jack parou e voltou-se para o amigo.

- /Você vai congelar vestido deste jeito./- disse o amigo.

Fazia tanto tempo que ele não sai a daquele quarto que quase se esquecera de que a temperatura lá fora nos corredores era muito mais baixa que nos aposentos aquecidos magicamente.

- /Você tem razão, eu quase havia esquecido./- falou segurando o seu familiar e grosso sobretudo preto e vestindo-os por cima da sua roupa atual.

- /Vamos Tigre é por aqui./- disse Leo o guiando pela mão.

Os dois saíram do quarto enquanto percorriam o caminho para fora, a mente do Tigre era assaltada por mil e um pensamentos dispersos, que não duravam tempo o suficiente para ele analisá-los misturados em um turbilhão de coisas que o deixava entorpecido sendo apenas guiado pelo amigo, até ouvir a voz conhecida de Andrei.

- /Olá Tigre./

- /Olá. / ele respondeu tentando afastar aquele tom estranho de sua voz.

- /Como tem passado?/

- /Relativamente bem./- ele respondeu saindo de seu torpor. - /E você, como anda o mundo lá fora?/

- /Esperando para ter o Tigre de volta./- disse o outro, e o Tigre esboçou um sorriso de volta.

- /E eu esperando para voltar, meu amigo, acredite você nem sabe o quanto./

- /Vamos?/- perguntou Leo.

- /Sim./- concordaram os dois.

A assim seguira, o caminho de antes, o Tigre pisava no piso conhecido e sentia como se cada metro demorasse um eternidade para passar diante de seus olhos cegos, e seu coração bateu acelerado quando ouviu a voz de seu amigo:

- /Chegamos./- comunicou Andrei.

O rangido da porta se abrindo aguçou seus sentidos e ele quase esperou que a ruiva o recebesse sorrindo, mas essa esperança se desvaneceu quando ouviu a voz suave de Beatrice.

- /Bom dia Tigre./ - enquanto lhe dava um abraço. - /Venha ela está aqui./

Ele não conseguiu responder ao comprimento, sua boca parecia seca, e sua língua incapaz de articular palavras, deixou-se apenas guiar novamente pela mão da amiga, até sentir com a outra mão os lençóis macios de uma cama próxima. Seu coração congelou, parou de bater, ela estava ali, ele podia sentir a pele quente por debaixo do lençol.

Era ela, não havia dúvidas, podia sentir a respiração cálida que se derramava para fora de seu peito, podia sentir a pele macia da barriga perfeita que ele sabia tão bem ser dela. Afastou a mão imediatamente como se tivesse se queimado, não se sentia no direito de tocá-la, ela estava tão imóvel como se houvesse sido petrificada.

Seus olhos não conseguiram conter aquela sensação ardente que trazia junto consigo as lágrimas que ele lutava a todos os custos para conter.

Sentiu uma mão segurar a sua, e leva-la até o rosto delicado e calmo da ruiva, queria tirar sua mão dela, não queria tocá-la, tinha medo de tocá-la, e ainda assim desejava tocá-la. Sentiu os cabelos, macios espalhados sobre o travesseiro. Deslizou os dedos por ele como sempre fazia quando tinha que acordá-la, mas desta vez não funcionou. Porque ela não acordava? O que a mantinha dormindo imóvel todo aquele tempo? Ele queria tanto que ela estivesse sã, que estivessem ambos sorrindo juntos, conversando, brincando e provocando como antes. Seu coração batia tão devagar que ele achou que fosse morrer, sentiu sua pele esfriar, ou seria a dele que ainda conservava o mesmo calor de antes?

Ela estava lá, era só chamar. Não entendia porque não poderia acordá-la.

- /Raposa.../- ele murmurou baixinho, e mesmo Beatrice que estava ao seu lado mal conseguiu ouvir. Não conteve a vontade de chamá-la.

Não obteve resposta alguma, nem mesmo um suspiro mais forte, nada, ela continuava impassível como antes. Então ele teve certeza que algo a impedia de acordar, ela não estava só dormindo. A Raposa jamais deixaria de responder se ele chamasse, sua Ginny jamais faria isto.

Tateou a procura das mãos dela, uma jazia ao lado do corpo, sem vida, mas ainda assim quente como o resto do corpo, segurou-a com firmeza, mas sentiu uma pontada dolorosa no peito quando não a sentiu devolver o gesto.

Em meio a sua agonia e falta de ar, que o sufocava lentamente no cheiro que ele sabia ser característico dela, ele perguntou com a voz levemente embargada para Bea:

- /Como ela está?/

- /Linda./- respondeu a outra, em um fiapo de voz. - /Lembra daquela vez que fomos patinar ela um lago congelado em frente a casa do Andrei?/

Ele confirmou com uma aceno da cabeça.

- /Ela está exatamente igual./- disse Bea.

O Tigre se lembrou daquele fim de tarde a exatos dois verões atrás, lembrou de como ela sorrira quando Leo desajeitado levara um tombo no gelo, e como o vento gelado bagunçava seus cabelos jogando-os para todos os lados e deixando as suas bochechas levemente rosadas por causa do frio. Bea tinha razão ela estava linda.

Então ele pôde ouvir uma voz a suas costas:

- /Desculpem, mas agora tenho que pedir que se retirem, temos que ministrar o remédios nela.Vocês podem voltar outra hora./- era Seleena.

- /Tem certeza? Não podemos ficar nem mais um instante?/- perguntou Andrei.

- /Não seria plausível Andrei./- ela disse severa.

Não tinha consciência de quanto tempo havia passado ali, mas pareciam horas, e mesmo relutante em sair de perto da pele morna e abandonar o cheiro dela, deixou-se guiar para fora do aposento e de volta a sua agora já tão familiar cama.

Alguns minutos depois Nay havia lhe dado outros remédios, e até tentou conversar com ele, mas viu-se frustrada já que ele não tinha nenhuma vontade de conversar agora. Sentiu um sono imediato quando ela deixou o lugar, e alimentou sérias suspeitas que estava sobre efeito de alguma poço do sono, mas ele não se importava, pois o cheiro dos cabelos ruivos ainda estava impregnado em suas mãos, em sua mente.

Cinco dias depois

Jack sentiu sua mente ser suavemente acordada pelo barulho de pés que pisavam rápido no chão de pedra ao seu redor, não sentiu a pálida claridade do sol que entrava costumeiramente pela sua janela e batia em seu rosto lhe acordando, não sentiu a usual temperatura mais branda que fazia de manhã cedo. Sentou-se lentamente na cama, o que havia acontecido? Claramente ainda não era manhã, e pela temperatura ele poderia arriscar dizendo que não estava nem perto de amanhecer.

- /O que está acontecendo?/- ele perguntou na esperança de que algumas das pessoas que passavam apressadas pelo lugar lhe respondessem.

- /Sr. Malfoy, volte a se deitar./- foi tudo que ouviu em resposta de um curandeiro que passou rápido pelo local.

Mas ele não conseguia, algo em seu íntimo lhe dizia que não conseguiria mais deitar, fechar os olhos e simplesmente voltar a dormir, o sono parecia ter se esvaído dele como água se esvai de mãos abertas.

-/Sr. Malfoy, o senhor pode continuar a dormir./- disse um curandeiro que parou em frente a sua cama.

Ele ignorou a frase dita pelo homem e repetiu sua pergunta.

- /O que aconteceu?/

- /Nada sério, não se preocupe, o senhor está bem, volte a dormir./- mais uma vez ele não tinha obtido respostas concretas.

Jack apurou os ouvidos não mais entorpecidos pelo sono, prestando atenção nos murmúrios que escapavam das conversas, misturados ao som dos pés apressados. Depois de alguns instantes, ele distinguiu um nome que fez seu estômago dar uma cambalhota, e um frio descomunal tomar conta de seu ser como se estivesse nas mãos de dementadores. Entre nomes de instrumentos e procedimentos médicos, ele ouvira o nome da Raposa, sussurrado rápido e temeroso, como se a pessoa que o deixou escapar estivesse receosa em pronunciá-lo.

Deixou que o nervosismo invadisse sua mente, fazendo eu coração atingir um ritmo desesperado, precisava saber o que estava acontecendo com ela:

- /Seleena!/- ele chamou da sua cama, na esperança de ela estivesse por perto.

Não obteve nenhuma resposta. Uma agonia crescente tomava conta dele, enquanto era simplesmente ignorado por todos que passavam.

- /Seleena!/- ele chamou novamente, mas a bruxa parecia não estar por perto. Tateou ao seu redor, se preparando para descer da cama quando uma mão o impediu, segurando-o pelo braço com delicadeza.

- /Tigre, não saia daqui./- ele ouvia uma mulher falar. Identificou a voz no mesmo instante, era Nay.

- /Nay, o que está acontecendo?/- ele perguntou de imediato.

- /É a Weasley, Jack! Fique aqui./- ela disse, soltando-o.

- /O que tem a Ginny? O que está acontecendo com Ginny Weasley, Nay?/- ele perguntou se atropelando nas palavras na pressa de saber se a ruiva estava bem.

- /Não saia daqui Jack!/- foi tudo que ele ouviu de longe, enquanto a enfermeira se afastava.

Sua mente encheu-se de medo, estariam todos agitados por causa dela, será que ela havia piorado? Uma dor aguda golpeou seu peito e ele levantou-se decidido a sair da cama e descobrir o que estava acontecendo. Sentiu o chão de pedra frio tocar seus pés como se mandassem ele ficar deitado, mas ele não ligou, deu alguns passos com certa pressa, esbarrou em algo, não sabia o que era, e simplesmente afastou o objeto com um empurrão e continuou trôpego com as mãos a frente do corpo. A cada passo sua garganta apertava, o que estaria acontecendo com ela?

Então uma mão o segurou com força pelo ombro.

- /Sr. Malfoy, por favor permaneça em sua cama por favor/- ele ouviu a voz de um homem.

- /Preciso ver a Srta. Weasley./- falou com pressa tentando se desvencilhar do curandeiro.

- /Não será possível agora, volte para onde o senhor estava./

- /Não, eu quero saber o que está acontecendo com Ginny Weasley./- falou o Tigre com firmeza.

- /Por favor, o Senhor pode voltar a sua cama? Estamos muito ocupados.../

- /Eu sei que vocês estão ocupados, ou você acha que eu sou surdo, seu idiota!/- explodiu o Tigre, ele estava se irritando porque ninguém respondia a sua pergunta, será que ninguém entendia que ele precisava urgentemente vê-la? Ninguém entendia a sensação que o fazia sufocar e se apossava lentamente da sua garganta?

- /Sr. Malfoy, o senhor precisa se acalmar, e voltar para a sua cama, o senhor pode se machucar.../

- / Não me diga para ficar calmo! Todos estão desesperados correndo de um lado para o outro! Preciso saber o que está acontecendo com a Weasley!/

- /Todos estamos preocupados, mas não é hora... Volte... /- o homem insistia em perder seu tempo.

- /Onde está ela?!/- esbravejou o Tigre.

- /A Srta. Weasley está recebendo os cuidados necessários.../

- /O que está acontecendo com ela?!/

- /Deixe isso para os curandeiros.../- mas ele não teve oportunidade de terminar a frase, o Tigre perdera a paciência e lhe acertara um soco e o homem caiu no chão com o nariz sangrando.

Andou a passos rápidos e incertos esbarrando em objetos e pessoas apressadas, então ouviu a voz de seu irmão ao longe. Talvez Antony pudesse fazer alguma coisa, ele tinha que fazer alguma coisa. Não podia ficar assistindo aquilo tudo sentado!

- /Antony!/- ele gritou. Não demorou muito ouviu passos em sua direção.

- /Jack, o que você está fazendo aqui?!/- perguntou o irmão ofegante.

- /Não importa pirralho, a Raposa, alguma coisa está acontecendo com ela!/- falou com uma nota de desespero na voz.

- /Eu sei, estou tentando descobrir o que é, mas todos estão tão apressados para me dizer o que é./

- /Você encontrou Seleena?/- perguntou Jack.

- /Não ela está no quarto da Raposa./

- /Me leve até lá./- disse o Tigre decidido.

- /Não permitiram minha entrada no local, eu já tentei, não estão deixando ninguém que não seja do hospital entrar./- avisou Antony.

- / Vão ter que deixar, me leve até lá, Antony!/

Neste momento uma outra pessoa adentra o ressinto apressada.

- /Pirralho, Tigre, graças a Merlin vocês estão aqui./

- /Andrei, tem alguma coisa acontecendo com a Raposa!/- falou Antony rapidamente antes que o outro pudesse dizer mais uma palavra.

- /Eu sei./- respondeu o russo.- /Vim correndo lhe contar, acabei de encontrar com Seleena saindo do quarto dela./

- /Você encontrou Seleena? O que ela disse?/- disse o Tigre em desespero seu sangue congelando nas veias com medo da resposta, e se ela tivesse piorado, ou pior estivesse morta. Seu coração batia como louco dentro do peito, parecia querer perfurá-lo tamanha era sua ansiedade, e aquela velha sensação que o sufocava tornou-se mais intensa do que nunca.

- /A Raposa acordou!/

Uma sensação quente expulsou o gelo de suas veias, e ele conseguia respirar novamente, ela tinha acordado! Ela estava acordada! Seu coração por outro lado acelerou o ritmo, e o Tigre saiu em disparada, esbarrando em tudo que estivesse pela sua frente, pela direção que ele sabia levar ao quarto onde ela estava.

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