I
Getting lost within myself
Se perdendo dentro de mim mesmo
Nothing matters no one else
Nada importa, ninguém mais
I have lost the will to live
Eu perdi a vontade de viver
Dizem que quando estamos à beira da morte, todos os nossos atos, todas as nossas lembranças desfilam diante de nossos olhos, como se revivêssemos tudo o que fizemos. Agora que sinto o bafejar da morte tão próximo a mim, lembro com nitidez assustadora todas as tolices cometidas, cada mínima palavra que tenha dito e ouvido até então.
Eu poderia dizer que todas as minhas ações passadas foram, em sua maioria, feitas por eu ter sido influenciado pelos ideais da nossa família, mas você sabe que isso é uma mentira. Como você me disse certa vez, nós temos escolhas. Você escolheu viver da maneira mais adversa possível daquilo que aprendemos quando éramos crianças, assim como Andrômeda escolheu viver em virtude do amor que sente por aquele nascido-trouxa.
Escolhas, decisões... no entanto, eu apenas conseguia enxergar um único caminho. Destino, sina, fortuna. Não importava, eu não tive a capacidade de enxergar que eu poderia tomar o destino em minhas mãos e moldá-lo conforme a minha vontade.
Gostaria de saber se você se lembra da época em que nossa prima fugiu - embora eu não tivesse bem certeza de que aquilo havia sido mesmo uma fuga. Andrômeda não era o tipo de pessoa que dissimularia uma atitude desse tipo, principalmente por ter feito questão de anunciar para a família inteira que carregava o filho de um sangue-ruim.
Ainda havia certa exaltação em mamãe e em tia Druella, que lançavam as maiores ofensas contra Andrômeda. E claro, eu apenas observava de longe, sem manifestar o que eu achava daquilo tudo porque, na verdade, eu pouco me importava com nada o que não fosse de meu interesse. Para mim a nossa prima havia sido a pessoa mais idiota do mundo por envergonhar a família por causa de um sangue-ruim e eu achava que ela merecia todas as injúrias e ofensas e maldições por isso.
Mas eu sabia que você não havia ficado totalmente feliz. Eu sentia que você experimentava um misto de alegria e pesar com o que ela havia feito. O motivo da sua alegria eu soube porque você mesmo fez questão de esbravejar para quem quisesse ouvir o quanto ela foi corajosa em fazer o que queria, em se libertar daquele inferno - como você costumava se referir à nossa casa em Grimmauld Place. E eu o odiava absurdamente por dizer aquelas coisas porque, afinal de contas, aquele era o nosso lar, o seio do nosso clã. Você ria e zombava do quanto eu era ingênuo e idiota por acreditar que nós, os Black, éramos uma família, por acreditar na crença do toujours pur e confiar cegamente nos preceitos que nos foram ensinados.
Você, com seu tão nobre espírito grifinório nunca irá admitir que era egoísta o bastante para ficar amargurado com a partida de Andrômeda, a prima favorita, a única pessoa que o compreendia, a única com quem você tinha alguma afinidade, enquanto que eu era apenas uma cópia mal acabada sua, uma miniatura dos Black.
Existem coisas piores que o ódio declarado, e o seu desprezo por mim foi apenas um dos vários motivos que nos afastou.
E em contrapartida, eu o odiava pelo seu desdém, pela minha incapacidade de ser semelhante a você.
Quando toda a família foi reunida na sala da tapeçaria e mamãe queimou o nome de Andrômeda, eu ouvi Bellatrix dizer que logo as coisas iriam mudar porque nós, bruxos de sangue-puro, iríamos ter todo o poder e respeito possíveis e imagináveis; e que nenhum mestiço ou sangue-ruim iria macular o nome de famílias nobres e respeitáveis como a nossa, e que nunca precisaríamos nos esconder dos trouxas como se fôssemos criminosos, porque eles teriam mais, muito mais a temer.
Foi naquela noite que eu ouvi pela primeira vez ser mencionada a pessoa do Lorde das Trevas. Eram conversas sussurradas, com uma aura de medo e reverência em tudo o que dizia respeito àquela pessoa. Ninguém dizia o seu nome, apesar de alguns o saberem.
Era como se ele fosse algum tipo de entidade divina e dizer o seu nome seria como profaná-lo.
E eu tinha apenas onze anos. Não estou querendo justificar as minhas ações, alegando dizer que era jovem demais para compreender.
Crianças sabem muito bem o que é certo e o que é errado. Ou ao menos sabem o que é mais agradável aos seus interesses. Para mim era muito mais interessante seguir aquele caminho, do que ir contra o que esperavam de mim. Era confortável. E eu não queria ser um proscrito como você ou Andrômeda.
Todas as vezes em que Bellatrix, já uma Lestrange, ia para Grimmauld Place, eu a bombardeava com as mais diversas perguntas a respeito do Lorde das Trevas. Eu sabia que era recíproco, nós nunca havíamos tido muitas afinidades. Bella dizia que eu era muito parecido com Narcisa: um fraco mimado, que sempre viveu na sombra de nossos pais. Podia até mesmo ser verdade, mas ela não deixou de se deliciar quando eu mostrei real interesse com a causa do Lorde.
Era estranho o modo como ela idolatrava o Mestre. E a sua voz rouca assumia um tom enlevado e ao mesmo tempo... lascivo. Era quase assustador. Ela afirmava que só ele seria capaz de nos trazer toda a dignidade a que tínhamos direito.
Poder.
Ele nos traria poder e glórias inimagináveis. Seus olhos cor de gelo intilavam de maneira voraz, a mão direita afagava cuidadosamente o antebraço esquerdo. Bellatrix acariciava com palavras a figura do Lorde Negro, com a mesma fascinação que um elfo doméstico dedica a seu dono.
E aquilo acabou por me contagiar, a ponto de me fazer caminhar alegremente para o serviço das trevas.
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