Sobre a paixão dela pelo teatr
Os refletores incidiam diretamente sobre seus olhos. Hermione tinha que segurar-se para não lacrimejar em cena. No bosque não existiam refletores. A cena se passava à luz do luar. Tinha que se concentrar e esquecer da luz. Cantou a música final, e, enfim, pode lavar o rosto. Os aplausos ainda continuavam. Era um sucesso! Adorava os aplausos, as cenas e o figurino. Desceu e foi cumprimentar o público. Intercalava personagem e atriz, a gosto do freguês. Foi para casa mais tarde. Os pés doíam.
Dormiu.
A Rotina era sempre a mesma, cenas, textos, brigas e refletores. Não gostava muito de dirigir. Não tentava. Hermione ainda não era uma atriz famosa, mas tinha potencial e esbanjava charme. É certo que já tinha anunciado não fazer, em hipótese alguma, teste do sofá. Ela tinha medo de cena de nu. Tinha medo de beijo técnico. Era crua. Era nova. Tinha acabado de sair da escola. Dezoito anos... Ainda tinha muito que aprender para poder parar de fazer infantil.
Assistia peças compulsivamente. Cinema tinha perdido a graça. Ia ao teatro, fizesse chuva ou sol. Era, então, uma quinta feira. Tinha sido convidada pelo seu diretor para assistir à ultima apresentação de uma peça que tinha ficado o ano todo em cartaz, mas que ela não assistiu. As entradas estavam mais baratas. Ela foi com duas amigas. Chegou atrasada. Na porta do teatro, estavam o seu diretor e um outro, jovem.
- Hermione, isso são horas?- O diretor esbravejou.
- Me desculpe, Lucia se perdeu para chegar à minha casa.
- Tudo bem. Dessa vez eu perdôo. - O diretor disse, enquanto começava uma música que vinha de dentro do teatro.
- A peça já começou? - Hermione perguntou ansiosa. O diretor, então, virou-se para o rapaz do seu lado e perguntou:
- Essa música faz parte do espetáculo?
- Não - O rapaz respondeu.
- Hermione, quero que conheça Draco Malfoy, ele é produtor desta peça.
- Prazer. - Ela disse, estendendo a mão para um aperto. Surpreendeu-se, por ele, ao invés de usar daquele cumprimento jovial mundialmente conhecido, o aperto de mão, beijou-lhe as costas da mão direita.
- Satisfação. - Ele respondeu.
As amigas de Hermione foram também apresentadas ao jovem produtor, e as três logo rumaram para a sala de espetáculos.
Os atores já estavam em cena. Estavam todos congelados. Hermione reconheceu um deles como sendo um antigo colega de curso. As outras eram todas mulheres. Todas muito belas. O espetáculo transcorreu sem cenário. Os atores se movimentavam entre jogos de palavras, personagens já existentes, metalinguagem, luzes e canto. O amigo de Hermione estava particularmente bem, fazendo papel de mulher. O texto falava apenas de mulheres, era uma adaptação livre da obra de Nelson Rodrigues, intitulada Mulheres de Nelson. A castanha concentrou-se, durante todo tempo, no espetáculo. Tinha fome de teatro. Queria aprender mais. Queria copiar trejeitos. Queria poder falar mal.
Vieram os aplausos, mas a cortina não fechou-se. As luzes do palco se apagaram todas, e os atores trocaram suas camisolas transparentes por roupões pretos de seda, na frente do público. Chegou o diretor daquela peça. Propôs uma discussão à respeito dos temas sugeridos pelo incomodante espetáculo. Tinham que concordar que aquela peça não era nem um pouco para menores. Hermione, a cada cena, levava um tapa. Teria ela, coragem de fazer aquilo? De ficar nua, de beijar mulher, expor os seios?
Era atriz, não era? Se não era, que virasse.
Discutiu com o diretor da peça, a respeito de Nelson Rodrigues, que Hermione sustentava como sendo um cara conservador e reacionário, enquanto o outro não concordava. Acabou-se o debate. Todas as luzes se acenderam.
Foi cumprimentar Blaise Zabini, seu amigo do curso de teatro. Abraçaram-se empolgadamente. É certo que tinham conversado pouco na época do curso, mas ele tinha estado tão bem em cena que ela não poderia deixar de abraçá-lo assim. Elogiou-o quanto pode. Estava realmente feliz de ver como ele tinha crescido.
- E você, continua com teatro, não é? - Blaise perguntou.
- Claro! A gente não consegue viver sem... Estava num infantil, a temporada acabou ontem. Agora dá pra eu assistir as peças de vocês, enquanto ensaio outras.
- Bom saber! Vou te assistir, só me chamar!
- Claro que chamo!
- Ah! Lindo! Você tem orkut? - O tal produtor chegou, do nada, e usou um tom de voz irônico para se dirigir a Blaise. - As fãs estão te enchendo muito?
- Ei, ele é meu amigo! - Hermione retrucou, rude.
- Que vocês são amigos deu pra perceber. Mas só por que é amigo não pode ser fã? - Draco Malfoy continuava usando um tom irônico, desta vez, porém, era mais masculino.
- Olha: fã, pra mim, é uma relação que vem de baixo pra cima. É desigual. - Hermione retrucava, azeda.
- Eu sou fã de Blaise e sou amigo dele. Ele é meu fã e é meu amigo.
- Já entendi! Mas pra mim não é assim! - Ela parecia uma criança mimada ao responder - Enfim, parabéns Blaise, estava muito bem!
Os dois se abraçaram e Hermione foi cumprimentar outro conhecido, que tinha visto fazer a iluminação do espetáculo. Abraçaram-se e tentaram descobrir de onde se conheciam. Descobriram que, se ele não tivesse largado a faculdade, seriam futuros colegas de profissão. Lembraram de um curta-metragem que os dois fizeram juntos, e que o diretor nunca chegou a exibir. Falaram mal do diretor do curta. Reclamaram que gastaram dinheiro. Riram. Draco Malfoy apareceu novamente.
- Está virando perseguição, eim... - Hermione falou, em tom sarcástico, para o produtor.
Ele respondeu alguma coisa desimportante e os dois ficaram conversando por alguns minutos. Ele, Draco, era filho do professor de teatro dela. Blaise era um ex-aluno do curso. Draco e Blaise moravam juntos. Ela ria de alguns comentários dele. A carranca não saiu. Hermione tinha essa coisa de “marra de primeiro dia”, ela fingia-se de brava. Sabia que não era. Andaram de braços dados em direção ao diretor de Hermione e conversaram numa roda com as amigas dela. Todos corteses. Todos agradáveis.
Reunião de elenco. O produtor e Blaise saíram para acompanhar. Hermione ainda ficou mais um tempo no teatro. Rumaram, depois, para suas casas, na cidade vizinha. Aquele teatro era o melhor da região. Hermione sonhava apresentar-se nele. Tinha uma luz diferente, um cheiro diferente. Devia ter um gosto bom. Queria aquele palco, aquela arte, a vida de alguém por ela.
Encheu os pulmões antes de tentar adormecer. Não pode.
Tinha nela uma ânsia de arte inigualável. Precisava por tudo pra fora, talvez gritar, talvez escrever. Fixou-se numa folha branca e disse da catarse que nunca entenderia. Talvez ela também fosse poeta. Ainda não sabia qual era a sua. Sabia que toda arte trazia catarse e queria catarse pra sempre.
Adormeceu sonhando com véus. A arte tinha poder purificador. Amanheceu com pássaros cantando como nunca antes. Um clichê, pensou. Romantismo já não tinha passado?
Tomou um banho e pôs-se a trabalhar a personagem que deveria estar pronta na quarta feira. Conseguiu sugar o máximo que pode. Pôs se a andar com livros na cabeça, sim, a personagem deveria ter uma postura bem melhor que a dela. Fez todos os alongamentos. Seguiu a rotina, então estável, de atriz.
NA: Eis mais uma fic minha, que eu só vou atualizar se as pessoas deixarem review. Os motivos são maiores que puro capricho de pessoa egoísta. Essa fic ainda me dói. Ainda é difícil escrevê-la. Que se eu fosse dedicá-la a alguém seria ao meu ex. E esse começo da fic é exatamente o nosso começo. Só que dessa vez, como eu escrevo a história, os rumos são outros e a personagem principal não sou eu. Preparem-se para Shekespeare, Nelson Rodrigues e Chico Buarque!
E no mais, leiam Quadrilha (capítulo 10 online semana que vem), Campo de força, Overdose (feita para o mesmo ex de Bastidores), Flores, Veneza, Depois do Bar e... em breve, se tudo der certo, A resposta para todas as perguntas (uma RHr, feita por uma autora que não gosta de RHr, tentando ser fluffy).
E só por que propaganda é a alma do negócio, meu blog cor-de-rosa:
www.alinedias.blogspot.com
Beijos
Anne-que-se-chama-Aline
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