Capítulo 5
Every step that I take is another mistake to you”
Quando Snape voltou à sala, Draco acordou de seu devaneio e se arrependeu amargamente de se deixar encontrar naquela posição ridícula. Apesar disso, não conseguiu enxergar nos olhos negros do ex-professor nada que pudesse evidenciar que ele concordava com Draco que aquilo era uma atitude de criança. Snape deveria saber que agora o jovem estava marcado para sempre por algo que deixou de fazer. Mesmo assim, Snape foi duro ao dizer:
- Levante-se do chão. Preciso explicar algumas coisas antes de irmos ao encontro do Lorde das Trevas, amanhã pela manhã. Ele está em Godric´s Hollow, num esconderijo próximo ao local onde assassinou os Potter.
- Por que o Mestre se esconde em Godric´s Hollow? – Draco questionou enquanto se levantava e assumia novamente o ar de arrogância que lhe era habitual, mas agora com um esforço ainda maior e já não tão convincente. – Ele poderia escolher qualquer outro lugar do mundo, e por que elegeu justo aquele onde foi derrotado pelo Potter Perfeito?
- Os desígnios do Mestre pertencem apenas a ele – Snape não olhava para o garoto, mas estava concentrado numa lasca da parede ao seu lado. – Aprenda isso e já será meio caminho andado, Draco.
Um trovão se fez ouvir do lado de fora e a construção frágil estremeceu. Draco olhou pela janela e encarou o pretume da rua, agravado pela falta de estrelas da noite nublada. Talvez a tempestade viesse para lavar-lhe a alma, levar embora tudo aquilo que ele não queria mais guardar dentro de si. Se o dia amanhecesse depois da tempestade, poderia trazer esperanças de que ele sobrevivesse, de que o Lorde entendesse os reais motivos pelos quais ele não pôde cumprir a missão. O Mestre não poderia negar que ele havia tentado e se empenhado, mas Snape dificultou as coisas quando quis tomar a glória toda para si. Era isso, esta era a linha de raciocínio que poderia salvá-lo da condenação. Acusaria Snape de tudo, diria que ele se interpôs entre Draco e Dumbledore, impedindo assim o jovem de matá-lo como seu mestre ordenou. A solução era acusar Snape.
Draco dirigiu o olhar desafiador para o ex-professor, que também o encarava. Ia dizer tudo o que pensava sobre ele quando um novo trovão ecoou na sala, e as gotas grossas de chuva começaram a fustigar o vidro empoeirado, lavando a sujeira das paredes, das janelas e da vida de Draco. Ele abriu a boca para falar, mas não conseguiu articular nenhuma palavra. Apenas observava, enquanto Snape se sentava num canto da sala e abria uma espécie de tampa de madeira que ocultava um pequeno piano velho e enferrujado. Snape passou os dedos longos e um tanto tortos pelas teclas, o que fez com que o instrumento produzisse um barulho desafinado. Tocava uma música suave, um jazz moderno que não combinava em nada com o momento, e que provavelmente era coisa de trouxas. Draco estava surpreso com a atitude do professor. Jamais imaginou que ele fosse afeiçoado a este tipo de cultura trouxa. Snape não tocava tão bem, e o piano não ajudava muito, por estar desafinado, as cordas protestando pela falta de uso. Mas ele continuava tocando, e a chuva continuava castigando o lado de fora da casa, como se a construção fosse o útero de uma mãe que velava pela segurança de um bebê, mas ao mesmo tempo sufocava. O som fazia com que Draco se sentisse relaxado e, sem ao menos notar, ele voltou a se sentar na poltrona puída da sala. Snape parecia não notar sua presença ali, talvez nem se importar muito. Apenas continuava tocando, como se não tivesse que dizer a Draco nada que importasse. Como se as areias do tempo não estivessem caindo velozmente rumo ao amanhecer. O jovem foi incapaz de se controlar e soltou displicentemente um questionamento, mas sua voz não tinha nada de acusador:
- Por que você está tocando isso agora?
- Porque há certas coisas na vida – Snape sequer olhava para o garoto – que não podemos esperar. Elas têm que ser feitas no agora, caso contrário se perdem eternamente em meio ao turbilhão do destino.
- Snape... – Draco ia dizer alguma coisa, mas se esqueceu do que queria falar. Apenas deixou que o embalo do jazz levasse seu pensamento a vagar mais uma vez naquela noite.
Estava em seu terceiro ano em Hogwarts. Sirius Black, que Draco acreditava ser um dos seguidores fiéis do Lorde, e também o traidor do segredo dos Potter, havia fugido de Azkaban e aterrorizava a comunidade bruxa. Mas Draco sequer se importava com isso. Tudo o que queria era conhecer mais e mais sobre Artes das Trevas. Não que gostasse muito de estudar, mas depois do aniversário de casamento dos pais, pedia autorizações esporádicas de Snape para utilizar o acervo da área restrita da Biblioteca. Embora pesquisasse alguns livros, Draco não conseguia se concentrar em nenhum deles. Achava tudo aquilo inútil. Não entendia e nem tampouco questionou seu pai sobre o porquê de escolher a traidora do sangue da Weasley para abrir a Câmara Secreta. Na verdade, Draco teria feito aquilo com orgulho e sem a necessidade de manipulação de um diário idiota, se tivesse sido convocado para tal. Mas o pai não confiava nele, e Draco queria contrariá-lo. Queria levá-lo a se arrepender de não ter dado o diário nas mãos dele.
Àquela altura, o ódio de Draco por Harry Potter já estava velado e consolidado, cultivado a cada dia por ambas as partes. Mas o sentimento de desprezo era o que imperava em sua relação com Hermione Granger e Rony Weasley. E ele se surpreendeu absurdamente quando a garota o interpelou e ameaçou com a varinha mesmo diante de Crabbe e Goyle. Ele havia demonstrado estar feliz com a iminente condenação do hipogrifo maluco de Hagrid, e acabou por insultar o professor de Trato das Criaturas Mágicas diante do trio e do próprio Hagrid. Granger não hesitou em tacar-lhe um tapa na cara com toda a força que conseguiu reunir. Logo em seguida, ameaçou-o com a varinha. Irritado, sentindo-se humilhado pela garota, e sem querer admitir que ficou com medo, Draco resolveu reclamar ao pai sem citar o tapa, mas apenas a ameaça. Preparou a carta e mandou-a via correio-coruja. Afinal, se Lúcio Malfoy podia dar um jeito no hipogrifo do mestiço do Hagrid, porque não poderia também arrumar uma forma de prejudicar a senhorita Granger?
No entanto, o estômago de Draco revirou quando, na manhã seguinte, ele recebeu um berrador. Sorte que a coruja o entregou em seu próprio dormitório nas masmorras da Sonserina, portanto poucas pessoas escutaram o conteúdo. Era como se Draco estivesse revivendo cada palavra gravada permanentemente em suas lembranças. A voz do pai ecoou pelo dormitório onde ele estava com seus capangas:
- Draco Malfoy! Um exímio membro de uma família de sangue-puro apanha de uma nascida trouxa e quer que seu pai o defenda? Quer que use de minhas influências para prejudicar a família desta escória? Aprenda a se defender, Draco! Aprenda a fazer as coisas sozinho, pelo menos uma vez na vida. Aprenda a honrar o nome de sua família e a dar os passos certos rumo à sua própria glória. Pare de me envergonhar! Assinado, seu pai, Lúcio Malfoy.
Em seguida, o berrador se desfez em minímos pedaços diante dos estupefatos asseclas de Draco. Envergonhado, encarou Crabbe e Goyle e gritou:
- O que é que vocês estão olhando?! Saiam daqui, anda, quero ficar sozinho! E se mencionarem a alguém o que aconteceu aqui, juro que amaldiçôo vocês com um Cruciatus antes que possam me pedir perdão.
Os gorilas de Draco saíram do quarto e foram se reunir ao grupo da Sonserina no salão comunal da casa. Não queriam que Draco os questionasse sobre o acontecimento, já que ambos haviam contado aos pais sobre o caso, e provavelmente esta foi a maneira como Lúcio ficou sabendo do tapa da Granger. Draco permaneceu abandonado em sua própria cama, mirando o teto e sentindo que cada novo passo que dava para tentar agradar o pai era encarado como mais um erro para a interminável lista de imperfeições que ele guardava sobre o próprio filho.
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